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2 CICLO DA POLÍTICA PÚBLICA E EDUCAÇÃO INFANTIL NO

2.2 Educação Infantil: infância, criança e apontamentos legais

Para compreender os movimentos das instituições e das mudanças políticas atuais na educação infantil, faz-se necessário o registro das concepções de infância, de criança, de educação e de educação infantil que embasam este trabalho. Consideramos que há uma complexa teia de relações que deram origem e sustentam as discussões nessa área. Isso porque, uma vez que as políticas são construídas por diversos atores sociais com perspectivas diversas, entendemos que são permeadas por diversas bases epistemológicas. Além disso, identificamos que as reflexões acerca dos processos culturais foram elementos fundamentais para analisar as relações étnico-raciais na educação infantil. Portanto, para apresentar os construtos teóricos e as mudanças políticas que fundamentam o campo da discussão acerca da infância, da criança, da educação infantil e da cultura, mesmo sabendo que tratam-se de linhas teóricas com concepções distintas, recorremos a diferentes pesquisas na área das Ciências Humanas que compõem os Estudos da Infância, quais sejam: historiografia, sociologia da infância e das crianças e da psicologia histórico-cultural.

Na historiografia internacional, Ariès (1981), pioneiro dos estudos acerca das crianças e da infância, afirma, por meio da análise de obras de arte, que da Idade Média até o século XII a infância não era visibilizada ou representada. O autor esclarece que no século XIII começaram a ser tratadas como adultos em miniatura, não sendo consideradas em suas especificidades. Ariès (1981) afirma, ainda, que no século XVI, com as mudanças da Idade Moderna, iniciou-se a construção do “sentimento de infância”. A partir daí, foram pensadas roupas específicas e orientações acerca da convivência social da criança; quando ocorreu a criação de locais destinados à educação que, inicialmente, eram frequentados apenas pelas crianças da elite e, a partir do século XVIII, popularizou-se por todas as classes.

Ao buscar referências que pudessem nos aproximar da história das crianças no país, identificamos uma trajetória de violência e exploração desde os navios portugueses direcionados ao Brasil no século XIV. Nesse sentido, Ramos (2013) utiliza outras fontes históricas como, por exemplo, contos, registros da economia, relatos dos naufrágios, para

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apresentar dados que, para nós, revelam contradições da teoria de Ariès (1981) no que refere à condição das crianças desde o século XIV. De acordo com Ramos (2013), as embarcações portuguesas se valiam também do trabalho infantil e eram vistas como formas de ascensão social tanto para aquelas advindas das famílias dos estratos sociais mais baixos, como para algumas de classe mais favorecida. Para a realização desse trabalho, eram recrutadas crianças que, de acordo com suas origens, recebiam papéis sociais distintos, configurando-se grumetes, pajens, órfãs do Rei ou passageiros.

De acordo com o autor, as crianças pobres na Europa eram vistas, tal qual os negros escravizados, em condição próxima a de animais falantes. Em função da falta de mão de obra adulta e de baixa expectativa de vida das crianças, elas eram vistas como instrumentos de trabalho, cuja força da mão de obra deveria ser explorada ao longo de suas curtas vidas. Assim, crianças com idade abaixo de 12 anos até adolescentes de 16 anos, órfãs desabrigadas, ou as filhas de famílias em situação de rua nas áreas urbanas, ou ainda, as raptadas de famílias judias eram recrutadas pela Coroa para o trabalho nas embarcações destinadas ao Brasil e às Índias, quando trabalhavam como grumetes. Neste contexto, Ramos (2013) registra dois tipos de relações dos adultos com as crianças: a relação das famílias em situação de rua, que não apresentava sentimentos dos adultos para com as crianças e as viam apenas como problema econômico que poderia ser solucionado com a mão de obra nas embarcações, quando geravam lucro à família ou deixavam de gerar despesas; e, a relação das famílias judias que demonstravam afetividade pela criança e sofrimento diante de seus raptos.

O autor relata que o trabalho no navio, considerado como a principal escola para essas crianças, apesar de penoso, era compreendido como forma de ascensão social, pois, se sobrevivessem poderiam fazer carreira na Marinha utilizando suas formações práticas e ocupar os demais cargos, embora muitos não conseguissem chegar ao cargo de pilotos pela falta do domínio da leitura.

