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4 O PROCESSO METODOLÓGICO

5.1 Consigna da atividade e versão final do poema “a cidade”

5.1.2 Descrição das rasuras orais

Iniciamos a descrição das rasuras orais a partir do momento em que a dupla começa a escrever e negociar o que colocar no poema, após as orientações efetivadas pelo professor/coordenador da atividade. Os momentos que antecedem a escritura do poema em dupla ou momentos em que outros sujeitos falam enquanto a dupla está escrevendo o poema não farão parte de nossas descrições. Mas existe um turno em que veremos o quanto o texto-dialogal realizado pelo professor/coordenador e Valdemir faz surgir uma rasura oral. O que pretendemos afirmar é que, mesmo o texto sendo produzido pela dupla de alunos, outros sujeitos podem fazer as rasuras orais surgirem, já que uma palavra deste texto-dialogal aparece poema. Veremos este texto mais adiante.

As descrições que seguem são realizadas levando em conta os tipos de rasuras apontadas no segundo capítulo a partir das pesquisas de Calil (2010): rasura direta: branca ou negada; e rasura glosada: pragmática, textual, gráfico- ortográfica ou lexical.

Início da escrita do poema realizado pela dupla.

As descrições serão feitas a partir do tempo cronometrado, marcado acima, quando a professora Maria José entrega a folha a dupla, em diante, ou seja, as descrições se iniciam no tempo de 00:13:59.912 e seguintes.

A primeira rasura oral descrita na filmagem é que acontece no momento de tensão da escolha entre as palavras “VERACIDADE”, proposta por Valdemir,

“VERICIDADE”, proposta pelo professor/coordenador da atividade e “VELHICIDADE” proposta novamente por Valdemir, respectivamente, todas rimando com as palavras “CIDADE” e “IDADE”.

Texto-dialogal 1: 00:16:35.120 – 00:16:52.110 do processo de escritura do poema sem título, produzido a partir da palavra “cidade”.

Valdemir parece ter se confundido ao dizer a palavra “VERACIDADE”, pois explica no turno de 00:16:50.090 a 00:16:51.490 que quer escrever uma palavra relaciona com “velha”:

Explicação de Valdemir sobre a palavra “veracidade”.

Essa explicação que Valdemir faz “É. MAIS VELHA ASSIM...”, ao mesmo tempo em que afirma o que o professor/coordenador havia falado, também nega. Ele afirma com o “É” e nega, explicando, com “MAIS VELHA ASSIM...”. Valdemir pretende usar a palavra que tenha relação com “velha” e dessa maneira escolhe [“VELHICIDADE”] (VELHA + IDADE = VELHICIDADE ou VELHA + CIDADE = VELHICIDADE).

Este tipo de rasura oral não acontece com frequência no processo de escritura do poema, realizado pela dupla de alunos, como as rasuras orais pragmáticas, gráfico-textuais e lexicais, por exemplo. Esta rasura oral tem um caráter de modalização autonímica, pois vem acompanhada de um comentário meta-enunciativo, “caracterizados pelo retorno imprevisível sobre elementos atualizados no dizer do coenunciador” (CALIL, 2010) uma glosa que aparece na tentativa de explicar o que quer dizer e escrever no poema.

Valdemir desdobra seu dizer, e o dizer do professo/coordenador, para adequá-lo a “velha”. Ele busca o termo mais justo, mais adequado a “IDADE” que está ligado à juventude, idade adulta e velhice. Não seria adequado escrever “veracidade” ou “vericidade”, mesmo ambas tendo seus finais em “cidade”, quando a explicação se refere a algo ligado a “idade”, que é a velhice, representada pela palavra “velha”.

A rasura oral que segue, diz respeito ao texto-dialogal 2, o qual a folha e a caneta estavam em posse da aluna Maria das Graças. Ela acontece quando Valdemir retoma a dizer a palavra “VERICIDADE” e o professor/coordenador com um tom de espanto o interroga: “HÔ? Em seguida, Valdemir fala a palavra que entra no poema, pausadamente: “VE-LHI-CI-DA-DE” e ainda faz uso do “NÉ?”, mas ainda se portanto ao professor/coordenador e não a Maria das Graças. Nesse momento o professor/coordenador diz: “ENTÃO, VOCÊ DIZ PRA ELA.”

