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CAPÍTULO 2 – DESEMPENHO PRODUTIVO E PERFIL DE AMINOÁCIDOS

2.4. DISCUSSÃO

No presente estudo, peixes alimentados com dietas com 12% da proteína originada de aminoácidos cristalinos (AC12) apresentaram ganho de peso, conversão alimentar e taxa de eficiência proteica semelhante aos peixes que receberam a dieta com proteína originada de aminoácidos ligados unicamente à proteína dos alimentos (ALP). Para participar com 12 e 24% da proteína dietética, os aminoácidos cristalinos foram suplementados nas dietas AC12 e AC24 na proporção de 59,3 g kg-1 e 128,5 g kg-1, respectivamente, na presente pesquisa. Por outro lado, a utilização de dietas com 24% da proteína originada de aminoácidos cristalinos, resultou em desempenho inferior ao obtido em peixes que consumiram as dietas ALP e AC12.

Tais dados, corroboram com estudos realizados para avaliar a utilização de concentrado proteico de milho, com suplementação de lisina, em dietas para alevinos de Oreochromis

niloticus. Os autores concluíram que peixes que consumiram dietas suplementadas com 50 e100

g kg-1 de lisina apresentaram maior crescimento e conversão alimentar em relação aos que consumiram dieta com 190 g kg-1 de lisina (KHALIFA et al., 2018).

Semelhantemente, foi observado redução no crescimento de truta arco íris, alimentados com dietas com níveis de 500 g kg-1 e 700 g kg-1, de concentrado proteico de soja, em substituição da proteína da farinha de peixe (TUSCHE et al., 2012; ABDUL KADER e KOSHIO, 2012). As variações nos resultados podem estar relacionadas não somente ao nível de inclusão de aminoácidos cristalinos, mas ao intervalo de fornecimento da dieta reduzido (FURUYA et al., 2005), ajuste do pH da dieta (WHITEMAN; GATLIN, 2005) e composição e valor nutritivo dos ingredientes utilizados (WU, 2009).

O balanço entre os aminoácidos essenciais dietéticos e os exigidos para o crescimento e mantença, determina a eficiência proteica (PERES; OLIVA-TELES, 2006). Porém, a eficiência proteica é afetada não apenas pelo balanço entre aminoácidos essenciais, mas também pelos aminoácidos não essenciais (GREEN et al., 2002). No presente estudo, os peixes alimentados com as dietas ALP e AC12, apresentaram maior eficiência proteica, comprovando assim, um adequado balanceamento de aminoácidos, e que disparidades na absorção de aminoácidos ligados a proteína e aminoácidos cristalinos, afetam a utilização da proteína.

Os menores valores de taxa de crescimento e conversão alimentar encontrados nos peixes alimentados com a dieta AC24 pode ser explicada pela rápida absorção dos aminoácidos na forma cristalina. Os aminoácidos na forma cristalina, chegam mais rapidamente na veia portal e subsequente degradação, comprometendo sua utilização e aproveitamento. A taxa de crescimento e conversão alimentar foram piores, em peixes alimentados com a dieta com maior teor de aminoácidos cristalinos, no presente estudo. Tais dados, estão de acordo com pesquisas realizadas, as quais encontraram que a taxa de crescimento e conversão alimentar foram piores em peixes alimentados com maiores níveis de aminoácidos cristalinos (MURAI et al., 2011; AMBARDEKAR; REIGH; WILLIAMS, 2009; AMBARDEKAR; REIGH; 2007; PÉREZ- JIMENEZ et al., 2014). Isso se deve a rápida absorção dos aminoácidos na forma cristalina, consequentemente, ao rápido aparecimento dos aminoácidos na veia portal, e subsequente degradação, comprometendo sua utilização e aproveitamento (AMBARDEKAR; REIGH; WILLIAMS, 2009).