Já os pajens, de acordo com Ramos (2013), eram crianças recrutadas de algumas famílias pobres portuguesas, mas em maior parte dos setores médios urbanos e alguns filhos de oficiais. A intenção das famílias era de que seus filhos fossem inseridos na expansão marítima e ascendessem socialmente, revelando outra forma de preocupação e relação afetiva com as crianças à época. As condições de vida dos pajens eram menos difíceis que as dos grumetes, pois realizavam tarefas menos arriscadas e recebiam certa proteção dos oficiais.

O autor registra que as órfãs do Rei eram meninas órfãs entre 14 e 16 anos que eram mandadas para o Brasil com destino ao casamento com portugueses solteiros de baixa nobreza. Ramos (2013) apresenta, ainda, a figura das crianças passageiras dos navios, que

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eram filhos dos oficiais que não possuíam obrigações e os acompanhavam para aprender o ofício e as crianças de até cinco anos que acompanhavam seus pais, cujas condições de vida estava relacionada à classe social de sua família, sofrendo mais as de origem subalterna e menos os filhos da elite. O autor afirma que as crianças eram as primeiras a sofrer com as mazelas das naus e, por isso, com as altas taxas de mortalidade e quando sobreviviam, passavam por difícil processo que lhes cobrava o abandono de suas condições de crianças para assumirem a conduta de adultos.

Assim, compreendemos que apesar dos registros relacionados ao sentimento de adultos em relação ao afastamento compulsório de seus filhos, seja pela mortalidade infantil ou por conflitos sociais conforme os descritos por Ramos (2013), as histórias dos grumetes, dos pajens ou mesmo dos filhos dos oficiais nas embarcações e, depois, das crianças filhas dos escravos, evidenciam o lugar social das crianças. Tais registros revelam que o papel social das crianças foi, por muito tempo, relacionado ao trabalho pela perspectiva da concepção de que deveriam aprender ofícios úteis à sociedade que seriam melhor desempenhados na vida adulta. Isto porque, mesmo em situações sociais diferentes, as crianças participavam da tripulação e da vida social na colônia na condição de aprendizes. A exploração de diversas naturezas ocorreu sempre no âmbito das relações estabelecidas em função de sua característica de fragilidade física, advinda de sua condição etária.

Diante das funções atribuídas às crianças, compreendemos que desde o período colonial elas foram percebidas, no Brasil, como seres que se diferenciavam do adulto. Logo, sua condição biológica, associada ao seu período da vida, era considerada no estabelecimento de seu lugar social de aprendizes. Diante disso, identificamos que as concepções de criança, infância e educação estão relacionadas, ao longo do tempo, entrelaçadas no bojo dos contextos históricos. Nesse sentido, apresentamos apontamentos históricos e teóricos desta tríade para compreender como elas se constituem no campo das políticas públicas.

Abramowicz et al (2011), por meio de pesquisa sobre a iconografia de crianças no Brasil nos séculos XIX e XX, notaram que os assuntos tratados referiam-se a modos de educação e cuidados que se diferenciavam considerando gênero, cor e classe social:

[...] encontramos assuntos referentes ao como educar as crianças, o que fazer com elas, como medicá-las, higienizá-las, ou seja, assuntos sobre a maneira pela qual a criança deve ser construída, educada, civilizada, alimentada, etc. Ou melhor, assuntos sobre como “produzir” determinado tipo de crianças, que práticas e discursos devem incidir sobre os adultos, de maneira a afetar e se estender sobre as crianças para a solução de uma certa maneira de ser e de viver como as crianças e consequentemente de ter e construir uma infância. Neste período (...) havia uma

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forma de ser menina e de ser menino, negro e branco, pobre e rico (ABRAMOWICZ

et al, 2011, p. 269)

De acordo com Maciel e Neto (2006), a Companhia de Jesus se responsabilizou pelo método educacional brasileiro até o século XVIII. Conforme exposto por Abramowicz et

al (2011), orientações de várias áreas do conhecimento se dedicavam a preparar as crianças

ensinando-lhes códigos de comportamento que eram distintos a depender da condição social das crianças e suas famílias.