Texto-dialogal 2: 00:19:10.480 – 00:19:21.930 do processo de escritura do poema sem título, produzido a partir da palavra “cidade”

O que vemos anteriormente diz respeito ao que vai estar representado no poema, que é a palavra [“VELHICIDADE”], mas o que nos chama atenção é o “HÃ?”, postulado pelo professor/coordenador. Esta interrogativa pode ter várias interpretações, como: VERICIDADE? ou NÃO ERA VELHICIDADE? ou É ESSA PALAVRA MESMO? Este comentário – “HÃ?” – remete-se à palavra “VERICIDADE”, que não entra no poema, e faz surgir uma rasura oral de glosa lexical. Imediatamente Valdemir diz “VELHICIDADE” de forma pausada como se quisesse dizer: “vericidade não! é melhor velhicidade, né?” dando origem a mais uma rasura oral de glosa lexical.

A fala do professor/coordenador “ENTÃO, VOCÊ DIZ PRA ELA”, mostra que ele vai ser afastar e deixar a dupla seguir fazendo o poema. É neste momento que Maria das Graças escreve [“VELHICIDADE”].

Outra rasura aparece posterior ao momento ao que Maria da Graças escreve [“VELHICIDADE”] e diz “NÃO SEI SE VELHICIDADE FICOU CERTO”, realizando uma rasura oral de glosa gráfico-ortográfica, pois ela está referindo-se a

escrita correta da palavra. Mas, não obtém resposta de Valdemir, que ignora sua observação sobre a escrita da palavra dizendo: “VÁ, PULE UMA LINHA E FAÇA

OUTRA”, com tom de autoridade, como vemos no texto-dialogal 3:

Texto-dialogal 3: 00:19:47.269 – 00:19:55.890 processo de escritura do poema sem título, produzido a partir da palavra “cidade”.

O professor/coordenador se aproxima mais uma vez da dupla e pergunta como ela está se saindo: “E AI?”. Valdemir na tentativa de dar continuidade ao poema fala: “A LEITURA DA CIDADE É DURA”, mas sem falar com Maria das Graças se ela concorda ou não. Esta fala de Valdemir não aparece no poema escrito, mesmo com a tentativa de explicação do professor/coordenador e da ordem para colocar o que havia falado: “NO SENTIDO DE... DE... DE... LER A CIDADE.

NO SENTIDO DE ENTENDER A CIDADE. BOTE!”. Maria das Graças não entende o

que é para escrever e pergunta: “O QUÊ?”, como vemos no texto-dialogal 4, que nos mostra a ocorrência de uma rasura oral de glosa lexical, já que está havendo um comentário sobre o que seria “a leitura da cidade é dura”.

Texto-dialogal 4: 00:22:24.700 – 00:22:55.434 processo de produção do poema sem título, produzido a partir da palavra “cidade”.

No texto-dialogal 5, a rasura oral que surge é uma glosa lexical, pois Valdemir quer saber como é que se fala a palavra “escritura”, usando a frase:

“COMO É ESSA PALAVRA?”, pronunciada por ele, neste texto-dialogal, inicialmente

como “esquitura”. O professor/coordenador e Maria das Graças falam cada um duas sílabas da palavra de forma correta: “ESCRI” (professor/coordenador – TC: 00:23:01.294 – 00:23:01.714) e “TURA” (Maria das Graças – TC: 00:23:01.830 – 00:23:02.260).

Texto-dialogal 5: 00:22:55.944 – 00:23:13.840 processo de produção do poema sem título, produzido a partir da palavra “cidade”.

