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Diferenças e semelhanças: aspectos da fortuna crítica

Capítulo I — Encontro Marcado com Fernando Sabino

1.3 Diferenças e semelhanças: aspectos da fortuna crítica

Elencamos as críticas de o romance O Encontro marcado, agrupadas em edições de 1986 e 1996. Percorremos os caminhos da crítica desde a primeira edição, época em que imperava a crítica de rodapé, até chegarmos ao modelo que se mantém até hoje, o ensaio. O levantamento deste recorte da crítica foi necessário para comprovarmos as diferenças e semelhanças dentre os pontos de vista críticos, de modo a conhecermos um pouco mais nosso objeto e focarmos o nosso tratamento.

Entendemos que não basta pensar a crítica como uma faculdade de examinar e/ou julgar sob as formas de análise, de comentário, de apreciações teórica ou

estética. Ressaltamos que é necessário pensá-la em uma dimensão unificante, pensando nas relações e seu papel no âmbito literário, não apenas na definição de um conceito. A crítica literária não caminha só, ela acaba por envolver todo um contexto histórico-social, e mantém estreitas relações com a teoria e a história.

Roland Barthes (1999, p. 160-1) sustenta que, sendo a linguagem alheia a sua essência, toda atividade crítica deverá promover um discurso voltado para a linguagem. Ora, isso requer uma bagagem conceitual, há de se ter um conhecimento sistêmico sobre a literatura e seu universo. Portanto, esse conhecimento prévio revela a crítica como uma atividade engajada na história e no subjetivismo daquele que a pratica. Ocorre o cruzamento entre o discurso do crítico e o do autor observado, a crítica nada mais é do que o discurso sobre o discurso. Concluímos que o exercício da crítica constitui uma atividade metalingüística. O objeto literário, de acordo com as concepções barthesianas (1999, p. 161) descarta o julgamento de valor como elemento inerente à crítica e destaca seu caráter formal, isto é, a sua capacidade de adequar a linguagem de um período existencialista, psicanalista, marxista, à linguagem elaborada pelo escritor, segundo as exigências de sua própria época.

Percebemos, no decorrer dos tempos, variações na maneira de conceber e interpretar uma obra. Tais variações oferecem ao leitor uma ampla visão das obras que se eternizaram. Podemos dizer que essas variações abrangem uma visão relativa, uma vez que as interpretações abrangem novos contextos teórico-histórico- sociais. A partir desses esclarecimentos, buscaremos encontrar semelhanças e diferenças apontadas pelos críticos a respeito de nosso corpus de trabalho. O exame desses pontos colocará em evidência certos aspectos que acompanham a concepção crítica de O Encontro Marcado. Por meio dessa conduta, procurar-se-á observar algumas tendências críticas que a obra suscita.

Observamos que as críticas de Antonio Candido, Clarice Lispector, Antonio Olinto, Hélio Pólvora, José Carlos de Oliveira, Paulo Rónai, José Paulo Moreira da Fonseca e Eduardo Portella elogiam o “ritmo e o tempo” do romance. Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos sugerem o “viés jornalístico” na prosa do escritor mineiro, apontam que o ritmo do autor traz a agilidade que é marca do jornal. Dessa maneira, sugerem que a mídia influenciou o prosador Fernando Sabino. Os “diálogos” e a linguagem direta e a coloquialidade foram observados por críticos como Antonio Houaiss, Carlos Dante de Moraes e Jorge de Sá. Dalton Trevisan, Hélio Pólvora e Helena Silveira ressaltam que o romance denuncia um “cronista”,

apontando os episódios cronísticos como uma marca fundamental do romance. Estas características serão mais detalhadamente estudadas no segundo capítulo que trata da narrativa contaminada. Enfocaremos o hibridismo entre crônica e romance e a velocidade, o ritmo, o tempo como influências diretas da mídia na literatura do prosador mineiro. Destacaremos a trajetória do escritor como documentarista, visto que esta função também exige agilidade na composição

Afonso Ávila, Jacques do Prado Brandão, Henrique Pongetti, José Marianno Carneiro da Cunha e Tristão de Athayde sugerem que a obra é um “romance de geração”. Com o auxílio dos críticos que analisaram a obra do prosador mineiro e de outros que analisaram obras diversas, tentaremos demonstrar que um testemunho individual pode ser também o testemunho de uma geração. Um recorte do momento histórico retratado no romance far-se-á necessário.

Antonio Candido, Luis Martins, João Etienne Filho, Wilson Martins e Dalton Trevisan atestam que o romance é uma “autobiografia”. No segundo capítulo, tentaremos chegar ao veredicto sobre a confirmação ou não da autobiografia.

Afonso Frederico Schmit, Dalton Trevisan e Joel Silveira sugerem a “educação sentimental” e o ambiente dos “aprendizes de poetas e escritores”. Fábio Lucas, Haroldo Bruno, Tristão de Athayde, Dulce Maria Mindlin apontam para o existencialismo presente no romance. A “angústia”, a “solidão”, a “náusea”, “o drama interior”, são temas presentes nessa filosofia, críticas de Lúcio Cardoso, José Carlos Barbosa Moreira, Antonio Candido apontam para esses temas. Eduardo Portella vai além e sustenta que se trata de “romance filosófico”. Tristão de Athayde, Fábio Lucas, Gustavo Corção, Dulce Maria Mindlin e Marco Aurélio Matos observaram a “religiosidade” presente no romance. A atmosfera de um artista em formação, o ambiente do jornal, o projeto literário, as desilusões, as crises de angústias, os fracassos. Os medos, os desafios, os fracassos serão temas estudados no terceiro capítulo, que tratará do projeto idealizado e nunca realizado de se escrever um romance. A metalinguagem do terceiro capítulo focará o fracasso do narrador como sendo também o fracasso de uma geração.

Uns dos aspectos fundamentais que diferenciam as críticas compiladas nas obras de 1986 e 1996 referem-se à elaboração da linguagem. A maioria das críticas da edição comemorativa dos trinta anos de lançamento do romance foram escritas por jornalistas, escritores, críticos etc... que praticavam uma crítica não- especializada.

Os apontamentos críticos da obra da editora Nova Aguilar enriqueceram sobremaneira a fortuna levantada até então. Creditamos a essa diferenciação o viés ensaístico e investigativo e também à especialização dos críticos selecionados. A crítica de 1996 compilou estudos mais aprofundados do romance O Encontro Marcado. Muitas dessas críticas incluídas na obra da editora Nova Aguilar foram redigidas por professores universitários, como é o caso de Jorge de Sá, Edilberto Coutinho, Tristão de Athayde, Dulce Maria Vianna Mindlin, Antônio Houaiss, Fábio Lucas. Ressaltamos que Antonio Houaiss além de ensaísta, diplomata, filólogo, lexicógrafo pertence à Academia Brasileira de Letras desde 1971. Fábio Lucas pertence às Academias Paulista e Mineira e é um dos mais destacados críticos literários em atividade. Outro grande crítico que analisou a obra de Fernando Sabino foi Antonio Candido que sempre acompanhou a trajetória do prosador mineiro. A análise reflexiva mais fundamentada abre caminhos para novas interpretações da obra do prosador mineiro.

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