Marcílio (2006) registra a forma como a sociedade procedia com as crianças órfãs. De acordo com a autora, as rodas dos expostos administradas pelas Santas Casas de Misericórdia funcionaram no Brasil ao longo do século XVIII e início do século XIX e acolhiam bebês abandonados em três cidades, sendo que nos demais municípios eles ficavam sob a responsabilidade das Câmaras, que atendia uma pequena parcela. Marcílio (2006) informa que a maioria das crianças abandonadas acabava morrendo, contudo, as sobreviventes, que não eram atendidas pelas rodas ou pelas Câmaras, eram adotadas por famílias. Os trechos seguintes evidenciam algumas condições relevantes sobre as crianças e a condição da infância pobre:

Foram poucos os casos de roda de expostos que tiveram condições de asilo para os expostos. Buscava a rodeira colocar logo o bebê recém-chegado em casa de uma ama-de-leite, onde ficaria, em princípio, até a idade dos três anos. Mas procurava-se estimular a ama a manter para sempre a criança sob sua guarda. Neste caso, e até a idade dos 7 anos, em alguns casos, e de 12 anos, em outros, a Santa Casa pagava-lhes um estipêndio pequeno. A partir daí, poder-se-ia explorar o trabalho da criança de forma remunerada, ou apenas em troca de casa e comida, como foi o caso mais comum (MARCÍLIO, 2006, p. 74 e 75).

[...]

Como as Misericórdias não podiam abrigar todas as crianças que voltavam do período de criação em casas de amas, e como estas só em minoria aceitavam continuar criando as crianças, passado o período em que recebiam salários grande parte das crianças ficava sem ter para onde ir. Acabavam perambulando pelas ruas, prostituindo-se ou vivendo de esmolas ou pequenos furtos [...] (MARCÍLIO, 2006, p. 75).

Preocupada sempre com essa situação, a roda buscava casas de famílias que pudessem receber as crianças como aprendizes – no caso dos meninos – de algum ofício ou ocupação (ferreiro, sapateiro, caixeiro, balconista etc.) e, no caso das meninas, como empregadas domésticas. Para meninos havia ainda a possibilidade de serem enviados para as Companhias de Aprendizes Marinheiros ou de Aprendizes do Arsenal da Guerra, verdadeiras escolas profissionalizantes dos pequenos desvalidos, dentro de dura disciplina militar (MARCÍLIO, 2006, p. 76).

Diante disto, compreendemos que o funcionamento das rodas dos expostos nas Santas Casas de Misericórdia e os encaminhamentos dados às crianças após completarem os sete anos de idade, contribuíram para que as desigualdades já presentes fossem mais

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fortemente instituídas. Identificamos, portanto, que a diferenciação dos códigos de comportamento utilizados na educação das crianças contribuiu, desde o Brasil colonial, para estratificação social e construção das relações de poder.

Além dessa alternativa de educação formal para as crianças, recorremos à Maciel e Neto (2006, p. 470) para registrar que a partir do século XVIII, com o advento das reformas pombalinas, que desejavam modernizar a colônia, o ensino formal tornou-se responsabilidade da Coroa Portuguesa quando “a metodologia eclesiástica dos Jesuítas é substituída pelo pensamento pedagógico da escola pública e laica”. Contudo, os autores afirmam que “[...] pode-se notar a presença, já nessa época, de dois tipos de escola (uma para os filhos da nobreza e burguesia e outra para os grupos sociais menos abastados) [...] (MACIEL; NETO, 2006, p. 472).

A partir das contribuições de Maciel e Neto (2006) e Abramowicz et al (2011), refletimos que os cuidados médicos e pedagógicos direcionados às crianças, carregam traços da desigualdade que se materializaram nas diversas áreas das relações sociais. Assim, com a educação dos jesuítas somadas às orientações da medicina, os códigos de comportamento diferenciados influenciaram em oportunidades de educação desiguais. E, por meio do disposto por Marcílio (2006), compreendemos que as companhias dos aprendizes garantiram que a desigualdade continuasse a ser implantada pelo trato com as crianças e com a infância pobre pela via da educação formal. Como ficavam em regime de internato e eram submetidas a uma condição calamitosa de atendimento e a correções físicas, identificamos que a escravidão continuava a ser reproduzida naqueles espaços.

