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Do prazo de cinco anos do artigo 618, caput do Código

CAPÍTULO III – DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREITEIRO

5. Da Empreitada na indústria da construção civil

5.3. Da responsabilidade civil do empreiteiro por defeitos que afetam a

5.3.7. Do prazo de cinco anos do artigo 618, caput do Código

Antes de empreender uma tentativa de convencimento, convém nesse passo assinalar que a preposição durante utilizada no caput do artigo 618 resulta de processo de conversão de adjetivo, como ensina Evanildo Bechara131, para quem, “tudo na língua é semântico, isto é, tudo tem um

significado, que varia conforme o papel léxico ou puramente gramatical que as unidades lingüísticas desempenham nos grupos nominais unitários e nas orações”.

Durante, diz ele, exprime duração ou permanência de algo num tempo

determinado. Assim, a responsabilidade do empreiteiro permanece pelo tempo de cinco anos. Somente após o decurso daquele tempo fica ele forro da responsabilidade que lhe cabe.

Essa era a provisão existente no direito anterior, com a diferença, como apontada, que agora está prescrita a irredutibilidade do prazo.

Essa irredutibilidade anunciada no texto vigente foi introduzida para afastar qualquer discussão que no passado existia.

Clóvis Bevilaqua132, em comentários ao artigo 1.245 do Código de 1916, na Nota 4, dizia que “os contratantes podem aumentar ou diminuir esse prazo, que não é de ordem pública”, citando em abono da tese, opiniões de Baudry, Aubry et Rau e Guillourard, além de acórdãos unânimes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

No mesmo sentido o parecer de Alfredo Bernardes da Silva133, que

recorrendo a doutrinadores franceses, que, em grande maioria, admitem a redução ou ampliação do prazo, concluiu: “Quer no direito anterior, quer no domínio do Cód. Civil, é perfeitamente lícita e obrigatória a cláusula em um contrato de empreitada em que se tiver fixado o prazo de um ano para a permanência da responsabilidade do construtor ou empreiteiro pela segurança e solidez do edifício construído e entregue ao seu proprietário”.

Em sentido contrário à possibilidade de redução do prazo de garantia, manifestaram outros monografistas da empreitada.

131 Evanildo Bechara, Gramática escolar da língua portuguesa, Rio de Janeiro, Nova Fronteira

Participações S/A, 2010, p. 290.

132 Clóvis Bevilaqua, Comentários ...cit. p.352.

Costa Sena134, apreciando a norma contida no artigo 1245 do Código de 1916, deixou consignado: “É fácil compreender que a segurança e estabilidade dos edifícios é matéria de interesse geral. Como tal entra também nas normas de direito penal, pois constitui perigo potencial à incolumidade pública. Princípio absoluto, inalterável por arbítrio das partes, nulas são as cláusulas exonerativas de responsabilidade, porventura inseridas no contrato”.

E. V. de Miranda Carvalho135, observando haver opiniões ilustres de

conceituados juristas no sentido de que as partes podem reduzir ou aumentar o prazo do artigo 1245, escreveu: “preferimos, com a devida vênia, a opinião que somente permite o aumento convencional do prazo de cinco anos, pois admitir também o arbítrio das partes, na dispensa ou na diminuição de tal prazo, importaria numa burla flagrante ao art. 1245, que foi escrito no Código em atenção ao bem da comunidade, e, não, para degenerar em letra morta sob o influxo de interesses privados, não raro os mais subalternos”.

O atual Código dissipou qualquer divergência que ainda pudesse remanescer do passado. Declarou peremptoriamente a irredutibilidade do prazo, mas não proibiu a possibilidade de seu alargamento.

Quanto ao termo inicial do prazo, não o revelou a lei.

Nesse passo, é preciso distinguir. Se a obra for entregue depois de concluída, o prazo somente começa a fluir da entrega ou da consignação. Se os contratantes houverem convencionado a entrega por partes ou se, na falta de convenção, o caso for de obra de partes distintas, ou de obra que se determina por medida (artigo 614 do Código Civil), o prazo de cinco anos começa a correr, se o objeto da construção for divisível, da entrega de cada parte, distinta ou verificada por medida; se tal objeto for indivisível, o prazo contar-se-á da entrega da última parte da construção concluída.

