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IV. CONCILIAÇÃO NOS DIFERENTES ÂMBITOS DO DIREITO

4.2. Direito Penal e a conciliação

No Direito Processual Penal a conciliação pode ocorrer nos casos de crimes contra a honra e nos estipulados pela Lei n. 9.099/95, ou seja, todas

as contravenções e crimes com pena não superior a dois anos (excetuados os crimes de procedimentos especiais).

Para os crimes de calúnia e injúria, o Código de Processo Penal é explícito em determinar a possibilidade de conciliação entre as partes. Apesar de não estipulado, o crime de difamação deve seguir o mesmo rito processual dos artigos 519 e seguintes, que inclui a possibilidade de conciliação antes do recebimento da queixa. Damásio E. de Jesus explica sobre a ausência dessa determinação no Código, “ocorre que, ao tempo em que foi elaborado o Código de Processo Penal vigente, não tínhamos, no Código Penal de 1890, delito com esse nomen júris”.187

A calúnia significa atribuir falsamente a alguém fato tipificado como crime. Exemplo: ‘A’ dizer que ‘B’ furtou o carro de ‘C’, sendo que ‘B’ não cometeu tal crime. A difamação consiste em atribuir a alguém fato ofensivo à sua reputação, independente se verdadeiro ou não. O problema nesse caso é a criação de uma visão social negativa com a divulgação do fato, independente se verdadeiro ou não. Exemplo: ‘D’ dizer que ‘K’ foi trabalhar completamente embriagado na semana passada. A injúria significa atribuir a alguém qualidade negativa, que ofenda sua dignidade ou decoro. Exemplo: ‘J’ chama ‘G’ de ladrão, imbecil.

Afirma Vicente Grecco Filho

“esse tipo de procedimento não é aplicado para crimes contra a honra iniciados por denúncia (crimes contra a honra praticados contra funcionário público), os quais são de ação pública mediante representação e em que, oferecida a denúncia, é impossível

retratação, de modo que não teria cabimento tentativa de reconciliação, que seria, ademais, irrelevante e impertinente”188. No procedimento, o juiz oferecerá oportunidade de conciliação antes de receber a queixa, as partes serão ouvidas separadamente e sem a presença de seus advogados. Esse momento é considerado como uma conversa amigável e informal buscando unicamente o entendimento das partes e a conciliação, tanto porque não deve ser lavrado o termo.

O juiz, no momento da conversa, verificando possibilidade de conciliação, chamará os advogados responsáveis e promoverá o entendimento entre as partes, agora sim lavrando termo de desistência da queixa, que, posteriormente, será arquivada. Caso a conciliação não aconteça, o juiz lavrará o termo de insucesso da audiência de conciliação, posteriormente decidindo pelo recebimento ou não da queixa.

Discute-se, doutrinariamente, sobre o cabimento de o juiz determinar a condução coercitiva das partes para a tentativa de conciliação. A maioria doutrinária defende a incompatibilidade de obrigar alguém a comparecer a algum lugar para tentar uma conciliação. A vontade de não comparecer indica claramente que não existe interesse em se conciliar. O juiz, nesse caso, considerará prejudicada a tentativa de conciliação e aceitará o recebimento da denúncia.

O rito do Juizado Especial (Lei n. 9.099/95) segue para as contravenções e crimes com penas máximas não superiores a dois anos, cumulada ou não com multa; exceto os crimes de procedimentos especiais. A Lei n. 11.313/06 alterou redação do artigo 61 daquela lei, passando a

especificação dos crimes com penas máximas de um para dois anos, conseqüentemente alterando o conceito de infrações penais de menor potencial ofensivo.

A Comissão Nacional de Interpretação da Lei n. 9.099/95 concluiu que

“essa lei é aplicável pelos juízes comuns (federal e estadual), militares e eleitorais, imediata e retroatividade, respeitada a coisa julgada, os institutos da Lei 9.099/95, como composição civil, extintiva da punibilidade (artigo 74, parágrafo único), transação (artigos 72 a 76), representação (artigo 88) e suspensão condicional do processo (artigo 89)”.189

O artigo 60 da referida lei especifica que “o Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e leigos, tem competência para conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência”.

O procedimento do Juizado Especial Criminal começa com a audiência preliminar. Nela estarão reunidos o autor do fato, a vítima, o responsável civil, os respectivos advogados e o representante do Ministério Público. Aberta a audiência, o juiz, conversando informalmente, esclarece às partes as vantagens da aceitação de um entendimento; essa é considerada como a tentativa de conciliação entre as partes.

O artigo 72 da lei determina como o juiz inicialmente trata o andamento da conciliação:

“Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade” (artigo 72 da Lei n. 9.099/95).

A tentativa de conciliação para o campo penal somente existe transação, pois o Ministério Público transige quanto à pretensão punitiva e os autos do fato transigem quanto à possibilidade da absolvição.

Consideram-se requisitos do juiz para a correta condução da conciliação:

a) buscar o acordo entre as partes para além da solução jurídica da controvérsia;

b) agir por equidade e não de acordo com o princípio estrito da legalidade; c) conciliar objetivando o fim maior da lei: pacificação social e o respeito à vontade das partes;

d) aconselhar, pacificar, indicar vantagens da conciliação, sem pressões. A conciliação será feita pelo juiz ou por conciliador mediante a orientação do juiz. “Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados, na forma da lei local, preferentemente entre bacharéis em Direito, excluídos os que exerçam funções na administração da Justiça Criminal” (parágrafo único do artigo 73 da Lei n. 9.099/95).

“Art. 74. Parágrafo único. Sendo ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo

homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação”.

O autor, sendo regularmente intimado e não comparecendo à audiência preliminar, nem justificando sua ausência, não poderá ser conduzido coercitivamente, já que a aplicação do artigo 80 cabe somente nos casos de processo já instaurado. O juiz então designará a audiência de instrução e julgamento, e, conseqüentemente, estará prejudicada a tentativa de conciliação para aquele momento, nada impedindo sua retomada no início da próxima audiência. O mesmo ocorre ao não-comparecimento da vítima, quando regularmente intimada, ou seja, perde a oportunidade de conciliar-se.