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2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO CONCEPTUAL

4.4. P ROJETOS EM D ESENVOLVIMENTO

4.4.1. E SPAÇO S ABERES E S ABORES

Em outubro de 2014 a pedido do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) o GSSDCR Miro cedeu a cozinha da sua sede para a realização de uma formação na área da agricultura biológica, produção de doces, compotas e licores. Esta encontrava-se praticamente intacta desde a mudança de instalações, embora utilizada por Elisabete Henriques, que ali fazia enchidos e broa, para consumo do grupo e para venda, bem como refeições para fora. Foram cerca de 24 pessoas que estiveram em contexto de formação até fevereiro de 2015. Finda a formação e até ao mês de junho, 5 pessoas ficaram a fazer um estágio, ao mesmo tempo que fizeram algumas plantações e uma pequena estufa. Dessas 5 pessoas, o GSSDCR Miro aceitou uma, de nome Anália Simões, para desenvolver o projeto de Saberes e Sabores. A esta juntou-se precisamente Elisabete Henriques, que Manuel Nogueira considera ser um caso social, uma vez que, quando o grupo lhe deu a mão, se encontrava abandonada pela família – não tinha contacto com os pais e tinha o marido preso – e estava desempregada. O grupo deu-lhe então oportunidade de emprego no restaurante do Complexo Turístico da Serra da Atalhada, durante o tempo que esteve a explorar esse espaço, com o principal objetivo desta ter condições para poder reaver os filhos, que lhe tinham sido retirados e estavam aos cuidados de uma irmã. Nas palavras de Manuel Nogueira “quando fechámos o complexo

turístico da Atalhada, não a quisemos mandar embora (…) fácil era mandá-la embora, para

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nós era um alívio, era menos um ordenado, mas lá vinha outra vez o problema social, lá vinha outra vez o tribunal a tirar-lhe os filhos” (E319). Posto isto, em maio de 2014, com a cozinha da sede totalmente inativa, Elisabete Henriques fez dela o seu posto de trabalho. Assim, a cozinha que em tempos servia o Serviço de Apoio Domiciliário, nos últimos tempos servia refeições por encomenda, pelas mãos de Elisabete Henriques, e a partir de junho de 2015, passou a ser a sede dos Saberes e Sabores. Ao saber de experiência feito de Elisabete, juntou-se o conhecimento adquirido por Anália Simões na formação do IEFP e durante o estágio, para fazer nascer um novo espaço que tem procurado o sucesso. Juntas, para além do que Elisabete Henriques já fazia, passaram a fazer bolachas com ervas aromáticas, a juntar ervas aromáticas ao sal, folares da páscoa, compotas e licores, tudo isto de forma artesanal. Os produtos são vendidos dentro do Grupo, para o exterior e nas feiras artesanais em que têm vindo a participar, nomeadamente a feira de São Pedro de Alva, a da escola de hotelaria, em Coimbra e a feira de Oliveira do Hospital. Para além de permitirem as vendas, as feiras revestem-se de uma importância capital, pois funcionam como forma de divulgação dos seus trabalhos e da marca Miro, uma vez que todos estes os produtos artesanais recebem este nome. A marca Miro foi exatamente criada depois de ter nascido o espaço Saberes e sabores, pela necessidade de dar um nome aos produtos.

Figura 3: Produtos gastronómicos e artesanais: em cima, à esquerda, produção de broa; em cima, à direita, produção de enchidos; ao

centro, à esquerda, plantações de ervas aromáticas; ao centro, à direita, bolachas com flor de sal e sal com ervas aromáticas; em baixo, à esquerda licores; em baixo, à direita, compotas.

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Quer Elisabete Henriques, quer Anália Simões trabalham a tempo inteiro neste espaço, sendo que ambas são funcionárias do GSSDCR Miro.

Tal como Elisabete, também Anália, que era distribuidora de pão, estava desempregada. Durante dois anos recebeu o subsídio de desemprego, tendo passado muito tempo em formação.

