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No capitulo 1 e na introdução deste capítulo enfatizamos a estrutura helicoidal anfipática como sendo uma característica fundamental para o modo de ação de muitos peptídeos antimicrobianos, em particular os pertencentes à família dos Mastoparanos extraídos do veneno de vespas. Particularmente discutiu-se que a amidação do C-terminal é fundamental para justificar as características antimicrobianas e hemolíticas do EMP-AF. O mecanismo de ação com membranas parece ser o de efeito detergente, ou seja, há uma acumulação de peptídeos que vão gradativamente perturbando a estrutura da bicamada lipídica (afinamento) até que a mesma se rompa, deixando vazar moléculas fundamentais à sua manutenção. Nesse mecanismo os peptídeos são alinhados com seus eixos paralelos à membrana e serão tanto mais eficientes quanto mais se aprofundarem para o interior da bicamada lipidica. Por isso é fundamental o caráter helicoidal e anfipático, pois a face hidrofóbica ficará “enterrada” no interior da bicamada, que também é hidrofóbica, enquanto a face hidrofílica, catiônica, interage com as cabeças polares, sejam elas zwiterionicas ou aniônicas. Nesse sentido, conceitos como helicidade, anfipaticidade, hidrofobicidade, ângulo polar, amidação do C-terminal são utilizados na análise.

Propusemos também a discussão da importância da amidação do C-terminal, utilizando o Mastoparano EMP-AF, ambos na forma amidada (EMP-AF-NH2) ou na forma

carboxilada (EMP-AF-O-). A forma amidada tem uma eficiência 50% maior para a

degranulação de mastócitos de células de rato quando comparado à forma carboxilada, em 10-5 M. Em eritrócitos humanos a forma carboxilada não apresenta qualquer atividade hemolítica, enquanto a forma amidada é hemolítica (Konno et al.; 2000, Cabrera et al.; 2004).

A perda de atividade antimicrobiana e hemolitica pelo EMP-AF-OH está associada à redução do conteúdo helicoidal, à diminuição da anfipaticidade. De fato, as simulações realizadas neste capítulo mostraram que:

(1) Para o EMP-AF-NH2 o conteúdo helicoidal é alto, entre os resíduos 3 a 14, a

anfipaticidade está bem caracterizada nas faces hidrofóbica e hidrofílica, a cadeia principal é solvatada preferencialmente por grupos CF3 do TFE, o que permite que a rede de ligações

de hidrogênio n-n+4 mantenha a hélice-D e sugere uma forte interação com a parte hidrofóbica da membrana lipídica. A glicina não possui cadeia lateral e por isso apresenta grande liberdade conformacional e permite a exposição dos átomos eletronegativos da cadeia principal ao solvente. Essas características fazem da glicina um resíduo “desestabilizador” de hélices em solvente polar como a água. Resíduos polares e ou carregados interagem favoravelmente com o solvente polar e também tem essa característica por que o solvente polar pode também interagir com a cadeia principal. Uma exceção é a lisina por causa dos quatro grupos metilênicos da cadeia lateral. A seqüência primária do EMP-AF apresenta dois blocos com características distintas para essa abordagem. Os resíduos de 3 a 8 (Leu 3 – Leu 4 – Lys 5 – Ile 6 – Ala 7 – Lys 8) interagem com solvente polar de forma desfavorável, protegendo as ligações de hidrogênio da cadeia principal (as lisinas pela presença dos grupos metilênicos), enquanto os resíduos de 9 a 14 (Gly 9 – Ile 10 – Ile 11 – Lys 12 – Ser 13 – Leu 14) têm tendência contrária. É por isso que em solução aquosa essa parte da hélice é que se desestrutura primeiro, como vimos na seção 3.2. A despeito da presença do grupo amida no C-terminal, que permite aumentar a rede de ligações de hidrogênio e, potencialmente, favorece a estruturação em hélice, em solvente aquoso a presença da glicina, das isoleucinas e da serina (polar) induzem a desestruturação do peptídeo. Em misturas TFE-água a solvatação da cadeia principal por grupos CF3 protege em parte a rede de ligações de hidrogênio e a presença do grupo amida

no C-terminal, com mais uma ligação (O da Ile 11 com o NH2) estabiliza a conformação

em hélice-D do resíduo 3 ao 14. Esse comportamento pode ser visto tanto dos gráficos de RIN como da evolução temporal do macro-dipolo da hélice (figura 3.10) que cresce com a aproximação da estrutura do peptídeo da hélice ideal.

(2) Para o EMP-AF-OH encontramos uma fração de resíduos em hélice relativamente baixo, do resíduo 3 ao 7, a idéia de anfipaticidade está comprometida, embora o perfil de solvatação das cadeias laterais ainda apresente preferência por grupos CF3 entre os resíduos 3 ao 10. Nesse sentido pode-se dizer que a hidrofobicidade associada

com estes dados, tem valor um terço menor comparado ao caso amidado e reflete, num certo sentido, a interação eletrostática dele próprio com o grupo carboxílico COOH. Dinamicamente, partindo da estrutura em hélice, a presença desse grupo quebra inicialmente as ligações de hidrogênio entre os aminoácidos próximos a ele e inicia um lento processo de desestruturação da hélice, acompanhado de uma aproximação do grupo COOH dos grupos NH3+ das cadeias laterais das lisinas (8 e 12). Estas “pontes salinas”, que

persistem por períodos significativos da simulação, estabilizam a estrutura em hélice-D com os resíduos 8, 9 e 10.

Estas diferenças de estrutura e comportamento dinâmico sugerem, por que o ambiente de simulação é só uma mimetização de uma membrana lipidica, uma explicação para o comportamento biológico dos dois análogos. Considerando o mecanismo de ação do tipo detergente, ou de permeabilização da membrana, o EMP-AF-NH2 devido a estrutura

em hélice-D longa, estável, anfipática, com interação favorável ao ambiente hidrofóbico das caudas lipídicas e hidrofílico das cabeças polares, interage com a membrana enterrando a parte hidrofóbica nesta e fazendo interagir os grupos carregados das lisinas com as cabeças polares dos lipídeos. Dessa forma, o peptídeo potencializa sua capacidade de deformar a membrana e a partir de certa concentração de peptídeos passa a permeabilizá-la. O EMP- AF-OH, ao contrário, devido a pequena fração de resíduos em hélice, por apresentar parte dos resíduos em conformação aleatória, tem sua anfipaticidade comprometida e interage desfavoravelmente com a membrana e, em concentrações similares ao do análogo amidado, não produz a permeabilização da membrana, portanto, não apresenta o comportamento antimicrobiano, não apresenta atividade hemolítica e não desgranula mastócitos.

Capítulo 4 – Análise Estrutural do MP-X e Paulista-MPI

4.1 Introdução

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