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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.4 Difração de Raios X e método de Rietveld

Em 1895, o físico alemão Wilhelm Conrad Röntgen (1845-1923) descobriu a existência dos raios X. Ele percebeu que estes raios incidiam em uma chapa fotográfica de forma similar à radiação luminosa, todavia, era capaz de perpassar camadas espessas de madeira, do corpo humano e, até mesmo, de metais, diferentemente de outras radiações como a infravermelha e a luminosa [59].

A partir de então, os raios X foram utilizados como um meio de se obter um modelo de descrição da estrutura interna de objetos e até do corpo humano, por meio da radiografia, por exemplo. Contudo, não havia um critério de utilização de tais raios devido ao desconhecimento de sua natureza. Somente em 1912 reconheceu-se que os raios X eram ondas eletromagnéticas. A partir disso, a análise do processo de difração desta radiação por cristais começou a ser feita como forma de se estudar a estrutura interna da matéria [59].

A lei de Bragg para interferência construtiva foi desenvolvida em 1913, com o intuito de analisar o comportamento dos raios X quando estes perpassam a estrutura cristalina dos materiais. Ela recebe este nome em homenagem ao físico inglês William Lawrence Bragg (1890-1971) e ao seu pai, o físico, químico e matemático inglês William Henry Bragg (1862- 1942), pelo estudo da difração e reflexão de raios X em sólidos cristalinos e o desenvolvimento da lei física que rege este processo.

Para compreensão desta lei, é necessário entender que a difração é um fenômeno relativo à reorientação das frentes de onda quando passam por um orifício ou contorno de objeto cuja dimensão é da mesma ordem de grandeza de seu comprimento de onda (no intervalo de 0,5 a 2,5 Å para os raios X) [60].

Além disso, o processo de interferência, que se relaciona ao fenômeno da difração, é consequência do princípio da superposição de ondas e classifica-se em: interferência destrutiva, quando ondas superpõem-se em oposição ou fora de fase (crista com vale, por exemplo) e resulta em momentânea redução da amplitude das mesmas e interferência construtiva, quando ondas sobrepõem-se em fase (crista com crista ou vale com vale, por exemplo) resultando em incremento momentâneo da amplitude da onda [60, 61].

Deste modo, a fim de que ocorra interferência construtiva entre um raio refletido por um átomo em um determinado plano e outro raio refletido em um plano adjacente, a uma

15 distância (d), é preciso que a diferença de caminho entre esses raios seja um múltiplo inteiro do comprimento da onda eletromagnética refletida (λ). Isto, com intuito de que ocorra o encontro de crista com crista ou vale com vale da onda incidente. Tal comportamento é descrito pela Lei de Bragg, a qual se baseia no modelo de difração de raios X exposto na Figura 9.

Figura 9 – Difração de raios X e Lei de Bragg. Fonte: Adaptado de Cullity (1978)[59].

Pela análise desta figura, nota-se que a soma dos segmentos de reta SQ e QT equivalem ao dobro da distância interplanar d vezes o seno do ângulo de incidência interplanar θ, a qual, por sua vez, é igual a um dado número inteiro m, denominado de ordem de difração, vezes o comprimento da onda incidente λ, o que é expresso na Equação 4. Além disso, esta equação descreve a condição para que ocorra uma configuração que possibilite a interferência construtiva descrita anteriormente.

𝑆𝑄

̅̅̅̅ + 𝑄𝑇̅̅̅̅ = 2𝑑ℎ𝑘𝑙𝑠𝑒𝑛𝜃 = 𝑚𝜆, (4)

na equação acima, o subscrito hkl representa os índices de Miller. Adjacente a isto, o estudo da estrutura cristalina dos materiais por difração de raios X possibilitou a elaboração do conceito referente à célula unitária, a qual é a unidade básica de organização dos cristais, quer dizer, é “o bloco constituinte” da estrutura cristalina. A Figura 10 mostra um esquema da célula unitária, onde a mesma apresenta três eixos cristalinos denominados de parâmetros de rede a, b e c; sendo que, entre eles, são formados os ângulos ,  e .

16 Figura 10 – Célula unitária e parâmetros de rede. Fonte: Adaptado de Cullity (1978)[59].

De acordo com a configuração dos parâmetros de rede e dos ângulos entre os eixos cristalinos podem-se obter sete sistemas cristalinos (triclínico, monoclínico, ortorrômbico, tetragonal, hexagonal, romboédrico e cúbico) os quais englobam 14 redes de Bravais. O sistema cristalino monoclínico, por exemplo, possui a  b  c e  = = 90°  [59].