A maior taxa de deposição lipídica em peixes alimentados com a dieta ALP e AC24, pode estar relacionada com a oxidação do esqueleto carbônico dos aminoácidos (WU, 2013). Além de, estar relacionada com diferenças na absorção de aminoácidos, como a ʟ-lisina, o primeiro aminoácido limitante (FURUYA et al., 2001). A suplementação de aminoácidos cristalinos na dieta da presente pesquisa, levou ao aumento da proteína bruta, cinzas e redução do teor de lipídeo corporal em peixes alimentados com dieta AC12. Esses resultados são consistentes com outras pesquisas, em tilápia do Nilo com suplementação de ᴅʟ-metionina, ʟ- lisina e ʟ- treonina (FURUYA et al., 2004), bagre do canal (Ictalurus punctatus), com suplementação de níveis crescentes de ʟ-lisina (AMBARDEKAR; REIGH; WILLIAMS, 2009).

Estudos avaliando dietas com deficiência em ʟ-lisina com black sea bream (Spondyliosoma cantharus) (ZHOU et al., 2010), salmão do atlântico (Salmo salar) (GRISDALE-HELLAND et al., 2011) e perca (Perca fluviatilis) (YANG et al., 2011), observaram redução no teor de lipídeos corporais. No presente estudo, a disparidade na absorção de aminoácidos cristalinos e ligados a proteína, resultou em diferenças na absorção e utilização de aminoácidos, como ʟ-lisina, causando diferenças no teor de lipídeos corporais. A ʟ-lisina participa do metabolismo da carnitina – participa do transporte de ácidos graxos de cadeia longa, do citoplasma para a mitocôndria, para realizar a β-oxidação (WALTON et al., 1984; WU, 2013).

A retenção de nitrogênio, é um parâmetro validado para avaliar os efeitos da proteína dietética sobre o ganho de peso, uma vez que, o ganho de peso é resultado do acréscimo de

vários nutrientes, não apenas da proteína (TIDBALDI; TULLI, 1999). Neste estudo, a retenção de nitrogênio foi maior em peixes alimentados com a dieta ALP e AC12. Similarmente, outros autores relataram aumento na retenção corporal de nitrogênio em tilápias do Nilo alimentadas com dietas com níveis crescentes de ʟ-treonina (SILVA et al., 2006) e ʟ-lisina (CAO et al., 2012). A menor retenção corporal de nitrogênio observada nos peixes que consumiram a dieta com elevado nível de inclusão de aminoácidos cristalinos confirma a hipótese da imparidades na absorção de aminoácidos, em comparação aos aminoácidos ligados à proteína dos alimentos.

A absorção de aminoácidos e peptídeos, depende dos sistemas de transporte - proteínas responsáveis por reconhecer e transferir substratos específicos através da membrana do enterócito, e permitem que as células selecionem substratos específicos a partir de um pool de aminoácidos. Podem atuar sozinhas ou em conjunto. Eventualmente, o transporte de alguns aminoácidos requer gasto energético, e acoplamento de íons sódio e potássio, com quebra de ATP (adenosina trifosfato). Estes são considerados transportadores da membrana apical do enterócito Na+ dependente, ou seja, ativo (FRENHANI; BURINI, 1999; MATTHEWS, 2000).

A atividade dos transportadores de aminoácidos e peptídeos no enterócito, é regulada pelos níveis de aminoácidos na borda em escova. Sendo que, variações que ocorrem na atividade absortiva, dependem do custo da atividade de absorção dos transportadores, e da disponibilidade de nutrientes no lúmen, cuja presença, estimula a atividade dos transportadores (FRENHANI; BURINI, 1999). As diferenças significativas na retenção de aminoácidos, entre os peixes alimentados com diferentes níveis de aminoácidos cristalinos, pode ser devido a variações na disponibilidade e forma dos aminoácidos ou peptídeos presentes na borda em escova no momento da absorção. Sendo que, há transportadores específicos para certos aminoácidos, como glicina e cisteína (FRENHANI; BURINI, 1999).