Continuando o texto-dialogal 5, o professor-coordenador pergunta “A

ESCRITURA DA CIDADE NÃO TEM MAIS IDADE OU A LEITURA DA CIDADE NÃO?, para que a dupla pense e faça a escolha que achar mais adequada. O que

surge a seguir é o que nos chama a atenção. No texto-dialogal 6, Valdemir opta pela segunda opção: “A LEITURA DA CIDADE NÃO TEM MAIS IDADE”, mas o que fica registrado, por Maria das Graças, no poema é mais parecido com a primeira: [“A ESCRITURA DA CIDADE NÃO TEM MAIS IDADE”], como vemos no trecho abaixo:

Verso do poema sem título, escrito por Maria das Graças.

Texto-dialogal 7.

No texto-dialogal acima, observamos que Maria deseja colocar algo diferente do que os dois haviam combinado anteriormente, mas algo que também foi sugerido pelo professor/coordenador no TC: 00:23:25.970 – 00:23:26.580 (“É DURA”). Maria das Graças confirma que deseja escrever o trecho proposto pelo professor/coordenador no TC 00:23:29.623 – 00:23:30.980 (“É DURA. ESSA!) e também no TC 00:23:34.490 – 00:23:35.470 (“ESSA É MAIS MELHOR”). O professor-coordenador propõe que a dupla escreva as duas opções e que depois veja e escolha o que fica melhor. Maria das Graças solicita a ajuda de Valdemir dizendo “COLOCO QUAL?” no TC 00:23:47.022 – 00:23:47.802.

Posteriormente, Valdemir, com um tom irônico e autoritário, manda Maria escrever o que ela quiser “BOTE O QUE QUISER BOTAR. BOTA AÍ O QUE VOCÊ

DISSE”, no TC de 00:23:54.396 – 00:23:57.040. Maria das Graças parece não

entender o que Valdemir falou, ou o motivo pelo qual ele falou dessa maneira, e o interroga com “HEIM?” como nos mostra o TC 00:23:50.682 – 00:23:52.102.

A glosa sobre o que acontece quando Valdemir fala com tom irônico e autoritário com Maria das Graças é uma rasura oral de glosa pragmática, pois está referindo-se ao que ela falou imediatamente. Essa mesma fala de Valdemir marca

uma glosa pragmática de negação. Valdemir não falou em nenhum momento para Maria das Graças não colocar, mas o tom de sua voz deixa claro que não era isso que ele pretendia escrever se estivesse de posse da folha e da caneta.

A autoridade de Valdemir, sobre a produção do poema, se consolida na fala de Maria das Graças no texto-dialogal 8, apontado a seguir:

Texto-dialogal 8.

O trecho “SE EU COLOCAR UMA COISA E VOCÊ NÃO CONCORDAR, VAI

FICAR...” no TC 00:23:58.012 – 00:24:01.332, mostra que Maria não termina a frase,

mas seu jeito de falar demonstra que ela queria dizer que Valdemir iria reclamar do que ela escrevesse se não fosse proposto por ele.

Valdemir não fala, não dá nenhuma opinião e Maria das Graças decide começa a escrever o verso mostrado em páginas anteriores. Ela escreve as duas primeiras letras da palavra [“ESCRITURA”] (IS – forma como ela escreve inicialmente), mas tem dúvidas como se escreve o resto da palavra.

O professor/coordenador se aproxima e pergunta se eles precisam de ajuda. É ai que Maria das Graças fala: “ESCRITURA, É...”, querendo saber com que letra se escreve “escritura”, se é com “C”, com “Q”, por exemplo, e Valdemir responde com tom de autoridade e como se não quisesse que mais ninguém se aproximasse da dupla: “É COM “C”, MENINA!”. Essa rasura oral é uma glosa gráfico-ortográfica, pois está relacionada à escrita da palavra “escritura”.

Texto-dialogal 9.

O professor-coordenador escreve a palavra no quadro e Maria a escreve no poema, como mostra o texto-dialogal acima.

Algumas rasuras orais apresentam-se apenas para mostrar o que ficaria mais adequado ao texto e outras apresentam-se para mostrar a grafia correta das palavras que são colocadas no texto, como vimos acima.

