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III. A proteína CFTR

4. DISCUSSÃO & CONCLUSÃO

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O acometimento pulmonar devido à atividade da CFTR deficiente ou ausente é o que determina a piora clínica do paciente e a sua sobrevida. O fenótipo clássico da FC é mais facilmente reconhecido do que o não clássico, sendo em sua grande maioria diagnosticado ainda nos primeiros anos de vida, sugerido por um ou mais sintomas clínicos característicos e/ ou pelo antecedente familiar de um irmão ou parente próximo ou, mais recentemente, em nosso meio, pela TNN positiva para a FC. Tal diagnóstico deve ser confirmado pela presença de evidência da disfunção da CFTR por meio da identificação de duas mutações que sabidamente causam FC, dois testes de suor alterados e / ou medidas bioelétricas anormais da atividade da CFTR. No entanto, existe uma parcela de pacientes sendo diagnosticados desde a infância até à idade adulta que apresentam as formas não clássicas ou mais leves da doença, e que, dependendo da origem étnica das populações avaliadas, podem representar até 15% de todos os diagnósticos de FC. Para confirmar ou excluir o diagnóstico de FC em indivíduos com critérios de diagnóstico questionável ou TNN alterada para FC, sem evidência de manifestação clínica da doença, é necessário a aplicação de métodos de avaliação da função da CFTR confiáveis e validados.

O objetivo do primeiro trabalho aqui apresentado foi o de estabelecer um biomarcador sensível e robusto para o diagnóstico e prognóstico FC através da avaliação eletrofisiológica de fragmentos de biópsia retal em micro-câmaras de Ussing. Foram avaliadas as medidas da secreção de Cl- mediada pela via AMPc (representando a função da CFTR) em 524 biópsias

retais recém retiradas de 118 indivíduos, sendo eles 51 indivíduos com FC (pacientes com diagnóstico clínico confirmado); 49 com suspeita clínica de FC; e 18 indivíduos controle saudáveis pareados por idade. Nossos resultados mostraram que os indivíduos com a FC clássica apresentaram o início dos sintomas mais precoce, com a presença de insuficiência pancreática, doença pulmonar grave e falta da secreção de Cl- mediada pela CFTR com valores ≤ 5% da

função quando comparada aos indivíduos saudáveis. Os indivíduos com formas não clássicas da FC apresentaram função residual de Cl- mediada pela CFTR entre 10-57%, e os controles não FC

apresentaram valores mais elevados ≥ 30-35%. A comparação destes valores permitiu confirmar FC em 16/49 indivíduos (33%) e excluí-la em 28/49 (57%). Além disso, estes dados evidenciaram boas correlações com diversos parâmetros clínicos, tais como: a idade ao diagnóstico, concentrações de Cl- no suor, função pancreática (valores de elastase fecal), escores

de SK e função pulmonar (FEV1). Portanto, a determinação da secreção de Cl- mediada pela

CFTR em biópsias retais mostrou aqui ser um biomarcador preditivo sensível, reprodutível e robusto para o diagnóstico e prognóstico da FC.

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A partir deste dados atuais, podemos propor que os níveis de CFTR acima ~ 10% da função CFTR normal, são necessários para um melhor prognóstico FC. Os pacientes com FC com função da CFTR abaixo de 10% apresentaram quadro clínico mais grave. Além disso, os controles não FC e indivíduos cujo diagnóstico de FC foi afastado tiveram níveis de secreção de Cl- mediado pela CFTR ≥ 30-35%, como também demonstrado em estudos anteriores (Hirtz et

al., 2004). Os resultados da avaliação genética trouxeram uma nova proposta de pesquisa de mutações na região de Campinas, que provavelmente se reflectem para o estado de SP, iniciando com a pesquisa em 15 exões (exões 3, 6a, 7, 9, 10, 11, 12, 13, 16, 17b, 18, 19, 20, 21 and 24), a qual mostrou uma frequência de detecção de mutações de 95,14%; e quando necessário alargando depois a pesquisa de mutações para os restantes 12 exões.

No segundo trabalho foram avaliados (i) a técnica utilizada para a realização das biópsias quanto à viabilidade das amostras obtidas para análise em micro-câmara de Ussing e análise bioquímica; (ii) avaliação global do procedimento da biópsia retal quanto ao tipo de preparo e sedação e presença de complicações; e também quanto ao grau de desconforto a partir da perspectiva dos pacientes.

Em relação à viabilidade das biópsias, foram comparadas as medidas de resistência transepitelial utilizando-se três soluções diferentes para a preparação do intestino (solução fisiológica de NaCl a 0,9%, solução de glicerina 12%, ambas por via retal, e manitol a 10% por via oral), e duas pinças de biópsia (padrão e jumbo). Correlações semelhantes foram realizadas para os descritores macroscópicos das biópsias, nomeadamente: nível de integridade dos tecidos, friabilidade, presença de muco e sangue nas amostras. Os nossos resultados indicam que o aumento da integridade dos tecidos e a menor friabilidade dos espécimes obtidos se correlacionam com uma maior resistência transepitelial (isto é, viabilidade), e que dependem da solução utilizada para a preparação do intestino e da pinça de biópsia. A solução salina fisiológica (NaCl 0,9%) e a pinça jumbo foram as que demonstraram melhores resultados no estudo.

Em relação ao conforto do procedimento da biópsia retal, a grande maioria dos indivíduos (76%) não relataram altos níveis de desconforto, devido a curta duração do procedimento (máximo de 15 min.) e por este ser relativamente indolor (79%).

Durante a realização do projeto do estudo com as biópsias retais encontramos alguns pacientes com valores questionáveis do TS, outros com a necessidade de realizar um segundo TS, porque tinham somente um e, durante esse período, ocorreu a implantação da TNN para FC no

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estado de SP. Houve um aumento na demanda local e uma necessidade de observar a dinâmica de realização do TS em nosso centro. Por isso, iniciamos um processo de revisão da técnica de realização do TS que culminou com o terceiro trabalho desta tese, que tem como objetivo a avaliação das etapas da realização do teste do suor em serviços capacitados para o diagnóstico de FC no estado de SP.

As dificuldades quanto a realização do TS eram compartilhadas e, após um encontro dos centros de referência que atendem os pacientes com FC no estado de SP, foi realizado o convite de participação aos centros deste estado. Nossos resultados mostram não haver uniformidade nas etapas para a realização do TS nos diferentes centros do estado de SP avaliados no estudo. Foram encontradas inconsistências quanto à padronização da técnica e disponibilidade de equipamentos, situação que pode inviabilizar o correto diagnóstico da FC em todo o país, já que acreditamos que este estudo possa ser o reflexo do que ocorre no Brasil. É urgente a padronização da técnica do TS a partir de uma revisão conjunta com todos os centros capacitados que realizam o TS no Brasil.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

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