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O discurso do sucesso escolar como investimento financeiro pela família

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CAPÍTULO I – EDUCAÇÃO E O DISCURSO DO SUCESSO ESCOLAR COMO

1.3 O discurso do sucesso escolar como investimento financeiro pela família

O capitalismo e a ideologia neoliberal querem, mais do que nunca, inserir a educação na lógica de mercado, padronizando-a por entre os países e somente importando-se em enxergá-la como um valor econômico. Sob esse ponto de vista faz-se necessário pensar no que já foi dito por Nietzsche (apud Laval, 2004, p. 22) nas conferências Sobre o porvir nos estabelecimentos de ensino, quando ele interroga o real sentido dos discursos sobre a necessidade de cultura para a modernidade. Para Nietzsche, a cultura clássica, reservada para alguns, entra em decadência e por cultura universal, desse momento em diante, entende-se uma cultura totalmente diferente daquelas dadas pelas universidades ou estabelecimentos secundários que visavam a formação de espíritos intelectualmente treinados e equipados para pensamentos mais elevados. A nova cultura, que se definiria atualmente de massa, não tem como objetivo reproduzir os grandes gênios do passado e é submetida a três propósitos específicos: o fim econômico, o político e o científico.

Ainda de acordo com Nietzsche, a subordinação econômica produz os efeitos mais importantes, pois se ela conduz à extensão e à ampliação da cultura, é com o fim de aumentar a riqueza pessoal e coletiva. É “um dos grandes dogmas da economia política, mais caros ao tempo atual” (NIETZSCHE, apud Laval, 2004, p. 22). Assim a democratização da cultura é cada vez mais conduzida pela eficácia econômica. É necessária uma cultura rápida, econômica, que custe pouco esforço e permita ganhar muito dinheiro, acrescenta Nietzsche.

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Em virtude disso, mais pessoas são chamadas para o saber, porém um saber que seja útil e que tenha como finalidade o bem estar do homem. Esse era o propósito da escola: fazer com que cada um progredisse até o ponto em que sua natureza o chamasse a tornar-se corrente, ou seja, que o homem tire do conhecimento e do saber, maior quantidade de felicidade e benefício. Nesse sentido, a eficiência apodera-se, aos poucos, do domínio cultural e escolar. Essa constatação leva a crer que a ameaça que surge não é em relação à baixa do nível cultural do homem, mas de um duplo movimento de extensão social e de instrumentalização da cultura pelos interesses econômicos privados.

Desse ponto de vista, o saber não é mais um bem adquirido para a formação da essência universal do homem, como no modelo escolar do passado, mas em um investimento mais ou menos rentável para os indivíduos igualmente dotados e talentosos. A partir desse momento, novos critérios operacionais como a eficácia, a mobilidade e o interesse substituem os valores escolares vigentes outrora e com isso, a escola muda seu sentido,

ela não é mais o local de assimilação e de presença frequente das grandes narrações que forjam caracteres estáveis para situações sociais bem definidas;ela é o lugar de formação de caracteres adaptáveis às variações existenciais e profissionais em movimento incessante (LAVAL, 2004, p.23).

Desse modo, o utilitarismo que marca o espírito do capitalismo não é contrário ao saber em geral nem contra o saber para um número maior de pessoas, ele o considera uma ferramenta a serviço da eficácia do trabalho. Nos dia de hoje, essa concepção torna-se ainda mais contundente, já que “o discurso hegemônico neoliberal adotou como estratégia no campo educacional a proposta de transferir as questões educacionais do âmbito político para o âmbito de mercado” (NETO; MACIEL 2004, p. 52).

É certo que, partindo dessas análises, é possível perceber que as propostas neoliberais para a educação escolar, ou seja, formal, pretendem transformar a escola em uma empresa produtiva, entretanto ao comparar a educação a uma empresa, pode-se notar que entre ambas há uma diferença muito grande quanto aos objetivos de cada uma. A empresa, por exemplo, tem como fim os lucros, que, diga-se de passagem, tem que ser contabilizado em curto prazo; ao contrário da educação, que tem como objetivo a formação do homem e do trabalho, o que requer um trabalho a longo prazo. Visto por essa ótica, a escola não pode ser comparada nem tampouco transformada em empresa, porque seu produto final é o conhecimento e não uma mercadoria.

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Neste momento, faz necessário frisar que os autores abordados, neste capítulo, não postulam ou se manifestam em favor das propostas neoliberais, eles apenas discutem, tensionam as questões que aqui são colocadas ao longo das discussões, tendo como referência as mudanças tanto no campo educacional, como no socioeconômico, ocorridas nos últimos tempos.

Por esses motivos, na tentativa de evitar o fracasso, os pais buscam, para os filhos, escolas que ofereçam uma formação que garanta não só o sucesso escolar, mas, sobretudo, o profissional. Escolas que se expõem como mercadorias em vitrines: outdoors, cartazes, propagandas na mídia falada, escrita e virtual. O imperativo do sucesso profissional aparece até mesmo antes dos nomes das escolas que garantem uma carreira promissora aos que nelas estudarem.

A ordem que dita em que escola o filho deve estudar, para quê e quais são os lucros que ele terá, se frequentar esta ou aquela escola, é perceptível em vários veículos de comunicação escrita, tornando um verdadeiro jogo de sedução para os pais que buscam o sucesso dos filhos.

Se, na sociedade contemporânea, o reconhecimento do sujeito se dá pelo lugar que ele ocupa determinado pelo sucesso não só escolar, mas especialmente, profissional, qual é o lugar do sujeito que fracassa? Que concepção a sociedade tem de fracasso? O capítulo seguinte discutirá este assunto.

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CAPÍTULO II – A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA: CONCEPÇÕES, LAÇOS

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