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Desafios do Contexto Educacional do Professor de Língua Estrangeira

O presente estudo tem como sujeitos da pesquisa professores que lecionam línguas estrangeiras. Neste tópico, serão apresentadas reflexões acerca dos desafios próprios do contexto educacional no qual esse docente de L.E. está inserido atualmente, no Brasil. Para começar, no documento Parâmetros Curriculares Nacionais de Línguas Estrangeiras (BRASIL,1998), voltado para o terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental, o conhecimento de língua estrangeira é descrito como sendo bastante prestigiado na sociedade brasileira, mas, ainda de acordo com o mesmo documento, tal prestígio não chega à escola, onde as disciplinas de línguas estrangeiras se encontram deslocadas, de sorte que, conforme esse documento, há inúmeros cursos e institutos particulares com a finalidade de ensinar L.E. Apesar de ressaltar que, ao contrário do que propõe a cultura incutida na sociedade, a função de ensinar L.E. é da escola e não dos cursos e institutos de línguas, no próprio documento (Parâmetros Curriculares Nacionais) se afirma que o ensino de L.E. não é visto como importante, para a formação do aluno.

[...] o ensino de Língua Estrangeira não é visto como elemento importante na formação do aluno, como um direito que lhe deve ser assegurado. Ao contrário, freqüentemente, essa disciplina não tem lugar privilegiado no currículo, sendo ministrada, em algumas regiões, em apenas uma ou duas séries do ensino fundamental. Em outras, tem o status de simples atividade, sem caráter de promoção ou reprovação. Em alguns estados, ainda, a Língua Estrangeira é colocada fora da grade curricular, em Centros de Línguas, fora do horário regular e fora da escola. Fora, portanto, do contexto da educação global do aluno. (BRASIL, 1998, p. 24).

Dificuldades inerentes a esse contexto são igualmente expostas, tais como: falta de materiais adequados, turmas muito numerosas, número reduzido de aulas por semana, tempo insuficiente dedicado à matéria no currículo e ausência de ações formativas contínuas junto ao corpo docente. Somadas a ditas circunstâncias, estão: a escolha por desenvolver prioritariamente a habilidade de compreensão escrita – sem que essa opção tenha sido resultado de reflexões linguísticas ou metodológicas –; as contradições entre a proposta de ensino escolhida e os conteúdos; atividades e abordagens efetivamente desenvolvidas em sala.

Nota-se que as circunstâncias ambientais, a própria cultura incutida na escola – e, por que, não dizer entre os próprios professores de línguas? – caminham para um clima pouco motivador, no que concerne ao ensino das L.E.

Celani (2008) afirma que o trabalho como docente é encarado pelo próprio governo brasileiro com menosprezo, como simples ocupação ou “bico” – como a autora descreve – e não como profissão; ressaltando que a profissão pode ser exercida por qualquer um, afirma que se abre espaço para que profissionais de outras áreas e até mesmo de área nenhuma assumam o ensino das disciplinas de língua estrangeira, quando da falta de professor especializado. A despeito de não se referir às línguas estrangeiras no geral, mas ao inglês, os resultados do estudo de Miccoli (2007) trazem informações relevantes para esta investigação, porque apresentam reflexões sobre os desafios que docentes (da rede pública e privada) de língua inglesa enfrentam, no ensino da língua.

A partir dos relatos dos professores participantes de sua pesquisa, Miccoli (2007) tece reflexões a propósito dos desafios para ensinar língua inglesa. O primeiro item destacado é o de que a abordagem predominante ainda hoje, no século XXI, em sala de aula, é a tradicional, que compreende a língua como um sistema estrutural. Assim, nele se aprende a língua como um conhecimento sem aplicação, aprende-se o conteúdo sem que se reflita a sua função dentro do contexto. Outro ponto evidenciado em seu estudo foi o material didático: Miccoli (2007) aponta que há dificuldades relativas à adequação do material à realidade do professor e do aluno – o conteúdo encontrado no material didático, por vezes, excede a carga horária disponível para a disciplina e, outras vezes, deixa a desejar. Além disso, há ocasiões nas quais os alunos não podem comprar o material didático; nesse caso, segundo Miccoli (2007) os docentes acabam por usar lousa e caderno como alternativa para a ausência do material.

