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3.2 Desafios pedagógicos face à docência

3.2.5 Dificuldade em aliar teoria e prática

Este elemento categorial foi explicitado por alguns professores que, por meio de suas narrativas, demonstraram certa dificuldade em aliar teoria e prática na sala de aula, evidenciando que, muitas vezes, o aprendizado da teoria vem separado do aprendizado da prática da profissão. Isso pode ser verificado pelas falas dos docentes Antônio, João e Elisa:

Tinha uma determinada técnica a ser passada e eu sei que eles tinham conhecimento prévio pra isso. [...] Eles tiveram que juntar tudo o que tinham de uma disciplina anterior praquilo, claro que talvez fosse facilitado, talvez porque eu tenha dado a disciplina anterior pra eles (Prof. Antônio)

[...] o aluno chega no estágio eles dizem assim: “eu não sei fazer isso”, mas tiveram, eles não lembram como fazer. Então tu acabas ensinando de novo ou muito superficialmente, mas ensinando, fazendo com que ele relembre as coisas que ele teve da disciplina. [...] o aluno quando chega no estágio sem as práticas antes, não sabe nada (Prof. João)

Você passar de uma contextualização prática pra uma parte teórica só, e não ter a prática ao lado, então é complicado isso, foi bem difícil [...]. Tem aula expositiva, depois como essa é uma disciplina, de intensivismo, tem toda a parte teórica, depois as práticas [...] (Profa. Elisa)

As professoras Maria e Joana, todavia, acreditam na importância da teoria contextualizada com a prática e explicitam como fazem isso em suas disciplinas, a partir de suas falas:

Percebe-se no dia-a-dia, um discente mais teórico, mas menos preparado para atuação prática. Acredito muito na experiência paralela à experiência curricular, o aluno construindo a sua própria trajetória. [...] Há previsão (no planejamento das disciplinas) de vivências práticas e de sua discussão. [...] Vivências práticas durante a teoria (atividade que pensa que promove a aprendizagem dos alunos) (Profa. Maria)

[...] porque a minha disciplina sendo prática, eu consigo entrar na teoria, no próximo dia tem uma vivência prática daquela teoria. [...] Então, a gente trabalhar essa teoria e eles assistirem a uma vivência na prática, [...] o retorno deles: “a gente aprende, a gente consegue se dar conta do que é, aquilo como se vivencia na prática” [...] (Profa. Joana)

Considerando a relevância dessas narrativas, afirmamos que a teoria não pode ser separada da prática, mas que estas precisam caminhar juntas durante o processo formativo discente, de maneira que a teoria embase a prática e que, a partir da prática, se possa ter elementos capazes de questionar e/ou ampliar os conhecimentos teóricos da profissão. Ademais, além de levar em conta o mérito da questão curricular que separa as disciplinas teóricas das práticas, precisamos pensar que a formação necessita voltar-se para a prática da profissão e para a sociedade na qual os alunos atuarão depois de formados e que, portanto, é preciso que se instaure um processo reflexivo sobre a prática com base na teoria e vice- versa.

Percebemos, ao analisarmos as narrativas que utilizamos para ilustrar esta categoria, que, assumir a docência, para estes professores que não passaram por nenhum tipo de preparação inicial, foi algo bastante complexo. As narrativas revelam que eles têm encarado de maneira positiva a docência, como um desafio que precisou de muita força e crédito nas próprias capacidades para vencê-los. Isso reflete o modo como docentes sem preparação inicial entram para a universidade e assumem a docência, tendo que, com seus próprios esforços, ultrapassarem as barreiras encontradas, o que poderia diferir se houvesse a concomitância de processos formativos oferecidos pela instituição na qual estão inseridos e se houvesse espaço para o compartilhamento de conhecimentos, de saberes e de fazeres entre os docentes.

Sabemos da importância da aprendizagem da docência como parte do processo formativo necessário a esta atividade, mas, de maneira nenhuma, pensamos que a culpa pela falta de formação é dos professores. Antes de responsabilizar os atores do ato educativo, precisamos refletir sobre as políticas públicas existentes para o ensino, percebendo que a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, 1996) reforça a ênfase na realização de pós- graduação, ao tornar a sua realização requisito para a formação do docente do ensino superior, o que sabemos não preparar para ser professor. A universidade, por sua vez, segue as políticas públicas, mas também goza de autonomia na direção e organização de atividades, portanto, poderia proporcionar programas de formação docente aos que ingressam e/ou estão atuando, de acordo com suas prioridades.

Compreendemos, assim, a afirmativa de Zabalza (2004, p. 105), quando afirma que

não se deve estranhar que, nós professores universitários, tendamos a construir nossa identidade profissional em torno da produção científica ou das atividades produtivas que geram mérito acadêmico e que redundam em benefícios econômicos e profissionais.

Assim, o professor fica a mercê das exigências para a carreira docente e aos requisitos para progressão funcional na mesma, não entrando, sequer em contato, a não ser, como mencionamos, em disciplinas da pós-graduação, com os conhecimentos sobre didática ou metodologia do ensino que, em geral, não são suficientes para a formação do professor universitário.

Desta forma, como podemos esperar deste professor que modifique a sua forma de atuação, deixando de embasar-se em um modelo de ensino tradicional, o qual vivenciou durante todo o seu tempo de estudante? É possível que os professores evitem perpetuar modelos de docentes seus? Como proporcionar experiências docentes que levem em conta processos de ensino diferenciados, considerando os diferentes sujeitos e contextos em que se dão a aprendizagem? Apesar dos interrogantes que existem para esta nova forma de atuação, podemos ver, na categoria a seguir, elementos que explicitam ações na direção do que estamos postulando.