• Nenhum resultado encontrado

Existem poucos dados epidemiológicos divulgados sobre a incidência de ICD em Portugal. Um estudo realizado no CHULN entre os anos 2000-2007 mostrou um aumento da incidência desde o início do seculo XXI, com passagens de valores médios de 3,71/10 000 para 15,41/10 000 no ano de 2007. [21]

Outro estudo realizado no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) apresentou números superiores, com uma incidência anual de 36,2/10 000 para 2014 e 46,6/10 000 para 2015. [23]

Considerando que o número de internamentos no CHULN durante o período do estudo foi de 79 675 (40 115 em 2017 e 39 560 em 2018), podemos, de forma um pouco abusiva, calcular “taxas de incidência” considerando somente o diagnóstico de ICD com base nos resultados laboratoriais. Assim, incluindo somente os resultados com toxinas positivas, teríamos uma incidência média inferior às dos trabalhos referidos acima, sendo de 18,2 casos por 10 000 internamentos, verificando-se também uma redução da incidência de 2017 para 2018, diminuindo de 22,2 para 15,2 casos por 10 000 internamentos.

No entanto é possível que o número real de ICD corresponda a um valor superior aos encontrados neste trabalho, tendo em conta que a pesquisa de TcdA e TcdB por imunoensaio enzimático (TCD) apresenta uma baixa sensibilidade, podendo subvalorizar o número real de ICD. Outros testes como a pesquisa do gene da TcdB por PCR (NAAT) apresentam a desvantagem de não conseguir diferenciar entre portador assintomático e ICD ativa. Então, é provável que a verdadeira incidência se encontre no intervalo entre os resultados com diagnóstico laboratorial positivo e o diagnóstico laboratorial positivo + provável, que foram neste estudo de 18,2 e 31,1 casos por 10 000 internamentos, respetivamente. [21,23]

Foram pesquisados todos os casos de uso de pulsos de vancomicina de janeiro de 2017 a dezembro de 2018 para o tratamento de ICD, sendo encontrados nesse período 13 casos. Foram aceites duas terapêuticas possíveis, o uso em formas de pulsos (regime

pulsed), a que corresponderam seis casos, e com um desmame progressivo inicial, após

26 casos identificados. Dos 13 casos encontrados verificou-se a presença de um indivíduo que realizou ambas as terapêuticas com pulsos de vancomicina.

Os 12 indivíduos encontrados apresentavam uma mediana de idades avançada (83 anos) com um único individuo a apresentar uma idade inferior a 65 anos (41 anos). Identificaram-se também outros fatores de risco para recorrência na maioria dos indivíduos, com 92,3% (12 casos) a realizar antibioterapia nos três meses prévios, com a classe farmacológica mais utilizada as cefalosporinas (8 casos), seguido carbapenemos (7 casos), penicilinas (6 casos) e fluroquinolonas (4 casos), dos quais, à exceção dos carbapenemos, se encontram associados frequentemente com desenvolvimento de ICD. Refere-se também um elevado número de comorbidades, internamentos prévios e de utilização de supressão da acidez gástrica.

Relativamente ao episódio em que foi utilizado o regime de pulsos de vancomicina, em 4 casos correspondeu ao episódio inaugural, e nos restantes casos como terapêutica para a recorrência (1-4 episódios de recorrência) da ICD, sendo que em dois dos casos já tinha sido realizado terapêutica prévia com fidaxomicina.

Avaliando a evolução clínica destes casos é possível observar que 23,1% (3 dos casos) acabam por recorrer a curto prazo (< 4 semanas), após o fim da terapêutica com vancomicina, a que corresponde uma primeira recorrência e duas terceiras recorrências, e uma percentagem de 25,0% e 100,0% dos casos, respetivamente. No entanto é provável que os valores das percentagens de recorrência encontrados se encontrem enviesados dada a dimensão reduzida da amostra em estudo.

O uso de terapêutica antimicrobiana concomitante ou após o regime de pulsos de vancomicina ocorreu em quatro casos, associado a um dos casos de recorrência.

Com base nos dados obtidos neste estudo, verifica-se que a taxa de recorrência com a utilização de ambos os regimes de pulsos de vancomicina foi de 23,1%, sendo inferior para o regime pulsed, a apresentar valores de 16,7% e superior para o regime

27 A taxa de mortalidade da amostra analisada foi de 75,0% (9 doentes em 12 incluídos), muito diferente da encontrada em outras trabalhos, e tendo somente um caso no qual o óbito foi atribuído diretamente a ICD (8,3%).[30] Esta taxa de mortalidade suporta a hipótese de esta ser uma amostra enviesada, constituída por doentes com muitas comorbilidades, idade avançada e elevada probabilidade de insucesso clínico, independentemente dos episódios recorrente de ICD.