A próxima rasura oral acontece quando Maria das Graças escreve a estrofe: [“A ESCRITURA SERA QUI TEM MAIS IDADE”] e Valdemir fala que não está correto. Porém, não “corrige”, não acrescenta, para ajudá-la a escrever o que acha melhor, ou mais correto. A frase de Valdemir, “TÁ ERRADO ISSO AI”, mostra sua autoridade sobre Maria das Graças e sobre o que ela escreveu. Esta autoridade apresenta-se desde o momento que a folha e a caneta foram passadas para que Maria escrevesse o poema e Valdemir falasse o que era para ser escrito. Esta rasura oral é chamada de glosa pragmática, pois remete-se ao contexto imediato e é mostrada no texto-dialogal 10.

Texto-dialogal 10.

No próximo texto-dialogal, vemos que Maria diz para o professor/coordenador que escreveu errado por culpa de Valdemir que não a ajudou: “ELE NÃO FALOU AI EU FIZ ERRADO”. Valdemir, com o mesmo tom irônico de anteriormente, diz que Maria esqueceu de escrever porque é muito inteligente: “PORQUE ELA É MUITO INTELIGENTE”. Neste texto-dialogal não foi produzido nenhuma rasura oral, mas vale destacar que Valdemir continua indignado por Maria das Graças estar escrevendo e ele não. Em resposta, ao que Valdemir falou, Maria das Graças pergunta com um tom também irônico: “POR QUE VOCÊ

NÃO ESCREVE, ENTÃO?”. Valdemir não responde e isso talvez aconteça pelo fato

do professor/coordenador fazer uma brincadeira com os dois, pelo fato deles estarem brigando tanto e assim não se entendendo para a escrita do poema. Ele fala: “QUE QUE VOCÊS TEM HOJE? VOCÊS DORMIRAM COM A BUNDA

DESCOBERTA, É?”. Valdemir responde que não. Mas Maria da Graças fala em

resposta: “PORQUE ELE É CHATO!”. Neste momento, fica mais evidente que Maria das Graças também não estar satisfeita com a escolha da dupla e com fato de estar escrevendo. O professor/coordenador tenta dar mais um incentivo para que a dupla de alunos continue escrevendo o poema: “VAI. A ESCRITURA...”, como vemos abaixo:

Texto-dialogal 11.

A rasura oral que acontece, no texto-dialogal 12, desenvolve-se quando Maria das Graças escreve a palavra [“LEITURA”] e Valdemir a questiona sobre escrever de novo a mesma palavra: “OXE! É DE NOVO É?”, no TC 00:30:07.743- 00:30:08.543. Maria das Graças o mostra que a palavra que tinha sido escrita era

“escritura” e não “leitura”: “NÃO! QUE AQUI TEM A ESCRITURA.”, no TC

00:30:12.286 – 00:30:13.816. Esta é uma rasura oral de glosa pragmática gráfico- visual, pois se refere ao que se pensava que estava grafado na folha, mas que realmente não estava: a palavra “leitura”.

O professor/coordenador faz a leitura do que a dupla já havia escrito e pede para que eles continuem falando no que mais poderia ser escrito. Ele fala: “A

LEITURA” e logo em seguida diz: “FALA” como se estivesse dando uma ordem para

Maria e Valdemir. Valdemir, argumenta o que está registrado no TC de 00:30:39.900 a 00:30:41.240: “NUM É LEITURA NÃO AI!”. Essa rasura oral é uma sequência da anterior, portanto, é uma rasura de glosa pragmática, mas de aparente negociação e também de autoridade. Valdemir quer a troca de “leitura” por outro termo.

Texto-dialogal 13.

O professor/coordenador pede que Maria das Graças passe a folha e a caneta para Valdemir. Parece ser uma tentativa de fazer o poema e a conversa fluírem de forma satisfatória, pois os dois alunos se mostraram insatisfeitos desde os primeiros momentos de escrita em dupla para esta atividade. Em alguns momentos da filmagem até se chamaram de “chato” e de “inteligente”, com um tom irônico; não sentaram próximos um ao outro e a dupla precisou por mais de uma vez da intervenção do professor/coordenador da atividade, como foi mostrado em episódios anteriores.

