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O clima paranaense está passando por mudanças. Pesquisadores da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) em parceria com o Ministério do Meio Ambiente coletaram informações e projetaram cenários climáticos para o estado. Até 2050, o norte e o noroeste podem ter um aumento na temperatura de até 5,6°C, enquanto que o litoral terá um acréscimo de 2,1°C, o menor aumento para o estado. As chuvas deverão diminuir em 18,2% no norte, mas ao sul haverá um aumento de 19,9% projetados para os próximos 25 anos (INSTITUTO RENÉ RACHOU - FIOCRUZ MINAS, 2020).

Atualmente, as regiões apresentam comportamento semelhante, respeitando-se as características do clima local. O aquecimento do estado tem sido observado há alguns anos e, consequentemente, tem-se observado mudanças no regime de chuvas e na umidade das regiões. Nesse estudo, observou-se um comportamento atípico da umidade relativa na RM de Paranaguá. Alguns pesquisadores pontuam a interferência no microclima local causada pela presença de um porto marítimo na região (BECKER et al., 2018; RESENDE et al., 2019).

O estado é também marcado por um arco de temperaturas elevadas, partindo das regiões de Foz do Iguaçu, passando por Toledo, Umuarama, Londrina e Bandeirantes. Esse arco é devido ao relevo, a serra do mar e os dois primeiros planaltos do estado, que são áreas de maior altitude, o que interfere na circulação atmosférica e concentra as massas frias na porção sul e sudeste do estado (MAACK, 1948; MENDONÇOA; DANNI-OLIVEIRA, 2017). O clima e sua característica sazonal tem relação direta com a ocorrência de doenças e a distribuição dos casos de doenças cardiorrespiratórias ao longo do ano (STEWART et al., 2017; MAYKOWSKI et al., 2018; SUN et al., 2018).

Quando observadas as médias mensais, as internações por doenças cardiovasculares são mais frequentes nos meses de verão (novembro a fevereiro). Em contrapartida, as internações por doenças respiratórias têm seu pico nos meses frios, como também observado em outros estudos (DADBAKHSH et al., 2017; SUN et al., 2018), principalmente junho no caso do Paraná. Já as doenças e transtornos mentais têm índices de internação irregulares ao longo do ano, mas os meses de verão e

primavera são os com maiores índices. Essa irregularidade também foi observada em outros estudos, assim como a prevalência de casos em meses de verão e primavera (PARKER; GRAHAM, 2016; WIRZ-JUSTICE, 2018).

ZHAO et al., (2018b) observaram em seu estudo que as altas temperaturas foram mais associadas ao aumento do risco para internações por doenças cardiovasculares, enquanto que as temperaturas mínimas foram mais relacionadas com as admissões por problemas respiratórios - resultados similares com os encontrados para o Paraná. Segundo ainda os mesmos autores, a curva de risco obtida na área estudada, aldeias rurais no noroeste da China, são bem parecidas com as observadas no Paraná, com as temperaturas mais altas relacionadas com as doenças cardiovasculares, enquanto as doenças respiratórias têm a parte de risco da curva associadas a faixa anterior ao percentil 25°.

O maior registro de internações em dias de semana é um viés observado em vários estudos (TADANO; UGAYA; FRANCO, 2010; ARDILES et al., 2017; WALKER et al., 2017). Essa característica também é observada em outros países e está associada ao tipo de tratamento e a necessidade de cuidados mais intensos. Em alguns casos, mesmo com a procura por atendimento médico em finais de semana e feriados, a internação não é realizada. Então, dependendo da gravidade da situação, o indivíduo tende a buscar o atendimento em dias úteis (UEMATSU et al., 2016; LUAN et al., 2018). As doenças cardiovasculares causam aproximadamente 18 milhões de mortes por ano em todo o mundo, dessas cerca de 80% são pessoas de baixa renda. A população carente geralmente não tem acompanhamento clínico, diagnóstico e tratamento precoce de doenças (GIORGINI et al., 2017). Diversos estudos concluíram que temperaturas extremas contribuem diretamente para a morbimortalidade, assim como as características climáticas do local em que vivem, e o extrato socioeconômico (CURRIERO et al., 2002; BHASKARAN et al., 2009; YE et al., 2012; PHUNG et al., 2016).

