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2.3 MÁ OCLUSÃO DE CLASSE II DE ANGLE

2.3.1 DESCRIÇAO E MORFOLOGIA DA CLASSE

As más oclusões em populações humanas e as tentativas de tratar essas condições são evidentes desde o inicio da civilização. A descrição ou a classificação de uma má oclusão é um pré-requisito essencial para a determinação da prevalência ou a severidade desta condição oclusal na população. Várias tentativas de classificação foram feitas durante todo o século XIX, mas somente ao final desse mesmo século que Edward Angle (1899), através de sua experiência em prótese e seu ávido interesse pela oclusão dentária, publicou o artigo intitulado “A Classificação da Má Oclusão” , no qual estudou centena de casos e descreveu três classes de má oclusão, com base na relação oclusal ântero-posterior dos primeiros molares permanentes e formulou o sistema de classificação que até nos dias de hoje recebe o seu nome. Designou a classificação numérica das três possibilidades de relacionamento ântero- posterior dos primeiros molares permanentes: classe I, II e III. A neutroclusão, ou má oclusão de classe I é caracterizada pela cúspide mésio-vestibular do primeiro molar superior ocluíndo com o sulco vestibular do molar inferior. Angle (1899) acreditava ser esta configuração dentária a mais apropriada para uma função harmônica. A má oclusão de classe II é dada quando o primeiro molar inferior oclui em relação distal ao

primeiro molar superior, com a cúspide mesio-vestibular do primeiro molar superior ocluindo à frente da cúspide mesial e mediana do primeiro molar inferior. Angle (1899) também dividiu a má oclusão de classe II em divisão 1, na qual os incisivos centrais superiores mostram uma inclinação para vestibular, e na classe II divisão 2, na qual os incisivos centrais superiores estão inclinados para lingual. Por fim, ele descreveu uma subdivisão de cada uma dessas divisões, na qual a má oclusão se mostra unilateral, com o outro lado em oclusão normal.

A classificação de Angle (1899), apesar da variedade de manifestações das más oclusões apresentadas pelas discrepâncias esqueléticas e dentárias nos três planos do espaço, representa a primeira forma de caracterizar as más oclusões e sua aceitação universal pela Odontologia até hoje é o testemunho de sua grande contribuição.

Cohen (1959), descreveu a oclusão normal, incluindo a idéia de relação cêntrica e oclusão. Ele classificou como classe I ou neutro- oclusão, quando os dentes e base óssea mandibular guardam uma relação de normalidade entre os dentes e base óssea da maxila. A cúspide mesio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui, no sulco central do primeiro molar permanente inferior, com a mandíbula em repouso e os dentes em oclusão cêntrica. Por esta definição, na classe I, poderia existir má oclusão ou oclusão normal.

Andrews (1972), descreveu as seis chaves de oclusão normal. Neste artigo, o autor incluiu , além das relações das cúspides de

primeiros molares descritas por Angle (1899) e Cohen (1959), a cúspide mesio-lingual do primeiro molar permanente superior, deve ocluir na fossa central do primeiro molar permanente inferior, e ao mesmo tempo, a vertente distal da cúspide disto-vestibular do primeiro molar permanente superior ocluindo na vertente mesial da cúspide mesio-vestibular do segundo molar permanente inferior. Associados a estas características, teria uma correta inclinação e angulação de todos os dentes, ausência de giroversões, de diastemas e uma curva de spee suave ou plana. A má oclusão de classe II, se apresenta então em toda situação em que o primeiro molar permanente superior estiver à frente do inferior, porém, o autor indica que se observe a relação dos pré-molares e caninos para se confirmar à relação ântero-posterior.

Durante o século XX, a descrição original de Angle para a má oclusão de classe II foi expandida por outros autores, a fim de incluir as relações oclusais de pré-molares e caninos. Isso se tornou necessário por causa da limitação de se descrever apenas a relação molar, que não fornecia uma caracterização mais completa das discrepâncias oclusais ântero-posteriores. É possível encontrar indivíduos com relação molar classe I e relação canino classe II, na qual o trespasse horizontal aumentado é causado pelo espaçamento e protrusão dos dentes superiores. Também é possível encontrar uma relação molar classe II associada a uma relação canina classe I e trespasse horizontal normal, causado por apinhamento ou perda dos dentes superiores mesiais aos

primeiros molares. Tornou-se claro que a abordagem original de Angle, era muito simplificada para descrever a diversidade da má oclusão de classe II decorrentes de origens esqueléticas e dentárias. A introdução das radiografias cefalométricas padronizadas, e o seu fundamental uso na Ortodontia, permitiu uma análise mais profunda das características dentárias e esqueléticas que podem ser evidenciadas nos indivíduos portadores de más oclusões de classe II. (BISHARA,2004)

Do ponto de vista esquelético, Tweed (1966) sugeriu a caracterização da classe II pelo ângulo ANB maior que 4,50, por protrusão maxilar e/ou retrusão mandibular.

Coben (1971) estabeleceu uma ponte de união entre o conceito de crescimento e tratamento da má oclusão de classe II. Segundo o autor, o processo biológico da correção da classe II é dividido em 3 princípios básicos de tratamento:

-Correção pelo crescimento

-Reabsorção e remodelação da área subnasal do processo maxilar. -Movimento dentário intra-alveolar.

