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A média de idade 32 anos é compatível com o observado em estudo realizado na França por Faivre et al (2009), porém a variação etária em nossa pesquisa foi de 17- 49 anos, enquanto a do estudo francês foi de 28-37 anos. Dankert et al (2008), na Holanda, encontraram uma faixa etária em mulheres com RTT de 25-37 anos. A diferença da nossa faixa etária para a destes estudos provavelmente acontece porque a taxa de gestação em adolescentes e mulheres mais jovens em nosso país é maior que em países desenvolvidos.

O estudo demonstrou que 43 (55,12%) mulheres com RTT eram nulíparas e a maioria das mulheres 54 (69,23 %) não tinha história de abortamento anterior, esses dados concordam com a literatura. Heisterberg e Kringelbach (1987) e Nesheim (1984), observaram que as nulíparas são as que mais apresentam a possibilidade de RTT e complicações do seu tratamento. Esse dado também é observado quando a RTT é pós-parto, conforme relataram Dankert et al (2008).

A maioria dos casos de RTT se dá por retenção de tecido pós- abortamento (Van den Bosch, 2008), cuja principal manifestação é o sangramento anormal, fato também observado nas internações por RTT tanto no serviço público quanto no serviço privado da nossa pesquisa.

O fato de que a maioria das mulheres incluídas em nosso estudo foi proveniente de serviço privado ocorreu porque a utilização da VH nas complicações puerperais da RTT é pouco divulgada e difundida, principalmente nos hospitais públicos do Rio de Janeiro. Colabora com esta pouca difusão o fato de que ainda existem poucos estudos sobre sua utilização nestes casos e tampouco há um protocolo de atendimento melhor definido. Outra dificuldade

da referência das mulheres com diagnóstico de RTT para realização de VH no serviço público é o receio dos profissionais de que a demora para a execução do procedimento possa agravar as condições clínicas da mulher. Este exame, embora de larga aplicação nos serviços de ginecologia, nem sempre está facilmente acessível para utilização em casos de urgência. Já no serviço privado a utilização da VH se difundiu mais rapidamente entre os médicos ginecologistas e obstetras. Estes especialistas quando já têm o conhecimento do uso da VH para abordagem na RTT, encaminhavam as suas pacientes eventualmente antes mesmo de tentarem a realização da curetagem uterina ou AMIU.

Na literatura especializada, o tratamento de primeira escolha para a RTT é a AMIU (Soulat C e Gelly M, 2006, Pereira PP et al, 2006 e Kulier R, 2004,), porém, a nossa amostra contém um número elevado de mulheres com RTT sem tratamento prévio 47 mulheres. Estas mulheres apresentavam poucos sintomas e os médicos que as assistiam optaram por realizar a VH para obter a certeza do diagnóstico e eventualmente seu tratamento, uma vez que nem sempre o diagnostico ultrassonográfico é definitivo. Após a confirmação diagnóstica foi realizado o esvaziamento monitorizado pela VH. Não obstante tenha sido realizada a VH como primeira forma de tratamento é importante a realização de novos estudos para avaliar a indicação da VH cirúrgica nesses casos.

A ultrassonografia de controle pós-parto vaginal e pós-abortamento foi estudada por Van Den Bosch (2008) que verificou uma taxa de 6,3% de RTT com 63% das mulheres necessitando de intervenção cirúrgica. O restante dos casos teve resolução espontânea.

Um terço dos diagnósticos de RTT em nosso estudo foi realizado devido a uma ultrasonografia de controle após abortamento espontâneo. Isso provavelmente ocorreu pela dúvida do médico assistente em relação à presença de RTT ou por ser uma conduta de rotina do profissional a solicitação do exame de imagem para confirmar a retirada de todo o material durante a curetagem.

O sintoma mais freqüente da RTT encontrado em nosso estudo foi o sangramento transvaginal anormal. O percentual observado foi semelhante ao descrito em estudos sobre tratamento de RTT realizados por Dankert et al (2008) e van den Bosch (2008). Inclusive a RTT foi a principal causa de hemorragia pós-parto como relatado por Hoveyda (2001), ao avaliar a causa de sangramentos puerperais.

A infecção do tecido endometrial também foi a complicação observada em 9,67% das mulheres no estudo cubano de León (2001). Nesse estudo a principal causa de re-ingresso hospitalar das pacientes já curetadas era febre e dor, enquanto que em nossa pesquisa a principal causa de internação foi o sangramento anormal e o diagnostico de RTT após exame ultrassonográfico de rotina.

Durante a VH foi feito o diagnóstico de perfuração uterina pós-curetagem por abortamento em duas mulheres (2,56%), semelhante ao estudo de León (2001), que observou três casos em 62 mulheres (4,83%).

Duas pacientes apresentavam sinéquias uterinas diagnosticadas na VH, nesses casos, as mulheres tinham sido submetidas a mais de uma curetagem uterina prévia.

