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Distribuição dos alunos residentes no campo que utilizam transporte

3.1 Aspectos do contexto sócio econômico e cultural do campo: a cidadania

3.1.5 Distribuição dos alunos residentes no campo que utilizam transporte

O Gráfico 6 demonstra que a prática de transportar os filhos dos trabalhadores do campo para os núcleos urbanos, é freqüente. A inexistência de escolas suficientes no campo, mesmo no Ensino Fundamental, obrigam o deslocamento de 48,8% dos alunos de 1ª a 4ª série e 68,9% dos alunos de 5ª a 8ª série, para as escolas situadas na zona urbana.

Esses problemas se agravam à medida que os alunos vão avançando em direção às séries mais elevadas. Vê-se, no Gráfico 6 que segue, que 93,5% dos alunos do campo precisam se deslocar para as escolas urbanas para cursarem o ensino médio, o que torna a saída do local de residência uma condição para o acesso a escola, e não uma opção.

Gráfico 6 - Distribuição percentual dos alunos residentes na área rural que utilizam transporte escolar oferecido pelos poderes públicos (estadual ou municipal) por nível de ensino segundo a localização da escola. Brasil – 2002

Fonte: MEC/INEP

Neste aspecto, fica explicito a falta de cumprimento, por parte do Estado, do Artigo 206 da Constituição Federal de 1988, que trata dos princípios que servem de base para que o ensino seja ministrado. Em seu inciso I, destaca-se o seguinte: “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”. Todavia, no cotidiano concreto dos alunos, ficam evidentes as dificuldades de acesso à escola do campo, especialmente se considerarmos as condições de conservação e o tipo dos transportes utilizados, bem como as condições de trafego das estradas.

Somando-se aos problemas já apresentados, estão as divergências entre os governos municipais e estaduais acerca da responsabilidade com os custos do transporte escolar, uma vez que a LDB não estabelecia claramente estas responsabilidades. E visando suprir esta lacuna, em julho de 2003, foram acrescidas aos Artigos 10 e 11 da Lei 9.394/96, a especificação das responsabilidades dos respectivos entes federados com o transporte escolar. Entretanto, esta mudança trouxe poucos resultados, uma vez que outros problemas como as longas distâncias, conservação das estradas e recursos insuficientes não foram resolvidos (GUIMARÃES, 2008). 48,8 68,9 93,5 51,2 31,1 6,5 0% 25% 50% 75% 100%

EF - 1ª a 4ª série EF - 5ª a 8ª série Ensino Médio

Intelectuais9 que se dedicam ao estudo e pesquisa acerca da educação

têm evidenciado a importância da escola para o desenvolvimento de uma Nação e para o exercício da cidadania. Mas, contraditoriamente, a realidade educacional brasileira, evidenciada nos dados apresentados até aqui, nos mostra uma situação extremamente excludente em relação aos direitos inerentes à cidadania. A falta de investimento em educação do campo compromete o acesso, permanência e a aprendizagem dos educandos do campo, gerando altos índices de repetência, evasão escolar, persistência do analfabetismo, professores submetidos a péssimas condições de trabalho e baixos salários, ausência de uma efetiva política de formação e valorização que garanta uma formação que os prepare para os desafios postos no cotidiano escolar10.

De um modo geral é evidente a necessidade de valorização da escola pública no que se refere à estrutura física, equipamentos, formação e valorização dos trabalhadores, e currículo articulado à realidade. Quando observamos a literatura e as pesquisas acerca da educação do campo, percebemos que as deficiências são particularmente acentuadas, e constatamos que historicamente o poder público não implementou um sistema educacional que atendesse às necessidades das populações do campo, reconhecendo-o como um espaço social e de constituição de identidades e sujeitos (CALDART, 2002).

Vale destacar algumas reflexões sobre educação do campo, com base ainda em Roseli Caldart (2004b) que apresenta proposições para a organização escolar e sua função social, de forma a construir coletivamente algumas referências para processos pedagógicos a serem desenvolvidos pela escola. Neste sentido, enfatiza que alguns aspectos a se considerar são: socialização ou vivência de relações sociais; construção de uma visão de mundo; cultivo de identidades; socialização e produção de diferentes saberes. Cada um dos aspectos mencionados conjuga-se na seguinte proposição:

A educação do campo deve incluir em seu debate político e pedagógico a questão de que saberes são mais necessários aos

9 Severino (1992), Rodrigues (2000), Silva e Gentili (1996).

10 Autores que tratam de questões relacionadas a educação do campo, destacamos: Hage (Org.),

sujeitos do campo, e podem contribuir na preservação e na transformação de processos culturais, de relações de trabalho, de relações de gênero, de relações entre gerações no campo; também que saberes podem ajudar a construir novas relações entre campo e cidade. Além disso, é preciso discutir sobre como e onde estão sendo produzidos hoje estes diferentes saberes, qual a tarefa da escola em relação a cada um deles e que saberes especificamente escolares podem ajudar na sua produção e apropriação cultural (CALDART, 2004b, p. 48).

A proposição acima citada expressa alguns aspectos da concepção de educação do campo que vem se constituindo em um movimento político pedagógico denominado Por Uma Educação do Campo. Este considera a educação como uma importante estratégia para o desenvolvimento territorial sustentável, o fortalecimento da agricultura camponesa e a valorização dos sujeitos do campo.

Deste movimento político pedagógico participam movimentos sociais, comunidade científica de várias universidades e instituições, organizados na Articulação Nacional por Uma Educação do Campo, que, diante da realidade de negação da cidadania aos sujeitos do campo pela falta de garantia de direitos, evidenciados na Constituição Federal e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, desenvolvem ações reivindicatórias e propositivas. A dinâmica dos componentes da Articulação Nacional por Uma Educação do Campo deu a ela um caráter de movimento social11, uma vez que sempre vinculou a educação do campo a um projeto de desenvolvimento para o campo, pautado nas experiências desenvolvidas em diversas regiões campesinas do país. Esta dinâmica possibilitou aos movimentos sociais do campo intervir na elaboração das DOEBEC, que apresentaremos no próximo ponto.

11 Segundo Johnson, um movimento social “é um esforço coletivo contínuo e organizado que se

3.2 Os Movimentos Sociais em defesa da Educação: o papel da Articulação