No entanto, a utilização na prática clínica continua limitada pela fraca evidencia científica a que está associada, e tendo em conta a idade avançada que a maioria dos doentes que desenvolvem ICD apresenta, a escolha de vancomicina, especialmente no regime de tapered e pulsed, recomendado nas orientações da IDSA/SHEA, pode constituir um desafio para o doente.

Visto em Portugal apenas existir vancomicina sob forma de ampolas para administração endovenosa, o método de preparação para esta terapêutica envolve a dissolução do conteúdo da mesma em soro e a administração apenas de uma porção da solução obtida, quatro vezes por dia, ao longo das semanas seguintes, podendo constituir uma dificuldade acrescida em doentes mais idosos ou com menor suporte social, acrescendo ainda o facto de a solução apresentar um tempo de semivida de 48h, o que impossibilita a preparação prévia, em meio hospitalar, da medicação para o doente.

No entanto, apesar destas limitações, os resultados obtidos neste trabalho demonstram uma eficácia superior à relatada em estudos recentes que abordam a terapêutica com fidaxomicina, tanto em regime standard, como em regime de pulsos, com valores de recorrência descritos de 32,1% e 29,1% respetivamente, e superior ao regime standard de vancomicina, com taxas de recorrências de 34,3-41,0%. [28,29]

Este trabalho apresenta como principal limitação a reduzida população estudada, apenas 13 casos, impossibilitando a extrapolação dos resultados obtidos para outras populações, sendo necessários mais estudos que abordem tanto os regimes de pulsos de vancomicina e a sua eficácia, como a comparação com as restantes opções terapêuticas existentes.

28

Bibliografia

1 - Nagy E. What do we know about the diagnostics, treatment and epidemiology of Clostridioides (Clostridium) difficile infection in Europe? J Infect Chemother. 2018 Mar; 24(3): 164-170

2 - Leffler DA, Lamont JT. Clostridium difficile Infection. 2015 Apr 16;372(16):1539- 48.

3 - Chandrasekaran R, Lacy DB. The role of toxins in Clostridium difficile infection. FEMS Microbiol Rev. 2017 Nov 1;41(6):723-750

4 - Verheyen E, Dalapathi V, Arora S, et al. High 30-day readmission rates associated with Clostridium difficile infection. Am J Infect Control. 2019 Feb 15. pii: S0196- 6553(19)30026-4

5 - Cataldo MA, Granata G, Petrosillo N. Clostridium difficile infection: new approaches to prevention, non-antimicrobial treatment, and stewardship. Expert Rev Anti Infect Ther. 2017 Nov;15(11):1027-1040.

6 - Crobach MJT, Vernon JJ, Loo VG, et al. Understanding Clostridium difficile colonization. Clin Microbiol Rev. 2018 Mar 14;31(2).

7- Lawson PA, Rainey FA. Proposal to restrict the genus Clostridium Prazmowski to Clostridium butyricum and related Species. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology (2016), 66, 1009–1016

8- Gerding DN, Johnson S. (2019). Clostridium difficile Infection, Including Pseudomembranous Colitis. In: Kasper DL, Hauser SL, Jameson JL, Fauci AS, Longo DL, Loscalzo J (Eds.), Harrison’s Principles of Internal Medicine. 19th ed. (pp. 557- 561). New York: NY Mc Graw Hill.

9 - Eze P, Balsells E, Kyaw MH, et al. Risk factors for Clostridium difficile infections – an overview of the evidence base and challenges in data synthesis, J Glob Health. 2017 Jun;7(1):010417.

10- Förster B, Chung PK, Crobach MJT et al. Application of Antibody-Mediated Therapy for Treatment and Prevention of Clostridium difficile Infection. Front. Microbiol. 9:1382.

29 11- Crobach MJ, Planche T, Eckert C, et al. European Society of Clinical Microbiology and Infectious Diseases: update of the diagnostic guidance document for Clostridium difficile infection. Clin Microbiol Infect. 2016 Aug;22 Suppl 4:S63-81

12- Ramsay I, Brown NM, Enoch DA. Recent Progress for the Effective Prevention and Treatment of Recurrent Clostridium difficile Infection. Infect Dis (Auckl). 2018 Mar 7;11:1178633718758023

13- Song JH, Kim YS. Recurrent Clostridium difficile Infection: Risk Factors, Treatment, and Prevention. Gut Liver. 2019 Jan 15;13(1):16-24

14- Deshpande A, Pasupuleti V, Thota P, et al. Risk factors for recurrent Clostridium difficile infection: a systematic review and meta- analysis. Infect Control Hosp Epidemiol. 2015 Apr; 36(4):452-60.

