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2.4 A NOVA CIÊNCIA JURÍDICA DO DIREITO ANIMAL

2.4.1 O Direito Animal no exterior

O pleito pela consideração ética com os animais e, consequentemente, de reconhecimento de direitos, apesar de antigo, vem se tornando cada dia mais relevante no exterior e mais recentemente no Brasil, já se encontrando no seu campo teórico consolidado em alguns países e noutros em vias de se consolidar, tendo em vista pesquisas científicas que categorizam os animais como seres sencientes - capazes de sentir dor e sofrimento -, e das massivas denúncias de maus-tratos aos animais expostas pelas organizações de proteção e defesa animal, o que vem contribuindo para o debate acerca da ampliação da comunidade moral para os animais nas diversas áreas do conhecimento, notadamente na Ciência Jurídica.

Um exemplo, no plano internacional, é o reconhecimento dos direitos animais que foi objeto da Declaração Universal dos Direitos dos Animais anunciada em Bruxelas/Bélgica (27/1/1978) e em Paris (15/10/1978), durante assembleias da UNESCO. Apesar de não se tratar de uma normativa jurídica internacional mas sim de uma carta de princípios, se trata de um importante marco na inclusão dos animais na esfera da moralidade humana. O documento prescreve uma série de dispositivos acerca da proteção aos direitos dos animais, tendo sido subscrito inclusive pelo Brasil. Tal declaração é objeto de críticas de algumas vertentes do direito animal, todavia, demonstra o empenho de entidades e organizações internacionais que buscam efetivar, a nível mundial, os direitos dos animais, conforme Ataíde Junior (2018).

Outros exemplos a nível internacional, é que uma das mais respeitáveis instituições universitárias norte-americanas já contam com cadeiras específicas de “Animal Law” nas suas faculdades de Direito. Desde a primavera de 2000, a Harvard Law School realiza seu curso de “Animal Rights Law”, inaugurado pelo professor Steven M. Wise. Seguiram-se à iniciativa de

Harvard cursos de “Direitos dos Animais” nas igualmente importantes universidades de Duke

e Georgetown, segundo Oliveira e Lourenço (2009).

Ainda no campo internacional, juristas de escol e intelectuais de vanguarda já sedebruçaram sobre a matéria. Entre tantos outros estão Demogue, Cesare Goretti, John

Rawls, Sunstein Cass, Martha C. Nussbaum, Laurence Tribe, Richard Posner, Alasdair Macintyre, Alan Dershowitz, Santiago Nino, Peces-Barba, Richard Epstein, Tom Regan, Steven M.Wise, Gary Francione, Will Kymlicka, Canotilho, Bertrand Russel, J.M. Coetzee, Edgar Morin, Henry Spyra, Keith Thomas e Richard Ryder, narram Oliveira e Lourenço

(2009).

Hoje em dia a disciplina direito animal é obrigatória em mais da metade das quase 200 escolas de direito dos Estados Unidos, sendo a ideia da ampliação da categoria de coisas para sujeito de direito aos animais defendida por vários professores estadunidenses, igualmente por um crescente número de advogados, comentam Oliveira e Lourenço (2009).

Prosseguem os mesmos autores comentando, que o respeito ético e jurídico pelos interesses dos animais tem adquirido foros de irreversibilidade em muitos meios, sendo praticamente impensável que um filósofo moral deixe de abordar questões relacionadas à ética animal nos dias de hoje, tendo sido ainda o judiciário internacional bastante provocado por juristas, que pleiteiam uma maior proteção e revisão da natureza jurídica dos animais.

A nova ciência do direito animal busca, portanto, renovar o modelo antropocêntrico e especista que instrumentalizou os animais e distanciaram o animal humano da natureza, herança de tradições milenares, religiosas, filosóficas e científicas.

Todavia, a problemática é profunda e tem raízes na Grécia Antiga, tendo como representante maior Aristóteles e sua “Grande Cadeia do Ser”, que colocou os seres humanos num patamar superior, abençoados com a racionalidade, e negou aos animais capacidades que consequentemente poderiam lhe conceder direitos. A finalidade do animal era unicamente servir o homem. Também os romanos, com a dicotomia pessoa/coisa, tão cara ao Direito e que ainda é base de diversos sistemas jurídicos contemporâneos contribuíram para este centramento, no dizer de Lourenço (2008), reproduzindo que os animais seriam coisas, situadas no âmbito do direito de propriedade. Na tradição judaico-cristã, encontra-se também raízes, que com à doutrina agostiniana e a filosofia tomista reforçaram a coisificação dos animais, afirmando que o mandamento “não matarás” não se aplica aos animais. Chegando-se até a era moderna, da renascença ao racionalismo clássico e o mecanicismo cartesiano, culminando, em síntese, com o pensamento do filósofo Immanuel Kant, que influencia especialmente o Direito e suas conceituações jurídico-constitucionais da dignidade da pessoa humana, colocando-o como “fim em si mesmo” em todas as relações, apenas com deveres indiretos com os animais, já que, nesta visão, eles não possuem autoconsciência e existem meramente como meios para um fim. Esse fim é o homem.

Lourenço (2008) narra que o movimento moderno de direitos animais teve suas raízes no início da década de 1970, quando um grupo de filósofos da Universidade de Oxford começou a questionar porque o status moral dos animais não-humanos era necessariamente inferior à dos seres humanos. Esse grupo incluía o psicólogo Richard D. Ryder, que cunhou o termo "especismo", usado num panfleto impresso para descrever os interesses dos seres na base de membros de espécies particulares. Ryder tornou-se um contribuidor com o influente livro Animals, Men and Morals: An Inquiry into the Maltreatment of Non-humans, editado

por Roslind e Stanley Godlovitch e John Harris e publicado em 1972. Foi numa resenha de

seu livro para o New York Review of Books que Peter Singer, professor de Bioética na

University Center for Human Values na Universidade de Princeton, resolveu em 1975 lançar

Libertação Animal, livro que impulsiona o movimento de direitos animais, apesar de baseado no utilitarismo.

Nas décadas de 1980 e 1990 o movimento se juntou numa larga variedade de grupos profissionais e acadêmicos, incluindo teólogos, juízes, físicos, psicologistas, psiquiatras, veterinários, patologistas e antigos vivisseccionistas.

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