• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 1. Efeito da concentração do ácido acético, pH e concentração celular

4 Resultados e Discussão

4.2 Efeito do pH inicial e da concentração inicial de células sobre o

acético como única fonte de carbono

Os resultados do crescimento celular (g/L) de M. guilliermondii durante 96 h de incubação em meio sintético contendo ácido acético como única fonte de carbono, com variação de pH e concentração inicial de massa seca, estão representados nas Figuras 6 e 7.

Figura 6. Curvas de crescimento (g/L) de M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa celular de 0,2, 0,5 e 2,5 g/L, pH 5,5, a 30oC, 160 rpm.

0 1 2 3 4 5 6 7 8 0 12 24 36 48 60 72 84 96 Ma ss a se ca (g/ L) Tempo (h)

Figura 7. Massa celular (g/L) de M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa celular de 0,5 e 2,5 g/L, pH 3,5, a 30oC, 160 rpm.

Houve diferença na produção de massa seca da levedura, a qual foi dependente do pH, para todas as concentrações iniciais de massa celular, sendo que para os tratamentos de concentração inicial 0,5 e 2,5 g/L, o aumento da biomassa foi bastante acentuado no pH 5,5 (Figura 6), porém para as mesmas concentrações, em pH 3,5, não houve crescimento (Figura 7).

A queda na produção de biomassa para leveduras em faixas de pH baixo e meios contendo ácido acético foi avaliada também por Chandel, Silva e Singh (2012). Os autores verificaram que em pH baixo, o ácido acético torna-se lipossolúvel e se difunde através da membrana plasmática, em seguida, dissocia-se funcionalmente devido ao pH neutro, no interior da célula, e acumula-se no citoplasma. Os prótons (H+), que são liberados no citoplasma, iniciam um processo de redução do pH da célula causando uma inibição da atividade levando a morte celular. Para a levedura aqui estudada, tal efeito deve ter ocorrido para todos os tratamentos realizados em pH 3,5. Tal efeito evidenciou um gasto energético da célula para manutenção de sua sobrevivência, devido à alta concentração de ácido acético não dissociado no meio, pois nesta forma o ácido acético pode se difundir através da membrana celular e dentro da célula provocar efeitos tóxicos (MEINANDER et al., 1994). De acordo com Sousa et al. (2012), o ácido acético,

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 0 12 24 36 48 60 72 84 96 Ma ss a se ca (g/ L) Tempo (h)

como um ácido monocarboxílico fraco com um pKa de 4,76, tem a sua toxicidade fortemente aumentada, exercendo um efeito antimicrobiano, em valores de pH abaixo de seu pKa.

A maior variação de crescimento celular foi obtida no tratamento cuja concentração inicial foi de 2,5 g/L de massa celular em pH 5,5, (Figura 6), porém em pH 3,5 e com esta concentração inicial de massa, não houve crescimento (Figura 7). Os resultados da variação da concentração de ácido acético estão demonstrados na Figura 8, onde é possível verificar que houve uma maior diminuição da concentração do ácido no meio para os tratamentos em que o pH inicial era de 5,5. Tais condições apresentam uma redução drástica do ácido no meio ocorrendo concentrações muito próximas de zero ao final das 96 h de incubação, sobretudo para o tratamento com 2,5 g/L de concentração inicial de células.

Para os tratamentos cujo valor de pH inicial era de 3,5, verificou-se ainda um consumo do ácido acético (Figura 8) mesmo não havendo crescimento celular (Figura 7). Tal efeito pode ser explicado porque em pH abaixo de seu pKa (4,76) a forma não dissociada do ácido acético entra nas células por difusão simples, e uma vez dentro da célula o ácido acético se dissocia e se o pH extracelular é menor do que o pH intracelular isso irá conduzir à acumulação de acetato e a acidificação do ambiente intracelular. Os efeitos promovidos por esses eventos são diversos, destacando-se a inibição dos mecanismos de captação de aminoácidos e metabolismo de carboidratos (SOUSA et al., 2012). Lima et al. (2004) explicaram que uma vez dentro do citoplasma, o ácido acético molecular se dissocia em cátion hidrogênio e ânion acetato que reduzem o pH intracelular e como consequência, várias vias metabólicas importantes são afetadas. Estes autores observaram ainda que as leveduras tem um sistema para manter a homeostasia de pH, que é dependente de uma enzima responsável pelo bombeamento de protóns através da membrana plasmática (H+_ ATPase). Na presença de ácido acético, as leveduras podem desviar ATP para o transporte de prótons, restringindo assim, a disponibilidade de energia para o crescimento. Estes autores verificaram uma redução de 46% na produção de biomassa em meios sintéticos contendo ácido acético (5 g/L).

