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5.1 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

5.1.3 Diferentes percepções do cooperativismo

Na medida em que lida com o paradigma econômico e com toda sorte de influências que este tem sobre o cotidiano do homem, o modelo de gestão cooperativista é alvo das mais variadas interpretações.

As percepções filosóficas, sociológicas e econômicas incidem de maneira importante nas interpretações realizadas.

A maior ou menor qualificação do observador em determinado campo do conhecimento, o que redundará em maior ou menor capacidade de análise; a posição que ocupa diante do modelo, se é participante, estudioso ou influenciado; o modelo mental prevalecente no esforço de análise, que determinará seu nível de isenção; enfim, todo um conjunto de fatores contribui para a formação de um conjunto de visões, às vezes equivocadas, sobre o cooperativismo.

Num sentido amplo, Rech (2000) defende a idéia de que o cooperativismo possa ser observado por dois pontos de vista, o socialista e o capitalista.

Na perspectiva do autor, [...] os chamados socialistas utópicos entendiam a

cooperativa como um dos caminhos para uma nova ordem econômica e social

(RECH, 2000, p. 10).

A idéia desses pensadores, entre eles, Owen, Fourier e Lassalle, citados por Rech (2000, p. 10), seria a de fazer do modelo de gestão cooperativista um instrumento

de contraposição ao capitalismo, cujo processo de emergência nos meados do século XIX deu margem a uma série de conflitos de interesses entre as classes proprietárias e operárias. Para eles, o cooperativismo seria uma etapa para se alcançar o socialismo.

Ainda entre os socialistas utópicos, Charles Gide defendia a idéia de uma

República cooperativa na qual todos os segmentos da economia se organizariam

por meio de cooperativas, o consumidor seria o soberano e as relações de trabalho seriam mediadas pelas próprias cooperativas.

A história mostrou que, mesmo em países onde a idéia socialista foi adotada como opção prioritária, como na China e na União Soviética, as cooperativas não foram adotadas na sua integralidade, com foco na participação do trabalhador, mas, sim, como modo de organização complementar da produção, nos locais onde a centralização estatal, conduzida pelo partido, não era capaz alcançar ou não era suficiente (RECH, 2000).

Na perspectiva capitalista, os liberais e os fisiocratas entendiam o cooperativismo como um instrumento de correção ao capitalismo.

A cooperativa, sendo colocada como fator intermediário entre o pensamento liberal e o socialista, surgia como elemento de intervenção no mesmo plano em que operava a Igreja, o Estado, a Família.

Essa perspectiva encontrou mais eco que a anterior, e hoje as cooperativas representam importante segmento da economia capitalista, embora [...] setores

progressistas, seja na área sindical, como na político-partidária, talvez por total desconhecimento, [seja] contra iniciativas cooperativistas (RECH, 2000, p. 17).

Não se pode negar, no entanto, que a absorção do cooperativismo pela economia capitalista tenha “contaminado” o primeiro, principalmente em razão dos imperativos de produtividade e de competitividade.

Ainda do prisma das múltiplas interpretações, Rios (1998) apresenta um conjunto de visões que demonstram as possibilidades de deturpação, das quais o cooperativismo pode ser alvo:

1. Visão Utópica: A despeito da grande representatividade do modelo cooperativista no mundo, que pode ser representada pelos milhões de pessoas que envolvem e o grande volume de recursos que movimenta, ainda há os que o vêem como algo ideal, mas inalcançável.

2. Visão Comunista: Essa visão confunde o princípio da igualdade do cooperativismo com totalidade igualitária do comunismo. No cooperativismo, é defendida a idéia de tratamento igual por parte do sistema a todos os cooperados, e não a igualdade de propriedade por parte de todos os cooperados, o que seria a idéia comunista.

3. Visão Socialista: O cooperativismo não procura padronizar os procedimentos dos cooperados, nem os obriga a manter-se sob as regras do sistema, também não “estatiza” sua produção, o que indicaria uma iniciativa socialista.

4. Visão Oportunista: A ação de pessoas desonestas que percebem o poder de convencimento do discurso cooperativista tem provocado abalos ao modelo. No entanto, é bom lembrar que a possibilidade de utilização do modelo cooperativista para a prática de fraudes não o inviabiliza, da mesma forma que não inviabilizou qualquer outro que tenha sido usado com propósitos escusos.

5. Visão Romântica: Diante de um quadro de histórica instabilidade econômica, de exagerada intervenção ou abandono do governo em alguns segmentos da economia, o modelo de gestão cooperativista não raras vezes é percebido como uma reunião de “vitimizados” pelo sistema, o que provoca a passividade à espera de dias melhores.

6. Visão Marxista: Embora os cooperados representem um conjunto de pessoas ligadas pelos mesmos interesses, isso não significa uma contenda ideológica entre classes, na medida em que o Estado, por exemplo, promova uma intermediação harmoniosa entre partes com interesses conflitantes.

7. Visão Paternalista: De forma análoga à da Visão Romântica, há os que acreditam que a cooperativa deve exercer a figura de provedor para o cooperativado. Nesses termos, prevalece o imobilismo e a passividade dos que esperam que a sua suposta importância seja reconhecida e que um ente superior solucione os problemas de produtividade e competitividade que nem mesmo o cooperativado quer reconhecer. 8. Visão Mercantilista: A percepção equivocada por parte dos dirigentes

da cooperativa e a desatenção aos princípios cooperativistas podem induzi-los a dividir a atenção a seu negócio essencial com outras atividades, fazendo com que o leque de ambientes competitivos da cooperativa cresça sem que possa progredir nos diversos ambientes da mesma forma, o que pode redundar na ruína de todos.

9. Visão Piedosa: A perspectiva social da cooperativa não deve ser confundida com uma perspectiva assistencialista. Embora a solução de problemas comuns esteja na essência do cooperativismo, a perspectiva econômica não pode deixar de referenciar a condução do negócio. Assim sendo, a atenção ao mercado e às exigências da sobrevivência e prosperidade do negócio não podem ser substituídas pela filantropia.

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