As áreas mais desenvolvidas estão concentradas no norte e oeste do estado, tais quais as regiões metropolitanas de Maringá, Foz do Iguaçu e Londrina, que têm os

índices mais altos de IDHM. As regiões de Palmas, Guarapuava e Telêmaco Borba tiveram os menores índices registrados. Apesar dessa classificação das regiões, esse valor de IDHM é médio, estando presente na mesma região cidades mais e menos desenvolvidas. Curitiba, a capital do estado, apesar de ter alto IDHM, tem cidades pouco desenvolvidas em sua região metropolitana, o que reflete na média do índice da RM.

As regiões mais desenvolvidas são também as que apresentam mais riscos para os problemas respiratórios, exceto Maringá. As áreas menos desenvolvidas apontam riscos mais frequentes para doenças cardiovasculares. Esse efeito socioeconômico também foi observado em estudos realizados em outros continentes (WANG et al., 2012; YE et al., 2012; SHERBAKOV et al., 2018).

Como as áreas com IDHM mais elevados são também as mais urbanizadas, a relação direta desse fator com as doenças nas vias aéreas, provavelmente está relacionada com a qualidade do ar nessas cidades. PHUNG et al. (2016b) perceberam que a taxa de pobreza e o baixo desenvolvimento socioeconômico aumentaram o risco de hospitalização devido às altas temperaturas, ao passo que, rendas familiares maiores e o acesso à água potável reduziram os riscos relacionados às variáveis climáticas.

A temperatura mínima foi fator determinante para as mortes em di versas faixas etárias para as doenças cardiovasculares, tanto em homens quanto em mulheres, resultados também encontrados por outros autores (KYSELY et al., 200 ; DE’DONATO et al., 2013). Apesar disso, nas áreas mais quentes do estado, as máximas e a umidade relativa apresentaram maiores riscos. Um estudo realizado na China concluiu que os extremos de temperatura máxima estão associados à cardiopatia isquêmica, com risco maior em idosos e mulheres (TIAN et al., 2012). Na Europa, esse comportamento também foi observado, sendo na Holanda, por exemplo, 57% das mortes por doenças cardiovasculares (KUNST & LOOMAN, 1993).

Apesar de levar tempo para que o organismo assimile o estímulo do ambiente, o

ZHAO et al. (2018), em seu estudo para o Brasil, também observou maior efeito da temperatura nos lags 0 e 1 para as internações hospitalares. As defasagens relacionadas ao calor são menores que as relacionadas ao frio para os idosos, sendo o atraso para a temperatura máxima variando de 0 a 1 dia, enquanto que para a mínima essa variação normalmente é deslocada para 2 a 3 dias (BUNKER et al., 2016).

Quando o organismo é exposto a temperaturas muito baixas, observa-se um aumento nos níveis de catecolaminas (neurotransmissores que iniciam o processo de vasoconstrição e taquicardia) resultando no aumento da pressão arterial (LIM et al., 2012; EIKELIS et al., 2018; WU; VASEGHI, 2020). A longo prazo esses efeitos biológicos podem resultar em aumento da viscosidade do sangue e isquemia do miocárdio (LIM et al., 2012; CUIQING L, ZUBIN Y, 2015).

A exposição ao calor, em contrapartida, causa a vasodilatação, como mecanismo de resposta para reduzir o aumento da temperatura corporal, o que demanda maior esforço do sistema cardiovascular, aumentando a frequência cardíaca e reduzindo o volume sanguíneo nos átrios, no peito (coração, tórax e veias), no fígado e no baço. Esse déficit de sangue causa a insuficiência cardíaca, o que, em conjunto com o estresse térmico induz a um aumento dos eritrócitos, neutrófilos e plaquetas, aumentando a viscosidade do sangue e desencadeando diversos prejuízos ao sistema cardiovascular (LIM et al., 2012; CUIQING L, ZUBIN Y, 2015; GIORGINI et al., 2017).

As doenças cardiovasculares, além do efeito instantâneo, apresentam riscos relativos significativos no intervalo de tempo de 48 a 96 horas, como encontrado em outros estudos (YE et al., 2012; WANG et al., 2014). As internações para esse capítulo de doenças ocorrem mais frequentemente no lag 0, enquanto que as mortes apresentam frequências altas nas defasagens a partir de dois dias, resultado também observado por BUNKER et al. (2016). Essa diferença encontrada entre internação e morte pode estar relacionada com tratamentos e intervenções clínicas, e ao tempo necessário para que o estresse térmico seja fatal ao organismo (FLOURIS et al., 2018).

