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3. UM BREVE HISTÓRICO DO TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

3.3. A EDUCAÇÃO DE CRIANÇAS COM TEA

Considerando os debates sobre a escolarização de crianças com TEA, Bragin (2010) ressalta a dificuldade em encontrar textos abordando a historicidade da escolarização de crianças com TEA. Pode-se destacar que, entre os anos de 1963 e 1983, o principal meio de atendimento a crianças com autismo era através da educação. Porém esta área era utilizada

como meio de doutrinação dos corpos, modificação dos comportamentos, terapias e programas para o desenvolvimento dessas crianças em escolas especializadas criadas por familiares dos próprios sujeitos com autismo.

No Brasil, a primeira escola criada especificamente para o atendimento de alunos com autismo “[...] foi a AMA de São Paulo, que foi fundada por um grupo de pais de crianças autistas, no dia oito de agosto de 1983.” (BRAGIN, 2010, p. 02). Conforme dados retirados diretamente do site da própria instituição12, a AMA – Associação de Amigos do Autista –

nasceu a partir do desejo de pais de familiares de crianças com autismo de ter um futuro para seus filhos, já que na época não haviam pesquisas e tratamentos em nosso país que atendessem essas crianças. Já nos anos iniciais da instituição, a AMA recebeu um espaço no quintal de uma igreja, cedido pelo pai de um garoto com Síndrome de Asperger, para que pudesse instalar sua escola.

Segundo o site, inicialmente a instituição – beneficente e sem fins lucrativos – tinha muita dificuldade em obter recursos para se manter aberta. Atualmente o quadro é outro, oferecendo atendimento gratuito e recebendo apoio das Secretarias de Estado de Educação e da Saúde. Mesmo com esse apoio, se torna necessária a arrecadação de dinheiro para compra de alimentos, materiais pedagógicos, capacitação de funcionários, manutenção de equipamentos, entre outros.

Até o ano de 1988, a instituição teve dificuldades para encontrar metodologias adequadas para trabalhar no desenvolvimento de crianças com TEA, indo buscar por novas atividades e conhecimentos em outros países que já tinham associações com o mesmo objetivo que a AMA. Nesta época, um programa de ensino comportamental vinha sendo implantando no exterior, o TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Communication Handicapped Childrem). Atualmente, este é um método utilizado em muitas escolas de educação especial no Brasil.

É possível perceber que o Transtorno do Espectro Autista passou por muitas etapas até o seu reconhecimento e categorização no Manual de Diagnósticos, e que, mesmo sendo reconhecido como transtorno, ainda hoje é pouco compreendido no sentido de que ainda há uma lógica de generalização em que todas as pessoas com esse diagnóstico são vistas como se tivessem as mesmas características. Desse modo, essa lógica as aprisiona nas características do transtorno, já que ainda são vistas como alheias ao momento presente e muitas vezes tratadas de forma estigmatizante pela sociedade. Muito desse entendimento social de

incapacidade e diferenciação vem do próprio DSM-V, que até certo ponto coloca esses sujeitos como desiguais, e também da lógica da medicalização, em que a medicação é posta como alternativa de contenção dos corpos e sujeitos. Isso se dá, muito por conta do capitalismo, que faz com que haja a necessidade de aumentar cada vez mais o lucro das indústrias farmacêuticas, muitas vezes, sem considerar as consequências que os corpos sofrem.

Destarte, é necessário refletir sobre até que ponto a medicação seria a alternativa mais eficaz, considerando a quantidade de possibilidades de intervenções, principalmente no ambiente escolar, que possui uma diversidade de espaços, experiências e construção de relações e interações com o outro, oportunizando ao sujeito situações de autoconhecimento e reflexão a partir das relações que estabelece nesse ambiente. Além disso, devemos nos questionar como esse diagnóstico é entendido e como ele é recebido pelos professores, se de forma a limitar o sujeito ou como forma de auxiliar a compreender seus comportamentos e dificuldades.

Apesar da dificuldade em encontrar textos que apontem as características do TEA como instrumento potencializador na elaboração da prática pedagógica, ou seja, uma literatura e prática que sequer fala desses indivíduos como sujeitos pedagógicos, entendo que esses estudantes têm a possibilidade de se desenvolver e aprender, desde que o professor perceba a importância de ter um planejamento e uma prática pautados na flexibilização, num sentido não de promover atividades individualizantes e diferenciadas para essa crianças, mas sim a construção de atividades que sejam possíveis e feitas por todos os estudantes e que ao mesmo tempo contemple o sujeito com TEA em sala de aula.

O texto de Chiote (2012) sinaliza a problematização em relação ao sentido dado ao diagnóstico e as possíveis práticas que podem ser promovidas dentro do ambiente escolar para contemplar e auxiliar o desenvolvimento dos sujeitos com TEA. Tal texto discorre acerca da brincadeira com as crianças com autismo e a mediação pedagógica do professor nessa ação. Neste sentido, utiliza como argumento que a criança aprende através das relações que estabelece com os mais experientes, sejam eles adultos ou crianças, tendo como principal fundamento a teoria histórico-cultural de Vygotsky. Considerando que as interações dentro da instituição escolar são limitadas de acordo com o diagnóstico recebido e que acaba ocorrendo um baixo investimento nessas interações, Chiote (2012) propõe a discussão da teoria histórico-cultural como proposta de práticas inclusivas dessas crianças e que propiciam o desenvolvimento social, sensorial, motor e cognitivo desse sujeito, por meio da interação com seus pares.

Neste sentido, torna-se relevante refletirmos sobre como esse diagnóstico de TEA é entendido pelos professores e como ocorre a construção de práticas pedagógicas com esses sujeitos. O diagnóstico é uma forma de reduzir o sujeito ao seu quadro nosológico? Como o sujeito é pensado e compreendido a partir do momento que o professor tem acesso a essa informação? E as práticas pedagógicas, são pautadas no diagnóstico ou no sujeito em si?