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Ao iniciar este estudo, um dos primeiros momentos que consideramos importante é esclarecer e registrar o que compreendemos por educação no contexto contemporâneo, uma vez que essa ideia nos acompanhará – ora figurando o espaço central, ora o cenário de nossas discussões – por todo o texto. Por isso, desencadeamos a discussão teórica manifestando que educação será tratada a partir da perspectiva que aborda o indivíduo como ser integral, na qual a formação do homem, seu amadurecimento como consequência do viver e a cultura tornam-se a sua finalidade.

Diante dos desafios da atualidade, quando o desenvolvimento econômico, científico e tecnológico e a globalização marcam o início do século XXI, em companhia das crises sociais, angústias, aflições, isolamento humano e carência de solidariedade, a educação emerge como uma possibilidade potencial de favorecer a transformação, especialmente, nas ideias de paz, esperança e justiça social, nas quais todos sejam livres e capazes de conviver conscientemente entre indivíduos, grupos e sociedade (DELORS, 1998).

Segundo Morin, Ciurana e Motta (2003), a missão da educação para a contemporaneidade, onde além da diversidade de culturas há pluralidade de fontes de inovação e de criação em todos os domínios – momento chamado de Era Planetária pelos autores – “é fortalecer as condições de possibilidade da emergência de uma sociedade/mundo composta por cidadãos protagonistas, conscientes e

criticamente comprometidos com a construção de uma civilização planetária” (2003, p. 98).

Com a ampliação do acesso às tecnologias digitais, à internet e a partir das transformações nas relações entre os sujeitos advinda desse acesso de forma contínua – tais como a popularização, aproximação e alcance à informação, expansão e alteração de fronteiras territoriais e redimensionamento das relações dos sujeitos com o tempo – é importante repensar o papel da educação, da escola e dos que dela fazem parte – professores, alunos, gestores, comunidade. Como alguns dos aspectos que caracterizam as demandas educacionais atuais consideramos os quatro pilares da educação contemporânea, definidos no relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o século XXI (DELORS, 1998) e que são: aprender a conhecer; aprender a fazer; aprender a conviver (viver juntos) e aprender a ser.

Embora Delors (1998) discuta os pilares como competências a serem ensinadas/desenvolvidas, destacamos que não é neste sentido que tratamos deles. Enfatizamos que este autor aponta ações/condutas que nos parecem importantes e que podem auxiliar a pensar a educação em uma perspectiva ampliada, além da que é possível observar como vigente. A autonomia limitada dos sujeitos que reproduzem, sem criticidade, modelos propostos por minorias dominantes, a dificuldade crescente em lidar com situações cotidianas, especialmente quando ligadas ao viver junto, ao relacionar-se com o outro, dificuldade de identificar o outro como ser humano e de viver respeitosamente em sociedade, são elementos que apontam para necessidade de repensar as formas de educar para formação de cidadãos plenos e os quatro pilares parecem nos oferecer alternativas que ultrapassem essa situação.

Ao apreciarmos o primeiro pilar citado aleatoriamente, aprender a conhecer, entendemos que cada indivíduo é capaz de compreender o mundo em que vive na medida em que isso lhe é necessário para viver com dignidade e com o desenvolvimento de suas capacidades profissionais e comunicacionais, bem como o prazer de conhecer e descobrir constantemente. Ou seja, aprender a aprender para beneficiar-se das oportunidades oferecidas pela educação ao longo da vida, considerando que o aprender e o conhecer, enquanto processos, nunca estarão

acabados e podem se enriquecer ao longo de toda a vida com experiências, estudos e pesquisas.

Observando o contexto em que vivemos atualmente, as tecnologias digitais, a comunicabilidade, a facilidade de acesso a informações e aos meios de comunicação favorecendo a colaboração entre os indivíduos, a expansão de limites de tempo e espaço podem desencadear momentos de reflexão e de revisão das formas de criar práticas educativas que vem sendo exercidas há tempo e, aparentemente, sem muito efeito. Porém, para que isso aconteça é necessário que os sujeitos estejam preparados para discernir, compreender, criticar e agir de modo consciente diante de demandas econômicas, sociais e culturais contemporâneas que envolvem, também, essa emergência das tecnologias digitais na vida cotidiana. Assim, o desenvolvimento de postura crítica e reflexiva, contemplando aprendizagens significativas e que possam ser aplicadas no cotidiano, torna-se papel da educação atualmente.

O pilar que aborda o aprender a fazer está intimamente relacionado ao anteriormente mencionado, aprender a conhecer. Segundo Delors (1998), aprender a fazer não implica, somente, a aquisição de técnicas ou procedimentos para uma qualificação profissional, mas o desenvolvimento de competências para enfrentar situações cotidianas e a trabalhar de modo colaborativo. É proporcionar aos indivíduos que saibam colocar em prática seus conhecimentos, sendo capazes de adaptarem-se ao trabalho no futuro, sugerindo inovações geradoras de novas oportunidades no mundo do trabalho. Aprender a fazer não pode ser reduzido à preparação de alguém para uma tarefa técnica específica, pois com os avanços da tecnologia – as máquinas estão cada vez mais ‘inteligentes’ – há exigência de que os profissionais sejam mais comprometidos com processos, tenham a capacidade de se comunicar com clareza, trabalhar em grupos, gerir e resolver conflitos, agindo de forma ética e moral dentro do contexto. Desse modo, aprender a fazer implica dominar intelectualmente as técnicas, participando de modo colaborativo, da criação do futuro.