A dinâmica de absorção de aminoácidos no plasma pode ser influenciada por vários fatores, como a forma dos aminoácidos nos ingredientes da dieta (PEREIRA; ROSA; GATLIN III, 2017); concentração de íons, afinidade de substratos, concentração de aminoácidos intracelulares, transportador de aminoácidos (FRENHANI; BURINI, 1999; MATTHEWS, 2000). Além disso, fatores como a frequência de alimentação (FURUYA et al., 2005), atividade de enzimas (AMBARDEKAR; REIGH, 2007), baixa palatabilidade e síntese proteica reduzida (MURAI et al., 2011), ingredientes da dieta (WU, 2009), qualidade da proteína e período de jejum podem afetar a absorção dos aminoácidos (SCHUHMACHER, 1993).

O pH da dieta, é um fator que pode afetar a dinâmica de absorção de aminoácidos (WHITEMAN; GATLIN, 2005; PARMA et al., 2019). O pH gastrointestinal é responsável pela digestão adequada das proteínas dietéticas, pois prove um ambiente ótimo para ativação e ação

das enzimas digestivas (ILHAN et al., 2017; PARMA et al., 2019). Estudos avaliando o ajuste do pH da dieta, comprovaram que quando o pH da dieta foi ajustado, houve melhorias no desempenho de bagre do canal (WILSON et al., 1997), carpa comum (NOSE et al., 1974),

Sciaenops ocellatus e Morone chrysops x Morone saxatilis (WHITEMAN; GATLIN, 2005).

Portanto, neste estudo, o pH da dieta foi ajustado, para minimizar os efeitos do pH sobre a absorção dos aminoácidos. O pH do trato gastrointestinal, também está associado ao hábito alimentar, se onívoro ou carnívoro, e frequência alimentar (KROGDAHL et al., 2015; YÚFERA et al., 2012). Algumas espécies, como truta arco íris, e cobia (Rachycentron

canadum), são caracterizados por uma secreção ácida contínua, e mantença do pH

gastrointestinal ácido, mesmo durante o período de jejum. Enquanto que, outras espécies apresentam pH gástrico neutro durante o jejum, seguido por liberação de ácido hidrocloridrico, após a ingestão de alimento (YÚFERA et al., 2019; BUCKING et al., 2009).

A frequência alimentar influencia vários fatores na digestão proteica, como a atividade enzimática e síntese proteica (FURUYA et al., 2005). A atividade das enzimas digestivas é ativada principalmente pela presença do quimo no estomago, onde se inicia a digestão proteica (SILVA et al., 2015). A frequência alimentar pode minimizar os efeitos negativos da rápida absorção dos aminoácidos na forma cristalina, provendo os aminoácidos necessários para a síntese proteica (FURUYA et al., 2004). Uma vez que, diferenças no tempo de absorção de diferentes fontes de aminoácidos, pode reduzir a eficiência e síntese proteica, pois os aminoácidos cristalinos são absorvidos e catabolizados mais cedo que aminoácidos ligados a proteína (AMBARDEKAR; REIGH; WILLIAMS, 2009).

No presente estudo, o perfil corporal de aminoácidos de juvenis da tilápia do Nilo alimentados com as dietas experimentais sem e com aminoácidos cristalinos, não foi afetado pela dieta no presente estudo. De forma geral, há constância na composição corporal de aminoácidos de peixes teleósteos (MAMBRINI; KAUSHIK, 1995; AKIYAMA; OOHARA; YAMAMOTO, 2007), sendo a retenção dietética mais influenciada do que a composição corporal de aminoácidos, como observado em estudos realizados com tilápias do Nilo alimentadas com dietas com aminoácidos cristalinos (MICHELATO et al., 2016).

O presente estudo comprova que a absorção de aminoácidos cristalinos ocorre mais rapidamente que aminoácidos ligados a proteína. Tais diferenças no perfil de absorção, comprometem o desempenho, composição corporal, retenção de aminoácidos com altos níveis de aminoácidos cristalinos na dieta. Portanto, é necessário levar em conta níveis de inclusão de aminoácidos cristalinos, pois possibilita a utilização de fontes proteicas de origem vegetal com

balanceamento de aminoácidos adequado, de forma sustentável ambiental e economicamente, na criação de tilápias.

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