A correção de toda classe II é o resultado de um, dois ou dos três princípios. Segundo o autor, o principio básico que se deve aproveitar é a correção com o crescimento, dizendo ser, a resposta mais efetiva e propícia tanto para a classe II esquelética quanto dento-alveolar.

De acordo com Henry (1957), existem quatro categorias nas quais a maioria dos casos de classe II, divisão 1 podem ser classificada:

Protrusão dento-alveolar maxilar, protrusão basal maxilar, deficiência mandibular e retrusão dento-alveolar mandibular.

Fisk et al. (1953) avaliando as más oclusões de classe II indicaram seis variações morfológicas que se podem encontrar: 1) Maxila protruída em relação ao crânio; 2) Protrusão dos dentes superiores; 3) Mandíbula normal, porém retroposicionada; 4) Deficiência mandibular; 5) Dentes Inferiores retroposicionados em uma mandíbula normal; 6) Combinação entre as alterações morfológicas anteriores.

As características do perfil tegumentar em 30 indivíduos com má oclusão de classe II, divisão 1, de ambos os gêneros, dos 12 aos 16 anos de idade, foram avaliadas por Brandão et al. (2001), através da análise facial numérica, por meio de mensurações feitas em fotografias e comparadas com os valores padrão estabelecidos pelas análises cefalométricas clássicas do perfil tegumentar. Os resultados evidenciaram um alto grau de convexidade facial e ângulos nasolabiais e mentolabiais diminuídos como características faciais marcantes dos indivíduos portadores de má oclusão de classe II, divisão 1 de Angle.

2.3.2 PREVALÊNCIA

Angle (1907), examinou inúmeros casos e já, naquela época, estimava que as más oclusões de classe II apresentariam uma prevalência de aproximadamente 27% da população. Desde então, muitos estudos epidemiológicos foram realizados em diversas populações, no intuito de estabelecer a prevalência das más oclusões de classe II. Na população americana, segundo Spalding (2001), a prevalência dessa má oclusão atinge 25 a 30% das crianças no estágio da dentadura mista, 20 a 25% das crianças no estágio da dentadura permanente jovem e 15 a 20% dos indivíduos adultos, não existindo diferenças entre gênero.

No Brasil, de acordo com um levantamento epidemiológico realizado por Silva Filho et al. (1990), em 2416 crianças de ambos os gêneros, da região de Bauru, no estágio da dentadura mista, a má oclusão de classe II apresentou uma prevalência de 42%, sendo que 27% de origem dentária e 15% de origem esquelética (11,5% má oclusão de classe II, divisão 1 e 3,5% má oclusão de classe II, divisão 2).

Markovic e Nikolic (1971) examinaram 480 crianças dos jardins de infância de Belgrado, na faixa etária entre 2 a 6 anos, e encontraram uma prevalência de 21,5% de má oclusão de classe II, no estágio de dentadura decídua.

Ao examinar 680 crianças americanas, na faixa etária de 2,5 a 6 anos de idade, Infante (1975) mostrou que a prevalência de má oclusão de classe II não apresentou diferença estatística entre os gêneros e atingiu 26,5% da população em estudo.

A prevalência da má oclusão de classe II na dentadura decídua também apresenta valores elevados para a população brasileira, como relatado no estudo realizado por Martins et al. (1998), em 838 crianças de 2 a 6 anos, de ambos os gêneros, de escolas públicas e particulares da região de Araraquara. No referido estudo, a prevalência de más oclusões de classe II atingiu 38,5% do total da amostra.

Um levantamento epidemiológico mais recente realizado por Silva Filho et al. (2002), em 2016 crianças de 3 a 6 anos, de ambos os gêneros, de escolas públicas e particulares de Bauru, também confirmou a elevada prevalência das más oclusões de classe II em estágios precoces do desenvolvimento da oclusão. Nesse levantamento epidemiológico, a prevalência de más oclusões de classe II atingiu 33,68% da população estudada.

Essa elevada prevalência de más oclusões de classe II em estágios precoces do desenvolvimento da oclusão, constitui um fator de preocupação, visto que estudos longitudinais indicam que as distoclusões, quando estabelecidas precocemente, usualmente não sofrem correção espontânea (BISHARA, 1998). Portanto, uma vez caracterizada a

discrepância esquelética de classe II, a mesma parece ser transferida da dentadura decídua para a dentadura permanente (VARRELA, 1998).

Muitos estudos epidemiológicos ainda são necessários para chegar-se a uma conclusão definitiva da existência de diferenças raciais quanto à prevalência das más oclusões de classe II. No entanto, os estudos epidemiológicos internacionais sugerem uma prevalência de más oclusões de classe II de 20% para a América do Norte, Europa e Norte da África. Na América Latina (incluindo o México e a América do Sul), no Oriente Médio e na Ásia, a prevalência seria um pouco mais baixa, cerca de 10 a 15%. As populações negras da África (região sub-Saara) teriam uma prevalência ainda menor de más oclusões de classe II, cerca de 1 a 10%. Os ameríndios homogêneos, habitantes das Ilhas do Pacífico e outros grupos indígenas têm a prevalência mais baixa de má oclusão de classe II , de 0 a 5% (SPALDING, 2001)

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