O terceiro pilar discutido e indicado no relatório para a UNESCO da comissão internacional sobre educação para o século XXI, aprender a conviver (viver juntos), desperta-nos interesse neste estudo pois trata da compreensão do

outro, da percepção de interdependências das ações dos indivíduos e da importância do respeito mútuo. Sabendo que os seres humanos, de um modo geral, tem tendência a supervalorizar as suas qualidades e as do grupo a que pertencem, educar para a não-violência e para a solidariedade não é tarefa simples, especialmente se considerado o fato de que a “tendência da sociedade é dar prioridade à competição e ao sucesso individual” (DELORS,1998, p.97).

No sentido de educar para a cooperação, convivência e, com efeito, a aprendizagem de viver juntos, há duas vias complementares: a descoberta progressiva do outro e a participação em projetos comuns, nos quais seja possível encontrar objetivos pelos quais trabalhar junto, evitando e resolvendo conflitos, comunicando-se e aceitando o outro como legítimo, agindo com respeito e compreendendo as diferenças.

Aprender a ser compreende, finalmente, as especificidades do indivíduo e que precisam ser contempladas no educar o corpo, o espírito, a imaginação, a criatividade e o pensamento para que os outros pilares sejam plenamente desenvolvidos. Desse modo, “desenvolver a sua personalidade e estar à altura de agir com cada vez maior capacidade de autonomia, de discernimento e de responsabilidade pessoal” (DELORS, 1998, p. 102).

Então, observando os aspectos discutidos até o momento, percebemos a importância da construção do conhecimento para que cada um seja capaz de compreender o mundo em que vive a fim de que suas interferências neste mundo sejam convergentes para uma vida digna, de convivência pacífica, solidária, respeitosa, colaborativa e cooperativa, com domínio intelectual – compreensão consciente – de técnicas e processos. A educação neste contexto é um processo no qual corpo, espírito e pensamento se desenvolvem em função da necessidade de uma sociedade na qual os sujeitos sejam comprometidos, conscientes e protagonistas. Nestes aspectos enxergamos o que Maturana e Rezepka (2000, p.10) destacam quando falam sobre o sobre o compromisso da educação

A tarefa da educação é formar seres humanos para o presente, para qualquer presente, seres nos quais qualquer outro ser humano possa confiar e respeitar, seres capazes de pensar tudo e fazer tudo o que é preciso como um ato responsável a partir de sua consciência social.

É importante destacar que vivemos em um momento histórico no qual a sociedade pode ser considerada como a da aprendizagem, na qual aprender

constitui uma via indispensável para o desenvolvimento pessoal, cultural e mesmo econômico dos cidadãos. A educação pode ser entendida como um todo, inspirando e orientando estratégias para a vida consciente e responsável.

Como modo de ilustrar o que tratamos por educação na contemporaneidade, apontamos o que vivemos no Rio Grande do Sul com a reestruturação curricular do ensino médio porque este é um tempo no qual temos repensando as concepções de educação com as quais convivemos. A partir de plenárias locais, regionais e estaduais, promovidas com a intenção de debater a reestruturação curricular do ensino médio com a comunidade escolar, professores, CREs, Seduc/RS e instituições de ensino superior, desde o quarto trimestre de 2011 experienciamos a discussão do papel do ensino médio na formação do sujeito, que

[…] gira em torno da sua identidade como etapa final da escolaridade básica. Está em questão sua funcionalidade, organização curricular, qualidade da formação dos docentes, financiamento e, em particular, os desafios da formação humana no âmbito das grandes transformações no campo do trabalho, cultura, ciência e tecnologia que atravessam a sociedade contemporânea. (AZEVEDO; REIS, 2013, p.27)

A concepção de educação que registramos nos parágrafos anteriores parece-nos coerente com o que permeia a reestruturação curricular do ensino médio em nosso Estado. Ou seja, na proposta apresentada para a reestruturação, a etapa da educação básica relacionada ao ensino médio tem a necessidade de vinculação da educação à realidade social e ao desenvolvimento científico-tecnológico, integrando as áreas do conhecimento (linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas). Na realidade, a reestruturação prima por uma apresentação de oportunidades para desenvolvimento de projetos com atividades práticas e vivências relacionadas à vida, ao mundo e ao mundo do trabalho, além das aulas dos componentes curriculares do ensino médio, que podem ser fortalecidas no diálogo interdisciplinar (RIO GRANDE DO SUL, 2011b).