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Essa pesquisa teve como proposta contribuir com uma investigação transcultural, descrevendo um estudo de caso de uma jovem usuária de comunicação alternativa, de doze anos de idade, alfabetizada, diagnosticada com paralisia cerebral, sem fala articulada e com significativo comprometimento motor, comparando-a a um sujeito controle da mesma idade e com desenvolvimento motor e de linguagem dentro dos padrões de normalidade.

O estudo buscou conhecer e analisar os meios pelos quais a jovem se comunica e a forma de interpretação dos enunciados produzidos por outros ao utilizar-se de seu sistema de comunicação.

Na tentativa de se pesquisar estudos com esse mesmo propósito, foi realizada uma revisão da literatura brasileira nessa área, apontando certa carência de estudos longitudinais sobre o desenvolvimento da linguagem em crianças que utiliza os sistemas gráficos como sua principal forma de comunicação.

Nesse estudo, foi realizada analise e observações da criança e de seus interlocutores na compreensão e emissão das mensagens. Para isso, utilizou-se o método qualitativo, descrevendo os resultados de cada tarefa. O método qualitativo “não busca estudar o fenômeno em si, mas entender seu significado individual ou coletivo para a vida das pessoas” (TURATO, 2005).

A análise dos dados e resultados foi apresentada no capítulo anterior, porém, alguns deles poderão ser descritos aqui tendo o objetivo de discutir e de refletir os mesmos, para uma melhor compreensão dos enunciados emitidos pela participante.

De um modo geral, os resultados obtidos na pesquisa foram positivos e os objetivos foram alcançados. Vale ressaltar que independente dos achados nas provas realizadas com Marcela, a mãe considerou a pesquisa válida e importante.

Os resultados obtidos nas entrevistas, checklists e escalas de avaliação, bem como nas tarefas comunicativas, proporcionaram uma melhor compreensão das interações comunicativas entre a usuária de CAA e seus parceiros de comunicação, nesse caso, a mãe, a psicopedagoga e a cuidadora.

Os resultados apontam que a mãe era a interlocutora que utilizava com maior freqüência a comunicação alternativa com Marcela e era mais competente no uso da linguagem alternativa com a participante do que a cuidadora e psicopedagoga. Resultado semelhante foi encontrado no estudo de Delgado (2010), onde a mãe é o

parceiro de comunicação mais competente e, diferentemente dos resultados encontrados acima, a mãe de Olívia (WALTER, NUNES, 2009) relata que a filha não utiliza muito sua prancha com os pictogramas em casa, pois ela compreendia muito bem a filha pelos gestos e expressão de “sim” e “não. A mãe relata entender Marcela 99,99% das vezes, já a professora diz compreender Marcela 80% das vezes. No que se refere à mal- entendidos durante a comunicação, a mãe refere ser raro acontecer mal-entendidos e a professora diz não ser freqüente, mas que ocorre. A mãe era capaz de escolher um novo vocabulário para Marcela, mas diz não ser capaz de lhe ensinar um novo sistema de comunicação alternativa. Delgado (2010) encontrou como resultado, que a mãe era capaz de escolher o vocabulário, novos símbolos gráficos e o tipo de comunicação alternativa da criança. A psicopedagoga demonstrou ser capaz em acrescentar novas palavras no livro de comunicação de Marcela.

Em relação às tarefas de comunicação, os resultados do estudo não apontaram dificuldades, nem nas tarefas de compreensão, nem nas de produção de Marcela. Em poucas tarefas Marcela apresentou alguma dificuldade, e essas tarefas serão descritas a seguir. Comparando os dados expostos por Delgado (2010), Marcela apresentou resultados mais favoráveis que a participante do estudo citado, Tereza. No estudo de Delgado (2010), os resultados da participante Tereza, apontaram dificuldades nas tarefas de compreensão e nas de produção, deixando a criança frustrada por não se fazer entender e até por não elaborar meios de transmitir a mensagem exigida na prova.