Como Anália Simões diz “hoje, com a minha idade, também já não é fácil entrar no mercado

de trabalho, com a crise em que estamos. Tentar fazer tudo por tudo para que as coisas resultem para dar continuidade ao meu posto de trabalho, aqui. Uma coisa é nós termos 20 anos, outra coisa é termos a minha idade, 47 anos. Temos tentar arranjar maneira de darmos continuidade à nossa vida profissional porque se não for assim estas oportunidades que a gente tenta agarrar com unhas e dentes, não é fácil”(E620). Assim, abraçou este projeto que lhe trouxe uma oportunidade única, tal como a própria afirma “gosto muito do trabalho e

gosto de sentir que as coisas vão lá para fora e que se vendem e que estão a resultar”(E621). Da entrevista com Anália Simões, percebe-se ser uma mulher com querer, que percebe a oportunidade que teve e a agarra com convicção, tudo fazendo para que tudo dê certo, como se pode ver nas palavras de Manuel Nogueira: “agora Anália tens que trabalhar para ele,

tens que dar o máximo, precisamos de inventar, de vender, de ir a feiras, precisamos de mostrar” (E122

).

Este projeto acarreta igualmente algumas dificuldades, uma vez que começar de novo, mais a mais numa determinada fase da vida, não é fácil. Anália Simões falou, na entrevista das dificuldades que sente “É claro que não é fácil, eu nunca estive a fazer nada disto na

minha vida, é tudo novo. (…) Eu não fiz disto a minha vida, não fiz disto a minha profissão, o pouco que eu sabia era daquilo que eu já fazia em casa com os meus pais e com os meus avós; porque a minha vida nunca foi esta. Podia fazer algumas compotas, broa, mas tudo muito caseiro, nunca em contexto profissional”(E623). De facto, a perspetiva de produção ao

nível profissional acarreta uma dimensão de muito maior responsabilidade do que fazer o mesmo serviço amadoramente. Ao mesmo tempo confere um objetivo à vida, atribui-lhe sentido e faz pensar que realmente é preciso investir todas as energias para ter sucesso. Uma das preocupações que foram manifestadas prende-se também com os conhecimentos adquiridos ao longo da formação, mostrando a necessidade do saber, na dimensão do fazer. A 20 E6 – Anexo A, Entrevista 6 21 E6 – Anexo A, Entrevista 6 22 E1 – Anexo A, Entrevista 1 23 E6 – Anexo A, Entrevista 6

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qualidade, o aspeto e a conservação dos produtos, são exatamente facetas do trabalho que desenvolvem, que implicam pequenos truques, que só quem conhece é capaz de fazer.

Fazendo um balanço do trabalho que se desenvolve no espaço Saberes e Sabores, percebe-se que uma das preocupações existentes é usar sempre os produtos da cooperativa do Grupo, o que é verdadeiramente uma mais-valia, como confirma Manuel Nogueira “80% dos produtos

que chegam ao espaço são provenientes dos cooperadores” (E624). Do mesmo modo Anália Simões afirmou que “através das feiras damos a provar os nossos produtos a pessoas que

não tem nenhuma ligação connosco, que facilmente dizem aquilo que pensam; e gostam. Apreciam principalmente as bolachas, acham um produto diferente, são sabores que não se encontram nas prateleiras do supermercado. (…) Gostam dos enchidos, como são curados com lenha, não têm nada a ver com os enchidos comprados no supermercado (…) As compotas também, com sabor de fruta caseira, que acabam por dar um sabor mais intenso”(E625

), quando lhe foi pedido que fizesse um feedback da sua experiência e mostrando o interesse que os produtos vão tendo, não só no espaço da instituição, como exteriormente, no mercado – revelando o êxito desta iniciativa.

No sentido de garantir o crescimento da marca, é objetivo do projeto expandi-la agora para lojas da região que tenham já uma linha gourmet.