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SUMÁRIO

3. REVISÃO DA LITERATURA

3.1 Dor crônica: definição e epidemiologia

Dor é uma experiência sensitiva e emocional desagradável, associada à lesão real, em potencial ou descrita em tais termos (International Association for the Study of Pain, 1986). Pode ser compreendida como sofrimento e, desde os primórdios, provoca esforços humanos na busca do alívio. Por conta disso, a compreensão fisiopatológica e de mecanismos adjacentes é essencial para seu tratamento. A dor aguda – com duração de até três meses – tem função biológica de manutenção da vida. Após esse período, ela passa a ser crônica. Essa geralmente não tem função biológica, podendo causar incapacidade temporária ou permanente dos indivíduos (Twaddle, Cooke, 2006; Von Roenn, Paice et al., 2006; Cruccu, Sommer et al., 2010; Teixeira, Siqueira et al., 2012a). Sua subjetividade dificulta o diagnóstico e o tratamento.

Dor crônica é prevalente, afetando cerca de 10,1% a 55,2% da população anglo-saxônica (Harstall, Ospina, 2003) e gerando altos custos diretos e indiretos. Cerca de 75% a 80% dos atendimentos em saúde são motivados pela dor e aproximadamente 30% a 40% dos indivíduos com dor crônica utilizam cinco vezes mais o sistema de saúde do que a média geral de outros usuários. Na população com mais de 60 anos, há prevalência de dor crônica de 51,4%, a qual diminui após os 75 anos (Teixeira, Siqueira et al., 2012a). Entre os doentes internados, a frequência de dor é de 45% a 80%, tendo como causas mais comuns as epigastralgias e outras dores abdominais, dor à micção, cefaleias, artralgias, dores nos membros e dor torácica (Teixeira, Kraychete et al., 2006). As afecções do aparelho

locomotor afetam cerca de 42,8% da população, e são seguidas pelas afecções neuropáticas (31,2%). Teixeira et al. (2006) observaram que a síndrome fibromiálgica, a dor miofascial e a dor abdominal apresentam como média etária 49,6 anos, sendo que a neuralgia pós-herpética, a dor no coto amputado e a dor pós-acidente vascular encefálico são mais comuns em indivíduos mais idosos. As dores crônicas são mais prevalentes entre os indivíduos do sexo feminino e são localizadas principalmente na região dorsal e em membros inferiores. Elas provocam diminuição da funcionalidade física, aumento da insônia, depressão, dificuldades ao caminhar e, consequente, diminuição da qualidade de vida (Teixeira, Siqueira et al., 2012a). Dentre os problemas econômicos aventados, destacam-se: redução da jornada diária de trabalho; absenteísmo; processos de aposentadoria e pensões precoces.

Os estudos epidemiológicos sobre a dor no Brasil ainda são escassos e em geral centrados em condições ou locais específicos. Em Salvador, a dor crônica foi observada em 41,4% da população, sendo que 48,4% eram do sexo feminino e 16,3% tinham como queixa principal a lombalgia (Sa, Baptista et al., 2008). Este resultado corrobora a revisão realizada por Teixeira et al. (Teixeira, Kraychete et al. 2006) na qual é relatada dor lombar de 8% a 45% da população brasileira adulta, enquanto que na população americana essa prevalência é de 26,3%. Ferreira et al. (2011) também relataram que intensidade da dor, sexo feminino, depressão, ansiedade ou outros transtornos psiquiátricos, morbidades associadas, baixo nível de escolaridade, alto índice de massa corpórea e idade avançada foram

preditores de dor crônica. A diferença cultural também é um fator que pode influenciar a prevalência de dor e o comportamento associado (Fillingim, 2012).