Outro aspecto com relação ao termo a quo deve ser considerado, em face da legislação especial. É o da efetiva entrega da obra ao proprietário, desde que não esteja atrelado a providências de órgãos públicos encarregados da concessão de atestados de segurança ou de habitabilidade. A relação jurídica, que se firma entre empreiteiro e proprietário da obra, não pode

134 Costa Sena, Da empreitada...cit. cit. p. 78/79.

135 E. V. de Miranda Carvalho, Contrato de empreitada, Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1953, 1ª

desprezar essas interferências, pois enquanto não houver autorização para o uso da obra construída, não tem o dono da obra o direito de nela imitir-se e, conseqüentemente, de qualquer constatação de eventuais defeitos. Quer dizer: o prazo de cinco anos começa a fluir a partir da entrega da obra pelo empreiteiro, desde que dela possa o proprietário ter o uso e gozo.

No que diz respeito à natureza do prazo de cinco anos, também muito se discutiu. Especialmente na vigência do Código anterior. Para comprovar o dissenso doutrinário, é bastante invocar novamente E. V. de Miranda Carvalho136, que fez exaustiva pesquisa na doutrina pátria e estrangeira, bem como nas decisões judiciais, voltadas à discussão sobre ser de prescrição ou de decadência o prazo de cinco anos previsto no artigo 1245. Citado monografista, alinhando as razões que o levaram à sua conclusão, assinalou: “Não tergiversamos em aderir à prescrição trintenária”.

A discussão parece ter perdido a importância que já despertou anteriormente. Isso porque o entendimento generalizado que se assentou, mesmo na vigência do Código anterior, consolidada no atual diploma, é de que o prazo irredutível de cinco não é nem de prescrição, nem de decadência. Trata-se de prazo de garantia.

Dentre outros, assim entendem: José de Aguiar Dias, Maria Helena Diniz, Carlos Roberto Gonçalves, Arnaldo Rizzardo, Maria Lígia Coelho Mathias e Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi, Alexandre Junqueira Gomide137.

Maior ou menor, assim tem sido considerado o prazo, também nas legislações estrangeiras, durante o qual subsiste a responsabilidade do empreiteiro. No direito português, tal como no nosso, o prazo é de cinco anos, consoante o prescrito no artigo 1225º. No direito italiano (artigo 1.669 do Codici) e no recente Código Civil argentino (artigo 1275) o prazo é de dez anos.

136 E. V. de Miranda Carvalho, Contrato... cit. p. 268 a 273.

137 Arnaldo Rizzardo, Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009, 4ª

edição, p. 535; José de Aguiar Dias, Da responsabilidade ... cit. p. 391; Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil, vol. 3.... cit. p. 377; Maria Helena Diniz, Curso.... vol. 7. cit. p. 362; Maria Ligia Coelho Mathias e Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi, Direito civil, contratos.

Rio de Janeiro, Elsevier, 2008, p. 143; Alexandre Junqueira Gomide, Contrato de empreitada e inexecução: aspectos controvertidos envolvendo prazos deo exercício de pretensões e direitos, Revista

A responsabilidade do empreiteiro capitulada no artigo 618 diz respeito a defeito de solidez e segurança, nos termos expostos. Outros defeitos, porém, podem sobrevir, e, ocorrendo, igualmente será responsabilizado o empreiteiro. Não com fundamento no artigo 618. São defeitos aparentes e defeitos ocultos que podem acarretar, não somente uma desvalia da obra entregue, mas até mesmo a sua inteira impropriedade.

Essa outra ordem de defeitos não está albergada pelo disposto no artigo 618, mas por outros preceitos, como examinado anteriormente, sob a epígrafe da responsabilidade civil do empreiteiro por defeitos que não afetam a segurança e solidez da obra. E, como corolário, não se aplica a essas situações o prazo de garantia de cinco anos.

5.3.8. Do prazo de cento e oitenta dias do parágrafo único do artigo 618