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2.4. O D ESENHO P ASSIVO

2.4.8. C ONDICIONANTES I NTERNAS

2.4.8.2. E NVOLVENTE NÃO OPACA

Os vãos envidraçados são componentes do edifício que permitem uma relação direta entre o seu interior e o exterior. Para além da vista, estes incentivam a receção de ganhos solares diretos e potenciam uma ventilação e iluminação natural. O seu dimensionamento é da maior importância para um correto balanço energético, pelo que deve ser adequado ao percurso solar e ao clima. Deve ainda existir um equilíbrio entre áreas envidraçadas, que reagem ao clima de uma forma mais instantânea, e as opacas, que atenuam o impacto das incidências extremas do clima.

Num clima como o de Portugal, a orientação que mais otimiza os ganhos solares ao longo de todo ano é a orientação a sul. A orientação a sul torna-se bastante útil pois consegue receber ganhos quando os raios solares estão baixos (Inverno) e, com a ajuda de um sistema de sombreamento, prevenir a entrada dos raios solares quando estes estão mais altos (Verão).

Nas orientações a Nascente e Poente não se verifica uma diferença tão acentuada do ângulo solar. Por este motivo, um envidraçado colocado sobre estas orientações necessita de cuidados especiais, já que, durante o Verão, especialmente a Poente, existe o risco de sobreaquecimento por efeito de estufa. Torna- se assim relevante que o dimensionamento dos vãos nestas orientações seja mais contido e que exista um sistema de sombreamento pelo exterior.

Os vãos orientados a Norte possuem um peso significativo no balanço energético, visto que não produzem ganhos energéticos significativos. Mesmo assim, estes vãos são essenciais pois potenciam uma boa ventilação natural dos espaços, favorecem uma iluminação natural difusa (aproveitando a luz proveniente da abóbada celeste), estabelecem relações visuais com o exterior, etc.. Assim sendo, sempre que se projete uma abertura na fachada a Norte é importante reavaliar o equilíbrio global do edifício do ponto de vista dos ganhos e das perdas energéticas.

No caso dos vãos zenitais, quando estes se aproximam de um plano horizontal permitem a entrada de muita radiação solar durante todo o ano. Em Portugal, esta radiação é bem-vinda durante os meses mais frios, porém nos meses mais quentes pode originar sobreaquecimento do espaço. Este risco pode ser mitigado através de uma ventilação natural eficiente e/ou sistema de sombreamento. Para os envidraçados zenitais que se aproximam do plano vertical, o tratamento deverá ser idêntico ao que foi anteriormente descrito, consoante a orientação solar. Todavia, como se localizam em locais de difícil acesso, é aconselhável que o vão, assim como o sistema de sombreamento, sejam passíveis de ser operados à distância (manual ou mecanicamente).

Sabendo a orientação do envidraçado e conhecendo o movimento diário do sol, é possível obter uma previsão da quantidade de radiação solar que lhe será incidente nas diferentes estações do ano. Na Figura 2.29 é apresentada a variação ao longo do dia da radiação solar incidente numa janela com as diferentes orientações, nas estações de Verão e Inverno, em Portugal.

Figura 2.29 – Variação da radiação solar global em janelas verticais de diferentes orientações, nas diversas horas do dia, para 40˚ latitude Norte [26]

A escolha e especificação do vidro deve ser criteriosa, no sentido em que, deve ser feita com base numa análise de todas as suas propriedades, características, vantagens e desvantagens. De toda a radiação total incidente num envidraçado, uma parte é transmitida instantaneamente para o interior, outra é refletida para o exterior e uma terceira parte é absorvida pelo próprio vidro. Da radiação absorvida, que representa a energia acumulada no vidro, há ainda uma parcela que vai ser emitida para interior e uma outra para o exterior, devido a fenómenos de convecção e radiação. A decomposição da radiação solar incidente num envidraçado divide-se assim em 3 parcelas: transmitida, refletida e absorvida. Na Figura 2.30 está representada esquematicamente a decomposição da radiação incidente num envidraçado.

