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Uma coisa é certa, esta venda foi realizada no período de férias na tentativa de se driblar o movimento estudantil da universidade (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2013g).

Quando a direção do DCE/UNAMA declara que a venda da instituição ocorreu nas férias e foi às “escuras”, como insinua a publicação “Na calada da noite: vendida a Universidade da Amazônia ao grupo Ser Educacional! [...]”, de onde foi retirado o trecho acima, é porque de fato as negociações foram realizadas às escondidas, sem debate e participação da comunidade acadêmica, e a dois dias do natal de 2013.

Nesse dia 23/12, foram confirmadas as preocupações do Diretório

Central de Estudantes da UNAMA, com a publicação da compra da

Unespa, mantenedora da UNAMA, e ISES, mantenedor da FIT - Faculdades Integradas do Tapajós, pelo grupo Ser Educacional numa negociação de valor aproximado de R$ 152 milhões (de acordo com a "InfoMoney", 23/12/13). Uma coisa é certa, essa venda foi realizada no período de férias, na tentativa de se driblar o movimento estudantil da universidade (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2013g, grifo nosso).

O destaque da citação retrata uma circunstância perpassada por todo o período do ano de 2013, com o DCE/UNAMA sempre a divulgar: que a instituição estava em ritmo de venda, e os compradores eram um dos, como designavam, “tubarões do ensino”. Em muitos momentos o movimento estudantil alertava para as operações no país de empresas que almejavam lucros estratosféricos, permutando um serviço público em mercadoria74.

Dessa forma, o movimento estudantil teceu críticas contundentes ao Grupo Ser Educacional, antes mesmo da consumação do negócio. Em inúmeros documentos, assembleias e reuniões, os estudantes noticiavam os danos que poderiam desencadear com a compra da Universidade por um oligopólio educacional: “ocorrerá sucateamento da Universidade, demissões, cortes de investimentos e mais aumento nas mensalidades” (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 74 Em últimas publicações apresentadas na seção anterior se mostraram claras as mobilizações efetuadas pelo movimento estudantil da UNAMA na exigência de explicações à comunidade acadêmica a respeito dos boatos de venda da instituição. De forma a comunicar os estudantes, o DCE/UNAMA passou nas salas de aulas, realizou assembleis, reuniões, panfletagens etc., tencionava na promoção do diálogo com a comunidade acadêmica a respeito das possíveis transações que estavam ocorrendo na surdina. Por tudo feito, demonstra que as preocupações, como menciona a publicação do coletivo estudantil, não se tratou de “nenhum boato irresponsável [...]. A realidade dos fatos comprova mais uma vez que não se deve ter confiança na Reitoria [...] já que não foi realizada nenhuma comunicação ao conjunto dos estudantes e trabalhadores que sustentam a

2013g). O estudante Felipe Melo dos Santos, em entrevista para pesquisa, relata com exatidão aquele momento:

Estavam se iniciando os grandes conglomerados de educação. Não existia em Belém, por exemplo, a entrada da Estácio. Era a FAP, IESAM, etc., a UNIP não existia aqui. Aí estes grupos vieram comprando estas faculdades menores aqui. E compraram a UNAMA também. Na época que a UNAMA foi vendida, que anunciaram que foi vendida, que a gente fez essa onda. A discursão era que ela seria vendida para o grupo KROTON, e a gente já denunciava. A gente antes falava tudo isso aí que tá acontecendo – neste momento o entrevistado fica eufórico – sério! Pega o nosso material velho. A gente falava: ‘eles vão demitir os professores doutores, eles vão acabar com as bolsas que temos, eles vão demitir funcionários, eles vão cobrar as taxas novamente, eles vão fazer tudo isso’. E eles fizeram mano! É fato! (SANTOS, 2018).

Mesmo com a divulgação do negócio de compra e venda da UNAMA nos últimos dias do ano de 2013, a efetivação da transação somente foi concretizada em 19 de maio de 2014, como registra o documento emitido aos investidores pela Companhia75:

A SER EDUCACIONAL S.A. [...] vem a público informar que em continuação ao informado em Fato Relevante divulgado de 23 de dezembro de 2013, foi celebrado, nesta data, Contrato de Compra e Venda de Quotas e Outras Avenças (“Contrato”) por meio do qual sua subsidiária ICES – Instituto Campinense de Ensino Superior Ltda. (“ICES”) acordou: (a) adquirir 100% do capital social das sociedades (i) União de Ensino Superior do Pará – UNESPA, mantenedora da Universidade da Amazônia – UNAMA, sediada em Belém-PA (SER EDUCACIONAL, 2014a).

