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3 O SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO E SUA INSERÇÃO NA SAÚDE: FORMAÇÃO

3.2 Dimensão Teórico-Metodológica

A dimensão teórico-metodológica da profissão refere-se à atuação do assistente social interligada a um embasamento teórico, ou seja, parte da concepção de unicidade entre teoria e prática, considerando que o processo investigativo necessita de ambos para conceber a concreticidade de seu objeto de trabalho. Fundamenta-se numa perspectiva histórico-crítica, visando a apreender a totalidade da realidade social em busca de sua essência, considerando a dinâmica contraditória inerente ao processo de desenvolvimento humano. Esta dimensão engloba, portanto, os conhecimentos teóricos necessários à efetivação de uma análise crítica, fundamentada em princípios éticos e políticos.

Sendo assim, para melhor compreender a realidade apresentada, deve-se aprofundar o método, ou seja, o “materialismo-histórico-dialético”, o qual teve sua origem nas obras de Karl Marx e fundamenta, atualmente, hegemonicamente a categoria profissional do Serviço Social no Brasil. Segundo Kameyama (1989, p. 100), “a teoria marxiana tem uma especificidade na medida em que é a única teoria que resgata a totalidade e que também coloca a questão da transformação.” Sob a perspectiva desta teoria, baseada na lógica da dialética, nada é definitivo; tudo se transforma. Trata-se de um processo de contínua

construção e desconstrução, onde as relações se transformam e nós mesmos nos transformamos, nos reinventamos. Nesse movimento, também chamado de “espiral”, edificam-se princípios e valores que são empregados cotidianamente no exercício profissional. Tais princípios e valores emergem de acordo com a visão de mundo constituída em cada indivíduo, tratando-se de uma escolha ideológica entre as diferentes filosofias ou concepções existentes.

A essência da dialética é a visão crítica, segundo a qual tudo deve ser posto em dúvida; todo fato deve ser passível de negação, a fim de compreendermos melhor sua conjuntura e intervirmos na realidade. Considerando que esta perspectiva teórica é completamente oposta ao conformismo, é essencial para o assistente social se apropriar da mesma, visto que seu método investigativo requer uma visão global da dinâmica social e uma profunda análise crítica, garantindo a consistência de seu papel como transformador social. Parafraseando Marx, na XI Tese sobre Feuerbach: “Os filósofos apenas interpretaram o mundo de várias maneiras, trata-se agora de transformá-lo.” (MARX & ENGELS apud SIMIONATTO, 2011, p. 80).

A totalidade, uma das principais categorias do método em Marx, nada mais é do que conceber as expressões da questão social através de uma visão de conjunto, isto é, compreender os fenômenos de forma interligada, em sua totalidade. Segundo Konder (1981, p. 37), “a totalidade é mais do que a soma das partes que a constituem.” Na verdade, é a relação entre elas – relação dialética. Enquanto a historicidade (outra categoria do método), serve para compreendermos que todo fenômeno abrange processos históricos e estruturais. Para Kosík (1976, p. 48), “[...] todo conhecimento é uma oscilação dialética [...], oscilação entre os fatos e o contexto (totalidade), cujo centro ativamente mediador é o método de investigação.” Deve-se considerar a realidade como processo, isto é, nada é estático; tudo é passível de transformações. O assistente social, portanto, necessita ampliar sua visão investigativa/interventiva para além das demandas que se apresentam.

Por outro lado, a dimensão teórico-metodológica da profissão pressupõe que teoria e prática estejam sempre indissociadas, denotando a práxis profissional, outra categoria do método. Para Marx, não existe trabalho sem antes ter-se uma projeção ideal do que se pretende realizar na prática, evidenciando a capacidade teleológica do homem, isto é, o trabalho pressupõe uma atividade teleológica, a qual idealiza finalidades e meios, e resulta em uma matéria transformada, nova, objetificada pelo sujeito. Aliás, o trabalho é a categoria central do método em Marx. Segundo ele, é através do trabalho que o homem domina as

forças naturais e, ao mesmo tempo, “humaniza a natureza”. Marx afirma que o homem vive da natureza, sendo parte integrante dela; ele é o único ser que, para poder sobreviver, precisa modificá-la com seu trabalho. Sendo assim, o trabalho é essencial à vida humana, independentemente de qualquer forma social de produção. (MARX, 2013).

Segundo Simionatto (2011, p. 80), baseada nos estudos do filósofo político Antonio Gramsci (1891-1937), a filosofia da práxis “afirma a unidade entre teoria e prática”, tratando- se de “uma filosofia que se engendra no processo histórico” com vistas à transformação concreta da realidade. Parte-se da ideia de que a concepção filosófica de práxis, através de uma consciência crítica, seja o sustentáculo político da transmutação de estruturas sociais, pois engloba uma dimensão transformadora da realidade.

Contudo, dentro do movimento espiral da práxis – que é processo; é transformação –, encontram-se inúmeras contradições, isto é, apesar de a teoria oferecer critérios suficientes para se crer em sua efetividade, na prática, pode ser que não ocorra conforme o planejado, pois a realidade concreta do homem é permeada de contradições. Segundo Konder (1981, p. 43), “não há, no plano puramente teórico, solução para o problema.” Isto significa dizer que, por mais que se tenha uma receita pronta, o cotidiano vivenciado na prática evidencia inúmeros obstáculos, os quais, dentro das possibilidades, devem ser contornados e superados, todavia, compreende-se que nem sempre a teoria aplica-se à realidade, devendo esta estar em constante articulação com a prática, a fim de realimentá-la à medida que se dá esse processo.

No âmbito da atuação do Serviço Social na Saúde, esta dimensão se materializa através da apropriação do referencial teórico por parte do assistente social e de sua habilidade em materializá-lo em seu cotidiano profissional através da práxis, denotando uma prática competente e de qualidade. Em concordância com a teoria social crítica na qual a profissão está fundamentada, o profissional deve pautar suas intervenções através de um olhar de totalidade, visando ao enfrentamento das expressões da questão social identificadas durante os atendimentos com os usuários. O assistente social, ao compreender a importância das determinações sociais e culturais no processo saúde-doença dos sujeitos, deve sustentar e defender seu projeto profissional frente à instituição na qual atua, buscando combater ações que venham de encontro às reais necessidades dos usuários.