• Nenhum resultado encontrado

Os níveis de alometria obtidos através do estudo do crescimento estão frequentemente relacionados à função da estrutura corpórea analisada (HARTNOLL, 1974; HARTNOLL, 1978; HARTNOLL, 1990). Assim, a análise dos caracteres sexuais secundários que estão de alguma forma, relacionados com o processo reprodutivo, evidenciou que existem diferenças no coeficiente alométrico entre as fases juvenil e adulta.

Em muitas espécies de Brachyura, a relação CC vs. LC não apresenta diferenças entre as fases de desenvolvimento, como observado em Goniopsis

cruentata (Latreille, 1803) (COBO; FRANSOZO, 1988) e Portunus spinimanus

Latreille, 1819 (SANTOS et al., 1995). Geralmente, o formato da carapaça não está relacionado com a reprodução, e sim com as características morfológicas

25 de cada espécie, não sofrendo alterações durante a muda da puberdade (PINHEIRO; FRANSOZO, 1998).

As relações CPE vs. LC e CPD vs. LC em machos foram do tipo alométrico positivo nas fases juvenil e adulta. Esse padrão de crescimento também foi observado para machos das espécies Armases angustipes (Dana, 1852) (KOWALCZUK; MASUNARI, 2000), Hexapanopeus paulensis Rathbun, 1930 (FUMIS, 2006), Chasmagnathus granulatus Dana, 1851 (GREGATI; NEGREIROS-FRANSOZO, 2007) e Portunus spinicarpus (Stimpson, 1871) (CORBI-CORRÊA; FRANSOZO, 2002). Essas alterações na alometria dos quelípodos indicam mudanças, na forma e no tamanho, entre os diferentes estágios de desenvolvimento, principalmente ao atingirem a maturidade sexual.

As alterações na forma dos quelípodos, durante a ontogenia, podem estar associadas não apenas com o processo reprodutivo, mas também com a modificação da dieta (FREIRE et al., 1996). Para muitas espécies de Brachyura, como os caranguejos do gênero Uca (Leach, 1814), a maior quela dos machos tem sido relacionada às interações agonísticas, à defesa do território e com o aceno sexual para atração das fêmeas (HARTNOLL, 1974; LEE, 1995; TSUCHIDA; FUJIKURA, 2000; BENETTI; NEGREIROS- FRANSOZO, 2004; MASUNARI; DISENHA, 2005). Em algumas espécies da família Portunidae os machos competem pelas fêmeas e/ou utilizam os quelípodos para manipulá-las durante a cópula (PINHEIRO; FRANSOZO, 1993), apresentando alometria positiva, e ainda para a guarda pré ou pós cópula (SASTRY, 1983).

Os quelípodos de P. lichtensteinii apresentam diferenças entre os sexos e entre as fases jovem e adulta. Considerando seus movimentos lentos, observado pessoalmente em campo, e a forma delgada e alongada dos quelípodos nos machos, é possível que os mesmos sejam utilizados no momento de cópula, com os machos segurando as fêmeas. Entretanto, estudos detalhados sobre o comportamento da espécie ainda precisam ser desenvolvidos.

De acordo com Hartnoll (1974), o melhor caráter para observar o dimorfismo sexual na maioria dos Brachyura é o abdome, pois sua forma está diretamente relacionada com as suas diferentes funções em cada sexo. Essas

26 diferenças foram claramente observadas através da análise do crescimento relativo do abdome de P. lichtensteinii.

Nos machos a relação LA vs. LC foi alométrica negativa, diferindo entre as fases de desenvolvimento. Nestes o abdome é estreito e abriga o órgão copulador, denominado de gonópodo. De acordo com Hartnoll (1974) e com Mansur et al. (2005), o abdome cresce o suficiente para abrigar os gonópodos, podendo variar em forma e tamanho, mas em geral é menor que o das fêmeas. Algumas espécies podem apresentar crescimento alométrico positivo, como H.

pudibundus (MANTELATTO; FRANSOZO, 1994), G. cruentata (COBO;

FRANSOZO, 1998) e A. angustipes (KOWALCZUK; MASUNARI, 2000), e ainda crescimento isométrico para Callinectes ornatus Ordway, 1863 (HAEFNER, 1990) e Sesarma rectum Randall, 1840 (MANTELATTO; FRANSOZO, 1999).

Em contraste com os machos, a relação LA vs. LC das fêmeas apresentou diferenças significativas entre as fases de maturação. Na fase juvenil o crescimento foi alométrico positivo, com um aumento significativo no tamanho do abdome durante a muda da puberdade, passando a apresentar crescimento alométrico negativo após a maturidade sexual. A largura é limitada pelo tamanho do esterno (HARTNOLL, 1974; MANSUR et al., 2005), assim, após atingir o tamanho similar ao esterno o coeficiente alométrico diminui.

O abdome das fêmeas está associado com a capacidade de incubar os ovos, pois a exteriorização e a fixação dos mesmos não ocorrem sem alterações na forma do abdome e na estrutura dos pleópodos (GUIMARÃES, 2002). Nas fêmeas de P. lichtensteinii, o abdome é menos flexível que em outros caranguejos e os ovos ficam totalmente abrigados em seu interior, diminuindo a sua perda.

O gonópodo de P. lichtenteinii apresentou mudanças entre as fases de desenvolvimento. O gonópodo cresce em uma proporção maior até atingir o tamanho ideal para realizar sua função de órgão copulador. Após atingir a maturidade sexual, a diminuição na alometria pode ser uma vantagem reprodutiva para essa espécie. Desse modo, machos maiores podem copular com as fêmeas dentro de uma ampla gama de tamanhos (HARTNOLL, 1974; BERTINI et al., 2007). Esse padrão foi registrado para a espécie E. limosum

27 (GUIMARÃES; NEGREIROS-FRANSOZO, 2002), H. paulensis (FUMIS, 2006) e Ucides cordatus (Linnaeus, 1763) (PINHEIRO; HATTORI, 2006).