Em língua estrangeira, é comum que (baseando-se na Abordagem Comunicativa2) os professores busquem desenvolver um trabalho integrado das quatro habilidades que compõem a língua (a fala, a escrita, a escuta e a leitura). Um dos itens enfatizados por Miccoli (2007), portanto, é a integração das habilidades linguísticas. Os professores que participaram da sua pesquisa relataram dificuldades no desenvolvimento das quatro habilidades em sala e até mesmo a decisão de não trabalhar com a fala e a escuta. Os docentes justificaram a dificuldade, atribuindo-a ao número elevado de alunos por turma, aos

2 A Abordagem Comunicativa defende a aprendizagem que tem como centro o aluno. 0 professor deixa de exercer seu papenão exerce papel de autoridade, de distribuidor de conhecimentos, mas passa a assumir o papel de orientador.

níveis diferentes de aprendizado dos estudantes, à falta de estrutura física da sala de aula, ao pouco tempo de aula com os alunos.

Miccoli (2007) também encontrou relatos dos professores de inglês voltados para as dificuldades no uso das novas tecnologias. Nesse sentido, os docentes mencionaram a ausência de material disponível para o uso, frisando que havia apenas uma TV e um vídeo para toda a escola e que tal realidade tornava o uso inviável. Também foram evidenciados relatos sobre os desafios na avaliação da aprendizagem dos alunos; alguns dos motivos atribuídos pelos professores a tal desafio foram: o interesse dos estudantes pela nota atribuída às atividades e não pela aprendizagem em si, as diferenças individuais entre os alunos, alguns mais adiantados no processo de aprendizagem que outros, a falta de estudo por parte dos mesmos.

Para Miccoli (2007), o perfil dos alunos descrito pelos docentes é variado, havendo alunos interessados e aqueles desinteressados e até mal-educados, preocupados apenas com a nota. A indisciplina é outro item ressaltado pelos professores. Outros desafios levantados no estudo foram a necessidade de os professores estarem sempre motivados para, consequentemente, manter ou alcançar o interesse dos alunos e o fato de que precisam permanecer atualizados para tal e que muitas vezes, a fim de poder preparar aulas interessantes, acabam por usar dinheiro do próprio salário que – conforme assinalam os docentes – já é pequeno.

Outro item que merece destaque dentre as dificuldades expostas pelos docentes é a frustração do professor de língua inglesa frente às condições precárias de ensino em que se encontra, a falta de prestígio da disciplina e a dificuldade de motivar os alunos para as aulas. Sobre isso, Miccoli (2007, p.69) afirma:

O ensino de LI no Brasil já começa desacreditado. Os professores entram em sala de aula conscientes das condições precárias, sem acreditar que possam fazer mais do que ensinar umas poucas coisas. A eterna anedota de que os alunos não saem do verbo “to be” faz parte do folclore do ensino de línguas e parece imutável. Além disso, há a crença de que o estudante que não se expressa bem em português esteja fadado ao insucesso na aprendizagem de LI. Essa crença, pelos relatos dos professores, está na fala de colegas, que não acreditam no ensino de línguas e consideram o professor de LI como um professor de segunda classe. Dessa forma, a frustração parece inevitável. Outros desafios expostos pelos docentes foram: o grande número de alunos por sala, turmas heterogêneas, falta de tempo para desenvolver as atividades da disciplina, ausência de respaldo das políticas públicas, falta de prestígio da disciplina por parte do governo, da própria instituição em que lecionam e de alguns colegas professores de outras

disciplinas. Observa-se que as narrativas dos professores de língua inglesa apontam, de fato, para muitas das mesmas dificuldades enfrentadas por professores das demais disciplinas escolares, porém, outros desafios expostos são próprios da disciplina de língua estrangeira.

A fim de tornar mais claras as especificidades de lecionar língua estrangeira, serão listados alguns dos desafios inerentes ao ensino da disciplina, de acordo com os PCN de língua estrangeira (BRASIL, 1998), Miccoli (2007) e Celani (2008): (1) falta de prestígio da disciplina por parte da sociedade e do governo; (2) falta de prestígio/valor da disciplina por parte da escola e de colegas professores de outras disciplinas; (3) desinteresse em aprender língua estrangeira por parte dos alunos; (4) número alto de alunos em sala (inviabiliza o desenvolvimento das quatro habilidades linguísticas); (5) pouco tempo de aula (normalmente duas aulas por semana) para desenvolver um bom trabalho; (6) dificuldade para desenvolver as quatro habilidades linguísticas; (7) alunos em níveis diferentes de aprendizado da língua e (8) abordagem metodológica tradicional.

Há que se considerar, portanto, que ensinar uma língua estrangeira é seguramente tarefa árdua, em nosso país, e que vale a pena dedicar-se a estudos que investiguem o contexto de ensino da área e o estado físico e emocional do docente que trabalha com a disciplina. Na sequência, serão apresentados estudos recentes acerca da autoeficácia de professores e da Síndrome de Burnout.

3. PESQUISAS RECENTES E ANÁLISE TEÓRICA ACERCA DA AUTOEFICÁCIA