• Nenhum resultado encontrado

5 COMPREENDENDO A EDUCAÇÃO PERMANENTE PELO OLHAR

5.2 Processo de trabalho como educação permanente

5.2.3 Educação para a saúde

As categorias e subcategorias até aqui analisadas, apresentaram a Educação Permanente para os profissionais do SAMU como um caminho para o desenvolvimento do processo de trabalho, para o conhecimento técnico, ético-político, identificada como uma necessidade desses profissionais. Contudo, a educação para além destes sujeitos, indo para o âmbito da sociedade, que desconhece o serviço e o utilizam inadequadamente, foi fortemente também evidenciado nestas oficinas,

tornando-se uma subcategoria, equiparando-se às demais em sua relevância.

Precisamos entender o significado do processo educativo, das suas interferências no processo de trabalho e sua relação com a sociedade, “pois a educação se evidencia em qualquer contexto; não só nas escolas; é um processo que faz parte do social e por isso não pode ser considerada neutra em seus objetivos” (REIBNITZ, PRADO, 2006, p.131).

O termo “educação” inclui todo o processo através do qual o indivíduo (clientes e profissionais) adquire domínio e compreensão de certos conteúdos considerados valiosos para a vida social. A educação como técnica social e democrática, expressa uma concepção que influi no comportamento humano, possibilitando a este se ajustar aos padrões vigentes da interação e organização social (CEZAR VAZ et al., 2002).

Ao assumirmos uma atitude crítica, com reflexão das questões apresentadas, enfoque nas relações históricas dos fatos e análise das implicações, avançaremos para além da competência técnica que envolve os trabalhadores, mas mediante o favorecimento da reflexão acerca da realidade, o que possibilita mudanças nos sujeitos envolvidos, para além dos trabalhadores, neste caso os usuários.

Ceccim e Feuerwerker (2004, p.10) reforçam esta preocupação ao destacarem que,

a interinstitucionalidade e a locorregionalização expressam a diversidade de atores sociais envolvidos no processo da educação permanente, quer seja como dirigentes, profissionais em formação, trabalhadores, usuários das ações e serviços de saúde ou estudantes. A partir deles é que se podem definir as exigências de aprendizagem em cada equipe, serviço e esfera de gestão.

O foco nesse momento refere-se à necessidade educativa do cliente, que foi identificada como carência pelos trabalhadores de saúde do SAMU e posteriormente ser assumida como finalidade do trabalho a ser atingido. Nesta tendência, os clientes são vistos necessitando de informações acerca do serviço, numa concepção de educador e educando, na qual o produto da relação tem predominância no entendimento de suas dúvidas.

E quando eu falo que falta educação, não é só na população de baixa renda não, porque tem cidadão muito bem de vida, que desafora o profissional

médico, querendo que vá uma ambulância para atender a sua mulher que está com cistite, e quando você explica que o SAMU não serve pra isso, a pessoa pega o seu nome, diz que vai falar com o prefeito, que vai procurar os seus direitos, vai pra mídia, vai para os jornais, e o profissional do SAMU fica com “aquilo” na mão (M2).

Tu acreditas que tem gente que trabalha aqui na policlínica, que nos vê todos os dias e não sabe o nosso papel?(E1).

Entendendo a educação como um processo contínuo, que se estabelece durante toda a vida e em todos os lugares, partimos para articulá-la junto ao trabalho, como um movimento fundamental para o desenvolvimento dos trabalhadores, entretanto a sociedade também carece desse cuidado educativo e assim como no serviço, o processo deve ser uma tarefa realizável persistentemente.

Porque as pessoas precisam saber o funcionamento do SAMU, pra que serve, desde os profissionais de saúde, até a população (...) (M3).

A educação permanente não deve ser apenas pra nós, equipes, tem que ser também da população...a população tem que ser informada, de forma contínua, consistente (...) (M2).

Diante das falas é preciso reavaliar o papel da instituição SES – SAMU, quanto à responsabilidade e sensibilidade na transmissão do conhecimento e das informações; é necessário repensar o modelo, pois as pessoas são diferentes, apresentam problemas e soluções diferentes e, necessitam de informação clara para se tornarem cooperativas, manifestarem confiança e respeito durante essa relação serviço de saúde-comunidade (LEITÃO, 2001).

As propagandas na mídia, folder explicativo, talvez sejam um caminho para minimizar problemas como:

O número de trotes também é muito grande, até não estão anotando mais, de tanto que são (S1).

Os gestores devem ficar atentos para o fato de que, quanto maiores e mais velozes as mudanças, maiores a quantidade e a complexidade dos problemas a serem

enfrentados. É preciso visão de conjunto, competência técnica, consciência social, política e administrativa; neste caso, nas chamadas ao SAMU, é necessário reconhecer a existência de diferentes realidades, mantendo uma atitude aberta com respeito aos mitos, as religiões e à diversidade, para posteriormente planejar ações que dêem conta de estimular o compromisso social do usuário.