Para as temperaturas, as faixas com temperaturas mais altas (percentis 75° e 99°) apresentaram risco, ao contrário da umidade relativa, que demonstrou ser fator de risco no intervalo com menores valores (percentil 25°), mais uma vez corroborando com

resultados encontrados em outros estudos pelo mundo (DAWA et al., 2014; ONOZUKA; HAGIHARA, 2017; ZENG et al., 2017; BAI et al., 2018; ACHEBAK et al., 2019; CUI et al., 2019). A variabilidade da temperatura em curtos períodos de tempo tem efeitos adversos à saúde, que podem ser potencializados pela umidade relativa, já que a mesma modifica a relação da temperatura com o organismo (MCGEEHIN; MIRABELLI, 2001; ZENG et al., 2017; SUN et al., 2018).

Os grupos com idade acima de 80 anos foram os que apresentaram mais riscos para internação por doenças cardiovasculares, mulheres com 68,8% e homens com 50%. Segundo HUYNEN et al., (2001) e FLOURIS et al. (2018), a termorregulação não é tão eficiente em indivíduos idosos, o que aumenta o estresse causado pelo calor ou frio. A exposição ao ambiente provoca alterações fisiológicas, condições quentes podem causar débito cardíaco e de termorregulação principalmente na população geriátrica, tendo em vista as alterações fisiológicas e metabólicas sofridas naturalmente pelo envelhecimento (ITANI et al., 2020).

Entretanto, os grupos mais jovens apresentaram valores significativos de óbitos por doenças cardiovasculares (43,8% - GH1 e 31,3% - GM1). A letalidade em grupos com idade entre 40 a 60 anos é condicionada à capacidade de bombeamento do coração, que supri o fluxo sanguíneo necessário ao corpo, que diminui com o passar da idade gradativamente. Pessoas mais jovens têm frequência cardíaca maior, portanto, a ocorrência de algum problema que altere a irrigação sanguínea no coração apresenta resultado agudo, que associado a alguns fatores como: consumo de álcool, tabagismo, stress e sedentarismo, pode ser letal (XIAO; MOLECULAR, ; CARTER et al., 2017; HAGSTRÖM et al., 2017; CHOI et al., 2018; WÅHLIN; NYBERG, 2019).

Estudos realizados na Europa e na América do Norte demonstram que o efeito da temperatura alta é mais prejudicial para a ocorrência de doenças respiratórias (SHIGAMI et al., 2008; SUN et al., 2018). Entretanto, para a mortalidade os extremos tanto de frio quanto de calor apresentaram risco, resultado também observado por BUNKER et al. (2016). Sendo que nas áreas mais frias, o efeito dos dias quentes foi superior aos de dias frios. Poucos estudos foram realizados para o hemisfério sul, mas em uma cidade com clima temperado, em que pressupõe-se que a população está mais

adaptada ao clima quente, as temperaturas baixas foram mais prejudiciais para essas doenças (DADBAKHSH et al., 2017).

O aumento de mortes no inverno acontece devido as alterações fisiológicas que alteram a imunidade celular e hormonal, além dos fatores comportamentais (HUYNEN et al., 2001). Como observado, para as mortes, as temperaturas mínimas representaram mais risco, em especial no norte e noroeste, considerando o clima do estado e a adaptação dos indivíduos, essa resposta é condizen te.

Segundo ainda BUNKER et al., (2016), as doenças respiratórias têm riscos relativos mais associados a intervalos maiores de defasagens, principalmente por causa da relação direta entre essas doenças e as baixas temperaturas. Esses resultados são similares ao encontrado nesse estudo, que apesar de no lag 0 a frequência de risco ter sido maior para essas doenças, há uma porcentagem de 10,4% de risco na defasagem de cinco dias para as internações.