Figura 8. Concentração de ácido acético (g/L) nos cultivos de M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa celular de 0,5 e 2,5 g/L, pH 3,5 e 5,5 a 30oC, 160 rpm

Os resultados quanto à velocidade específica máxima de crescimento estão apresentados na Tabela 3, na qual se pode verificar que os melhores resultados para este parâmetro foram obtidos com a concentração de massa celular inicial de 0,5 g/L (0,04 h-1), entretanto um maior incremento de biomassa celular e maior remoção de ácido acético do meio foram obtidos para o tratamento em que se iniciou o cultivo com 2,5 g/L de massa celular inicial (Figuras 6 e 8), cuja velocidade específica máxima de crescimento foi 0,0127 h-1. Preez, Meyer e Kilian (1991) encontraram uma velocidade máxima de crescimento de aproximadamente 0,06 h-1 para a levedura Candida blankii em meios sintéticos contendo ácido acético (4 g/L). Rodrigues et al. (2003) avaliaram as velocidades de crescimento e taxa de consumo de ácido acético de uma linhagem de C. guilliermondii em hidrolisados e verificaram que melhores desempenhos foram obtidos quando o crescimento do inóculo ocorreu no mesmo meio em que ocorreu a fermentação. Tal procedimento pode trazer uma melhoria nas taxas obtidas neste experimento na aplicação desta levedura em processos de detoxificação biológica de hidrolisados de bagaço de cana-de-açúcar.

Rodrigues et al. (2012) observaram uma diminuição de 23% na velocidade de crescimento de uma linhagem de Zygosaccharomyces bailii em meio sintético contendo ácido acético com variação de pH de 5,0 para 3,0. Os autores comentaram

0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0 0 24 48 72 96 Á ci d o ac é tico ( g/ L) Tempo (h) 0,5 g/L - pH 3,5 0,5 g/L - pH 5,5 0,2 g/L - pH 5,5 2,5 g/L - pH 3,5 2,5 g/L - pH 5,5

que o ácido acético afetou a eficiência de crescimento, expressa pela velocidade específica de crescimento, podendo ser explicado pelo aumento na energia gasta para reduzir a acidificação intracelular associada com a dissociação do ácido no citosol neste pH, quando comparado com o pH 5,0. Ainda segundo os autores, este efeito é também evidenciado quando se comparam os valores da taxa de crescimento específico e rendimentos. Além disso, Piper et al. (2001) afirmaram que em pH baixo, ácidos orgânicos fracos promovem o acúmulo de seus ânions no citosol, os quais não podem difundir-se facilmente pela membrana, provocando uma série de efeitos inibitórios como aumento da pressão hidrostática e da produção de radicais livres, causando um estresse oxidativo que pode afetar vários parâmetros cinéticos.

Tabela 3. Valores de velocidade específica de crescimento (µmáx, h-1) dos cultivos realizados com a levedura M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa seca de 0,2, 0,5 e 2,5 g/L, pH 5,5, a 30ºC, 160 rpm.

Concentração inicial de massa celular (g/L) µmáx(h-1)

0,2 0,0213

0,5 0,0457

2,5 0,0127

A análise estatística mostrou que houve diferença significativa nas velocidades máximas específicas ao nível de 5% entre os valores de pH e entre as concentrações de massa celular (Tabela 4). Houve também interação significativa entre os parâmetros pH e concentração de massa celular, ou seja, para cada faixa de pH avaliada existe uma concentração que resulta em uma velocidade específica diferente (Tabela 4). Para tal análise, foram considerados os resultados dos cálculos das velocidades específicas de cada repetição, tendo sido realizada uma análise fatorial (2x3) incompleta, pois para o valor de pH de 3,5 foram avaliados somente dois níveis de concentração de massa celular (0,5 e 2,5 g/L).

Tabela 4. Análise de variância das velocidades específicas de crescimento (µmáx.) da levedura M. guilliermondii crescida em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa seca de 0,2, 0,5 e 2,5 g/L, pH 3,5 e 5,5, a 30ºC, 160 rpm.