Um método que pode ser utilizado para analisar qual tipo de célula unitária um sólido cristalino possui, quer dizer, descobrir qual seu sistema cristalino, foi desenvolvido pelo cristalógrafo holandês Hugo M. Rietveld (1932-2016) em 1969 [62, 63]. Este método possibilita o estudo de grandezas relacionadas às propriedades físicas e químicas de materiais, tais como: volume da célula unitária, parâmetros de rede, coordenadas atômicas, entre outros [59, 62-65].

O método de Rietveld para refinamento estrutural baseia-se no ajuste do perfil do difratograma calculado, com relação ao difratograma experimental a partir de dados fornecidos concernentes a estrutura cristalina. Em essência, o método envolve um ajuste ou refinamento de parâmetros referentes à forma dos picos, à dimensão da célula unitária e a estrutura cristalina; isto, a partir de equações e parâmetros estatísticos que otimizam os perfis dos difratogramas calculado e experimental [62, 63, 65].

Este método de refinamento estrutural, baseia-se na minimização do quadrado do resíduo obtido pela diferença entre as intensidades observadas e calculadas tomadas ponto a ponto de medição de intensidade, isto, a partir do método dos mínimos quadrados expresso na Equação 5: 𝑆𝑦 = ∑ (𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠− 𝑌𝑖𝑐𝑎𝑙𝑐)2 𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠 𝑁 𝑖=1 , (5)

na qual: Sy é a quantidade que deve ser minimizada; i é o passo analisado; Yiobs é a intensidade observada no i-ésimo passo; Yicalc equivale a intensidade calculada para o i-ésimo

17 passo e N é o número de pontos de dados obtidos no processo de construção do difratograma experimental [62, 65, 66].

Uma expressão numérica da qualidade do ajuste entre o perfil de difração calculado e o observado é dada pelas funções de perfil. Basicamente existem três funções de perfil fundamentais: o R perfil – Rp (profile R-factor); o R perfil ponderado – Rwp (weighted profile

R-factor) e o R esperado – Resp (expected R-factor) expressos, respectivamente, pelas Equações 6, 7 e 8 obtidas da referência [66].

𝑅𝑝 = ∑ |𝑌𝑖𝑖 𝑜𝑏𝑠−𝑌𝑖𝑐𝑎𝑙𝑐| ∑ 𝑌𝑖𝑖 𝑜𝑏𝑠 , (6) 𝑅𝑤𝑝 = √∑ 𝑤𝑖 𝑖(𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠− 𝑌𝑖𝑐𝑎𝑙𝑐)2 ∑ 𝑤𝑖 𝑖(𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠)2 , (7) 𝑅𝑒𝑠𝑝 = √[ 𝑁−𝑃 ∑ 𝑤𝑁𝑖 𝑖 (𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠)2 ] , (8)

nestas equações: N é o número de pontos de dados experimentais e P é o número de parâmetros ajustados [65, 66]. Além disso, o termo wi é o peso estatístico dado pela Equação

9. O valor de wi é obtido em função do desvio ou incerteza padrão 2[𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠] fornecido pelo quadrado da média da dispersão da intensidade observada como mostrado na Equação 10.

𝑤𝑖= 1

𝜎2[𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠], (9)

𝜎2[𝑌𝑖

𝑜𝑏𝑠] = < (𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠− < 𝑌𝑖𝑜𝑏𝑠 >)2 > . (10)

Os valores de Rwp e Rp indicam um refinamento estrutural estatisticamente satisfatório quando estão abaixo de 10%, todavia, valores até 20% são razoáveis [65, 66]. O fator Rwp obtido no último ciclo do refinamento estrutural deve aproximar-se ao máximo do Resp, o qual é o valor esperado idealmente para o Rwp [62, 65, 66].

A razão entre o Rwp e o Resp, dada na Equação 11, é denominada de precisão do ajuste (Goodness of fit) representado por S, o qual é a raiz quadrada do 2. Como o valor de Resp equivale ao estatisticamente ideal para Rwp, isto implica que S indicará um refinamento

18 estrutural ideal quando Rwp for equivalente a Resp e, consequentemente, S igual a 1 [62, 65, 66].

𝑆 = 𝑅𝑤𝑝

𝑅𝑒𝑠𝑝 , (11)

o valor de S deve ser mais próximo de 1, contudo, valores até 5 são estatisticamente aceitáveis [65]. Adjacente a isso, como os fatores Rp, Rwp, Resp e S são de natureza estritamente estatística, é necessário enfatizar que um refinamento estrutural estatisticamente aceitável (Rp e Rwp menor que 10% e S menor que 5) não necessariamente indicará de forma precisa os dados referentes as propriedades estruturais dos materiais. É preciso que as leis e princípios físicos e químicos sejam obedecidos, afim de que não existam valores ilógicos referentes a ligações químicas e parâmetros térmicos, por exemplo [65, 66].

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