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Distorções no sistema eleitoral e partidário

No documento Corrupção : (páginas 98-103)

3. A corrupção nas Idades Moderna e Contemporânea

4.5. Distorções no sistema eleitoral e partidário

O sistema eleitoral e partidário e o próprio funcionamento do Poder Legislativo brasileiro apresentam seríssimas distorções que mancham a imagem dos políticos, causam descrédito e fomentam a corrupção.

Sob o título "Congressistas propõem reforma do Legislativo"159 diversos deputados apontam algumas falhas, como segue:

a) Legislação eleitoral casuística, uma para cada eleição, geralmente para atender interesses de grupos ou partidos hegemônicos.

b) Infidelidade partidária, o que representa uma total falta de respeito ao eleitor.

Segundo o deputado Adylson Motta, nos últimos 5 anos houveram 376 mudanças de partido na Câmara.

156 KLITGAARD, Robert apud OCAMPO, Luís Moreno. Op. cit., capa posterior 157 Op. cit., p. 33.

138 A propósito dos vícios institucionais e conjunturais do parlamento brasileiro, Romelio Aquino teceu críticas veementes no artigo intitulado PARLAMENTO, CORRUPÇÃO E CENTRO, publicado no Caderno 2, da Série Textos da Associação dos Professores Universitários da Bahia, 30p.

139 SILVEIRA, Wilson. Congressistas propõem reforma do legislativo.Folha de São Paulo, 04 fev.1995, p. 1-8.

c) Excessivo poder dos líderes, que decidem por outros congressistas através do voto simbólico ou "voto de liderança" que, além de ser uma forma de burlar a falta de quorum, impede que o eleitor identifique o posicionamento de parlamentar frente às matérias em votação.

d) Desvinculação do deputado de sua base eleitoral, que fica sem representante, já que não temos o sistema distrital.

e) De acordo com o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Emando Uchoa Lima160 certa ocasião um deputado, instado a comparecer junto às bases, reagiu: "Ora, essa, não devo nada a ninguém. Comprei os meus votos e os paguei à vista". Para o advogado o voto é mercadoria em várias regiões do país.

f) Uso abusivo de dinheiro no financiamento das campanhas, revelando a poderosa influência do poder econômico nos pleitos eleitorais161.

A imprensa noticiou que "Os 94 deputados estaduais paulistas foram eleitos com 66% de recursos de empresários, a maioria empreiteiros"162, e que no geral "Gasto oficial representa cerca de um terço do real"163.

André Lara Rezende diz que "É hora de estabelecer um limite - realista e não hipócrita - sobre os gastos permitidos em campanha; exigir transparência e punir, de forma rigorosa e imediata, os excessos .,."164

g) Desproporcionalidade na representação política: os Estados do Sul e Sudeste, com 60% da população e 81% da riqueza nacional comparecem no Senado com 24 votos apenas. Os 19 Estados do Norte, Nordeste e Centro Oeste, com 40% da população e 19% da riqueza nacional possuem a esmagadora maioria no Senado, 57 senadores. Amapá, Roraima, Sergipe e Acre possuem juntos 3 milhões de eleitores.

160 LIMA, Emando Uchoa. Ética nas eleições. Id , 22 jul. 1996, p. 1-3.

161 NUNES, Claudine. Projeto quer financiamento público em campanhas. Jornal AN Capital. Florianópolis, 21 abr. 1997, p. 3.

162 DE NARDI, Carlos Magno. Empresas paragam a campanha em SP. Folha de São Paulo, 15 out. 1995, p. 1-12.

163 Editorial. Eleição s/a - Gasto oficial representa um terço do real. Id., 8 out. 1995, Caderno Especial, p. 8.

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Santa Catarina possui o mesmo número, só que aqueles Estados elegem 15 senadores e 46 deputados, enquanto Santa Catarina elege apenas 3 senadores e 16 deputados federais.165

Neste contexto, "Deputado vale 18 vezes mais que outro"166.

h) Predomínio de empresários no Congresso:

"Assim como no Senado, boa parte da Câmara é formada por empresários e advogados. São donos de um empreendimento rural ou urbano, 166 deputados eleitos para a legislatura 95/98 (cerca de 1/3 da Câmara). Pelo menos 52 são sócios de hospitais. Mais de 1/3 da casa é formada, segundo estudo do DIAP, por profissionais liberais (advogados - 102; médicos - 56; e engenheiros - 37). O DIAP afirma em sua análise que entre os profissionais liberais "muitos são testas-de-ferro ou empregados de grandes grupos de medicina privada, empreiteiras, congolomerados financeiros ou de prestação de serviços".167

i) Raio x das telecomunicações revela que oito grupos dominam as TVs no Brasil; membros de uma mesma família distribuem emissoras entre si; donos se escondem em testas-de-ferro; proprietários criam empresários, concentram emissoras e burlam Código Brasileiro de Telecomunicações168.