No que diz respeito às tarefas de compreensão, Marcela apresentou melhor desempenho na tarefa de compreensão 1 (um símbolo gráfico e quatro figuras), acertando 59 provas das 63 apresentadas, totalizando 93,65% de acerto. No restante das tarefas, a participante apresentou em todas as tarefas 80% de acerto e na tarefa de compreensão 6 (História), a participante acertou 90% na segunda tentativa. Isso demonstra que apesar da participante utilizar palavras em seu livro de comunicação, ela compreende as figuras do PCS, visto que iniciou o uso de comunicação alternativa com figuras. Esse resultado corrobora com o resultado encontrado no estudo de Walter e Nunes (2009), onde sua participante, Olívia, apresentou melhor resultado na tarefa de compreensão 1, totalizando 74% de acerto.

A tarefa de compreensão que Marcela apresentou pior desempenho foi a tarefa 5 (melhor ordenação das sentenças gráficas). Das 10 provas apresentadas nessa tarefa, Marcela acertou 7 delas, totalizando 70% de acerto. Esse resultado corrobora com o resultado encontrado no estudo de Delgado (2010), onde sua participante também

apresentou o pior desempenho na tarefa de compreensão 5. Porém, em seu trabalho, Delgado relata que a participante obteve resultados ruins nas tarefas de compreensão 3 (uma figura e quatro sentenças gráficas) e na 4 (vídeos), diferentemente da participante Marcela, que obteve um ótimo desempenho nas duas tarefas citadas. Diferentemente dos resultados encontrados acima, a participante do estudo de Walter e Nunes (2009), Olívia, apresentou pior desempenho na tarefa de compreensão 2 (Uma sentença gráfica e quatro figuras), acertando 4 provas das 15 apresentadas.

Na tarefa de compreensão 5, a participante deveria selecionar a sentença gráfica do PCS que melhor corresponde à figura desenhada no topo da página. É importante ressaltar que a ordenação das sentenças baseava-se em sujeito e complemento, como por exemplo, “Gato dormir dentro cesto”, conforme a ordenação pela língua portuguesa. Entretanto, não é incorreto certas formas de ordenação de uma sentença gráfica usada por Marcela, uma vez que a aprendizagem de sentenças de Marcela foi diferente de uma criança que apresenta linguagem oral. Seguindo esse raciocínio, a sentença “Helicóptero voar em cima casa” ter sido identificada pela participante como “Voar helicóptero em cima casa” ou “Pequeno livro em cima grande livro” podem não ser consideradas construções mentais incorretas, mesmo que não construídas com ordenação correta de acordo com a língua portuguesa: Sujeito – Verbo - Objeto. Estudos como o de Guarda e Deliberato (2006) encontraram resultados onde os usuários de CAA faziam ordenações sintáticas compostas por Sujeito – Verbo; Sujeito – Objeto; Verbo – Objeto.

Um resultado interessante é que apesar de a participante Miriam, sujeito controle, ter obtido um ótimo resultado em quase todas as tarefas, apresentou maior dificuldade na tarefa de compreensão 4 (um vídeo e 4 sentenças gráficas), obtendo 60% de acerto na primeira tentativa e 80% de acerto na segunda tentativa, tarefa que Marcela apresentou 80% de acerto tanto na primeira tentativa quanto na segunda.

Na tarefa de produção 1 (nomeando objetos nas figuras), no qual o objetivo da tarefa era Marcela nomear o objeto apresentado, a participante emitiu a resposta exata de onze objetos dos vinte apresentados a ela, não soube responder um objeto, nomeou o objeto “foguete” como “escrever” e no restante das figuras, categorizou os objetos por função ou por item relacionado. Vale ressaltar que dos vinte objetos apresentados, quinze deles não continham a palavra no livro de comunicação da participante. Comparando essa tarefa com o estudo de Delgado (2010), Marcela

apresentou um ótimo desempenho, visto que a participante do outro estudo nomeou corretamente apenar quatro dos vinte objetos.

Na tarefa de produção 3 (descrevendo as cenas nas figuras), Marcela apresentou a idéia principal em todas as provas com todos os parceiros, diferentemente da participante do estudo de Delgado (2010), onde a participante apresentou muitas dificuldades.

