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4 O CURSINHO POPULAR MIRNA ELISA BONAZZI: UMA INSERÇÃO NA

4.2 Os educadores e as educadoras populares

Muitos professores, educadores e colaboradores têm passado pelo Cursinho Popular Mirna Elisa Bonazzi. Entre os educadores e as educadoras populares que conheci, alguns ficam até hoje, outros completaram um ciclo e alguns foram passageiros. Com muitas dessas pessoas construímos laços de amizade, solidariedade, compreensão, simpatia e cumplicidade. Alguns deles tornaram-se meus guias para aprender sobre assuntos políticos e pedagógicos.

Assim, como já se mencionou, Bonaldi (2015, p. 313) distingue dois grupos de professores: os militantes e os voluntários. No entanto, o autor determina que essas duas categorias seriam “extremos opostos de um contínuo ao longo do qual os sujeitos da pesquisa estão dispostos” (BONALDI, 2015, p. 316), pois há muitas pessoas que se localizariam em vários pontos intermédios entre as duas categorias. De fato, ele mesmo definiria seu papel como um comprometimento maior daquele dos professores voluntários, mas nunca igual ao comprometimento dos professores militantes (BONALDI, 2015, p. 66). Assim, de acordo com o propósito de entender as motivações e interesses dos educadores dentro do marco da cotidianidade do cursinho, se propõe uma abordagem diferente.

Entendemos que quem se involucra em processos educativos populares e trabalho de base com movimentos sociais reivindicaria suas práticas como educador ou educadora popular. As motivações poderiam mudar de pessoa a pessoa, porém isso não determinaria completamente a participação dos sujeitos nas ações populares. As condições materiais, pessoais o políticas permitiriam garantir mais a participação e pertencia de uma pessoa a um processo de longo prazo. Partimos da ideia que quem chega a um processo de educação popular estaria procurando participar de processos de transformação social por meio da pedagogia como campo de reunião, reflexão e luta. Assim, a motivação maior seria acreditar na práxis da educação popular que nos herdou Paulo Freire, mas que pode ser recriada e reinterpretada.

O professor Cardoso (2012), em relação aos desafios das práticas pedagógicas nos cursinhos populares, nos apresenta três reflexões sobre o papel da educação nestes contextos: a construção de uma prática pedagógica própria dos cursinhos populares, uma renovação pedagógica devido a uma crise da escola pública e uma busca por saberes que incorporaria a diversidade do saber que provem dos subalternizados. A primeira reflexão, na qual vamos nos enfocar, apresentaria os cursinhos populares como “espaços privilegiados de formação de professores, alimentando experiências muito significativas que articulam projeto pedagógico, inovação metodológica, autogestão, envolvimento na organização administrativa da instituição e formação política” (p. 124). Assim, esses espaços tornar-se-iam em lugares que não somente formariam estudantes, preparando-os para um vestibular e para a vida com um pensamento crítico, senão que também locais onde os educadores realizariam suas primeiras experiências e ganhariam confiança. Deste modo, o debate sobre a formação docente chegaria a ser intrínseco aos cursinhos populares e à educação popular.

Na experiência em campo pudemos observar como alguns dos meus colegas avançariam nesse processo de adquirir experiência, ganhar confiança e se formar em aspectos político- pedagógicos. Eu mesmo tive um processo de crescimento que me permitiu entender os contextos e necessidades dos educandos, assim como entender melhor a política, a história e a sociedade brasileira. No entanto, este processo não teria acontecido de forma individual. Seria um processo coletivo construído com várias pessoas, onde seria possível identificar uma continuidade e comprometimento em um corpo que estrutura o Cursinho Popular Mirna Elisa Bonazzi.

Esse pertencimento a e permanência em um processo de educação popular também dependeria da forma como os educadores chegam ao cursinho e à Rede Emancipa. Esta maneira

de se aproximar à uma forma específica da educação popular estaria relacionada com as expectativas geradas e recriadas pelos participantes. Muitos chegam por meio do site de Internet da Rede Emancipa, por campanhas de divulgação do cursinho, pelas escolas de formação de educadores populares, indicados por conhecidos ou outros educadores e também haveriam casos de educandos que depois de completar um ciclo ou após um tempo como educandos se tornariam educadores. As motivações de cada indivíduo seriam particulares, porém seria possível identificá- las em dois grandes marcos: políticas e pedagógicas.

Entre essas motivações estariam aquelas em torno a contribuir ou fazer um retorno à sociedade. Confluem interesses em querer participar de um projeto político e pedagógico nos bairros, como uma forma de praticar ações políticas por outros meios. Também estariam as motivações de quem quer aprender ou verificar o exercício docente em espaços não burocratizados, como uma forma de constatar que seria uma atividade atraente e se enquadraria nas suas aspirações profissionais. Por último, existiriam os posicionamentos de educadores mais experientes que além de dar aulas em instituições pública ou privadas estariam tão vinculados à sua profissão que dedicariam os sábados para continuar dando aulas nos cursinhos. Assim, propomos identificar dois traços principais onde se enquadrariam as motivações dos educadores, que seriam o aspecto pedagógico e o aspecto político. Não obstante, nenhum educador ou educadora estaria motivado por questões puramente pedagógicas ou políticas, senão que harmonizariam interesses pedagógicos e políticos privilegiando algumas questões específicas.

Por exemplo, poderíamos distinguir um primeiro conjunto de educadores filiados ao PSOL que associaria seu papel no cursinho como parte da sua militância no movimento político. Aqui, a pedagogia poderia ser concebida como uma arma política de luta e transformação social. Um segundo conjunto consistiria em professores da rede pública (ou às vezes privada) que estão totalmente comprometidos com a educação. Neste conjunto, os educadores costumariam ter posicionamentos políticos que coincidem com a proposta da Rede Emancipa e que vão além das filiações no campo da política formal. Assim, o cursinho se tornaria um espaço político onde se contribuiria desde a labor pedagógica. O terceiro conjunto agruparia pessoas que queiram aprender ou procurem ganhar experiência no trabalho docente para constatar ou se dedicar de fato a essa labor dentro de seus planos profissionais futuros. Neste caso, também poderia existir um entendimento da realidade congruente com muitas outras pessoas do cursinho. Existe outro conjunto que seriam os educadores que moram na região, perto do cursinho ou em Taboão da Serra.

Eles talvez sejam os mais orgânicos e, entre eles, alguns podem também ser professores de escolas públicas, estar filiados ao PSOL ou não. Muitas das labores territoriais e administrativas do cursinho dependeriam destes educadores e educadoras. Por último, um conjunto composto por aquelas pessoas que antes foram educandos e continuaram no cursinho para tornar-se educadores populares, seja como professores na sala de aula ou como coordenadores. Assim, o cursinho também viraria um espaço popular de formação contínua.