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A alternativa em se propor um ensino baseado em competências, proveio ou provém em grande medida, da necessidade de uma alternativa a modelos formativos, os quais priorizam o saber teórico sobre o prático, o saber pelo saber (ZABALA; ARNAU, 2010).

Como disseram Zabala e Arnau (2010, p. 55),

[...] destacamos, por um lado, que a obrigação de propormos um ensino baseado no desenvolvimento de competências provém [...] das declarações atuais sobre o papel do ensino [...] se orientar para o desenvolvimento de todas as capacidades do ser humano, ou seja, para a formação integral das pessoas. [...] Até agora podemos entender a importância do uso do termo “competência” como uma forma de entender que o saber deve ser aplicável, que o conhecimento toma sentido quando aquele que o possui é capaz de utilizá-lo.

Entender que a vida é ação permite refletir o currículo por competências27 como necessidade de preparação do profissional para sua prática específica e para a vida, no sentido lato do termo.

Desta feita, a elaboração de um currículo que permita a convergência de saberes, por meio de projetos transversais, interdisciplinares e transdisciplinares, que privilegie o “aprender a aprender” e as práticas qualificadas, se torna um

caminho coerente em relação aos cursos de Direito, em face às novas demandas expressas pelos princípios universais humanitários28.

Não apenas o mundo do trabalho e a dinâmica dos ambientes cooperativos destacam a necessidade do processo formativo centrado na desenvoltura de competências, mas também as transformações do mundo real, do século XXI, as quais reverberam a cultura de uma necessária adaptação aos processos de incerteza e de complexidade.

A discussão sobre a necessidade de novas competências aos profissionais do século XXI tem espaço resguardado nos fóruns educacionais nacionais e internacionais. O relatório The Future of Jobs, publicado no World Economic Forum (2016), analisou as mudanças pelas quais passarão as relações de emprego, a qualificação dos profissionais e o mercado de trabalho.

Na referida publicação, o Fórum Econômico Internacional exprime que 35% das competências mais demandadas pelo mercado de trabalho na atualidade

devem mudar. Evidencia que dez novas competências essenciais serão exigidas para atuação dos profissionais e serão aquelas que ainda fazem os homens se sobreporem às máquinas (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016).

Em uma prospecção para 2020, o relatório analisa a possibilidade de extinção de muitas carreiras e sugere a necessidade de readequação na formação de muitas outras.

Segundo os dados analisados, a formação dos profissionais será influenciada pelo que se denominou de Quarta Revolução Industrial, a era da robótica, automação tecnológica, inteligência artificial e aprendizagem automática.

Algumas competências, a depender da área de conhecimento, segundo o relatório, serão essenciais para ingresso e permanência na carreira profissional. São elas: habilidade para resolução de problemas complexos, pensamento crítico, criatividade, habilidade para gestão de pessoas, habilidade de coordenação,

Longe de fechar questão “por desenvolver competências ou ensinar saberes”, investiga-se nesta tese a influência dos estímulos não exclusivamente definidos como saberes técnicos, mas também daqueles saberes comportamentais encartados no conceito de cidadania planetária e considerados valiosos na formação do jurista à medida que o qualifica para o exercício profissional com foco no bem comum, no respeito a diversidade e a visão sistêmica da sociedade e do mundo, promovendo a soluções criativas para problemas jurídicos

inteligência emocional, capacidade de julgamento e de tomada de decisão, orientação para servir, habilidade de negociação, flexibilidade cognitiva.

Ao defender-se a tese de que há uma necessidade de formar o profissional do Direito para uma cidadania planetária, no decorrer do currículo, na verdade, se está a convergir com os anseios de uma educação sistêmica que já é diretiva, segundo algumas entidades supranacionais, na prospecção atual para o futuro das pessoas, das coisas e do mundo.

A formação para a cidadania planetária e o desenho de diretrizes obrigatórias para um currículo com estímulos teóricos e práticos, que garantam uma vivência individual e coletiva, constituindo-se em processo interdisciplinar, político, cultural, científico, tecnológico, que promova a interação transformadora entre instituições de ensino superior e outros setores da sociedade, por meio da produção e da aplicação do conhecimento29, encontram agasalho nas concepções teóricas de Freire (2014) e Apple (2011) para o ensino-aprendizagem, para uma reconcepção

dos processos sociológicos de autodeterminação e democracia social, o que exige, assim, um alinhamento da formação curricular com os anseios do mundo contemporâneo.