O gonópodo dos machos e o abdome das fêmeas apresentam alometria positiva na pré-puberdade até atingirem um tamanho funcional na maturidade, minimizando dessa forma o desperdício de energia.

A maturidade sexual é definida como o conjunto de transformações morfológicas e fisiológicas em que indivíduos jovens ou imaturos atingem a capacidade de se reproduzir (HARTNOLL, 1985). O início da maturidade sexual representa um evento biológico importante, pois permite entender diferentes estratégias adaptativas desempenhadas pelos organismos, além de ser o momento em que machos e fêmeas começam a atuar diretamente na flutuação populacional (MOURA; COELHO, 2004; LIMA; OSHIRO, 2006).

O tamanho no qual os machos atingem a maturidade sexual (LC50 = 20,5 mm) é similar ao das fêmeas (LC50 = 21,5 mm). A maturação de ambos os sexos na mesma classe de tamanho foi observada em outros estudos com espécies do gênero Persephona (CARVALHO et al., 2010; BERTINI et al., 2010; TEIXEIRA, 2010) (Tabela III).

Tabela III: Comparação da largura da carapaça na qual 50% dos machos e das fêmeas atingem a maturidade sexual entre espécies do gênero Persephona.

Espécie Referências Localidade Maturidade (mm de LC)

Machos Fêmeas

P. lichtensteinii

Presente estudo Ilhéus (BA) 20,5 21,5

Carvalho et al., 2010 Ilhéus (BA) 22,1 21,4

Teixeira, 2010 Ubatuba (SP) 21,7 21,9

P. punctata Carvalho et al., 2010 Ilhéus (BA) 27,6 25,5

Teixeira, 2010 Ubatuba (SP) 25,2 26,6

P. mediterranea Bertini et al., 2010 Ubatuba (SP) 22,8 22,3

O tamanho no qual os Brachyura atingem a maturidade sexual pode variar de acordo com a temperatura, a disponibilidade de recursos alimentares (ANNALA et al., 1980; CASTIGLIONI; NEGREIROS-FRANSOZO, 2006), além das estratégias adaptativas de cada espécie (HARTNOLL; GOULD, 1988).

28 De acordo com Hines (1989), algumas espécies de Brachyura apresentam diferenças significativas no tamanho da maturidade sexual relacionadas às variações latitudinais. Em locais com baixa temperatura da água há um retardo nas taxas de crescimento, aumentando o tempo necessário para atingir a maturidade sexual. Em locais com temperaturas da água mais elevadas o crescimento é estimulado, ocorrendo o desenvolvimento precoce da maturidade sexual (HINES, 1989; ANNALA et al.,1980). De acordo com Annala et al. (1980), o início da maturidade sexual ocorre não só em função da temperatura, mas da interação entre a temperatura e outros fatores como a taxa de crescimento, idade, taxa metabólica e densidade populacional. Além disso, o tamanho da maturidade também pode variar em escala local, sendo esse padrão influenciado por fatores como a disponibilidade de alimento, densidade populacional ou mudanças sutis no substrato. Variações no incremento de muda e/ou no número de mudas que ocorrem antes da muda da puberdade podem afetar o crescimento e, consequentemente, influenciar nas diferenças do tamanho de início da maturidade sexual entre as populações (HINES, 1989). Entretanto, a falta de estudos sobre a espécie impossibilita comparações.

Diferentes métodos podem ser utilizados para a estimativa da maturidade sexual, sendo os mais comuns a análise histológica das gônadas, o crescimento relativo, a observação dos caracteres sexuais morfológicos externos e o tamanho da menor fêmea ovígera registrado.

Cada método oferece vantagens e desvantagens e sua escolha deve envolver uma criteriosa análise da relação entre a precisão dos resultados obtidos e o gasto de recursos para a obtenção dos mesmos, uma vez que esta escolha influencia na qualidade dos dados gerados. A análise histológica das gônadas envolve uma longa etapa preparatória com elevado gasto de reagentes e necessidade de equipamentos específicos. Os métodos morfológicos não exigem gasto com reagentes e os equipamentos necessários são rotineiros em laboratórios de pesquisa. O crescimento relativo é considerado como um método eficaz para a determinação da maturidade sexual uma vez que, a partir das relações entre determinadas dimensões corporais é possível identificar alterações na forma dessas estruturas e nas

29 suas proporções, não visualizáveis a olho nu. Entretanto, como é necessário mensurar várias dimensões, é um método que demanda um longo investimento de tempo. A análise da menor fêmea ovígera é questionável, pois, inúmeras vezes, é possível coletar fêmeas maduras sem a presença de ovos, o que inviabiliza apenas esta análise. A observação morfológica dos caracteres sexuais externos é, de forma geral, rápida e econômica, mas depende da nítida visualização do momento de transição através da existência de diferenças marcantes entre a fase imatura e a madura.

No caso da espécie P. lichtensteinii as variações na forma do abdome e do gonópodo são tão marcantes durante a muda da puberdade que visualmente é possível determinar o tamanho no qual esta transição está ocorrendo.

Neste trabalho verificou-se que tanto a análise dos gráficos de crescimento relativo, quanto a observação dos caracteres sexuais morfológicos, permitiram determinar a mesma maturidade sexual para P.

lichtensteinii. Além disso, o LC50 estimado para as fêmeas (21,5 mm) e o LC da menor fêmea ovígera (21,76 mm) foram muito semelhantes.

No documento UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ (páginas 35-40)

Documentos relacionados