• Nenhum resultado encontrado

Durand e a desvalorização do mito e da imagem no Ocidente

3. MITO, LENDAS E HISTÓRIA E SUAS RELAÇÕES COM O IMAGINÁRIO

3.1 Durand e a desvalorização do mito e da imagem no Ocidente

Segundo Durand, a civilização ocidental, erguida no racionalismo positivista, tratou o mito e a imagem como resultado de processos rudimentares na história da evolução do pensamento do homem. A desvalorização da imagem e da função da imaginação no desenvolvimento científico ocidental orientou Gilbert Durand na construção de uma Teoria Geral do Imaginário que veio a colocar aimagem, a imaginação e o imaginário, no cenário dos estudos acadêmicos.

Pois, para ele a civilização moderna, caracterizada pelo racionalismo positivista, acreditou ter eliminado o mito e minimizado o papel da imagem e do simbolismo. Ao valorizar a razão, em detrimento do imaginário, a iconoclastia ocidental pretendeu um “pensamento sem imagem”; mas, por trás da fachada hipócrita do iconoclasmo oficial, o mito continuou a proliferar de forma

clandestina, graças à expansão literalmente fantástica da mídia que reinstalou a imagem, em “carne e osso”, no uso cotidiano do pensamento (DURAND, 2002).

Podemos observar que na Antiguidade os mitos podem ser entendidos como representações de verdades profundas da mente, e a união desses mitos, de acordo com suas origens, formam as diversas mitologias que conhecemos. Logo, na antiguidade, o mito reinava sem rival, pois era um tempo em que o mito não é reconhecido como tal, visto que era a única forma de explicação da realidade.

Portanto o mito é para quem o vive, uma forma de realidade, é para o mundo inteligível que dele nasce, uma totalidade indefinível. Configura o mundo em seus momentos primordiais, relata uma história sagrada; propõe modelos e paradigmas de comportamento; projeta o homem num tempo que precede o tempo; situa a história e os empreendimentos humanos num espaço indimensionável, define os limites intransponíveis da consciência e as significações que instalam a existência humana no mundo.

Nesse sentido o mundo em que vivemos é cercado por símbolos e para Durand (2002), todo simbolismo é, pois, uma espécie de gnose, isto é, “um processo de mediação por meio de um conhecimento concreto e experimental” (DURAND, 2000, p. 31).

Esse simbolismo está presente nas lendas, e de acordo com Sales (2007), compreendemos que as lendas conservam quatro características do conto popular e do folclore: antiguidade, persistência, anonimato e oralidade, e que a imaginação simbólica pode evocar ressonâncias adormecidas, seja de forma individual ou coletiva, portanto, justificamos ser possível efetuar na sala de aula uma ressignificação simbólica das lendas, rompendo com a leitura literal do texto escrito e atribuindo o sentido simbólico que as lendas possuem.

Acreditamos que os mitos e lendas podem ser considerados como as primeiras maneiras encontradas pelo homem para explicar a realidade na qual se encontrava imerso. Os gregos conceituavam o mito como uma intuição compreensiva da realidade fundamentada na emoção/afetividade, o mito

expressa aquilo que o homem deseja e o que ele teme. É um relato fabuloso de algo que ocorre no tempo, na história e no começo das coisas; é um relato que personifica as forças do bem e do mal.

O mito surge frente a situações limites para o homem. A força do imaginário coletivo é a sua principal força, ele precisa da força da palavra; não é apenas a explicação para algo que se compreende, mas também o acomodante e o tranquilizante para o mundo que se apresenta como assustador.

Gilbert Durand considera o mito como:

[...] um sistema dinâmico de símbolos, arquétipos e esquemas, sistema dinâmico, que, sob o impulso de um esquema, tende a compor-se em narrativa. O mito é já um esboço de racionalização, dado que utiliza o fio do discurso, no qual os símbolos se resolvem em palavras e os arquétipos em ideias. (DURAND, 2002, p. 62-63).

Segundo Durand todo pensamento humano é uma representação e o imaginário constitui-se no conector obrigatório pelo qual forma-se qualquer representação humana. O imaginário é uma “re-presentação incontornável, a faculdade de simbolização de onde todos os medos, todas as esperanças e seus frutos culturais jorram continuamente desde cerca de um milhão e meio de anos que o homo erectus ficou em pé na face da terra” (Durand, 1999, p. 117).

Percebemos que o seu projeto consiste em estudar o modo como as imagens se produzem, como se transmitem, bem como a sua recepção. Em relação a esse pensamento de Durand Araújo e Teixeira afirmam que:

A expressão privilegiada das imagens encontra-se, contudo, no mito, cujas imagens seguem a sequência linguística: verbo, substantivo e adjectivo, sendo a função de substantivação nominal tida como secundária em relação ao verbo, verdadeira matriz arquetípica, ou em relação aos atributos que declinam a pluralidade intrínseca do sujeito (2009, p. 09).

Nesse sentido, o mito, no início da civilização grega, ensina o homem a ter certa conduta em relação aos seus semelhantes e outra em relação aos

deuses. Ou seja, o mito tem uma importante função social e mais do que isso, serve como ponto de união entre as pessoas.

Porém, com o nascimento do pensamento filosófico grego o mito, justamente com a sua explicação do início do mundo, perdeu a sua importância. Os primeiros filósofos, os quais estavam preocupados em descobrir a arché, ou seja, o princípio, que teria dado a existência ao mundo, trouxeram uma nova forma de ver e também de tentar dar uma explicação da origem do mundo físico.

Com o surgimento dessas novas formas de ver o mundo, o mito começou a ser questionado pelos gregos e, aos poucos, descartada a sua explicação de mundo. Os filósofos começaram a questionar a relação que os homens possuíam para com os deuses, pois, os deuses não poderiam ter formas iguais aos humanos e serem apenas um aperfeiçoamento do homem comum.

Pensando na problemática que envolve mito e lenda tentaremos situar a partir desse momento o que seria cada um a partir de alguns estudiosos no assunto. Por exemplo, Roland Barthes, em Mitologia, (2007, p. 205), afirma que o mito “é um sistema particular, visto que ele se constrói a partir de uma cadeia semiológica que já existe antes dele”.Para o referido autor (2007, p. 214), o mito é um sistema duplo, “no qual se produz uma espécie de ubiquidade: o ponto de partida do mito é constituído pelo ponto final de um sentido”.