Efetivamente, foi a partir do segundo semestre de 2014 que a UNAMA iniciou concretamente suas atividades sob a gestão do Grupo Ser Educacional. Este empreendimento educacional, mediante a sua Governança Corporativa (GC), induz com rigor uma lógica de eficiência, profissionalismo, racionalidade e produtividade que são alinhados às orientações do mercado de capitais. Isto posto, a lógica empreendida pela Companhia necessita ser

75 A repercussão nos jornais de grande circulação na capital foi intensa, assim como por outras regiões onde o Grupo Ser Educacional tem entrada no segmento educacional. Destacamos alguns deles para que possamos compreender o contexto da compra, além do que as reportagens trazem informações complementares: (1) A Ser Educacional fechou nesta segunda-feira um contrato de compra de 100% do capital da UNESPA, mantenedora da UNAMA [...]. O valor da compra é de R$ 151,2 milhões (MEIBAK, 2014); (2) De acordo com a assessoria, após a compra, os cursos e os programas de extensão e pesquisas serão incorporados aos “valores e missão do Grupo Ser Educacional”, “A aquisição da UNAMA faz parte da continuidade do projeto de expansão do Grupo nas regiões Norte e Nordeste (SANTOS, 2014); (3) Objeto de especulações já há pelo menos dois anos, mas nunca admitida por seus controladores, a venda da Unama, a primeira universidade particular a ser colocada em funcionamento no Pará, foi selada ontem para o Grupo Se r Educacional [...]. Procurados, os dirigentes da universidade se mantiveram inacessíveis à imprensa durante toda a tarde de ontem (DIÁRIO ONLINE, 2013).

direcionada para a busca de investidores, ampliação da empresa no mercado educacional e criação de valor aos acionistas (SER EDUCACIONAL, 2017a).

Por outro lado, em oposição a estes acontecimentos mercadológicos, que interferiram nas vidas e na formação de todos os estudantes da UNAMA, o movimento estudantil continuou em 2014 com seus embates, agora com algo novo a ser confrontado: o Grupo Ser Educacional. Destacamos algumas das principais medidas do coletivo estudantil que resumem o período de transição das gestões e o início da nova administração profissional: (1) a divulgação da política de abandono da Reitoria quanto ao campus da UNAMA da BR 316; (2) o aumento absurdo das mensalidades; (3) o corte do “Repasse” ao movimento estudantil e (4) a superlotação dos espaços no campus da Alcindo Cacela, como sinal de diminuição dos gastos para aumento dos lucros.

Imagem 14 – Prédio do campus da BR 316 na região metropolitana de Belém/PA.

Fonte: Imagens retiradas da publicação “Conquistas estudantis de abril e críticas do

DCE à omissões da Reitoria da UNAMA” (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014a).

“Antes o Campus “carro chefe” da UNAMA, hoje um campus BR abandonado!” (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014a). Estas foram as manifestações feitas e publicadas pelo DCE/UNAMA em relação ao descaso da reitoria com o espaço da UNAMA/BR, como é conhecido um dos maiores prédios, em estrutura física, da Universidade da Amazônia.

Os estudantes ponderam que a postura de sucateamento é resultado da transição entre gestões e a completa falta de interesse dos novos donos em manter a estrutura total da UNAMA. Visão empresarial que designa ao contingenciamento de despesas, por meio da qual

atua em múltiplos setores: reconfiguração das estruturas, demissões de professores antigos e funcionários, retorno das taxas antigas e criação de novas, aumento de mensalidades, superlotação de salas de aula, reutilização de espaços voltados para auferir lucro etc. Estas são medidas que serão tomadas de forma lenta e gradual, acreditavam os estudantes (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014a).

[...] foi um movimento deles contra o DCE, contra os recursos dos estudantes, um movimento contra a pesquisa, o ensino, a extensão, a monitoria, maior lotação em sala de aula, deu um salto enorme, promessas de FIES 100% e ilimitado, taxas abusivas, foi um tsunami de violência mercadológica (RODRIGUES, 2019)76.

De certo, são essas medidas que serão efetivadas em espaço de tempo adequado, segundo as boas práticas de Governança Corporativa. A estratégia central levada pela GC é justamente, na primeira ordem, o aumento do valor da companhia reduzindo seus custos imediatos para aumentar sua receita (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2002).

Como tendo em sua estrutura empresarial a GC, ligada aos ditames do mercado de ações, o Grupo Ser Educacional é obrigado a atuar nesses parâmetros para poder se manter ativo e atraente a futuros investidores na companhia, com a previsão de alavancar sua aceitabilidade entre os acionistas na bolsa de valores. Portanto, essas medidas, dirigidas ao campus da UNAMA/BR, entendidas pelo DCE como sucateamento, representam manobras mercadológicas para manter a competitividade da empresa no mercado de capitais.

O ano de 2014 não se deteve em apenas rearranjar os espaços da universidade para aumentar a eficiência, mesmo que para isso a superlotação de estudantes nas salas de aulas de outros polos da universidade tenha sido a solução, como ficou demonstrado na fala de Eduardo Rodrigues. Representou, também, a instauração de outras organizações e medidas, como o aumento das mensalidades e a eliminação inicial de algumas taxas como o “repasse” de recursos financeiros para o DCE/UNAMA utilizar em suas ações estudantis.