Em nosso estudo, quando da indicação da VH, havia um percentual elevado de mulheres que tinham sido submetidas a uma ou mais curetagens uterinas sem sucesso, permanecendo com restos. Dankert et al (2008), em seu estudo de RTT pós-parto cita Hoveyda e Pather, referindo a necessidade de mais de uma curetagem em 7% das mulheres com hemorragias puerperais. Já Cohen et al (2001) refere que cerca de 20% das pacientes submetidas à segunda curetagem pelo mesmo aborto permanecem com algum tipo de restos. Provavelmente esse percentual alto em nosso estudo se deve ao perfil dos serviços de VH, tanto público quanto privado, onde foi realizada a nossa pesquisa, pois são de referência na cidade do Rio de Janeiro, aumentando assim os casos mais complicados.

Em nosso estudo a VH funcionou como método diagnóstico em duas mulheres que apresentavam apenas endometrite, mas cujo exame ultrassonográfico sugeria RTT. Devido a VH foram evitadas duas curetagens uterinas.

Um dos primeiros trabalhos descrevendo a abordagem terapêutica da RTT foi realizado por Morimoto et al (1981), que sugeriu o uso da VH como forma de monitoramento, antes e depois da curetagem uterina e/ou da aspiração, referindo que estas seriam mais simples, efetivas e seguras. Foi este tipo de abordagem que realizamos quando havia grande quantidade de material retido. Porém, atualmente, diferente de Morimoto, quando na AMIU e/ou curetagem ao final persistem restos, ao invés de se realizar nova curetagem, se retira o material sob visão histeroscópica (Goldenberg M. et al, 1997, Cohen SB. et al, 2001 e Leone F. et al, 2005).

O tratamento exclusivo por VH, nos casos de pouca a moderada quantidade de material, também já foi descrito por Cohen et al (2001), Dankert et al ( 2008) e Faivre et al (2009).

Em VH a boa visibilidade da cavidade uterina ao final do procedimento é quase essencial para determinar o sucesso do tratamento. Esta visualização foi alcançada em 93,60 % dos casos de nosso estudo. Os cinco (6,40%) casos em que não se conseguiu essa boa visibilidade ocorreram por conta das dimensões aumentadas do útero e da presença de sangramento profuso. Avaliando retrospectivamente podemos concluir que estes casos seriam uma possível contra-indicação do tratamento vídeo histeroscópico. Não encontramos esse dado em nenhum trabalho publicado até o momento.

Dentre todos os casos em que ocorreu dificuldade de boa visualização da cavidade uterina ao final da VH, com má visualização da cavidade uterina ao final da VH, três estavam com cavidade uterina normal. Uma mulher não retornou para revisão, e apenas uma apresentou restos após a VH, sendo resolvido com uma segunda VH. Apesar de não haver uma boa visão da cavidade uterina ao final do procedimento, em apenas um caso dos 78 revistos, não obtivemos sucesso na primeira VH (complicada pela ocorrência de sobrecarga hídrica).

Apenas uma das 78 mulheres do estudo não obteve resolução completa pela primeira VH, pois o procedimento teve de ser suspenso devido à complicações clínicas (sobrecarga hídrica). Neste caso houve necessidade de dois procedimentos por VH para o esvaziamento completo da cavidade uterina, porém, era um caso já complicado por três curetagens prévias a VH.

Comparando o resultado dos dois exames histopatológicos que não concordaram com o exame de VH, podemos sugerir que as alterações da gestação sobre o endométrio, sobre formações polipoides e sobre nódulos miomatosos submucosos, além das alterações provocadas pelo tempo de retenção dos tecidos (inflamação, degeneração, calcificação), podem parecer sinais de restos ovulares ou placentários à VH. Também o procedimento de lavagem e aspiração que ocorre durante a VH pode ser suficiente para retirar o material necrótico e a fibrina que estava depositada sobre o material retido retirado, explicando a ausência de tecido trofoblástico demonstrada no exame histopatológico.

Quando avaliamos o resultado da revisão tardia, tivemos 04 (9,10%) exames alterados. Dois casos de sinéquias, um caso de permanência de restos e um de endometrite.

Analisando os dois casos de sinéquias, na revisão pós VH, observamos que essas duas mulheres tinham sofrido mais manipulação úterina, além do tratamento por VH: elas tinham sido submetidas a mais de uma curetagem uterina para resolução de RTT e posteriormente foram submetidas à VH. Nesses casos todas as sinéquias eram leves, e foram liberadas durante o exame de revisão histeroscópico. Ou seja, os únicos casos de sinéquias pós VH já haviam sido descritos no exame diagnóstico devido à manipulação uterina anterior, não sendo causados pela VH. O único caso de endometrite, já havia sido diagnosticado na primeira VH e o tratamento teve de ser repetido.

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