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No corrente protocolo, a técnica da variabilidade da freqüência cardíaca no domínio da freqüência foi utilizada para investigar anormalidades no sistema nervoso autônomo e do ritmo circadiano durante o sono em portadores de anemia falciforme.

As mudanças que ocorrem na variabilidade da freqüência cardíaca em função das fases do sono foram objeto de estudo de vários autores. [30-32] Bušek et al, analisaram a atividade autonômica de 11 indivíduos sadios durante estudo polissonográfico e verificaram elevações acentuadas dos valores de potência total durante o sono REM e valores mais baixos no período de vigília e na fase 4 do sono. Esta variação é considerada como modulação autonômica cardíaca normal durante o sono. A elevação da potência total no sono REM também foi observado em nosso estudo, porém quando analisamos a VFC durante o sono profundo (estágio 4) o componente de baixa freqüência

(atividade simpática) permaneceu com valores elevados. No estágio REM o componente de alta freqüência (atividade parassimpática) apresentou valores mais altos. Esses dois achados referentes aos componentes de alta e baixa freqüência está em discordância com os relatos da literatura para pessoas sadias.[26, 33]

Connes et al, ao estudarem a variabilidade da freqüência cardíaca no domínio da freqüência e do tempo, durante o sono (sem diferenciar os estágios do sono) em nove portadores de traços falcemico e ao compará-los com nove indivíduos normais verificou, na análise espectral, valores reduzidos da

potência total e da alta freqüência em relação ao grupo controle. Estes achados sugerem uma reduzida atividade parassimpática, porém devemos observar que

portadores de traços falcemico não apresentam a mesma evolução clinica e fisiopatológica da AF (SS). Diferentemente, na presente pesquisa

encontramos valores elevados da Ptotal em todas as fases do sono, com significância estatística apenas no sono REM, o que foi interpretado como predomínio da atividade simpática.

Flutuações da potência total entre os diferentes estágios do sono causam um impacto nos valores absolutos da MBF, BF e AF. Para diminuir os efeitos das variações da potência total nestas variáveis utilizamos valores normalizados desses componentes.

Ao contrário do que é descrito na literatura para pessoas sadias, [17, 33]

verificamos que a atividade simpática (baixa freqüência normalizada) prevaleceu sobre a atividade parassimpática (alta freqüência normalizada) em todos os estágios do sono nos portadores de AF. Isto significa que a atividade simpática manteve-se dominante durante todo o período de observação. As análises estatísticas não mostraram significância na banda de alta freqüência normalizada durante os estágios do sono, talvez devido ao baixo poder do teste ANOVA para medidas repetidas. Portanto é difícil afirmar se existiu alteração do ritmo circadiano da variabilidade da freqüência cardíaca.

Somente a banda de alta freqüência (nu) apresentou resultado significante para o estágio 4 do sono, o que está em concordância com o ritmo circadiano normal.

A relação BF/AF é descrita em pessoas sadias como próximo de 1. [34] Sendo assim, com o objetivo de enriquecer os nossos dados, sobre prévia autorização, comparamos a relação de BF/AF dos pacientes desse estudo com os dados encontrados pelo Dr. Finley et al.[31] Os autores avaliaram a variabilidade da freqüência cardíaca no domínio da freqüência em 61

indivíduos normais, separados por faixa etária em anos (0-2, 2-4, 4-6, 10-12, 20-24) durante a vigília, o sono profundo (estágio 4 do sono) e fase REM . Dentre o grupo de pessoas normais, selecionamos 18 indivíduos com idade similar (10 a 24 anos) a dos pacientes portadores de AF. O grupo de

indivíduos portadores de AF apresentou valores significativamente mais elevados da relação BF/AF do que os indivíduos normais, em todos os

estágios do sono. Documentamos também diminuição dos valores da relação BF/AF no estágio REM do sono, quanto em indivíduos normais se observa elevação desses valores no mesmo estágio do sono. Esses achados podem ser interpretados como uma alteração da capacidade de regulação do sistema nervoso autônomo levando ao comprometimento do ritmo circadiano autonômico cardíaco.

O ritmo circadiano da função autonômica durante o sono, tem sido avaliado por diversos autores em portadores da síndrome de apnéia obstrutiva do sono (SAOS).[35, 36]Noda A. et al. observaram valores mais elevados da relação BF/AF durante todo o sono quando comparado com indivíduos normais ou portadores de apnéia leve. Ao correlacionarem esses dados com a hipoxia existente durante a apnéia verificaram que, quanto mais acentuada a hipoxia mais se elevam os valores de BF/AF, ou seja, maior a atividade simpática dos pacientes.[35] Em nosso estudo não foi possível estabelecer relação entre VFC e hipoxia.

A queda na saturação de oxigênio tem sido descrita durante o sono e também na vigília em portadores de AF. Nossos dados estão em concordância com a literatura, quando se menciona redução média da saturação de oxigênio de 2%.[37, 38] Dessaturação contínua e periódica tem sido descrita em mais de 40% dos pacientes com AF. [39, 40]O mecanismo proposto para dessaturação

noturna inclui apnéia obstrutiva do sono secundária a hipertrofia de adenóides e amígdalas, e a doença crônica pulmonar secundária a AF, com acentuado comprometimento da relação ventilação/perfusão pulmonar. Relatos na literatura confirmam um precoce comprometimento pulmonar, com redução da capacidade de difusão do monóxido de carbono.[41, 42]

Romero-Vecchione et al [18]estudaram a resposta cardiovascular do sistema nervoso autônomo por meio do ortostatismo ativo, resposta pressórica ao frio, manobra de Valsalva e dosagem de catecolamina na urina. O estudo foi

realizado em indivíduos normais, com anemia ferropriva e AF (ambos com o mesmo nível de hemoglobina) e nenhuma alteração foi encontrada entre o grupo controle e o de anemia ferropriva, porém nos portadores de AF ocorreu uma resposta simpática deficiente. Nesta avaliação do sistema nervoso

autônomo os resultados divergem daqueles encontrado por nós onde ocorreu o predomínio do sistema autônomo simpático durante todo o período de sono. Porém ao analisarmos a relação AF/BF durante o sono REM constatamos um declínio em relação à fase 4 do sono, que sugere uma resposta do sistema nervoso autônomo simpático reduzido ou elevação do componente

parassimpático.

Estudos da VFC no domínio da freqüência, realizados em portadores de anemia perniciosa (déficit de vitamina B12) verificaram redução do componente simpático e parassimpático quando comparado a um grupo controle de indivíduos normais. Após correção dos níveis séricos de vitamina B12 com conseqüente normalização dos níveis séricos de hemoglobina os valores dos componentes de AF e BF também retornaram a valores normais.[21]

encontramos associação significativa na amostra estudada.

Estudos subseqüentes são necessários para melhor elucidação do funcionamento do sistema nervoso autônomo na anemia falciforme. Monitorização com holter 24 horas e análise da variabilidade da freqüência cardíaca no dominio do tempo e da freqüência, presença de um grupo controle de indivíduos normais e portadores de outro tipo de anemia, além da classificação dos pacientes quanto à gravidade da doença são fatores importantes para melhor entendimento do funcionamento do SNA na anemia falciforme.

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