Dando continuidade as descrições, observamos que a próxima rasura oral é de glosa gráfico-ortográfica, onde Maria das Graças remete seu comentário a escrita da palavra [“PRA”] que Valdemir fez. Vale lembrar que não havia nada de incorreto na grafia da palavra apontada pela aluna. Ela usa a frase: “QUE NOME DOIDO É

Texto-dialogal 14.

A próxima rasura oral efetivada pela a dupla é, mais uma vez, de glosa pragmática. Valdemir se expressa tentando mostrar que quer escrever o poema no outro lado da folha, numa tentativa aparente de organizá-lo melhor: “VOU PASSAR

PRO OUTRO LADO”, no TC 00:35:02.892 – 00:35:04.282. Maria das Graças não

aceita a mudança e diz que: “PODE NÃO”, no TC 00:35:05:492 – 00:35:06.232, como mostrado abaixo. É uma rasura oral pragmática gráfico-visual, pois se remete ao contexto imediato e ao espaço da folha em que pode ser ou não escrito o poema.

O que marca a fala de Maria das Graças é uma orientação dada à todas as duplas de alunos desde o inicio da aplicação do projeto na sala de aula e que se remete as rasuras escritas por eles produzidas. A orientação era mais ou menos a seguinte: caso a dupla pretendesse abandonar o que já havia escrito, não poderia apagá-lo, mas fazer apenas uma linha por cima do que iria “abandonar” e também, não poderia escrever no outro lado da folha, mas sim abaixo do rasurado. Talvez, por esse motivo, ela não permitiu que Valdemir escrevesse o poema no outro lado da folha.

Valdemir acata o que Maria das Graças falou, mesmo com tom autoritário, e fala: “VOU RISCAR ESSE E VOU FAZER AQUI.”, encontrado no TC 00:35:17.760 – 00:35:19.560, como mostra o texto-dialogal 15. A partir deste momento, a dupla parece melhorar seu relacionamento e as negociações acontecem de forma mais amigável.

Texto-dialogal 15.

Na tentativa de negociação para que Valdemir não escreva o poema nas linhas inferiores, Maria das Graças realiza mais uma rasura pragmática. Ela não sabe se Valdemir irá escrever outro poema, ou o mesmo poema de outra forma, que é o que acontece. Quando ela fala: “ACHO MELHOR ESSA...”, no TC 00:35:28.344 – 00:35:29.714, parece-nos que Maria está satisfeita com a parte do poema que havia sido escrita pela dupla, mesmo com todas as divergências de ambos. Ao falar, Maria aponta para a parte que já havia sido escrita.

Logo após este momento, Valdemir explica o que pretende fazer, como vemos no turno abaixo: “EU VOU FAZER OS VERSOS PEQUENO”, no TC 00:35:36.154 – 00:35:38.224. E vemos também a resposta de Maria das Graças:

“VOCÊ FEZ OS VERSOS GRANDES”, no TC 00:35:39.640 – 00:35:41.020, como se

não lembrasse que ela também escreveu uma parte do que estava no poema. O tamanho dos versos teve participação dos dois, mas Maria culpa Valdemir, desta vez com um tom de voz mais suave. Esta rasura oral é pragmática gráfico-visual, como mostra-nos o texto-dialogal 17.

Texto-dialogal 17.

Maria das Graças percebe que Valdemir está fazendo a mesma coisa que estava escrita anteriormente e comenta: “ELE TÁ FAZENDO A MESMA COISA. EU

PENSAVA QUE ELE IA FAZER OUTRA COISA”, no TC 00:36:38.820 –

00:36:42.830, como vemos abaixo:

Texto-dialogal 18.

Dando continuidade aos textos-dialogais para a escrita do poema, Valdemir retoma ao trecho “A ESCRITURA DA CIDADE...”, mas não termina de dizer o que aparece no poema escrito: [“A ESCRITURA DA CIDADE SERÁ QUE TEM MAIS IDADE”] e acrescenta outras opções de escolha para este trecho. Neste momento, observamos que Valdemir fala: “DÁ PRA LER OU DÁ PRA VER?”, apresentado no

texto-dialogal 19, recordando discursivamente ao poema de Cecília Meireles, como vimos anteriormente e discutiremos a seguir.

