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Discursos desiguais entre homens e mulheres

Capítulo 1 Fundamentos Teóricos

1.3. O sexismo linguístico

1.3.1. Discursos desiguais entre homens e mulheres

Embora algumas diferenças linguísticas entre homens e mulheres não sejam difíceis de perceber, o tema não chamou a atenção dos pesquisadores até ao início do séc. XX.

Otto Jespersen, um linguista dinamarquês, confirma a existência dos discursos diferentes usados por homens e mulheres nalgumas tribos de Ilhas Antilhas da América através de um exemplo que é registado por Rochefort. Isto é, os homens empregam

expressões particulares, que são entendidas, mas não usadas pelas mulheres. Por outro lado, as mulheres têm também palavras próprias não aceites pelos homens, pois quando o homem as usa, vai ser ridicularizado (Rochefort, 1665:449. citado por Jespersen, 1921:237). Porém, Jespersen pensa que Rochefort não fala realmente dos discursos de dois géneros como línguas ou dialetos totalmente distintos, mas apenas de certas diferenças gramaticais dentro da mesma língua. Com base nisso, Jespersen desenvolve o estudo sobre a particularidade do discurso feminino a partir de linguagens especiais (tabu, linguagem competitiva, no sânscrito), de aspetos gramaticais (a fenética, os advérbios, etc.), ou do estilo de linguagem. Apresentamos em seguida algumas conclusões importantes de Jespersen em relação às desigualdades linguísticas entre homens e mulheres em diferentes línguas.

Em primeiro lugar, dentro dos caribes velhos, em relação aos homens, as mulheres tinham mais limitações no uso do léxico. Pelos costumes tradicionais (como os tabus, por exemplo) ou ordens sociais, as mulheres caribes, por um lado, eram proibidas de empregar algumas palavras (a esposa não é permitida mencionar o nome do seu marido, por exemplo) e por outro, são obrigadas a usar certas palavras de maneira figurativa. Com base nisso, Jespersen conclui que as mulheres possuem o vocabulário mais limitado por temas peculiares e empregam mais expressões eufemísticas. No que diz respeito aos homens, conseguem expressar ideias de forma mais clara, uma vez que têm um alcance maior do vocabulário. A ideia é apoiada pelas descobertas em outras línguas na época do século XX, como no caso da Índia, i.e., sob as restrições culturais, usar palavras delicadas parece ser um privilégio de uma pequena parte dos homens de classe superior. Além disso, em relação aos homens, as mulheres geralmente falam menos línguas estrangeiras num contexto da imigração, tal como no caso de imigrantes alemães e escandinavos na América 4(cf. Jespersen: 1921: 239-242).

Em segundo lugar, Jespersen refere uma ideia de Leipzig (1903:79). Nalguns grupos linguísticos, há desigualdades entre os sexos no que respeita à renovação de uma língua. Em comparação com os homens, as mulheres apresentam um conservadorismo maior na maneira de usar menos palavras novas e cumprem mais regras gramaticais (como na França e Inglaterra). No entanto, o fenómeno é variado de cultura para cultura, como, por exemplo, no caso das mulheres japonesas, que manifestam menos conservadorismo, quer na pronúncia quer na seleção das palavas (Jespersen, 1921:243).

Além disso, em relação aos homens, as mulheres japonesas usam mais prefixos de polidez. O fenómeno dos diferentes usos do prefixo aconteceu também numa tribo da Bolívia, que se chama chiquitos. As mulheres, em relação aos homens, usavam menos vezes um prefixo que distinguiria o género do sujeito (Jespersen, 1921:240).

Em terceiro lugar, homens e mulheres pronunciam de forma diferente. O fenómeno é notado em várias línguas, tais como o inglês moderno.

(...), according to Daniel Jones, soft is pronounced with a long vowel /sɔ :ft/ by men and with a short vowel /sɔ ft/ by women; .... So far as I have bem able to ascertain, the pronunciation /t∫uldrən/ for /t∫ildrən/ children is much more frequent in women than men (Jespersen, 1921:245).

Ao nível sintático, no corpus de inglês, as mulheres preferem frases meias-feitas, fazendo sempre pausas desnecessárias. Quando elas usam frases longas, normalmente são as de marcações não gramaticais, mas emocionais pelo stresse e entoação (Jespersen, 1921: 251).

Deste então, surgiram vários estudos relativos à variação sexual na linguagem. John Fischer (1958) escolheu 12 crianças de uma pequena cidade da Nova Inglaterra5 de ambos os géneros com idades entre 3 e 10 anos para fazer uma pesquisa sobre a preferência de pronúncia de -ing. O resultado demostrou que a maioria dos meninos pronunciam -n(-in), mas, a maioria das meninas pronunciam -ŋ(-ing). Assim chegou à conclusão:

“in this community, -ing is regarded as symbolizing female speakers and -in as symbolizing males(Fischer, 1958:49)”.

Porém, Bonvillain duvida que seja o género a causa única daquela conclusão e exemplifica outro estudo semelhante que é feito por Trudgill com adultos. Segundo Trudgill, as variações sexuais na linguagem de pronuncia de -ŋ/-n estão relacionada mais com o classe social e um estilo contextual ou situacional (Trudgill, 1972:182, citado por Bonvillain, 1995: 227). Isto mostra que muitas vezes os estudos sobre diferenças linguísticas ligadas ao sexo não têm fundamentos muito sólidos.

Variações na linguagem devidas ao género também se encontram na gramática. Robin Lakoff (1973:55), por sua vez, aponta que no inglês amaricano, nota-se que as

5 A Nova Inglaterra (em inglês: New England) é uma região geográfica extraoficial que se localiza no

mulheres usam mais em seus discursos algumas estruturas gramaticais específicas, como, por exemplo, os modos de “tag question”:

John is here, isn't he? Sure is hot here, isn't it?

Na opinião de Robin Lakoff, a preferência das mulheres pelo uso desta estrutura gramatical é motivada pela sua incerteza e por falta de uma opinião mais afirmativa em relação às de homens.

Os estudos apresentam algumas conclusões semelhantes. Porém, visto que os resultados geralmente são condicionados pela língua específica ou pelo grupo social, não é possível chegar a acordo sobre diferenças sexuais no uso da linguagem. Além disso, descobrimos que, sob as influências dos movimentos feministas, e do desenvolvimento da Sociolinguística, as diferenças entre discurso masculino e feminino são tratadas como um tipo de sexismo linguístico. Neste contexto, os investigadores começam a ligar a variação linguística de género às razões extralinguísticas (a situação social, o contexto do discurso, a idade, etc.). Surgiram posteriormente estudos que, para além de estudarem o emprego diferente dos dois géneros, se focam também na língua própria, especificamente ao nível semântico, pelo aparecimento de métodos novos no estudo da linguagem.

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