Esse “repasse” é instituído desde 1997, por intermédio de um acordo entre a mantenedora da universidade e o DCE, circunstância que resultou no documento denominado: “Termo de convênio da UNAMA/UNESPA com DCE-UNAMA”, episódio abordado anteriormente. Sem os recursos a entidade estudantil iniciou o ano de 2014 com dificuldades

76 Trecho da entrevista concedida por Eduardo Rodrigues para esta pesquisa, na cidade de Belém, em 01 de junho de 2019.

financeiras de toda ordem. No entanto, mesmo com a situação difícil, o DCE/UNAMA, como focaliza Eduardo Rodrigues, não deixou de existir, pelo contrário, seguiu em sua mobilização:

É lógico que o repasse fez diferença, mas mesmo assim os estudantes estavam organizados, independente de recurso. [...] Foi um ataque, uma tentativa de desorganização do movimento, só que ele seguiu. Vários meses seguimos fazendo muita luta, muito enfrentamento, muita disputa contra a Ser Educacional (RODRIGUES, 2019).

Estes enfrentamentos, advertidos por Eduardo Rodrigues em trecho de sua entrevista, podem ser notados nas publicações seguintes das mobilizações do coletivo estudantil, como também é visível na “Imagem 15” a seguir.

Imagem 15 – Protesto da direção do DCE/UNAMA em frente ao Procon/PA

contra o aumento da mensalidade proposto pela administração da UNAMA e demais IES privadas. Destaque da reunião entre entidades patronais, representantes da UNE e UBES para firmarem acordo da taxa de reajuste.

Fonte: Imagens retiradas da publicação “Vamos à Luta para barrar o aumento de

mensalidades nas particulares no Pará!” (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014b).

Quanto ao aumento das mensalidades, as primeiras movimentações ocorreram na sede do Procon/PA sem a participação da direção do DCE/UNAMA, mas com estudantes da direção local da UNE e UBES, assim como representantes de empresários educacionais que atuam na região metropolitana de Belém (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014b). Como anunciado pelo movimento estudantil da

UNAMA, as próximas medidas dos chamados “tubarões do ensino”, em destaque a Ser Educacional S.A, seriam justamente o aumento das mensalidades.

O reajuste proposto na reunião – com os estudantes da UNAMA em protesto do lado de fora do prédio do Procon/PA – resumia-se a 8% nas mensalidades para o ano de 2015. Os representantes da UNE e UBES negociavam para que o reajuste se mantivesse no patamar da inflação projetada para o ano em torno de 6%.

Contrário a tudo isso, os estudantes do DCE sinalizavam como principal proposta: “nenhum aumento!” (DIRETÓRIO CENTRAL DOS ESTUDANTES DA UNIVERSIDADE DA AMAZÔNIA, 2014b). Justificavam que durante os últimos anos, o acumulado dos aumentos ultrapassava, em muito, a inflação de todo o período: “[...] é um grande absurdo! Todos os anos, nessas últimas duas décadas, a referida mesa aprova reajustes acima do índice da inflação, já acumulando mais de 40% de aumentos abusivos nas mensalidades dos estudantes!” (Ibidem, 2014b).

Quanto ao posicionamento da UNE e UBES, os dirigentes do DCE/UNAMA foram categóricos na recusa das decisões da reunião que contava com representantes do Grupo Ser Educacional. Para os estudantes deste DCE a tentativa de acordo do movimento estudantil nacional com os representantes empresariais do segmento privado no Estado do Pará se conduziu no sentido contrário as lutas por educação superior de qualidade, da mesma forma que não representavam um ato a favor dos trabalhadores paraenses pois atacava “ainda mais o bolso das famílias paraenses para aumentar os seus lucros! [lucros das empresas]” (Ibidem, 2014b, acréscimo nosso).

Portanto, o DCE/UNAMA teceu críticas contundentes à direção majoritária da UNE e UBES que mesmo em seus posicionamentos contrários aos aumentos acima da inflação, propostos pelo setor empresarial presentes, não tomaram nenhuma medida concreta para o enfrentamento: “Não chamaram a mobilização de estudantes, não convocaram a organização da luta unificada das entidades estudantis, nada” (Ibidem, 2014b). Ao invés disso, segundo a publicação, propuseram o ajuste no limite da inflação, sem compreender que o acumulado dos aumentos nos últimos anos foi muito acima do total inflacionário no mesmo período.

Entendemos que essa velha mesa de negociações é um espaço onde sempre se negocia em favor dos empresários, portanto não é o espaço privilegiado do movimento estudantil. Só a mobilização nas ruas e a organização da luta dos estudantes que pode enfrentar e parar os sucessivos aumentos! Portanto é culpa dos governistas imóveis da UNE e UBES a tranquilidade dos empresários nas suas farras de mensalidades! (Ibidem, 2014b).

No período transitório da venda da UNAMA e a instalação da nova gestão do Grupo Ser Educacional, o DCE manteve-se na oposição em favor de sua categoria, os estudantes. Até esse momento, os representantes da entidade não possuía o conhecimento mais apurado da empresa que comprou a UNESPA, mantenedora da UNAMA, tampouco sabiam dos propósitos mais fundamentais de sua atuação no mercado de ações, e a quem verdadeiramente a Companhia servia, que não eram para a qualidade da formação, mas para o rentismo de seus acionistas, fatos que iremos compreender melhor na próxima seção.