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Diferenças nos níveis de metabólitos entre subgrupos de pacientes bipolares

No documento FABIANO GONÇALVES NERY (páginas 106-109)

6   DISCUSSÃO 74

6.5   Diferenças nos níveis de metabólitos entre subgrupos de pacientes bipolares

Quando dividimos o grupo de bipolares alcoolistas de acordo com a categoria de alcoolismo, isto é, abuso versus dependência de álcool, não houve diferença estatisticamente significativa nos níveis de Glu+Gln, glutamato e NAA. Nossa análise deveu-se ao fato de que abuso e dependência de álcool podem ser categorias diagnósticas diferentes, e não estágios diferentes do mesmo transtorno psiquiátrico (em verdade, mesmo que fossem estágios diferentes do mesmo transtorno, a comparação entre os dois subgrupos ainda seria justificável para se avaliar possíveis efeitos de cronicidade do alcoolismo). É verdade que o diagnóstico de dependência de álcool pelo DSM-IV apresenta alta confiabilidade e validade de constructo, ao contrário do diagnóstico de abuso (Hasin et al., 2003). Um estudo naturalístico de pacientes alcoolistas mostrou que, ao longo de um ano, a evolução de abuso para dependência é de apenas 6% e a taxa de remissão do abuso é de 61%, enquanto para dependentes, a taxa de persistência da dependência é de 67% e de remissão é de apenas 24% (Hasin et al., 1997). Esses resultados sugerem que abuso e dependência do álcool são entidades clínicas distintas, e que abuso não necessariamente evolui para dependência.

Quase a totalidade dos estudos de ERM 1H em pacientes alcoolistas inclui pacientes com dependência de álcool ao invés de abuso de álcool, e não temos conhecimento de nenhum estudo de ERM 1H que tenha comparado essas duas categorias de alcoolismo entre si (TABELA 4). Reduções nos níveis de NAA na substância branca dos lobos frontais e aumento nos níveis de GPC+PC, PCr+Cr e mio-Ins na substância cinzenta do lobo parietal foram descritas em pacientes

dependentes de álcool em relação a indivíduos com uso leve de álcool (Meyerhoff et al., 2004). Além disso, associações entre dano neuroquímico e intensidade do uso de álcool foi mostrada através de correlações negativas entre os níveis de NAA no tronco cerebral e o consumo de álcool ao longo da vida, bem como entre correlações positivas entre as concentrações de mio-Ins e PCr+Cr no tálamo, cerebelo e lobo parietal e o número de doses mensais de álcool.

Infelizmente, a maior parte dos estudos clínicos sobre alcoolismo no TAB não faz distinção entre abuso e dependência. Dessa forma, não há dados clínicos sobre as diferenças quanto à gravidade do TAB, resposta ao tratamento ou evolução do alcoolismo entre pacientes bipolares que apresentam apenas abuso de álcool e pacientes bipolares que apresentam dependência de álcool. É possível que, da mesma forma que em alcoolistas sem transtorno primário, tais condições correspondam a categorias diagnósticas distintas, com um efeito diferente no curso e prognóstico do TAB.

Alguns critérios diagnósticos do DSM-IV para dependência de álcool pelo DSM-IV correspondem a sintomas que se originam de substratos biológicos bem definidos (como abstinência, tolerância e a busca compulsiva pela substância), ao contrário dos critérios para abuso, que são basicamente critérios de prejuízos nas esferas familiares, sociais e ocupacionais. A comparação entre pacientes bipolares com abuso

versus pacientes bipolares com dependência poderia potencialmente discriminar essas

duas categorias de alcoolismo com base no perfil neuroquímico do CPFDL. Porém, nossos resultados foram negativos e não discriminaram esses dois subtipos de pacientes bipolares alcoolistas. Essa foi uma análise exploratória, baseada em amostras pequenas em cada subgrupo (12 abusadores e 11 dependentes). Por isso, nossas conclusões são limitadas pelo fato de não podermos descartar um erro tipo II nessa análise. Estudos futuros em pacientes bipolares alcoolistas podem vir a examinar tal questao.

Nós também encontramos uma correlação negativa moderada entre tempo em remissão do alcoolismo e níveis de Glu+Gln. Se a exposição crônica e recente ao etanol causa um aumento dos níveis de Glu+Gln e de glutamato (Lee et al., 2003; Zahr et al., 2008) e a exposição crônica e pregressa ao etanol está associada à redução dos níveis de Glu+Gln e de glutamato (achados do presente estudo), é possível especular que um tempo maior de remissão do alcoolismo possa estar associado a uma progressiva diminuição (ou normalização) dos níveis de Glu+Gln. No grupo bipolar alcoolista, também observamos correlações negativas entre níveis de glutamato e idade e duração do transtorno de humor. Esse achado é consistente com um declínio, relacionado à idade, nos níveis de glutamato no CPFDL esquerdo em indivíduos saudáveis (possivelmente devido ao processo normal de envelhecimento, com diminuição do número de axônios, dendritos, conexões sinápticas e morte neuronal) (Grachev e Apkarian, 2001) e a uma interação de idade e efeitos neurotóxicos do etanol no tecido cerebral (o consumo pesado de álcool possivelmente causa uma aceleração das mudanças degenerativas) (Pfefferbaum et al., 1992). Assim, tais achados sugerem que o processo de envelhecimento, a cronicidade do transtorno de humor e o alcoolismo podem ser fatores que interagem entre si causando anormalidades neuroquímicas mais pronunciadas em pacientes com TAB. É preciso salientar, no entanto, que tais achados de correlações consistiram de análises exploratórias, não baseadas em hipóteses definidas a priori. Além disso, as variáveis relacionadas ao início e duração do tempo de exposição ao etanol foram obtidas a partir do módulo de entrevista para transtornos por uso de álcool do SCID, e, dessa forma, podem estar sujeitas a vieses de aferição e de memória. Esses achados devem, portanto, ser considerados como preliminares e interpretados com cautela até que estudos adicionais os confirmem.

6.6 Considerações finais: Importância dos achados para a

No documento FABIANO GONÇALVES NERY (páginas 106-109)