Texto-dialogal 19.

O que Valdemir realiza oralmente aparece no poema como vemos no trecho abaixo:

Trecho do poema “a cidade”.

A rasura oral que apresentamos no turno abaixo refere-se ao que Valdemir fala e é interrompido por Maria das Graças, que completa a sua fala, dando um sentido ao que ele havia começado a dizer. É uma rasura oral lexical, já que se remete a expressão, ou melhor, a complementação da expressão. Valdemir fala no turno 00:40:47.120-00:40:48.480 : “UM DOS DOIS TEM”, e Maria das Graças complementa imediatamente no turno 00:40:50.670-00:40:51.750: “QUE

ESCOLHER”28. Observamos que mesmo antes de Valdemir terminar de falar, Maria das Graças o interrompe acrescentando o que acredita “ficar melhor” no poema. Os TCs possibilitam-nos ver que as falas acontecem uma imediatamente à outra.

28 Como foi citada anteriormente, a palavra “ESCOLHER”, proposta por Maria das Graças, tem

relações discursivas como o poema de Cecília Meireles, Isto ou Aquilo: Ou se tem chuva e não se tem sol/ ou se tem sol e não se tem chuva/ Ou se calça a luva e não se põe o anel!/ Ou se põe o anel e não se calça a luva!/ Quem sobe nos ares e não fica no chão/ quem fica no chão não sobe nos ares./ É uma grande pena que não se possa/ estar ao mesmo tempo nos dois lugares!/ Ou guardo o dinheiro e não compro doce/ ou compro o doce e gasto o dinheiro/ Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo.../ e vivo escolhendo o dia inteiro!/ Não sei se brinco não sei se estudo,/ se saio escolhendo ou fico tranqüilo./ Mas não consegui entender ainda/ qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Ao falar “um dos dois tem” Valdemir também remete-se discursivamente ao poema de Cecília Meireles, como foi postulado anteriormente. Isso acontece porque no poema a autora sempre coloca duas coisas para serem escolhidas: “chuva ou sol”, “luva ou anel”, “ares ou chão”, etc. Valdemir também faz isso, mas de forma mais direta. O complemento que Maria das Graças realiza, acontece como se ela soubesse o que Valdemir iria falar, mas não é coincidência nenhuma, pois a dupla já havia lido e debatido29, em sala, o poema de Cecília Meireles no primeiro semestre de aula, tornando o que a dupla conversa, não uma coincidência, mas uma apropriação do que já havia sido lido.

Texto-dialogal 20.

Outra rasura oral acontece quando Maria das Graças refere-se à palavra [“DOS”], que estar sendo escrita por Valdemir. Maria fala com a entonação de que a palavra fosse escrita com “u” e não com “o”: “UM DUUUUS”. Valdemir não a questiona e mesmo sem uma observação direta de Maria das Graças ele faz a troca do “o” pelo “u”. Essa rasura oral é glosa gráfico-ortográfica, que apresenta-se no texto-dialogal 21.

29

O poema de Cecília Meireles havia sido lido e debatido anteriormente a escrita do poema “sem título” de Valdemir e Maria das Graças, pois a proposta do projeto, como o próprio nome sugere, é que um poema seja lido por dia em sala de aula. O poema de Cecília Meireles, no projeto, é o de número 56, portanto teria que ser lido antes do final do primeiro semestre. O poema de Valdemir e Maria das Graças foi escrito em setembro, meses depois da leitura do poema “Ou isto ou aquilo”.

Texto-dialogal 21.

Valdemir faz a leitura do que já havia sido escrito no poema e sem combinar com Maria, decide acrescentar mais um verso: [“PARA A CIDADE CRESCER”].

No texto-dialogal 22, observamos que Valdemir realiza uma rasura oral de glosa gráfico-ortográfica. Isso porque ele pergunta se a palavra “crescer” tem “s”,

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