Consoante Moreira e Tadeu (2011, p. 34), o currículo se exprime como meio institucionalizado de transmissão de cultura de uma sociedade, ou seja, “[...] o currículo e a educação estão profundamente envolvidos em uma política cultural”. Por esta razão é que universidades ou qualquer instituição que intenciona qualificar

seus aprendizes devem se reinventar quanto aos processos metodológicos, renunciar à utilização de métodos tradicionais de ensino e elaborar métodos com suporte noutros paradigmas.

Moreira e Tadeu (2011, p 36) postulam a ideia de que,

Nesse entendimento, o currículo não é veículo de algo a ser transmitido e passivamente absorvido, mas o terreno em que ativamente se criará e produzirá cultura. O currículo é, assim, um terreno de produção e de política

cultural, no qual os materiais existentes funcionam como matéria-prima de criação, recriação e, sobretudo, de contestação e transgressão.

O indivíduo, de acordo com as reflexões de Zabala e Arnau (2010, p. 31), não quer mais ser objeto, ele quer ser agente, participar e ser ouvido, em diversas áreas da sociedade.

Elevou-se o nível de conhecimento visado e, portanto o patamar necessário de competências para agir corretamente em campos cada vez mais

Na Resolução n. 7, de 18 de dezembro de 2018, expedida pelo Ministério da Educação estabelece as diretrizes para a extensão na Educação Superior Brasileira e regimenta o

disposto na Meta 12.7 da Lei n. 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação – PNE 2014-2024, há convergência para o reconhecimento da importância das experiências e vivências no processo de ensino-aprendizagem, ao determinar que as

atividades de extensão devem compor, no mínimo, 10% (dez por cento) do total da carga horária curricular estudantil dos cursos de graduação, as quais deverão fazer parte da matriz

diversos e evolutivos, na área do Direito não é diferente, pois o desejo de ter uma prestação jurisdicional mais efetiva e célere e a busca pela efetividade da justiça social trouxe à discussão a necessidade de mudança, da adoção de comportamentos flexíveis e cidadãos por parte dos operadores do Direito, favorecendo ambientes de cooperação e de auxílio a soluções autônomas pelas partes, como no caso dos meios alternativos de disputa e da capilarização da justiça.

A defesa da inserção da cidadania planetária, como tema transdisciplinar no currículo dos cursos de Direito, corrobora a necessidade de preparação dos profissionais para uma realidade social diversa, célere, tecnológica, autônoma e incerta, pois a orientação dos jurisdicionados para adequadamente transigirem sobre seus conflitos e problemas, em geral, só terá êxito se os juristas estiverem alinhados com uma nova visão de sociedade, de mundo, de Terra.

Beane (2003, p. 94) enfatiza:

O que aprendemos através da reflexão sobre as nossas experiências torna- se um recurso para lidar com problemas, questões e outras situações, tanto pessoais quanto sociais, à medida que estas surgem no futuro. Estas experiências e os esquemas de significação que construímos a partir delas, não se posicionam simplesmente nas nossas mentes como categorias estáticas e endurecidas. Pelo contrário, constituem significados fluídos e dinâmicos que podem ser organizados de uma determinada maneira para lidar com um assunto, de outra maneira para lidar com um segundo assunto, e assim sucessivamente. Este gênero de aprendizagem implica ter experiências construtivas e reflexivas, que não só alargam e aprofundam o entendimento actual de nós próprios e do nosso mundo, mas que também são “aprendidas” de tal maneira que podem ser transportadas e utilizadas em novas situações.

Para esta pesquisa, a investigacão qualitativa junto a professores e alunos voluntários do Programa Cidadania Ativa, com amparo em suas experiências junto aos projetos, e as percepções sobre as vivências e as mudanças subjetivas produzidas em cada um deles, pelas práticas experienciadas, permitiu o entendimento da necessidade de se trabalhar transdisciplinarmente a cidadania planetária como fator convergente para a mudança da perspectiva antropocêntrica

do Direito e garantia de um desenvolvimento sustentável arrimado por critérios do ecocentrismo e dos valores humanitários universais.

A tese defende, com a mudança do paradigma curricular, transformações de ordem cognitiva e o favorecimento de estímulos à elaboração humanística como alicerce indissociável das competências, habilidades e atitudes técnico-jurídicas, projetando possibilidades reais de avanços no ordenamento jurídico brasileiro.