Figura 2.30 - Decomposição da radiação incidente num envidraçado (adaptado de [32])

I – Energia solar global incidente (radiação direta + difusa) T – Transmissão energética global (Transmitida diretamente) R – Reflexão energética global (Parcela Refletida)

A – Absorção energética global (Parcela Absorvida) Ae – Fração da energia absorvida emitida para o exterior Ai – Fração da energia absorvida emitida para o interior

De forma a evitar repercussões graves durante o funcionamento de um edifício, é fundamental definir corretamente em fase de projeto as características do comportamento térmico e ótico do vidro. Os parâmetros de maior interesse para um estudo deste tipo, são o fator solar (g⊥), o coeficiente de transmissão térmica (U), o coeficiente de transmissão luminosa (tv) e o coeficiente de reflexão luminosa (Rv), Coeficiente de Seletividade Espectral (CSE), de seguida apresentados.

O fator solar do vidro (g⊥) define a totalidade da radiação solar que é transmitida para o interior dos compartimentos. Este parâmetro considera como ganhos de calor pela radiação solar a soma de duas parcelas, a radiação transmitida diretamente (T) e a radiação absorvida e reenviada para o interior (Ai), representadas na Figura 2.30 [33] .O fator solar de um envidraçado representa assim o quociente entre a energia solar transmitida para o interior, através do envidraçado, e a energia da radiação solar total incidente. A equação 2 traduz exatamente essa definição:

𝑔 ⊥=Ganho de calor solar através do vidro

Radiação incidente = T+Ai

l (2)

Onde:

 l – Radiação solar incidente;

 T – Transmissão energética global (Transmitida diretamente);  Ai – Fração da energia absorvida emitida para o interior.

O fator solar do vidro indica a fração da energia solar que efetivamente atravessa o envidraçado e é transmitida para o interior do edifício. Assim, quanto menor for o fator solar do vidro, menor será a quantidade energia através deste. Por outro lado, o g⊥ é condicionado pelo ângulo de incidência solar, condições de convecção natural pelo exterior, velocidade do vento e espessura do vidro. No mercado é comum encontrar fatores solares para os vidros que variam entre 0,10 (vidro duplo de cor azul com controlo solar) e os 0.90 (vidro simples claro) [33].

O coeficiente de transmissão luminosa (tv) representa a percentagem da luz visível que é transmitida para o interior do edifício, através do vidro. Vidros com um elevado coeficiente de transmissão luminosa são vidros com um aspeto transparente e que proporcionam ao utilizador uma boa iluminação natural, permitindo vistas para o exterior inalteradas. Vidros com um reduzido coeficiente de transmissão luminosa são geralmente usados quando se verifica a existência de problemas de encandeamento graves. Por outro lado, ao não permitirem a entrada de luz visível, criam ambientes interiores com iluminação natural insuficiente, principalmente, em condições meteorológicas de baixa radiação solar. Assim, o vidro com um reduzido coeficiente tv é inadequado para a maior parte das aplicações de iluminação natural, uma vez que não permitem a entrada de luz natural suficiente para um correto e adequado desempenho de tarefas visuais típicas, havendo quase sempre a necessidade de utilização da iluminação artificial para complementar períodos diurnos. Em termos práticos, os valores dos fatores de transmissão luminosa podem oscilar entre os 5% (vidro duplo de cor azul) e os 91% (vidro simples claro) [33]. O coeficiente de reflexão luminosa (rv) expressa a capacidade de um determinado vidro se comportar como um espelho. Este coeficiente do vidro representa a parte visível da radiação incidente no vidro que é refletida para o exterior. Um vidro com elevado coeficiente rv permite, no horário diurno, uma boa visão do interior para o exterior e refletância do exterior do edifício. No período de noite, estas características invertem-se. Todos os vidros lisos são refletivos, embora seja possível efetuar vários tratamentos de forma a aumentar essa refletância, tais como, a deposição superficial de filmes metálicos. Vidros com elevada refletância possuem uma reduzida transmitância, apresentadas desvantagens inerentes a esta propriedade (ambiente interior com reduzida luz natural). Em termos práticos, os valores

de reflexão luminosa podem ir dos 5% (vidro simples incolor) até aos 60%, com utilização de películas de proteção na superfície exterior do vidro [33].

