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O vazio e a existência de Deus

Apesar da variedade das discordâncias entre a física cartesiana e a newtoniana, aquela mais significante para Voltaire é a querela entre o mundo pleno e o mundo vazio. Esse ponto parece ser o mais importante, em primeiro lugar, porque muitas das outras divergências decorrem dele ou estão ligadas a ele, como é o caso das teorias sobre a luz. Além disso, a oposição entre o universo pleno e o mundo vazio é aparentemente aquela com maiores conseqüências metafísicas, pois Voltaire não deixará de repetir que a concepção de um universo pleno conduz ao ateísmo, e a aceitação do vazio conduz ao reconhecimento da existência de um ser criador. Nesse sentido, além do problema propriamente físico que existe em admitir o pleno, afinal como compreender o movimento na matéria sutil, há também a questão metafísica que reativa a querela entre Henry Moore e Descartes sobre o infinito divino e o infinito material. 89 Para Voltaire, o mundo da matéria infinita, o mundo pleno de Descartes, conduz ao ateísmo, à negação de um ser criador. Ao passo que “se, segundo Newton (e segundo a razão), o mundo é finito, se o vazio existe, então a matéria não existe por si mesma, logo recebeu a existência de uma causa livre”. 90 O raciocínio de Voltaire é o seguinte: se a matéria fosse infinita, e o vazio impossível, a matéria seria necessária. Se a matéria é necessária ela deve existir desde sempre, deve ter uma existência por si mesma, dispensando assim um criador. Mais do que isso, sendo anterior a tudo, ela seria uma propriedade de Deus ou o próprio Deus. Contrariamente, se aceitamos o vazio, a matéria deixa de ser necessária, passa a ser criada, evitando todos os problemas que se seguem do materialismo. Daí a necessidade de se corrigir Epicuro, segundo Voltaire. Descartes admitia um ser criador e não admitia o vazio. Epicuro negava a existência de um ser criador e admitia o vazio. De acordo com o philosophe, as coisas deveriam ser inversas. Descartes deveria ser ateu e Epicuro aceitar a existência de Deus. A existência do vazio “prova” que a matéria não é necessária, “pois aquilo que não está em todo lugar não pode existir necessariamente em nenhum lugar”, de modo que ela deve ser resultado da criação. Ao contrário, num mundo pleno, a matéria sendo necessária, “existiria por si mesma com uma necessidade absoluta, inerente à sua natureza, primordial, antecedente a tudo”.

89 Cf. KOYRÈ, A. Du monde clos à l’univers infini. Gallimard. Paris, 1973. p. 139-155.

90 VOLTAIRE. Elementos da Filosofia de Newton. Trad. Maria das Graças de Souza. Ed. Unicamp.

A oposição entre o mundo pleno e o mundo vazio aparece já na carta XIV das

Cartas Inglesas.91 Essa oposição será retomada diversas vezes nos Elementos da

Filosofia de Newton e em outros textos. Nos Elementos, a discussão aparece dentro do

debate sobre o espaço, no capítulo II da primeira parte, cujo título é “Do espaço e da duração”. Ali, Voltaire reproduz a polêmica perspectiva de Newton segundo a qual o espaço é um sensório divino e afirma que “o que diz respeito ao espaço, à duração, aos limites do mundo, Newton seguia as antigas opiniões de Demócrito, Epicuro e de uma multidão de filósofos corrigidos por nosso célebre Gassendi”. 92 Mais a frente na mesma obra, Voltaire apresentará certas objeções físicas que os defensores do mundo pleno devem enfrentar. No capítulo II da segunda parte, Voltaire diz:

“1. de que modo uma linha reta poderia chegar até nós através de tantos milhões de camadas de matéria movidas em linha curva, e por meio de movimentos diversos?

2. como um corpo tão fino poderia, em sete ou oito minutos, percorrer os espaço de quatrocentas mil vezes trinta milhões de léguas de uma estrela até nós, se, neste espaço, tivesse de penetrar numa matéria resistente? Seria preciso que cada raio desordenasse num instante trinta e três milhões de léguas de matéria sutil por quatrocentas vezes”.93

Entretanto, a disputa sobre o mundo pleno e o mundo vazio será mais uma daquelas disputas insolúveis. 94 No verbete “Espaço” do Dicionário Filosófico, o ceticismo de Voltaire é mais evidente do que aquele que já podíamos vislumbrar nos

Elementos. Voltaire afirma, então, que tanto faz qual sistema adotemos, a questão do

pleno e do vazio não tem conseqüências para a física:

91 “Ao chegar a Londres, um francês encontrará tudo muito mudado em filosofia, e também no resto.