Ainda em relação aos processos educativos destinados às crianças, de acordo com Kuhlmann Jr. (2000, p. 8), as creches começaram a se difundir no Brasil a partir da década de 1870 e, já no início do século XX, previa uma educação assistencialista, de baixo custo, promovendo a “pedagogia da submissão, que pretendia preparar os pobres para aceitar a exploração social”. O autor esclarece que houve no período do governo militar, de 1975 a 1985, intenções divergentes entre a perspectiva governamental e a dos movimentos sociais em relação à relevância da educação infantil:

As instituições de educação infantil tanto eram propostas como meio agregador da família para apaziguar os conflitos sociais, quanto eram vistas como meio de educação para um a sociedade igualitária, como instrumento de libertação da mulher do jogo das obrigações domésticas, como superação dos limites da estrutura familiar. As idéias socialistas e feministas, nesse caso, redirecionavam a questão do atendimento à pobreza para se pensar a educação da criança em equipamentos coletivos, como uma forma de se garantir às mães o direito ao trabalho. A luta pela

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pré-escola pública, democrática e popular se confundia com a luta pela transformação política e social mais ampla (KUHLMANN JR., 2000, p. 11).

Kuhlmann Jr. (2000) menciona que a entrada das mulheres de classe média no mercado de trabalho oportunizou que a educação infantil fosse pensada para além do atendimento aos pobres.

A partir das contribuições de Pardal (2005), Kuhlmann Jr. (2000) e Oliveira et al (1992), compreendemos o fato de que a ampliação da participação das mulheres no mercado de trabalho e as péssimas condições de trabalho oferecidas nas indústrias geraram reivindicações e greves trabalhistas que denunciavam, dentre outras coisas, o trabalho infantil e solicitavam a criação de creches para os filhos dos operários.

Para Pardal (2005), a mortalidade infantil das crianças pobres e o papel materno começaram a ser vistos de maneira diferente após a independência. A autora afirma que:

[...] no Brasil a creche teve por finalidade liberar a mão-de-obra da mãe pobre, o da escrava ou ex-escrava (PARDAL, 2005, p. 62).

[...]

A creche poderia também fornecer à classe dominante um ganho secundário. Além de libertar a mão-de-obra feminina e garantir a sobrevivência das crianças da classe trabalhadora, ela podia ser um lugar privilegiado de controle sobre essa classe. As creches e salas de asilo, portanto, com raras exceções, assumirão o caráter controlador que a filantropia delegou à escola (PARDAL, 2005, p. 70).

Por meio das elaborações de Pardal (2005), Kuhlmann Jr. (2000) e Oliveira et al (1992) compreendemos que as primeiras creches surgiram a partir da década de 1930, na perspectiva assistencialista, para atender as necessidades do mercado e da família e para controle das classes mais abastadas. Somente no fim século XX, com a Constituição da República Federativa do Brasil (5), de 5 de outubro de 1988 e com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 a criança passou a ser o sujeito central do processo educativo.

Diante desse contexto histórico, observamos que a situação das crianças pobres se configurou uma janela política para que outras questões sociais ascendessem à agenda governamental, o que pode justificar a demora para que fossem reconhecidas como atores sociais com direitos específicos.

Portanto, corroboramos com o entendimento de Sarmento (2008) e Corsaro (2011) quando se referem às crianças como um grupo subalternizado. Para isso, elas foram concebidas por muito tempo como um “vir a ser”, como aprendizes que não tinham nada a ensinar, foram exploradas e sofreram com a dominação etária, étnica, dentre outras. Elas tiveram seus corpos disciplinados sob o respaldo do Estado, que se apropriou de campos

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disciplinares como a medicina, o direito, a psicologia e a educação para perpetuar as relações de desigualdade estabelecidas desde o período colonial.

