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Estabelecida a relação entre o esófago revestido por epitélio colunar e o adenocarcinoma do esófago, importava estabelecer consensos sobre a definição operacional da entidade, de modo a ser possível comparar resultados da investigação provenientes de diferentes centros. Convém recordar aqui, que a partir do início dos anos sessenta passou a ser aceite que uma curta extensão do esófago distal (até 2 cm) era normalmente revestido por epitélio colunar

59. Neste contexto, houve autores que propuseram que a definição operacional da entidade

deveria incluir um mínimo de extensão de epitélio colunar no esófago distal para que o diagnóstico de esófago de Barrett pudesse ser feito. Skinner 78 utilizou a regra da existência

de pelo menos 3 centímetros de mucosa colunar acima da transição esófago-gástrica para classificar os doentes como tendo esófago de Barrett. A partir dos primeiros anos da década de oitenta, tornou-se regra a definição duma extensão mínima de epitélio colunar para o estabelecimento do diagnóstico de esófago de Barrett. Embora a extensão de 3 centímetros proposta por Skinner fosse a mais adoptada, encontram-se na literatura referências a extensões entre os 2 e 5 centímetros 90-92.

A evolução deste conceito “quantitativo” de esófago de Barrett (em que a extensão era essencial) para um conceito “qualitativo” em que o diagnóstico se baseia numa correlação endoscópico-histológica, assentou, no essencial, em 3 factos.

2.4.1. O espectro histológico do esófago de Barrett

Na literatura encontravam-se descrições de diferentes epitélios no esófago revestido por epitélio colunar. Em 1976 Paul e colaboradores 30 efectuaram, sob controlo manométrico e

após identificação do esfíncter esofágico inferior, biopsias seriadas em onze doentes com segmentos de esófago revestido por epitélio colunar a intervalos de 1 a 3 centímetros. Foi observada a presença de três tipos de epitélios colunares distintos. Um caracterizado pela presença de células parietais e principais que denominaram de tipo gástrico atrófico fúndico (n=5); um caracterizado pela presença de células mucosas, sem células parietais ou principias, a que chamaram de tipo juncional (n=4); um caracterizado pela presença de células caliciformes, que denominaram de epitélio colunar especializado (n=9). O trabalho de

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Paull e colaboradores 30 veio demonstrar que: a) o epitélio colunar especializado era o mais

prevalente no esófago revestido por epitélio colunar; b) os três epitélios tinham uma distribuição topográfica reprodutível, tendo o epitélio colunar especializado localização mais proximal e o tipo gástrico atrófico fúndico mais distal; c) ao contrário do evidenciado até então, no esófago revestido por epitélio colunar estavam presentes células parietais, que se limitavam ao epitélio tipo gástrico atrófico fúndico, que tinha sistematicamente um aspecto semelhante ao epitélio gástrico fúndico com alguma atrofia. De acordo com o conhecimento da época, dos 3 epitélios presentes no esófago de Barrett apenas o colunar especializado não pertencia ao espectro normalmente observado ao nível do estômago proximal.

Subsequente à descrição de Paull 30 da heterogeneidade epitelial do esófago de Barrett,

Haggitt 32 sugeriu uma relação entre o epitélio colunar especializado, que mais não é que uma

forma de metaplasia intestinal, e o adenocarcinoma do esófago. Essa relação veio posteriormente a ser confirmada por Skinner 78 e por Reid 10, tendo sido produzida evidência

que apenas o epitélio colunar especializado estava associado ao risco de progressão neoplásica no esófago de Barrett.

2.4.2. Do conceito quantitativo ao conceito qualitativo

Assim, no final da década de 70 e início da década de 80 estava estabelecido que o esófago revestido por epitélio colunar (na altura já definitivamente associado ao epónimo esófago de Barrett) era uma lesão adquirida com uma extensão variável, associada ao refluxo gastro- esofágico, constituída por uma mucosa com marcada heterogeneidade epitelial e com uma associação estabelecida com o adenocarcinoma do esófago. Tendo-se constatado a especificidade do epitélio colunar especializado como marcador do processo metaplásico que está na origem do esófago de Barrett e demonstrado a sua associação com a progressão neoplásica e o desenvolvimento de displasia e adenocarcinoma, observou-se uma natural transformação no conceito operacional de esófago Barrett. Processo lento, na medida em que permaneceu a necessidade da observação de determinada extensão de epitélio colunar, que variou entre 2 e mais de 5 centímetros, para que o diagnóstico do esófago de Barrett pudesse ser estabelecido 90, 91.

O critério da extensão do segmento de esófago revestido por epitélio colunar para o diagnóstico do esófago de Barrett veio a ser definitivamente posto em causa pelo trabalho de Stuart Spechler e colaboradores publicado em 1994 93. Nesse trabalho, os autores realizaram

sistematicamente biopsias imediatamente abaixo da linha Z em 156 doentes sucessivos submetidos a endoscopia alta. Em 12, o diagnóstico de esófago de Barrett (>3cm de esófago revestido por epitélio colunar e presença de epitélio colunar especializado) era já anteriormente conhecido. Nos restantes 142, observaram a presença de esófago de Barrett em 2 doentes e a presença de epitélio colunar especializado na ausência de critérios

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endoscópicos de esófago de Barrett em 26 (18%). Os resultados do trabalho de Spechler 93

foram decisivos para a adopção de um novo conceito de esófago de Barrett, que passou a ser definido como a presença de qualquer extensão de epitélio colunar especializado (metaplasia intestinal) no esófago tubular. A célula caliciforme, o marcador histológico da metaplasia intestinal, passou a ser, no contexto de um quadro macroscópico (endoscópico) adequado, simultaneamente o marcador de diagnóstico e de risco do esófago de Barrett 94.

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