A baixa umidade relativa do ar é um fator de risco para as doenças respiratórias, principalmente devido a relação da umidade com os poluentes atmosféricos, e da mudança causada pela umidade no estímulo da temperatura sobre o organismo (PARK, 2016; SUN et al., 2018). A junção de baixa umidade com extremos de temperatura tanto para as baixas, quanto para as altas, impacta o desempenho do sistema respiratório (SU et al., 2014). Há ainda que se considerar os surtos de vírus influenza relacionados às baixas umidades, visto que a inalação de ar seco prejudica o reparo do tecido conjuntivo e muscular do sistema e inibe a depuração mucociliar (WOLKOFF, 2018; KUDO et al., 2019).

Quando o indivíduo é exposto a variáveis ambientais extremas diversos mecanismos biológicos são iniciados para estabilizar a temperatura corporal em torno de 37°, esse processo é a termorregulação (KENNY et al., 2010; MORRISON; NAKAMURA, 2011; SMITH; JOHNSON, 2016). A exposição prolongada à essas variáveis afeta as funções cerebrais. No cérebro o calor é produzido quando há consumo de oxigênio e é removido pelo fluxo sanguíneo. Contudo, mudanças na temperatura e viscosidade do sangue alteram o processo de resfriamento cerebral,

reduzindo sua eficiência, como consequência tem-se danos e mudanças no órgão (YABLONSKIY; ACKERMAN; RAICHLE, 2000; LÕHMUS, 2018).

A maioria dos estudos encontraram associações entre as temperaturas altas e os transtornos mentais (VIDA et al., 2012; PENG et al., 2017; LEE et al., 2018). No Paraná, as doenças e transtornos mentais, por sua vez, têm números de internação mais altos nas regiões metropolitanas de Curitiba e Campo Mourão. MOREIRA & PEIXOTO (2017), apontam que no Brasil os transtornos mentais foram se tornando cada vez mais comuns em suas regiões quentes, ressaltando a influência da urbanização e do avan ço da civilização sobre essas doenças.

Embora a RM de Curitiba seja urbanizada, a região é uma das mais frias do estado, e as temperaturas mínimas apresentaram maiores riscos para ocorrência de doenças e transtornos mentais. Entretanto, há um aquecimento gradual na região, assim como no estado todo, e a população adaptada as baixas temperaturas tende a ser mais impactada pelo aumento das temperaturas e as mudanças climáticas (TRANG et al., 2016a, 2016b; OBRADOVICH et al., 2018).

DA SILVA et al., (2020), encontraram em seu estudo para Curitiba que os extremos de temperaturas são fatores de risco consideráveis para doenças e transtornos mentais, com a existência de uma relação dinâmica entre poluentes e temperatura. Um estudo realizado em três cidades com clima subtropical na China, chegou à conclusão de que as baixas temperaturas tiveram um efeito significativo e prolongado nos transtornos mentais, principalmente para a esquizofrenia, ansiedade e depressão (ZHANG et al., 2020).

Já na região de Campo Mourão, as temperaturas máximas apresentaram mais riscos para as doenças mentais. Ainda que a RMCM esteja localizada em uma área mais quente no estado, as máximas médias da região são elevadas e podem chegar a 30°C. Portanto, temperatura do ar ambiente ultrapassa a temperatura de conforto térmico causando incômodo e afetando a saúde mental, sendo agravado pelo aquecimento global e maior intensidade e frequência de ondas de calor. A temperatura afeta a saúde mental de forma diferente da física, o desconforto térmico pode causar

problemas no sono, que tem consequências na atividade cerebral (MULLINS; WHITE, 2019).

Os grupos com idade entre 40 e 60 anos apresentaram as porcentagens mais altas, em ambos os sexos, para as doenças mentais (63,7%). Essa faixa etária é apontada como a mais afetada em outros países, sendo estendida até 75 anos (HANSEN et al., 2008b; TRANG et al., 2016a; LÕHMUS, 2018; CUI et al., 2019).

TRANG et al. (2016) concluíram que o efeito de curto prazo da temperatura associado as doenças mentais são variados e dependem do diagnóstico de transtorn o mental. Em seu estudo alguns distúrbios apresentaram risco com ondas de calor de três dias, enquanto outros só depois de sete dias de exposição. No Paraná, o lag 0 foi mais significativo, mas até cinco dias de defasagens ainda foram observados riscos, resultado corroborado por WANG et al. (2014), que identificou riscos principalmente no intervalo de tempo de zero a quatro dias para as doenças mentais na China.

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