Deixou o mundo cheio, encontrou-o vazio”. Cartas Inglesas. Op. cit. p. 23.

92 Idem, ibidem. p.33.

93 Idem, ibidem. p.79. Ver ainda a página 75.

94 Voltaire não menciona a hipótese do éter da qual Newton lança mão para explicar a gravitação, cuja

recepção enfrentava os problemas advindos da concepção da ação à distância. Para ele, Newton é sempre o defensor do mundo vazio.

«Heureusement, quelque chose que disent les philosophes sur ces questions insolubles, que l’on soit pour Épicure, pour Gassendi, pour Newton, ou pour Descartes et Rohault, les règles du mouvement seront toujours les mêmes; tous les arts mécaniques seront exercés, soit dans l’espace pur, soit dans l’espace matériel».95

No mesmo verbete, aquela defesa da concepção newtoniana do espaço como sensório divino é rechaçada. Aquilo que outrora parecia claro e aceitável se torna obscuro e inadmissível:

« Newton regarde l’espace comme le sensorium de Dieu. J’ai cru entendre ce grand mot autrefois, car j’étais jeune; à présent je ne l’entends pas plus que ses explications de l’Apocalypse. L’espace sensorium de Dieu, l’organe intérieur de Dieu! je m’y perds et lui aussi. Il crut, au rapport de Locke, qu’on pouvait expliquer la création en supposant que Dieu, par un acte de sa volonté et de son pouvoir, avait rendu l’espace impénétrable. Il est triste qu’un génie tel que Newton ait dit des choses si inintelligibles ».96

Ora, perante isso é preciso inverter as posições dos argumentos físicos e metafísicos no que se refere à disputa sobre o vazio e o mundo pleno. À primeira vista, quando enfrentamos a questão a partir dos Elementos, parecem ser os argumentos físicos contra o pleno que conduzem à admissão do espaço puro. No entanto,

95 “Espace”. In: Dictionnaire philosophique.

96 Idem, ibidem. É notável que no momento em que Newton é “criticado” mais uma vez reaparece o termo

gênio, marcando o desrespeito do inglês pelo seu próprio lema: hipoteses non fingo. Em certos assuntos o próprio Newton não foi capaz de limitar sua imaginação genial.

compreender esse espaço puro é tão difícil que, no final das contas, enfrentaríamos tantas objeções sobre essa concepção, ainda mais quando afirmamos o espaço como sensório divino, quantas foram endereçadas à matéria sutil que preencheria todo o universo.

A partir do verbete do Dicionário, a questão do espaço puro, do pleno e do vazio aparece como uma questão insolúvel e inútil, já que na física tudo se passa da mesma forma, estejamos com Newton ou com Descartes. Assim, o resultado metafísico de cada uma das teses parece ganhar mais valor do que seus argumentos propriamente físicos. Para Voltaire, os argumentos físicos contra o mundo pleno são fortes o bastante para afastar tal sistema. No entanto, a aceitação desta ou daquela posição não tem resultado algum para a física propriamente dita, que continua a resolver seus problemas sem se preocupar com tais questões. Isso já não se passa com a metafísica. Dependendo de qual sistema somos levados a adotar, o resultado metafísico é diferente. Afirmar o vazio e conceber o espaço puro parece ser muito difícil. No entanto, o raciocínio nos mostra que um sistema de matéria infinita favorece o ateísmo, enquanto que a admissão do vazio favorece a existência de Deus. Não se trata então de afirmar esta ou aquela tese física a partir de argumentos irretorquíveis, mas tão somente de, perante a dificuldade de se decidir por esta ou aquela tese, ver qual delas favorece algo que para Voltaire era certo: a existência de Deus.