A Seletividade Espectral refere-se à capacidade de um determinado material envidraçado responder de modo diferente a radiação de diferentes comprimentos de onda ou, por outras palavras, um vidro espectralmente seletivo ideal permite a transmissão abundante de luz visível e rejeita o calor associado à radiação infravermelha. A seletividade espectral é avaliada através do Coeficiente de Seletividade Espectral (CSE) que se define como sendo o quociente entre a transmitância visível e o fator solar, ou seja:

𝐶𝑆𝐸 =𝑇𝑣

𝐹𝑆 (3)

Valores do CSE superiores a 1,2 indicam uma seletividade espectral crescente. Novos tipos de envidraçados, comercialmente disponíveis, possuem esta propriedade, permitindo que o controlo solar possa ser efetuado por vidros praticamente incolores. Um vidro com uma Tv relativamente elevada e um baixo FS indica que é espectralmente seletivo. Este tipo de vidros possuem uma camada de um filme fino (responsável pela seletividade espectral) e uma cor neutra ou levemente azul esverdeada.

O Coeficiente de transmissão térmica (U) representa um dos parâmetros mais importante num estudo que envolva fluxos de calor. No caso de um envidraçado, este coeficiente quantifica o fluxo de calor que o atravessa, provocado pela diferença de temperatura entre as zonas que separa, normalmente o interior e o exterior do edifício. Este coeficiente entra em consideração com os três mecanismos de transferência de calor: condução, convecção e radiação de grande comprimento de onda. Em termos físicos, o coeficiente de transmissão térmico, expresso em W/m2.˚C, representa o fluxo de calor (em Watt) por hora e por metro quadrado de envidraçado, considerando uma diferença de temperatura de 1 ˚C entre o interior e o exterior. O coeficiente de transmissão térmica é inversamente proporcional à resistência térmica (R). Assim, quanto maior for o coeficiente de transmissão térmica, menor será a sua resistência térmica (isolamento) isto é, maior será a quantidade de energia transmitida. O coeficiente de transmissão térmica (U) de todo o sistema de vão envidraçado depende do tipo de vidro, do material de caixilharia e das respetivas áreas, podendo ser determinado através da seguinte expressão [34]:

𝑈 =Ac×Uc+Av∗Uv+Lv∗ѱAc+Av [W/m2.˚C]

(4)

Onde:

 Ac – Área visível de caixilharia [m2];

 Uc – Coeficiente de transmissão térmica do caixilho [W/(m2.˚C)];  Av – Área visível de vidro [m2];

 Uv – Coeficiente de transmissão térmica do vidro [W/ (m2.˚C)];  Lv – Perímetro de vidro visível [m];

 ѱ– Coeficiente de transmissão térmica linear [W/(m.˚C)].

A cor dos envidraçados afeta a aparência das vistas do exterior (vidros bronze tornam sombrios os dias de céu limpo, por exemplo) e a aparência das superfícies e objetos interiores. Os vidros com tonalidades fortes (bronze, verde escuros, etc.) podem alterar significativamente a aparência das cores no interior.

Existe uma correlação estreita entre a cor dos envidraçados e as suas propriedades fotométricas; de um modo geral quanto mais escura for a cor mais baixa será a transmissão da radiação visível e consequentemente maior poderá ter de ser o recurso à iluminação artificial.