Fonte variação liberdade Graus quadrados Soma Quadrado médio F

pH 1 0,00237699 0,00237699 5697,9* Concentração massa 2 0,00055217 0,00027608 661,8* pH X Concentração massa 1 0,00059673 0,00059673 1430,4* Resíduo 5 0,00000209 0,00000042 Total 9 * Significativo a 5%

A variação de pH avaliada para todos os tratamentos ao longo do período experimental pode ser analisada nas Figuras 9 e 10. Pode-se verificar que para os tratamentos que apresentaram um maior crescimento celular (pH 5,5, Figura 9), ocorreu a alcalinização do meio, e para os tratamentos que não promoveram crescimento celular (pH 3,5, Figura 10), o pH apresentou uma variação muito pequena, em torno do pH inicial de 3,5, demonstrando que não houve variação na concentração de próton (H+) ao longo do período experimental. Isto deve ter ocorrido devido à alta concentração desta espécie química que é bombeada pela célula de dentro do citosol para o meio extracelular a fim de manter o pH intracelular, fazendo com que haja um gasto energético e reduzindo o metabolismo celular. Rodrigues et al.(2003) verificaram que em pH 3,5, a levedura C. guilliermondii apresentou baixa capacidade fermentativa que pode ser atribuída às altas concentrações de ácido acético não dissociado no hidrolisado (4,74 g/L), o que prejudicou a atividade celular, comprometendo as vias metabólicas.

Figura 9. Valores de pH dos cultivos de M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa seca de 0,2, 0,5 e 2,5 g/L, pH 5,5, a 30oC, 160 rpm.

Figura 10. Valores de pH dos cultivos de M. guilliermondii em meio sintético contendo ácido acético (10,5 g/L) como única fonte de carbono, em concentrações iniciais de massa seca de 0,2, 0,5 e 2,5 g/L, pH 3,5, a 30oC, 160 rpm.

0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 8,0 9,0 10,0 0 12 24 36 48 60 72 84 96 pH Tempo (h)

0,2 g/L de massa seca 0,5 g/L de massa seca 2,5 g/L de massa seca

3,0 3,5 4,0 0 12 24 36 48 60 72 84 96 pH Tempo (h)

Os resultados obtidos neste experimento corroboram aqueles encontrados por Felipe et al. (1997), ao avaliar o efeito do pH sobre o crescimento e metabolização das fontes de carbono em hidrolisados de bagaço de cana-de-açúcar por uma linhagem da levedura C. guilliermondii. Os autores verificaram que em valores de pH abaixo de 4,5, o consumo das fontes de carbono foi fortemente inibido e que acima deste pH, a maior parte das fontes de carbono foram consumidas e convertidas em xilitol. Verificou-se nestas condições, alterações morfológicas na membrana celular, e como resultado do mecanismo de inibição, os autores apontam como principais efeitos os distúrbios causados no transporte ativo da membrana devido a alterações no pH e competição por sítios ativos entre as moléculas de açúcar e ácido acético.

A pesquisa com uma levedura como M. guilliermondii quanto à sua habilidade em assimilar ácido acético e converter em biomassa e etanol, além da fermentação de pentoses, torna-se importante em vista de recente trabalho focando na engenharia genética de S. cerevisiae para co-consumo de xilose e ácido acético (WEI et al., 2013). A linhagem de M. guiliiermondii em estudo pode ser um importante micro-organismo a ser empregado na fermentação de hidrolisados.

Para os tratamentos avaliados nesta etapa experimental, as concentrações de etanol obtidas apresentaram valores muito baixos. A concentração máxima de etanol obtida foi de 1,47 g/L com parâmetros iniciais de 10,5 g/L de ácido acético em pH 5,5 e 2,5 g/Lde concentração de inóculo. Tais resultados evidenciam a necessidade de estudos que avaliem os demais parâmetros fermentativos, tais como a influência da aeração durante o período de incubação, visando melhores resultados em produção de etanol e outros produtos de maior valor agregado.

Os resultados obtidos até agora permitem estipular o pH 5,5 e concentração inicial de massa celular de 2,5 g/L, devido ao melhor desempenho em crescimento celular, maior remoção de ácido acético do meio e produção de etanol para a próxima etapa experimental, visando avaliar estes parâmetros em meio sintético constituído de pentoses e hexose e do inibidor furfural, comumente encontrado em hidrolisados de bagaço de cana-de-açúcar.