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Delineamento da pesquisa

No documento BEATRIZ VASCONCELOS MATIAS (páginas 93-96)

4. A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS COM POVOS INDÍGENAS:

4.2. Delineamento da pesquisa

A pesquisa desenvolvida teve como objetivo geral analisar os resultados das ações protetivas desenvolvidas por organismos públicos, no grupo kaingang da Aldeia Gyró, desde o início do assentamento nesta aldeia, até o primeiro semestre de 2019, para descobrir os seus impactos no modo de viver das famílias, que constituem essa Aldeia. Para isso, a pesquisa traçou como objetivos específicos: identificar as ações protetivas desenvolvidas por organismos públicos na Aldeia Gyró; descobrir a opinião dos indígenas da aldeia sobre as ações protetivas desenvolvidas com eles por organismos públicos; analisar os resultados das ações protetivas desencadeadas, na aldeia, no modo de vida de seus habitantes; e contribuir com o debate sobre o processo de assimilação cultural, satisfação das necessidades básicas e respeito a autodeterminação de povos indígenas na sociedade brasileira, decorrentes da proteção social.

A pesquisa de abordagem qualitativa foi desenvolvida na perspectiva crítico- dialética, para que pudéssemos analisar em profundidade o fenômeno escolhido, em sua essência, para além da aparência. Buscou-se fazer uma análise atenta, posicionada e perspicaz para não isolar o fenômeno, tampouco os sujeitos pesquisados do contexto da totalidade28 da sociedade capitalista. Não foi desprezada a influência dos múltiplos fatores determinantes das condições de vida, material e espiritual e das ideologias que permeiam o cotidiano dos sujeitos pesquisados. Foi dada atenção às particularidades e singularidades do contexto social, político,

28 A categoria de totalidade significa [...], de um lado, que a realidade objetiva é um todo coerente em

que cada elemento está, de uma maneira ou de outra, em relação com cada elemento e, de outro lado, que essas relações formam, na própria realidade objetiva, correlações concretas, conjuntos, unidades, ligados entre si de maneiras completamente diversas, mas sempre determinadas (Lukács, 1967, p.240).

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econômico e histórico no qual os sujeitos estão inseridos. Lukács (1982) ajuda compreender a mediação, assegurando que a mesma funda-se em três categorias: a generalidade, a particularidade e a singularidade. Nesta perspectiva, o ser humano estabelece vínculos tanto com a natureza, quanto com a sociedade por meio da relação dialética, desenvolvida entre seu ser singular, não semelhante a nenhum outro, e o seu ser geral, que se identifica com os outros seres humanos na vida em sociedade e com a espécie, bem como com todos os seres vivos, na natureza.

A negação recíproca entre a singularidade e a generalidade é a particularidade; ela é o movimento que relaciona o singular com o geral, estabelece a mediação entre estes e é responsável pela relação dos dois termos. Este movimento torna relativas tanto a generalidade como a singularidade, devendo elas serem compreendidas como processos que tendem à generalização e à singularização, respectivamente. Assim, não se pode alcançar a generalidade ou a singularidade, pois cada generalidade alcançada deve ser superada por uma outra que a contém. O mesmo ocorre com a singularidade, ela também deve ser entendida na perspectiva da superação (ALMEIDA, s/d, s/p).

A tensão entre os termos opostos, a generalidade e a singularidade, ocorre por meio da mediação que se expressa na particularidade. Por isso, nenhuma pesquisa é igual a outra, mesmo quando nelas se aborda o mesmo assunto e se utiliza dos mesmos critérios de seleção e organização do tema e problema de pesquisa abordados, bem como da mesma metodologia. Assim, não se pode ignorar o cotidiano dos sujeitos pesquisados, pois a efetivação da pesquisa só se dá pela contraposição do conhecimento que se pretende produzir aos elementos deste cotidiano. Porém, não se pode apropriar das vivências cotidianas dos sujeitos pesquisados, pois jamais se poderá ser um deles. A troca de conhecimento durante a pesquisa modifica a vida cotidiana dos envolvidos, mas não a suprime, ao contrário, a fortalece, na medida em que permite que ela seja pensada e, dessa forma, articulada (ALMEIDA, s/d, s/p).

Sob essa abordagem entende-se que tenha sido possível apreender de maneira mais próxima do real, um contexto local com suas particularidades, singularidades e generalidades e que assim se possa inserir o mesmo numa totalidade concreta, onde as questões abordadas façam sentido num contexto social amplo.

Para capturar de maneira abrangente os detalhes das relações sociais dos sujeitos, suas concepções e entendimento a respeito do problema de pesquisa, foi feita uma abordagem qualitativa para procurar responder de maneira mais

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aprofundada questões subjetivas que poderiam ser prejudicadas somente com a quantificação dos dados empíricos. Por isso, conforme sinalizado anteriormente, fez- se uma pesquisa de abordagem qualitativa, de caráter exploratório, descritivo e explicativo, usando como procedimento o Estudo de Caso.

A trajetória da proteção social destinada aos indígenas desde os primórdios, até a atualidade, conforme já apresentado, evidencia a sua complexidade e alerta para a necessidade de contemplar, nesta análise, tanto a particularidade desta Aldeia como a totalidade que constitui os povos indígenas.

Considerando o exposto até aqui, justifica-se a relevância de pesquisar os resultados produzidos pelas intervenções estatais, buscando explicar os limites e possibilidades das ações protetivas junto aos indígenas, no que tange aos resultados sociais (satisfação das necessidades básicas e à garantia e promoção da autodeterminação), bem como dos alcances deste trabalho para fomentar o debate sobre as intervenções estatais junto as populações indígenas.

O estudo de caso realizado usou a observação participante junto aos indígenas da Aldeia Gyró e entrevistas semi estruturadas com as suas autoridades (cacique, vice-cacique), e, ainda, com um outro homem da aldeia, e mais três mulheres de idades distintas, a fim de obter uma diversidade de opiniões.

A análise dos dados se deu pelo método crítico-discursivo, que analisou as falas e interpretou também o que não foi dito, como os gestos, silêncios e abstenções. Intercalando os dados teóricos e empíricos com o auxílio da teoria procurou-se explicar a subjetividade e compreender a objetividade das falas dos entrevistados. Pois, "a linguagem faz parte da sociedade, é uma prática social, um dos mecanismos pelos quais a sociedade se reproduz e autorregula" Gouveia (1997, p. 339), e o discurso molda a sociedade e também é moldado por ela, pelas relações de classe, gênero, raça ou por contextos e instituições Fairclough (1989, 2001), por isso, a importância de analisar de modo crítico as falas obtidas com as entrevistas, tendo presente que é preciso ultrapassar o que é meramente ouvido.

A seguir serão apresentados os resultados da pesquisa, iniciando com a identificação das políticas acessadas.

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No documento BEATRIZ VASCONCELOS MATIAS (páginas 93-96)