Atualmente o mercado relativo a vãos envidraçados oferece um conjunto alargado de soluções aplicáveis em edifícios, para as mais variadas funções/finalidades e com diferentes valores característicos de coeficiente de transmissão térmica (U), fator solar (g⊥) e fator de transmissão luminosa (tv). As características de comportamento térmico e ótico do vidro são, para qualquer projetista, noções imprescindíveis à otimização e dimensionamento dos vãos envidraçados, na conceção de um edifício. Tal como as características técnicas dos vidros, as caixilharias também sofreram uma grande evolução tecnológica ao longo dos últimos anos. A estanquicidade da caixilharia constitui uma das evoluções positivas, permitindo controlar, de forma eficaz, as trocas de calor e frio entre o interior e o exterior. Contudo, a estanquicidade obriga a definição de uma estratégia de ventilação natural, no sentido de garantir as renovações de ar, essenciais para a salubridade do ar interior (através de aplicação de caixilharia mais estanque, grelhas de ventilação, incorporadas no vão envidraçado, ventilação mecânica adequada). Atualmente as caixilharias mais frequentes no mercado são em alumínio, pvc e madeira. A seleção exigêncial de um vão envidraçado, de forma a obter um bom desempenho poderá passar pela análise dos seguintes parâmetros: permeabilidade ao ar, estanquidade à água, resistência e deformação ao vento, coeficiente de transmissão térmica, fator solar, coeficiente de transmissão luminosa, segurança contra incêndios (reação ao fogo), ventilação, segurança contra vandalismo e intrusão, e índice de redução sonora ponderado.

Em Portugal, o Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Habitação, com a portaria nº 349-B/2013 do Decreto-Lei n.º 118/2013,estabeleceu que, nenhum vão envidraçado da envolvente de qualquer edifício com área total superior a 5% da área útil de pavimento do espaço que serve, desde que não orientado a Norte (entre Noroeste e Nordeste), pode apresentar um Fator Solar (FS) correspondente ao vão envidraçado com o (s) respetivo (s) dispositivo (s) de proteção 100% ativo (s) que exceda os valores indicados no Quadro 2.6, função do tipo de inércia e da zona Climática de Verão (V1,V2,V3).

Quadro 2.6 – Exigências do fator solar máximo admissível [35]

Classe de Inércia Térmica

Fator solar máximo admissível

V1 V2 V3

Fraca 0,15 0,10 0,10

Média 0,56 0,56 0,50

Forte 0,56 0,56 0,50

Todavia, o Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Habitação, estabeleceu através da portaria nº379-A/2015 de 22 de Outubro, coeficientes de transmissão térmica superficiais máximos admissíveis para os vãos envidraçados em função da zona Climática de Inverno (I1,I2,I3), que constam no Quadro 2.7. O cumprimento dos requisitos previstos poderá ser avaliado tendo em conta o contributo de eventuais dispositivos de proteção, podendo basear-se no respetivo valor de Uwdn (coeficiente de transmissão térmica médio dia-noite do vão envidraçado).

Quadro 2.7 – Coeficientes de transmissão térmica superficiais máximos admissíveis para os vãos envidraçados em Portugal Continental e Regiões Autónomas [31]

Coeficientes de transmissão térmica superficiais máximos admissíveis para os vãos envidraçados (Portas e Janelas) – Uw [W/(m2.˚C)]

I1 I2 I3

2,80 2,40 2,20

Dando resposta às necessidades de melhor caracterizar os vãos envidraçados e permitir assim também promover a melhoria do desempenho térmico dos vãos envidraçados, por vezes torna-se necessário recorrer a programas de cálculo automático que permitam quantificar as características térmicas dos vãos envidraçados de um edifício. Estes softwares facilitam a caracterização de determinadas características dos vãos envidraçados, isto porque permite contornar um problema que é a complexidade e a duração dos cálculos exaustivos, diminuindo também a probabilidade de erros. Atualmente, existem inúmeros programas de cálculo, entre eles destacam-se Wis e Window 7.4. Para a presente dissertação foi utilizado o software Window 7.4, de modo a obter alguma sensibilidade para caracterização de algumas propriedades relativas aos vãos envidraçados. Deste modo, tendo em atenção à exaustiva lista de vidros existente no mercado, foram selecionados algumas tipologias mais correntes de vãos envidraçados decorrentes na construção em Portugal, que serão abordadas no capítulo 4 (subcapítulo 4.2.3.).

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SISTEMAS SOLARES PASSIVOS