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1.2 MOVIMENTOS SOCIAIS E ACADEMIA NA CONSTRUÇÃO INDENITÁRIA E

1.2.2 Definição oficial do conceito agricultor familiar

Criado em 1995 através da Resolução nº 2.191 do Banco Central do Brasil, e posteriormente instituído em 1996, pelo Decreto nº 1.946, o objetivo do PRONAF cuja finalidade como mencionado em seu artigo primeiro, é “de promover o desenvolvimento sustentável do segmento rural constituído pelos agricultores familiares, de modo a propiciar-lhes o aumento da capacidade produtiva, a geração de empregos e a melhoria de renda”. (BRASIL, 1996).

O estudo realizado pela Food and Agriculture Organization (FAO) e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), baseando-se no Censo Agropecuário de 1996, foi decisivo na formação do conceito de agricultura familiar. O formulou nova metodologia para apreensão do perfil da agricultura familiar no Brasil. Percebeu-se que 85% dos estabelecimentos agrícolas eram familiares. Representando também a grande capacidade produtiva da agricultura familiar, apesar de não ter os mesmos recursos produtivos do setor patronal, os agricultores ocupavam 30% da área total, dos quais 75% destes possuíam áreas que não ultrapassavam cinco hectares.

Em 2006, o Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), integrou uma base de variáveis que possibilitou introduzir estabelecimentos familiares em seus levantamentos e foram baseadas nas concepções da Lei da Agricultura familiar de 2006.

Através da instituição da Lei 11.326, de 24 de julho de 2006, estabelece os conceitos, princípios e instrumentos destinados à formulação das políticas públicas direcionadas à Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais. Conforme esta Lei, os agricultores familiares que possuem área de até 4 módulos fiscais, que utilizem predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, que tenham renda familiar advinda de atividades econômicas do seu estabelecimento e que dirija o seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. Nesta Lei são incluídos os silvicultores, aquicultores, extrativistas, pescadores e povos indígenas e integrantes de comunidades remanescentes de quilombos rurais e demais povos tradicionais.

Pelo Pronaf, vão, em tese, sendo integradas como beneficiários do apoio institucional, diversas categorias socioeconômicas de produtores sob uso do

trabalho familiar e correspondentes a modos diferenciados de existência social: extrativistas, pescadores, silvicultores (definidos pela atividade produtiva mais valorizada nos termos do programa); ribeirinhos (definidos pela adequação de práticas sociais aos ciclos de imersão ou emersão de várzeas)12; e remanescentes de quilombos (modo específico de apropriação e legitimação de posse e uso da terra). Portanto, concomitantemente, o termo

agricultor familiar, se ladeado ou apresentado relacionalmente, designa um

segmento por esse prisma diferenciado, mas parte do conjunto afiliado ao setor agricultura familiar. (NEVES, 2007, p. 16)

Não podemos negar que a criação de um conceito oficial ou de uma categoria política, que direciona aos agricultores familiares políticas públicas, algo que como mencionado ao longo do texto, foi resultado de muita articulação por parte de diferentes setores sociais ao longo das últimas décadas trata-se de uma conquista e representa um marco de reconhecimento político, além de abrir novas perspectivas para o seu reconhecimento empírico (WANDERLEY, 2011). Em resumo, Conforme Neves,

(...) o termo agricultura familiar corresponde então à convergência de esforços de certos intelectuais, políticos e sindicalistas articulados pelos dirigentes da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, mediante apoio de instituições internacionais, mais especialmente a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD). (NEVES, 2007, p. 15).

A definição da categoria agricultor familiar colocada pelo PRONAF é fechada, e ao mesmo tempo tem o intuito de englobar variados perfis de agricultores familiares que se enquadram nas suas políticas. Não podemos fazer uso deste conceito, visto que não nos ajuda analisar as especificidades de perfis que podemos encontrar no meio rural brasileiro, quanto a este público. Segundo Neves (2007), não pode ser reconhecido ou utilizado como noção analítica, visto que engloba uma diversidade de perfis em um único conceito e ao mesmo tempo não nos ajuda a compreender a diferenciação.

Segundo a crítica de Carneiro (2000), o caráter familiar da agricultura não se resume a uma quantificação do tempo trabalhado pela família confrontado ao trabalho assalariado que as unidades familiares, podem, porventura, contratar. Para ela, a especificidade do sistema familiar está na família responder pela organização técnica e execução das tarefas agrícolas, e, principalmente, pelo destino dado aos produtos desse trabalho. Nesse contexto, há uma amplitude enorme de sistemas familiares de exploração em que a família sintetiza uma rede de relações sociais que perdem sentido ao se resumirem às suas particularidades nas relações de mercado e de trabalho.

Conforme Wanderley (2009), o agricultor familiar, é um ator do mundo moderno, afirmativa que esvazia qualquer análise em relação à decomposição do campesinato. Comungando do conceito de Marcel Jolivet (2001, p.80), “no agricultor familiar há um camponês adormecido”. Neste sentido,

(...) o que concede aos agricultores modernos a condição de atores sociais, construtores e parceiros de um projeto de sociedade – e não simplesmente objetos de intervenção do Estado, sem história – é precisamente a dupla referência à continuidade e à ruptura (WANDERLEY, 2009, p. 189)

Conforme Lamarche (1993), os agricultores familiares portam uma tradição, fundamentada pela centralidade da família, pelo modo de vida e pelas formas de produzir, porém, devem-se adaptar às modernas condições da sociedade, pois há presença de influências de uma sociedade englobante, assim como estão inseridos no mercado moderno.

Segundo Wanderley, (2009), na sociedade moderna, no que se refere ao agricultor familiar e a reprodução do seu grupo, é possível identificar rupturas e permanências entre o atual agricultor moderno e o camponês. Ao invés de produzir apenas para subsistência do grupo, aos agricultores familiares podem demonstrar importante envergadura para investimentos a partir da integração com os mercados modernos. Porém os resultados da produção na unidade familiar permanecem indivisíveis. Neste sentido,

Essa permanência não é sem consequências, uma vez que ela explica a possiblidade de realização de projetos comuns pelo conjunto da família, e ao mesmo tempo, a emergência de alguns dos conflitos frequentes entre os membros da família, entre pais e filhos, marido e mulher etc. (WANDERLEY, 2009, p. 192).

Para permanência e reprodução familiar no campo, os agricultores familiares brasileiros, criam diferentes estratégias em meio à pobreza e às dificuldades enfrentadas: seja por falta de recursos financeiros e/ou dificuldades de cunhos naturais, secas ou excesso de chuvas. No terceiro capítulo, serão mobilizadas discussões a partir das realidades apresentadas em relação aos agricultores familiares, no que se refere às limitações, crenças, e às estratégias adotadas na busca da adaptação ao mercado.

1.3 ORGANIZAÇÃO DOS AGRICULTORES FAMILIARES E ADAPTAÇÃO