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4. O DESIGN COMO FERRAMENTA DE ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO

4.4. Design centradoo no usuário

Enquanto o Design Universal parte de uma necessidade para abordar o bem comum, considerando que as melhorias efetuadas para atender às demandas de um grupo poderão, potencialmente, serem úteis a outros grupos de usuários, o Design Centrado no Usuário (DCU) parte do princípio de que o atendimento ao usuário final deve ser o foco do desenvolvimento de um objeto ou serviço. Vale-se, basicamente, de quatro etapas: 1) a identificação do problema/contexto por meio de pesquisas,

observações e/ou entrevistas com um grupo de usuários – em que busca-se entender quem é o usuário do produto/serviço/ambiente, como e onde realiza suas tarefas; 2) levantamento de requisitos, pois uma vez que o perfil do usuário e o contexto de uso foram definidos, estabelece-se quais requisitos o novo projeto deve atender; 3) a criação de alternativas e construção de protótipos para teste – com o escopo do projeto determinado na etapa anterior, este é o momento para estabelecer fluxos de demandas, especificações de padrões e design até a obtenção de um protótipo; 4) a avaliação das soluções – em que são executados testes de usabilidade, refinamentos das soluções encontradas e a validação (ou não) do projeto. Em síntese, trata-se das preferências, experiências e habilidades de um grupo, não de um indivíduo isolado, embora esse grupo restrito represente um universo mais amplo (LOWDERMILK, 2013; QUARESMA, 2017).

Alves e Battaiola (2014) expõem o ciclo contínuo expresso pela ISO 9241 (2010) para discorrer sobre os procedimentos que ocorrem quando um projeto utiliza o DCU após a identificação da necessidade do usuário (planejamento, contexto, requisitos, prototipagem e avaliação), já prevendo em sua estrutura o reinício do ciclo, caso a avaliação final não seja satisfatória, como pode ser percebido na Figura 11. Cada procedimento do ciclo apresenta um conjunto de métodos e técnicas com as quais é possível envolver o estudante na atividade sem deixar de atender a diversidade funcional, prover a transmissão do conhecimento sem desrespeitar a autonomia dos estudantes e ainda fomentar a mediação entre os participantes e os conhecimentos. Os autores utilizam os princípios expressos por Maguire (2001) para determinar um melhor planejamento de imagens dinâmicas, caracterizando-o pela:

a) formação de uma equipe multidisciplinar para a elaboração do produto (o que, em primeira instância, resulta em agilidade no processo e qualidade no produto final); b) envolvimento ativo do aluno (o que exige prévia pesquisa de requisitos do usuário, de tarefa e contexto);

c) distribuição de funções entre usuário e sistema (o que não é possível a menos que haja uma análise sobre quais tarefas o usuário pode ou não desenvolver); e

d) iteração de soluções (testando-as para detectar falhas ou identificar melhorias) (ALVES; BATTAIOLA, 2014; MAGUIRE, 2001).

Figura 11: Representação do processo de DCU e os métodos ou ferramentas que serão utilizados no desenvolvimento das imagens acessíveis nessa pesquisa.

Fonte: Adaptado de ISO 9241 (2010) e Maguire (2001)

Entre as vantagens da criação de materiais utilizando o DCU está a possibilidade de modelar o objeto de aprendizagem às habilidades dos usuários por meio de consultas e testes, o que minimizaria a margem de erros e possibilitaria administrar a experiência do aluno, que passaria a ter, de fato, uma aprendizagem significativa. Contudo, a inclusão de pessoas com deficiência no grupo de usuários em um projeto deve considerar a necessidade de mudanças na metodologia de trabalho, pois nem sempre a amostra desse grupo de usuários será facilmente encontrada ou, ainda, suficiente para cobrir uma ampla gama de potenciais usuários, considerando as variáveis de uma mesma deficiência (ALVES; BATTAIOLA, 2014; MAGUIRE, 2001; PERSSON et al., 2015).