A diferença apresentada nos resultados de Marcela e Tereza (participante do estudo de Delgado (2010)) pode ser explicado pelo fato de Marcela ter sido alfabetiza e utilizar a CAA de forma escrita e Tereza se comunicar com o sistema pictográfico contido em seu livro de comunicação, limitando as respostas da participante. Por ser alfabetizada, Marcela conseguia soletrar as palavras que queria comunicar pelo alfabeto, contido no livro de comunicação, caso a palavra desejada não estivesse presente em seu livro. Esse fator pode explicar a grande diferença nas respostas de Marcela e de Tereza.

Na tarefa de produção 4 (descrevendo eventos em vídeos), Marcela conseguiu descrever as aspectos importantes e todos os vídeos, e seus parceiros conseguiram compreender. Isso demonstra que a participante conseguiu comunicar a seus parceiros o que a cena representava, sendo muitas vezes cenas abstratas como, “um homem andando com um abacaxi”, “uma garota escreve com uma cenoura e depois come”, entre outras.

Comparando as respostas das tarefas de produção de Marcela e Miriam, pode-se dizer que ambas conseguiram informar aos seus parceiros o que a tarefa exigia corretamente na maioria das tarefas, porém, o grande diferencial entre uma participante e outra, foi o tempo utilizado para dar o resultado, como mostra a tabela 3. Marcela levou muito mais tempo para descrever objetos, vídeos e cenas do que Miriam. Isso se deve ao esforço feito por Marcela em apontar e/ou escrever o que quer dizer, fator que Miriam não precisa, pois se utilizou da fala para responder as tarefas.

Marcela Miriam

Tarefa da Produção 1 32:51 01:37 Tarefa da Produção 2 Mãe: 05:50

Profissional.: 06:32 Par: 06:05

Mãe: 02:04 Prof: 01:50 Par: 01:14

Tarefa da Produção 3 Mãe: 23:05

Prof: 18:07 Par: 07:31

Mãe: 02:10 Prof: 01:19 Par: 01:32

Tabela 3: Descrição do tempo que cada participante dispôs nas tarefas de produção com seus parceiros de comunicação. *Obs: Foram realizadas 6 provas com a mãe, 5 com o par e 2 com a profissional.

Nas tarefas de produção de 2 a 4, fizeram parte delas os parceiros de comunicação. Os parceiros de Marcela foram a mãe, a psicopedagoga e a cuidadora, esta ultima escolhida pela participante. Em alguns momentos dessas tarefas, os parceiros indagavam Marcela sobre o que acontecia na cena, ou sobre algum objeto que Marcela queria descrever. Percebe-se que essa indagação do interlocutor favoreceu o desenvolvimento da tarefa. Essa situação vem de encontro com o estudo de Guarda e Deliberato (2006), em que os autores concluíram que a mediação do interlocutor favoreceu o desenvolvimento e a ampliação linguística dos enunciados. Ponsoni (2010) concluiu em seu estudo que a mediação do interlocutor, estimulou o relato de experiências e o reconto de histórias.

Pessoas que possuem um déficit na comunicação e que utilizam a comunicação alternativa necessitam que seus parceiros utilizem a CAA com eficácia para que esse interlocutor seja um facilitador da comunicação. Nessa pesquisa, percebemos que os parceiros de comunicação estavam acostumados, interessados e atentos na utilização do livro de comunicação com a participante, constituindo-se em facilitador do processo de comunicação. Sabemos que esse tipo de interlocutor é o ideal, porém não é sempre que encontramos famílias preparadas. O envolvimento da família nas intervenções é primordial. No estudo de Oliveira (2007), por exemplo, os familiares não se envolveram com as intervenções, acarretando em maiores dificuldades no aprendizado e na prática da CAA pelo usuário.

Tarefa da Produção 4 * Mãe: 27:38

Prof: 06:34 Par: 21:54 Mãe: 07:20 Prof: 04:05 Par: 07:10 Tarefa da Produção 5 36:28 04:45 Tarefa da Produção 6 56:28 05:45 Tarefa da Produção 7 06:03 01:44

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