O conhecimento da existência Deus

Qual é, porém, a natureza dessa certeza? Para compreendê-la é preciso retornar mais uma vez ao deísmo de nosso autor. Nosso objetivo aqui não é detalhá-lo, algo que já fizemos em outro lugar. 97No entanto, sendo nosso objetivo fornecer alguns elementos que constituem o universo de Voltaire e ressaltar as relações entre filosofia natural, metafísica e moral, não é possível deixar de reiterar certos pontos.

Sabemos que o Deus de Voltaire é conhecido por seus efeitos. Retomando a perspectiva de seu mestre Newton98, Voltaire sempre afirmou que a prova pelo desígnio

97 Na dissertação de mestrado, Voltaire filósofo: metafísica e filosofia inglesa na formação filosófica de

Voltaire (2004-USP), procuramos em dois capítulos estabelecer as vias pelas quais o autor chega ao conhecimento de Deus e quais são os resultados desse conhecimento em relação àquele que encontramos em Locke, Clarke e Newton, autores que constituíam suas fontes.

98 No escólio geral dos Principia, Newton diz: “Nós o conhecemos somente por suas invenções mais

sábias e excelentes das coisas e pelas causas finais; (...)”. In: Os Pensadores. Vol. Newton e Leibniz. Abril Cultural. São Paulo, 1974. p. 27.

é a única “demonstração” da existência de Deus.99 A conhecida prova a posteriori lhe parecia a única a evitar dificuldades comuns a outros argumentos e raciocínios. 100Entretanto, a via newtoniana de acesso ao conhecimento de Deus não conduz nosso

philosophe ao Deus do inglês, como mencionamos. O autor professava um deísmo

ressequido, aquele do velho Deus geômetra e distante. Mais do que mostrar que o Deus de Voltaire não é aquele Deus bíblico que animava a fé de Newton, o que desejamos no momento é compreender qual é o estatuto do conhecimento de Deus. Isso se faz ainda mais necessário quando temos em mente obras como os Diálogos de Lucrécio e

Posidônio, a partir do qual seria possível ver por que dificuldades passava a questão.

Nesses diálogos, Voltaire reproduz com tanta força a posição materialista que chegamos a duvidar se seu deísmo não se abalava com a força dos argumentos materialistas que recenseava.

Voltaire, sem dúvida, apresenta nesses diálogos um Posidônio convencido da existência de Deus a partir da idéia de que toda a obra demonstra um autor. Entretanto, a apresentação da posição de Lucrécio tem tanta força que chegamos a duvidar se o próprio Voltaire não se abalou com tais argumentos e não percebeu a fragilidade da posição deísta. Mesmo assim, Posidônio reafirma sua crença num Deus do qual nada mais podemos dizer. Ao final do diálogo, Lucrécio, perante a crença inabalavelmente estabelecida em Posidônio, pergunta sobre a relação desse Deus com nossas idéias, sentimentos e sensações, ao que Posidônio replica, confessando sua ignorância:

« J’avoue sur tout cela mon ignorance. Le monde pourra avoir un jour de nouvelles lumières, mais depuis Thalès jusqu’à nos jours nous n’en avons point. Tout ce que nous pouvons faire, c’est de sentir

99 A única exceção a isto se encontra no Tratado de Metafísica, quando Voltaire reconhece que a prova a

posteriori não avança nada sobre os atributos de Deus e se dedica a outras “demonstrações”, recorrendo a Locke e Clarke. Sobre isto ver: POMEAU. R. La religion de Voltaire. Op. cit. p.203-204 & BRANDÃO, R. Voltaire filósofo: metafísica e filosofia inglesa na formação filosófica de Voltaire. Dissertação de mestrado defendida no departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo em junho de 2004.