Cerca de um ano depois o mesmo jornal estampa em primeira página: "Congresso tem 96 donos de emissoras", alertando que o número pode ser ainda maior, já que alguns parlamentares têm emissoras em nome de terceiros.169

No texto da matéria se lê que "Um em cada 6 congressistas tem rádio ou TV" e que as concessões incluem Governadores e Ministros.

163 Diário Catarinense. Florianópolis, 16 mar. 1995, p. 35, Coluna do Movimento "O Sul é meu país".

166 BAHIA, Luiz Alberto. Deputado vale 18 vezes mais que outro. Folha de São Paulo, 11 set. 1994, p. A-3.

167 MONTEIRO, Marcelo. O novo perfil do Brasil. In Cadernos do Terceiro Mundo, n° 181, jan. 1995, p .8.

168 LOBATO, Elvira. Raio X das telecomunicações - Oito grupos dominam as TVs no Brasil. Ibid., 12 jun. 1994, p. 1-17 e 1-18.

169 LOBATO, Elvira. Concessões - Um em cada 6 congressistas tem rádio ou TV. Ibid., 14 maio 1995, p. 1-12.

j) Congresso descartável. A imprensa noticiou que 43% dos brasileiros dizem que o país poderia passar bem sem o Congresso170, conforme pesquisa realizada pelo Datafolha.

De acordo com a matéria, 55% dos entrevistados consideram o Congresso Nacional ruim/péssimo; enquanto 31% consideram regular e apenas 8% ótimo/bom.

1) Anistia a parlamentares condenados pela Justiça, como ocorreu no caso dos que usaram a gráfica do Senado em 1994. "Projeto livra da cassação todos os que usaram a gráfica do Senado para imprimir material de campanha"171; "O crime legal", condenando a anistia de 15 parlamentares172; "Anistia a Lucena - Desvio de poder legislativo"173; "Anistia a Lucena é condenada por 82%" 174 Estas são algumas das manchetes da época.

170 Editorial. Legislativo em baixa. Folha de São Paulo, 19 dez. 1993, p. 1-2.

171 SOUZA, Josias de. Parlamentares tramam anistia para Lucena. Ibid, 5 dez. 1994, p. 1-6. 172 Editorial. O crime legal. Ibid., 19 jan. 1995, p. 1-2.

173 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Desvio de poder legislativo. Ibid., 20 jan. 1995, p. 1-3. 174 Editorial. Anistia a Lucena é condenada por 82%Jbid., 15 dez. 1994, capa.

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5. Causas jurídicas

“O Estado, no Brasil, funciona mal porque ele existe para manter privilégios"

Nelson Wemeck Sodré

Para entendermos melhor as causas jurídicas da corrupção brasileira, é preciso que voltemos um pouco na história.

A política brasileira sempre foi dirigida por elites econômicas que se apoderaram da máquina pública para obtenção de privilégios.

Desde as capitanias hereditárias ao coronelismo agrário, aos grupos empresariais, ao corporativismo de servidores e agentes políticos, a idéia sempre foi a mesma: manutenção de privilégios.

Ainda muito recentemente, o jornal "Folha de São Paulo" em editorial "séculos de abuso" aborda a questão, merecendo transcrição o seguinte trecho:

"A monarquia colonial deixou uma herança que sobreviveu a vários modelos econômicos. Os grupos que se apoderaram da máquina estatal atravessaram vários regimes políticos.

Nas crises procuraram "salvar o seu", contribuindo para aprofundar a desigualdade e ampliar a marginalidade social. ”175

O professor LÉO ROSA DE ANDRADE176, criticando o "senhor rural", mais tarde "industrial", do capitalismo brasileiro, enfatiza:

"Ele é proprietário das coisas, e com este ânimo mantém ocupada a estrutura política. As políticas e as financeiras. Lá estão seus filhos, feitos 173 Folha de São Paulo, 12 abr. 1997, p. 1-2.

176 ANDRADE, Léo Rosa de. Álter Agora. Revista do Curso de Direito da UFSC, ano II, n. 3, outubro/95, p. 34.

bacharéis, ou "gente de confiança", que sabe porque fo i posta nos cargos e a quem deve as devidas satisfações. A coisa pública, então, é um cartório de solução de interesses privados, mas não de interesses privados em geral e, sim, aqueles dos donos do poder; dos grupos sociais dominantes que fazem as leis, as quais declaram seus privilégios."

Curiosa observação fez o Ministro de Estado das Comunicações SÉRGIO MOTTA177: "O regime militar construiu um Estado para servir ao capital" e que não conhece um empresário paulista que sobreviva sem o subsídio do Estado.

Podemos mesmo dizer que as leis no Brasil não foram feitas para punir as pessoas de poder e dinheiro. Nem as leis, nem o funcionamento dos órgãos de investigação e repressão. Por isto a corrupção, que é uma infração cometida por pessoas e grupos poderosos continua impune.

Feitas estas considerações iniciais, passemos ao exame de algumas graves deformações do nosso sistema jurídico que consideramos "causas" do aumento da corrupção.

No documento Corrupção : (páginas 98-103)

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