Quando o DCU passa a contar com a participação ativa dos usuários para tornar seus objetos de aprendizagem menos lineares e mais democráticos, surge a

vertente chamada Design Participativo (DP). Tanto o DCU quanto o DP possuem como vantagem uma maior probabilidade de o design resultante ser adotado por pessoas com deficiência, uma vez que elas estão envolvidas no processo em maior ou menor escala. A diferença principal reside no fato de que o DP tende a envolver o usuário em mais fases do projeto, não apenas como fonte de informação ou consultoria, o que exige cooperação total entre os usuários e desenvolvedores para a concepção de um projeto, por meio do compartilhamento de conhecimentos e experiências. Deste modo, o designer terá benefícios ao produzir com e não apenas para o usuário, pois este é capaz de reagir ao projeto ou ao uso de um determinado produto/serviço de modos jamais imaginados pelo desenvolvedor, apontando erros e melhorias com maior rapidez (ALVES; BATTAIOLA, 2014; LADNER, 2015; SANTA ROSA; MORAES, 2012; PERSSON et al., 2015).

Entre os erros comuns dos desenvolvedores apontados por Moraes e Santa Rosa (2012) estão a noção equivocada de que não existem diferenças entre os usuários, de que as aspirações e necessidades dos usuários são idênticas as suas e a tentativa de assumir o lugar do usuário para determinar o escopo do projeto, ressaltando que "(...) a forma com a qual o usuário reconhece, interpreta, pensa e interage com o sistema, na maioria das vezes, é diferente do profissional que concebe o sistema" ou ainda que "(...) existem reações psicológicas e fisiológicas que fogem ao controle da razão, tornando impossível [para o desenvolvedor] a incorporação do papel do usuário" (p. 25, grifo nosso). Por fim, resta ressaltar que os usuários "podem" participar "como se" fizessem parte da equipe, mas não são designers e tampouco ficarão a cargo de muitas das decisões do projeto, um sistema que Lander (2015) denomina de “paternalista”. O DP mantém uma linha divisória clara entre os papéis dos membros da equipe, não considerando que um desenvolvedor possa ser, em algum grau, também um usuário, como seria o caso de um ilustrador surdo projetando imagens para surdos.

4.4.1. Design Centrado no Ser Humano (HCD)

Chaves e Bittencourt (2018) ressaltam que, em algumas referências, o Design Centrado no Ser Humano (DCH) é apresentado como uma ampliação do DCU, já que ambos possuem origens semelhantes, como ergonomia e ciências da computação. Entretanto, a expansão de um termo para o outro se deve, sobretudo,

à inclusão da expressão em normas técnicas internacionais, visto que, de modo geral, as definições se aproximam, como é possível perceber pela definição do 30

Human Centred Design Institute (HCDI), da Universidade de Brunel, em Londres,

que menciona a integração de conhecimentos como ponto-chave para melhorar o bem-estar humano e capacitar as pessoas, de maneira a obter sistemas, máquinas, produtos, serviços e processos com uso mais intuitivo. O ponto sensível entre elas é o envolvimento do usuário em todo o projeto e desenvolvimento, algo que o DCU costuma restringir à tomada de informações/observação e/ou testagem (CHAVES; BITTENCOURT, 2018; HCDI, 2018; LADNER, 2015).

Dois pontos precisam ser considerados, no entanto: (1) a adesão ao DCH é maior entre usuários com deficiências sensoriais, como cegueira e surdez, uma vez que sua limitação física não constitui uma barreira para a aprendizagem, o desenvolvimento de raciocínio lógico e a criatividade; (2) encontrar usuários- desenvolvedores com deficiência não é tarefa fácil, se observado o baixo percentual apresentado pelo Censo de 2010 no que refere-se a formação acadêmica dessas pessoas – dos 23,9% dos brasileiros com deficiência, 61,1% sequer completou o ensino fundamental (CHAVES; BITTENCOURT, 2018; IBGE, 2010; HCDI, 2018; LADNER, 2015).

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