Tem gestores, até secretário de municípios, que ligam pra cá e não sabem pra que serve o SAMU, agora não sou eu que vou ter que explicar não é? O estado não pode estar omisso, tem que assumir esse papel, para que os gestores façam bom uso. O SAMU é um sistema fantástico, demasiado sofisticado, para uma população demasiadamente ignorante e mal-educada, que faz mau uso do sistema, e nós por estarmos sob pressão e não ter autonomia e segurança pra tomar decisões, muitas vezes se encaminha ambulância para coisas que não deveríamos encaminhar só pra depois não se incomodar com o nome sujo no jornal, ou o secretário reclamando, não se complicar no CRM, tem também os que usam o serviço pra se prestigiar politicamente (M2).

Com isso, percebemos que devemos entrar no mundo tecnológico com uma educação que capacite os indivíduos a responder ao avanço da tecnologia, aumentando o conhecimento para além de uma formação meramente técnica, mas também com o compromisso com a cidadania.

O êxito deste processo dependerá do espírito crítico permanente dos profissionais do SAMU, do compromisso social da instituição SAMU e do caráter coletivo das decisões dos gestores junto à equipe.

É evidente que todo o participante do processo educativo é um modificador ativo das informações apresentadas, o que significa dizer que o cliente e o trabalhador são produtores de mudanças implícitas, ou explicitas, do processo educativo. O profissional do SAMU, ao realizar a orientação oferecida ao telefone, ou na casa do paciente, além de ter ampliado seu conhecimento ético e político a partir da Educação Permanente, também possibilita esclarecer e orientar de forma ativa o cliente a partir das suas características, permitindo interações mais politizadas entre trabalhador e cliente.

A vida em sociedade nos remete á condição de sujeitos que se relacionam, precisam que tais relações sejam estabelecidas entre sujeitos iguais com direitos e

deveres iguais, ou seja, entre cidadãos. Ser cidadão pressupõe, então, a existência de uma sociedade democrática que só se constrói entre sujeitos que pensam criticamente e agem com conhecimento e autonomia. O diálogo é condição primordial para essa construção. “O diálogo pressupõe uma atitude de abertura, de compartilhamento, de troca de experiências, vivências, sentimentos, pensamentos.” (REIBNITZ; PRADO, 2003, p.27).

Algumas medidas que foram sugeridas pelos próprios profissionais envolvem o diálogo como ferramenta educativa, realizando informações sobre o SAMU à população, de modo que o usuário possa utilizá-las adequadamente e contribuindo assim para o melhor desenvolvimento do trabalho e exercício da sua cidadania. Para tanto, podem se efetivar “palestras em escolas”, fortalecer a articulação com os gestores municipais para divulgação na mídia, dentre outras maneiras.

A educação na escola, nas empresas foi o auge dos Bombeiros, atuando na prevenção das crianças, esse trotes também diminuiriam e inclusive tem pessoas que hoje trabalham na área em função de palestras nas escolas

(S1).

Nesse sentido, a educação como informação para a autonomia dos clientes e fazendo-os exercer a cidadania, possibilita segurança ao usuário quando realiza suas chamadas, adequadas para o serviço de urgência.

O ato de promover ações de saúde, no limite da educação em saúde, requer ultrapassar o próprio limite de trabalho imediato. Isto é possível se o produto do trabalho contiver a substância social da mudança desejada e necessária. É fundamental que não se dê atenção apenas às mudanças ocorridas no ambiente interno, mas fazer o ajustamento de cada órgão, ou serviço ao sistema organizacional, e este ao macrossistema social (LEITÃO, 2001).

Essa forma de apreensão da realidade aponta para a necessidade de novas elaborações do conhecimento e para o desenvolvimento de outras práticas que diferem daquelas que já construímos, e que contribuíram para reforçar o modelo vigente que não considera essa realidade adversa à maioria da sociedade. Assim, pensamos que ao modificarmos o nosso fazer, possibilitaremos abertura para a construção de uma práxis

capaz de transformar as relações sociais existentes e, entre elas, aquelas que se dão no trabalho (CORRÊA, 2005, p.130-131).

A educação, enquanto processo de reflexão e ação sobre a realidade, na perspectiva de sua transformação, e o trabalho, enquanto prática social, que também busca a transformação, podem caminhar juntos no desvelar horizontes para que a prática do serviço não seja só a replicação de conhecimentos científicos acumulados, mas um trabalho que se faz com prazer, com criatividade e segurança, tendo como finalidade a qualificação da saúde da população, incluindo nela todos os sujeitos.