100 Isso não impede que Voltaire adicione outras “provas” àquela do desígnio. Por exemplo, nos

Elementos, capítulo I, o autor recorre à sucessão de gerações. E, no Tratado de Metafísica, capítulo II, retoma a perspectiva de Locke apresentada no capítulo 10 do livro IV do Ensaio sobre o entendimento humano. É importante notar que essa via para o conhecimento de Deus é tomada no momento em que Voltaire reconhece que a prova a posteriori não fornece nada sobre a natureza e atributos divinos, daí a busca de uma outra via cujos resultados sejam mais ricos, mas da qual nosso autor nunca se convencerá.

notre impuissance, de reconnaître un être tout- puissant, et de nous garder de ces systèmes ».101

O que gostaríamos de ressaltar nesses diálogos não é, entretanto, o seu resultado, que já sabemos ser mais uma defesa de um deísmo ressequido. Gostaríamos, ao contrário, de ressaltar a força com que a posição materialista é apresentada. O que vemos se desenrolar nesses diálogos é a oposição ponto a ponto de teses e argumentos deístas e materialistas, fazendo com que muitas vezes reconheçamos a igualdade de forças das posições, mesmo que, por fim, a balança penda para o lado do deísmo.

O mesmo processo já podia ser identificado no Tratado de Metafísica. Ao lidar com a questão da existência de Deus, Voltaire passa em revista a posição materialista tentando responder um a um aos argumentos que visavam negar a existência de um ser superior. E ao que se chegou no Tratado? Mais uma vez a um deísmo magro como nosso autor. No entanto, o Tratado deixa claro aquilo que a força da posição de Lucrécio apenas sugere; na oposição deísmo versus materialismo, não se trata da certeza contra a falsidade, da crença baseada na demonstração, apesar do uso do termo por Voltaire, contra fábulas ininteligíveis. As dúvidas que surgem no embate entre essas duas posições realmente abalavam o philosophe, e seu ponto de apoio deísta não é, como veremos, uma sólida verdade demonstrada.

A oposição entre deísmo e materialismo é, na verdade, a oposição da verossimilhança contra uma tese repleta de dificuldades. O que sustenta a crença de Voltaire é uma verossimilhança, uma probabilidade, e não uma certeza demonstrada. Após todo o percurso de argumentos a favor e contra a existência de Deus, o autor diz:

“Que um leitor equânime, tendo maduramente pesado o pró e o contra da existência de um Deus criador, veja agora de que lado está a verossimilhança!”.102

101 Dialogues entre Lucréce et Posidonius. In : Mélanges. Gallimard. Paris, 1961. p. 332.

102 Tratado de Metafísica. In: Os Pensadores. Vol. Voltaire. Trad. Marilena de Souza Chauí. Abril

Qual é, então, o estatuo da crença na existência de Deus? Bem, antes de responder esta questão, devemos dizer que o materialismo é mais dogmático que o deísmo. O dogmatismo materialista teria de aceitar sem provas muito mais coisas do que o deísmo, a eternidade da matéria sendo uma das principais delas.

Em carta a Frederico datada de 17 de abril de 1737, Voltaire apresenta algo que lança luz sobre o que estamos tratando:

« Quelle sera donc l’opinion que j’embrasserai ? Celle où j’aurai, de compte fait, moins d’absurdités à dévorer. Or je trouve beaucoup plus de contradictions, de difficultés, d’embarras, dans le système de l’existence nécessaire de la matière ; je me range donc à l’opinion de l'existence de l’Être suprême, comme la plus vraisemblable et la plus probable. Je ne crois pas qu’il y ait de démonstration, proprement dite, de l’existence de cet Être indépendant de la matière. Je me souviens que je ne laissais pas, en Angleterre, d’embarrasser un peu le fameux docteur Clarke, quand je lui disais : ‘On ne peut appeler démonstration un enchaînement d’idées qui laisse toujours des difficultés. Dire que le carré construit sur le grand côté d’un triangle est égal au carré des deux [autres] côtés, c’est une démonstration qui, toute compliquée qu’elle est, ne laisse aucune difficulté ; mais l’existence d'un Être créateur laisse encore des difficultés insurmontables à l'esprit humain. Donc cette vérité ne peut être mise au rang des démonstrations proprement dites. Je la crois, cette vérité ; mais je la crois comme ce qui est le plus vraisemblable ; c’est une lumière qui me frappe à travers mille ténèbres’». 103