Apesar de compreendermos a importância dos dispositivos legais de 1988 e 1996, notamos que essa sobreposição das forças do adulto sobre a condição da criança não sessou e está presente em diversas esferas das relações sociais em função de sua condição etária. Diante dessa relação de dependência que subalterniza a criança, Sarmento (2008) define a infância como uma categoria geracional que depende de outras:

[...] a infância depende da categoria geracional constituída pelos adultos para a provisão de bens indispensáveis à sobrevivência dos seus membros, e essa dependência tem efeitos na relação assimétrica relativamente ao poder, ao rendimento e ao status social que têm os adultos e as crianças, sendo esta relação transversal (ainda que não independente) das distintas classes sociais. Por outro lado, o poder de controle dos adultos sobre as crianças está reconhecido e legitimado, não sendo verdadeiro o inverso, o que coloca a infância – independentemente do contexto social ou da conjuntura histórica – numa posição subalterna à geração adulta (SARMENTO, 2008, p. 22).

A partir das contribuições deste autor, consideramos que reconhecer a condição de subalternização da criança e a característica de dependência da infância em relação à outras categorias sociais, não significa afirmar que ela é apenas determinada pela ação do adulto. Nesse sentido, define infância como:

[...] esse período socialmente construído em que as crianças vivem suas vidas – é uma forma estrutural. Quando nos referimos à infância como uma forma estrutural queremos dizer que é uma categoria ou uma parte da sociedade, como classes sociais e grupos de idade. Nesse sentido, as crianças são membros ou operadores de suas infâncias. Para as próprias crianças, a infância é um período temporário. Por outro lado, para a sociedade, a infância é uma forma estrutural permanente ou categoria que nunca desaparece, embora seus membros mudem continuamente e sua natureza e concepção variem historicamente (CORSARO, 2011, p. 15, 16 – grifos do autor).

Nesta perspectiva, Sarmento (2008) esclarece que ela não depende das pessoas que a compõem, e, por isso, é estrutural, uma vez que a categoria permanece mesmo com a mudança de seus membros. É importante ressaltar que a infância não ocorre de maneira igual para todos nesse período da vida, nem apresenta as mesmas características em sociedades diferentes. De acordo com o autor, ela é homogênea e heterogênea ao mesmo tempo. A homogeneidade se trata da característica macro de categoria social geracional e da relação de dependência com outras categorias geracionais como classes, gênero e etnia.

Sobre a heterogeneidade, Siqueira (1997, p. 3) afirma que “[...] não há uma concepção de infância que possa ser universalizada, uma vez que não existe uma única

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infância, mas infâncias no plural”, isto porque o terreno em que estas infâncias são construídas se dá na contradição das classes e por aquilo que o modo econômico de produção enseja em relação às formas de sociabilidade humana.

Khoan (2004) enfatiza que:

Em certo sentido, há duas infâncias. Uma é a infância majoritária, a da continuidade cronológica, da história, das etapas do desenvolvimento, [...]. Existem também outras infâncias, que habitam outras temporalidades, outras linhas, infâncias minoritárias. Infâncias afirmadas como experiência, como acontecimento, como ruptura da história, [...]. Habitamos muitos espaços, muitas temporalidades, muitas infâncias. [...] Uma e outra infância não são excludentes. [...] Uma infância afirma a força do mesmo, do centro, do tudo; a outra, a diferença, o fora, o singular. Uma leva a consolidar, unificar e conservar; a outra a irromper, diversificar e revolucionar (KHOAN, 2004, p.4 e 5).

Desta forma, compreendemos que a heterogeneidade engloba diversas realidades situadas em tempos e contextos sociais múltiplos e trata-se de muitas infâncias particulares que compõem a categoria geracional da infância a cada momento histórico.

Sarmento (2015) trata da heterogeneidade ao afirmar que a geração da infância é marcada pela história, que, por sua vez, é constituída por crianças e adultos concebidos como atores sociais. A partir de suas contribuições, compreendemos que há uma mútua influência entre a infância socialmente instituída e as práticas sociais das crianças

Os adultos caracterizam a infância pela aplicação de processos de administração simbólica das crianças, isto é, pela indução de normas de conduta, permissões e interdições e pela configuração de imagens sociais sobre a infância. As práticas