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As alterações globais e a degradação dos ecossistemas têm originado uma preocupação crescente no domínio da conservação. A avaliação da integridade destes sistemas ecológicos e a aplicação de medidas de mitigação adotam uma importância crescente em gestão Ambiental (Silva-Santos, 2004).

As observações registadas ao longo do trabalho de campo apresentaram uma grande variação sazonal, o mesmo se verifica entre os diversos segmentos. No entanto, as diferenças na abundância registada para cada segmento podem ser explicadas pelas diferenças nas características do muro, resultados apoiados pelo Teste de Comparações Múltiplas, pela humidade e temperatura verificadas em cada segmento, bem como pela sua orientação e consequente exposição ao sol, fatores que influenciam a atividade das lesmas como refere Kozłowski (2011).

Ao longo deste estudo a observação de indivíduos apenas foi possível com temperaturas entre os 0.32 e os 15.80ºC e com humidades muito elevadas. A temperatura e a humidade são elementos fundamentais que regem a actividade das lesmas na qual se incluí a espécie Geomalacus maculosus (Kozłowski, 2011). Existem no entanto outros requisitos indispensáveis à ocorrência da espécie nomeadamente a existência de rochas ou afloramentos rochosos e árvores que comportem abrigos e alimentação à mesma (NRA, 2010). São ainda poucos os estudos sobre a influência de temperaturas baixas nos moluscos, e consequente hibernação, no entanto é percetível que os limiares de temperatura variam de espécie para espécie e consoante a estação do ano em que nos encontramos, sendo mais tolerantes a temperaturas mais baixas durante o verão (Dainton, 1953; Cook, 2004). Trabalhos realizados na Irlanda mostram que a G. maculosus se encontra ativa com temperaturas médias entre 2.88 e -5.57ºC, sendo o ponto de hibernação inferior a estes valores (Mc Donnell, 2011).

Os resultados obtidos relativamente às espécies rupícolas permitem concluir que os segmentos apresentam uma elevada percentagem de coberto de líquenes, quando comparadas com os restantes grupos funcionais. Este é um dos pontos que potencia a presença da espécie no local uma vez que fazem parte integrante da sua alimentação, conjuntamente com as hepáticas, musgos, fungos e algas (NRA, 2010). Através da recolha de dados verificamos que existe uma preferência de Geomalacus pela espécie de líquen crustáceo Diploschistes scruposus, e apresenta sinais claros de degradação do amido que faz parte da sua constituição. Estudos realizados na Irlanda referem que a maioria dos líquenes fruticulosos e foliosos que se desenvolvem nas rochas graníticas são ingeridos pelas lesmas (Reich, 2012). Os musgos são uma fonte de alimentação menos desejada pela G. maculosus devido ao gosto desagradável dos

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compostos fenólicos que produzem (Davidson & Longton, 1987; Davidson et al., 1989).

Os nossos resultados apresentam uma correlação negativa entre a abundância no inverno e no outono e a percentagem de coberto de musgos (Higrófilos e Xerófilos)/Líquenes Amilóides. A correlação negativa mantém-se entre a abundância na primavera e os Musgos Higrófilos. No entanto os resultados obtidos para o verão estão de acordo com os obtidos por Reich (2012), que afirma que o gosto desagradável da maioria dos musgos, não significa que não sejam importantes para a espécie, até porque obteve nos seus trabalhos uma correlação positiva entre a abundância de G. maculosus e a ocupação de briófitas/líquenes.

As previsões feitas com o modelo estocástico-dinâmico para uma quadrícula média mostram uma aparente constância da abundância ao longo do tempo, no entanto é percetível um ligeiro acréscimo previsto pelo cenário IS92. O cenário mais agressivo, A2, apesar do reduzido declive da linha de tendência, este é negativo. Estes resultados acabam por contrariar a informação transmitida por Byrne (2009) relativamente à população de Geomalacus na Irlanda, que é beneficiada pelo aumento da temperatura. Por outro lado a redução das condições de humidade afetam a bio- ecologia da espécie, nomeadamente em Portugal e em Espanha visto que na Irlanda o clima é distinto, com temperaturas amenas ao longo dos meses mais quentes e com uma precipitação média anual elevada (NRA, 2010).

Os resultados referentes à atividade da espécie permitem afirmar que apesar de se verificar um aumento na abundância, existe uma tendência para o clima não apresentar as condições mínimas para a atividade, agravando-se esta situação à medida que nos aproximamos de 2100. Na pior das hipóteses, as simulações efetuadas mostram que a inatividade anual chegará às 33 semanas, o que pode levar a graves implicações biológicas, nomeadamente na diminuição dos períodos de alimentação, diminuição dos períodos reprodutivos levando por conseguinte a um aumento da mortalidade. Os resultados obtidos apontam para uma maior abundância ao longo da primavera, no entanto, o inverno parece ser a estação mais favorável para a busca de exemplares, devido ao maior índice se atividade demonstrado. Apesar de todos os estudos realizados na Irlanda sobre a espécie, não existe informação para poder confrontar estes resultados, sendo este trabalho pioneiro na modelação da influência do habitat e do clima nos padrões de atividade de Geomalacus maculosus.

Os segmentos da área de estudo apresentam grande variabilidade a nível de abundância apresentando o segmento 2 os valores mais elevados e o segmento 6 os mais reduzidos. As simulações espácio-temporais fornecem dados curiosos na medida em que todos os cenários apontam para uma diminuição no primeiro caso e um aumento no segundo.

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Os valores reduzidos da abundância inicial observados no segmento 6 podem ser explicados pela elevada percentagem de Rocha Nua (RN), fator que não beneficia a presença da lesma no local, uma vez que não lhe confere quaisquer vantagens, quer de alimentação quer de camuflagem, ficando assim exposta aos predadores.

Embora os resultados sejam satisfatórios a nível da conservação da espécie ao longo dos anos devido ao aumento da abundância, sabemos que o aumento da temperatura é inevitável, bem como a redução da precipitação anual. Tratando-se de um molusco com ausência de concha, as elevadas temperaturas provocam a desidratação dos indivíduos. Segundo Cuttelod et al. (2011), e para poder ultrapassar estes problemas a lesma apresenta períodos de inatividade cada vez mais longos ao longo do ano. Fica no entanto uma questão em aberto ao qual o modelo desenvolvido não foi capaz de responder. Até que ponto a inatividade verificada compromete a sobrevivência da espécie em causa?

O modelo holístico desenvolvido ao longo desta dissertação poderá ser aplicado em muitos dos locais de ocorrência atual da espécie, uma vez que os cenários de mudança serão comparáveis. Poderá no entanto ser complementado com modelos reducionistas de mortalidade (na qual se pode incluir a predação), reprodução, períodos de hibernação/estivação e modelos de alteração das espécies rupícolas presentes no muro contemplando cenários extremos como por exemplo a remoção total da vegetação. Os pontos acima referidos não foram considerados neste modelo, podendo apresentar algum peso nos resultados finais obtidos.

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