A crença na existência de Deus é verossímil e provável, ela não tem o mesmo estatuto das verdades estabelecidas por demonstração matemática. 104A comparação da crença na existência de Deus com uma demonstração matemática parece nos conduzir a afirmar que esta crença não teria tanto valor, já que não se baseia na mesma força que teria uma demonstração propriamente dita. Além disso, poderíamos ser levados a pensar que o materialismo teria o mesmo valor epistêmico que o deísmo, o mesmo estatuto de opinião provável. Devemos, contudo, evitar esses dois mal-entendidos. Afirmar que o deísmo e o materialismo não podem ser demonstrados não significa conceder-lhes o mesmo valor epistêmico. Apesar de ambos serem indemonstráveis, um deles fornece verossimilhança e probabilidade que não estão presentes, ao menos no mesmo grau, na opinião contrária. Achar que porque são ambos indemonstráveis deísmo e materialismo devem ser postos no mesmo nível é dar um valor excessivo à demonstração.

O verbete ‘Certo, Certeza’ do Dicionário Filosófico apresenta claramente que, à exceção do conhecimento matemático e o conhecimento de existência de si mesmo, não há propriamente falando certeza. A certeza jurídica e a certeza histórica não são certezas propriamente ditas. A mesma comparação com as verdades geométricas reaparece no momento da crítica à noção de certeza jurídica:

“Il n’y a nulle certitude, dès qu’il est physiquement ou moralement possible que la chose soit autrement. Quoi! il faut une démonstration pour oser assurer que la surface d’une sphère est égale à quatre fois l’aire de son grand cercle, et il n’en faudra pas pour arracher la vie à un citoyen par un supplice affreux! ”.105

104 Cf. POMEAU, R. La religion de Voltaire. Op. cit. p. 205. 105 Cetain, Certitude. In: Dictionnarie philosophique.

A ausência da demonstração faz com que somente por extensão possamos chamar algo certo moralmente, já que não podemos afirmar que o contrário é impossível. É preciso então que nos contentemos com as probabilidades. 106

É importante notar que a questão epistemológica da certeza logo ganha no texto de Voltaire seu teor moral e “militante”, pois da discussão da fragilidade de nossas certezas passamos para a questão da pena capital e das injustiças em geral. 107 O probabilismo de Voltaire resulta numa prática jurídica pautada pela consciência da falta de certeza fora do âmbito matemático, tal consciência engendra a interdição da pena capital, já que não podemos fazer equivaler as probabilidades para a condenação com a certeza da morte do acusado.

A certeza histórica também se baseia na acumulação de indícios que, segundo nosso autor, só pode nos fornecer uma maior probabilidade e jamais uma certeza propriamente dita. Há apenas dois casos em que teríamos uma certeza, em que estaríamos fora do âmbito das probabilidades comuns à prática jurídica e à história: a certeza matemática e a certeza de nossa existência.

« Un jeune homme qui commence à étudier la géométrie vient me trouver il n’en est encore qu’à la définition des triangles. N’êtes-vous pas certain, lui dis-je, que les trois angles d’un triangle sont égaux à deux droits? Il me répond que non seulement il n’en est point certain, mais qu’il n’a pas même d’idée nette de cette proposition: je la lui démontre; il en devient alors très certain, et il le sera pour toute sa vie.

Voilà une certitude bien différente des autres: elles n’étaient que des probabilités, et ces probabilités examinées sont devenues des erreurs; mais la

106 « Si tel est le malheur de l’humanité qu’on soit obligé de se contenter d’extrêmes probabilités, il faut

du moins consulter l’âge, le rang, la conduite de l’accusé, l’intérêt qu’il peut avoir eu à commettre le crime, l’intérêt de ses ennemis à le perdre; il faut que chaque juge se dise: La postérité, l’Europe entière ne condamnera-t-elle pas ma sentence? dormirai-je tranquille, les mains teintes du sang innocent? ». Idem, ibidem.

107 É importante notar também que Voltaire ataca o fundamento de uma opinião comum àqueles que

defendem a pena capital. Muitas vezes a opinião favorável vem seguida pela idéia da certeza da culpa do acusado, algo como: “Só sou a favor da pena de morte se a culpa for certa”. Ora, é justamente esta certeza que Voltaire pensa ser impossível.

certitude mathématique est immuable et éternelle ».108

A certeza matemática depois de estabelecida por meio de demonstração permanece inabalável. E quanto à certeza de nossa existência? De acordo com Voltaire, ela está baseada no mesmo princípio das certezas matemáticas: o princípio de

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