No segmento cefálico, a dor afeta cerca de 70% dos indivíduos, sendo que em 10% ela é crônica. Aproximadamente 90% dos homens e 95% das mulheres apresentam cefaleia ao menos uma vez ao ano. Ela é observada em 3% a 8% das crianças com 3 anos, 19% das crianças com 5 anos e em 37% a 51,5% das crianças entre 7 a 15 anos de idade. Dentre as cefaleias funcionais, as mais prevalentes são a migrânea (afeta 25% dos indivíduos, sendo 20% do sexo feminino) e as do tipo “tensão”. Ao menos um episódio de cefaleia do tipo tensão foi descrito por 79% dos indivíduos, sendo que 20% a 30% deles têm dor crônica (Teixeira, Siqueira et al., 2012a).

Dor de dente é uma mais comuns e conhecidas dores da humanidade, observada em 40% da população mundial, sendo que a dor facial afeta 12%, e a cefaleia, 26% (Siqueira, 2012). Dados semelhantes são observados nos Estados Unidos e no Brasil, havendo prevalência (12%) de odontalgia entre adolescentes, com incapacitação média de 4,5 dias (Siqueira, 2012). A frequência de traumatismo dentário na população brasileira é de 8% aos 9 anos de idade, e de 13,6% aos 12 anos, chegando a 16,1% aos 14 anos (Siqueira, 2012).

A segunda causa mais comum de dor facial é a disfunção temporomandibular (DTM) (Zakrzewska, 2009). É mais comum em jovens entre 32,6 a 39 anos, e pode estar relacionada ao uso de próteses. Dor ao

abrir a boca (5%), ruído articular (24%) e dor em masseter (39%) podem estar presentes (Gonçalves, Dal Fabbro et al., 2010).

A cervicalgia afeta entre 9,5 e 35% dos indivíduos. Ela é mais comum em mulheres (13,5%) do que em homens (9,5%). Contudo, apenas 4% das mulheres a apresenta antes dos 30 anos de idade (Teixeira, Siqueira et al., 2012a).

Em 1997, a Neuralgia pós-herpética (NPH) foi prevalente em 12,4% dos pacientes atendidos na triagem do Centro de Dor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (CDHCFMUSP). Sua incidência é de 4,8 casos a cada cem mil habitantes na terceira idade, e de 1,3 casos nas demais faixas etárias (Teixeira, Okada, 1999; Teixeira, Siqueira et al., 2012a). A NHP pode ser acompanhada de disestesia anterior à erupção (entre 20% e 40%), que se mantém em 9% e 25% dos casos, tornando-se crônica em 10%, principalmente em idosos (47,5% a 70%) (Teixeira, Okada, 1999). Ela afeta a face em 17% a 25% dos casos (desses, 88% a 94% são no nervo trigêmeo, principalmente no ramo oftálmico) (Teixeira, Okada, 1999; Alvarez, de Siqueira et al., 2007).

A neuralgia idiopática do trigêmeo apresenta prevalência de 155 indivíduos a cada um milhão de habitantes nos Estados Unidos e na França. Sua incidência é de 4,3 a cada cem mil habitantes, sendo mais comum nas mulheres. Ela apresenta padrão familiar em 2,6% a 6% dos casos (Siqueira, Teixeira, 2012a). A síndrome da ardência bucal afeta de 0,7% a 18% da população e é mais comum em mulheres pós-menopausa (Nasri e Siqueira 2012).

A classificação de dor crônica baseia-se em geral nos mecanismos fisiopatológicos. A mais comum é a dor de origem musculoesquelética, seguida da dor neuropática. Essa decorre de lesão nervosa periférica e/ou central e anormalidades no trato espinotalâmico, a exemplo da dor pós- trauma do nervo alveolar inferior ou polineuropatia diabética. A dor nociceptiva está associada à inflamação e pode ser exemplificada pelas osteoartrites, pulpites e angina isquêmica. Dor de caráter disfuncional é aquela que não apresenta evidência de lesão somestésica, como a síndrome fibromiálgica, a síndrome do intestino irritado e as cefaleias. A DFA pode ser incluída nesse grupo. Por fim, a dor visceral está relacionada a órgãos como fígado, coração e pulmão, sendo comumente irradiada, difusa e difícil de ser identificada (Dworkin, Backonja et al., 2003; Giamberardino, Affaitati et al., 2006; Zhang e Baccei, 2008; Teixeira, Siqueira et al., 2012b).

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