15- Barra-Carrasco J, Paredes-Sabja D. Clostridium difficile spores: a major threat to the hospital environment. Future Microbiol. 2014;9(4):475-86.

16 - Yacyshyn B, Pathophysiology of Clostridium difficile–Associated Diarrhea. Gastroenterol Hepatol (N Y). 2016 Sep; 12(9): 558–560.

17- Cruz MP. Fidaxomicin (Dificid), a Novel Oral Macrocyclic Antibacterial Agent For the Treatment of Clostridium difficile-Associated Diarrhea in Adults. P T. 2012 May; 37(5):278-81.

18- McDonald LC, Gerding DN, Johnson S, et al. Clinical Practice Guidelines for Clostridium difficile Infection in Adults and Children: 2017 Update by the Infectious Diseases Society of America (IDSA) and Society for Healthcare Epidemiology of America (SHEA). Clin Infect Dis. 2018 Mar 19;66(7):e1-e48.

19 - Karas JA, Enoch DA, Aliyu SH. A review of mortality due to Clostridium difficile infection. J Infect. 2010 Jul;61(1):1-8.

20- Alonso CD, Mahoney MV. Bezlotoxumab for the prevention of Clostridium difficile infection: a review of current evidence and safety profile. Infect Drug Resist. 2019; 12: 1–9.

21- Vieira AM. Diarreia Associada a Clostridium difficile num Hospital central. GE Port J Gastrenterologia. 2010:21-8.

30 22- Chapin RW, Lee T, McCoy C, et al. Bezlotoxumab: Could This be the Answer for Clostridium difficile Recurrence? Ann Pharmacother. 2017 Sep; 51(9):804-810.

23- Sintra S, Taveira F, Canha C, et al. Epidemiology of Clostridium difficile infection in Portugal: Experience at a tertiary care hospital. EurJ Intern Med. 2019 Feb;60:e11- e13

24- Figueroa Castro, Carlos & Munoz-Price, L. Silvia. (2019). Advances in Infection Control for Clostridioides (Formerly Clostridium) difficile Infection. Current Treatment Options in Infectious Diseases. 11. 10.1007/s40506-019-0179-y.

25- Humphries RM, Uslan DZ, Rubin Z. Performance of Clostridium difficile Toxin Enzyme Immunoassay and Nucleic Acid Amplification Tests Stratified by Patient Disease Severity. J Clin Microbiol. 2013 Mar;51(3):869-73.

26- Surawicz CM, Brandt LJ, Binion DG, et al. Guidelines for diagnosis, treatment, and prevention of Clostridium difficile infections. Am J Gastroenterol. 2013 Apr;108(4):478-98; quiz 499.

27 – Cassir N, Fahsi N, Durand G, et al. Emergence of Clostridium difficile tcdC variant 078 in Marseille, France. European Journal of Clinical Microbiology and

Infectious Diseases, Springer Verlag, 2017, 36 (10), pp.1971-1974.

28 - Cornely OA, Vehreschild MJGT, Adomakoh N, et al. Extended-pulsed fidaxomicin versus vancomycin for Clostridium difficile infection: EXTEND study subgroup analyses. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2019 Jun;38(6):1187-1194

29- Mikamo H, Tateda K, Yanagihara K, et al. Efficacy and safety of fidaxomicin for the treatment of Clostridioides (Clostridium) difficile infection in a randomized, double- blind, comparative Phase III study in Japan. J Infect Chemother. 2018 Sep;24(9):744- 752.

30 - Hensgens MP, Goorhuis A, Dekkers OM, et al. All-cause and disease-specific mortality in hospitalized patients with Clostridium difficile infection: a multicenter cohort study. Clin Infect Dis. 2013 Apr;56(8):1108-16.

31 31 - Shim JK, Johnson S, Samore MH, et al. Primary symptomless colonisation by Clostridium difficile and decreased risk of subsequent diarrhoea. Lancet. 1998 Feb 28;351(9103):633-6.

32- Ziakas PD, Zacharioudakis IM, Zervou FN, et al. Asymptomatic carriers of toxigenic C. difficile in long-term care facilities: a meta-analysis of prevalence and risk factors. PLoS One. 2015 Feb 23;10(2):e0117195.

Documentos relacionados