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Efeitos da desordem nas transições de fase

2.2 Correlações, desordem e o modelo de Hubbard

3.1.2 Efeitos da desordem nas transições de fase

Inicialmente, pensou-se que a desordem destruiria todo o tipo de ponto crítico, pois, devido à presença de defeitos, o sistema ira se subdividir em várias regiões espaciais que sofreriam a transição de fase independentemente com diferentes temperaturas críticas. Argumentaremos aqui que este não é o caso, pois uma transição de fase permanece bem denida na presença de defeitos, pelo menos para sistemas clássicos na presença de desordem com correlações de curto alcance.

Assumiremos que o único efeito da desordem é introduzir uma distribuição de temperaturas de transições Tcno

sistema, naturalmente fazendo com que Tc = Tc(x). Neste contexto, temos também que as duas fases do material

não mudam qualitativamente devido à introdução da desordem. Em um ferromagneto, por exemplo, temperaturas aleatórias podem ser introduzidas pela diluição da rede, ou seja, a troca de átomos magnéticos por não magnéticos. 3.1.2.1 Desordem média e critério de Harris

Harris [93] estabeleceu um critério para a estabilidade de um ponto crítico limpo na presença de desordem fraca descorrelacionada (defeitos pontuais), ou mesmo com correlações de curto alcance.

Considere que o sistema de volume V foi dividido em N blocos de tamanho linear ξ, como mostrado pic- toricamente na Fig. (3.1). A temperatura crítica de cada um destes blocos será tomada como uma média de r (x) = r + δr (x) no volume Vb ∼ ξd de cada bloco. Deste modo, uma transição de fase bem denida só pode

ocorrer se a variação de temperatura ∆r entre os blocos é menor do que a distância global r da transição.

Para desordem descorrelacionada, o teorema do limite central diz que a variação de temperatura vai com a raiz quadrada do número de blocos

∆r ∼√N ∼ s

V

ξd ∼ ξ

−d/2. (3.6)

Usando as Eqs. (3.5) e (3.6), podemos escrever que ∆r ∼ rdν/2. Para que a transição seja bem denida, devemos

ter ∆r/r < 1, o que nos leva ao critério de Harris

CAPÍTULO 3. FASE DE GRIFFITHS ELETRÔNICA DA TRANSIÇÃO DE MOTT EM D = 2

Figura 3.1: Divisão pictórica de um sistema de volume V em N blocos de escala linear ξ, onde ξ é o comprimento de correlação da transição de fase limpa (sem desordem).

onde ν é o expoente crítico do comprimento de correlação do sistema limpo. Devemos notar que o critério de Harris fornece uma condição necessária, mas não suciente, para a estabilidade do ponto crítico limpo na presença de desordem.

3.1.2.2 Regiões raras e as singularidades de Griths

Para derivarmos o critério de Harris, discutimos os efeitos da desordem em transições de fase nos baseando no comportamento médio (global) da desordem. Agora, gostaríamos de discutir os efeitos que utuações raras de desordem podem ter sobre o sistema [16]. Concentraremos a discussão em magnetos diluídos como aquele esboçado na Fig. (3.2). A diluição pode ser pensada como a introdução de átomos não magnéticos, ou equivalentemente, de vacâncias.

A diluição reduz a tendência ao ordenamento magnético e, portanto, reduz Tc com relação ao seu valor no caso

limpo T0

c. Contudo, para um sistema innito, podemos encontrar regiões espaciais arbitrariamente grandes que não

possuam impurezas. Para temperaturas entre Tc e Tc0, essas regiões estão ordenadas magneticamente, apesar de o

sistema como um todo ainda estar na fase paramagnética. Estas regiões espaciais são conhecidas como regiões raras e as utuações no parâmetro de ordem induzidas por elas são conhecidas como momentos locais. A dinâmica de uma região rara é muito lenta, uma vez que mudar seu spin de direção envolve uma mudança coerente do parâmetro de ordem sobre um volume muito grande. Griths [14] foi o primeiro a mostrar que tais regiões raras podem levar a singularidades na energia livre, as singularidades de Griths. Essas singularidades ocorrem em todo o intervalo de temperatura entre Tc e Tc0, que agora é conhecido como região ou fase de Griths. Singularidades análogas

também ocorrem no lado ordenado da transição.

A probabilidade de encontrarmos um região rara é exponencialmente pequena no seu volume VRe na concentra-

ção de impurezas p, PR∼exp [−pVR]. Assim, regiões raras são graus de liberdade não perturbativos. Elas podem

ser vistas dentro de uma classe maior de eventos raros, da qual um exemplo são as caudas de Lifshitz presentes na densidade de estados de semicondutores desordenados [94].

No caso das transições de fase clássicas, as singularidades termodinâmicas de Griths aparecem como singula- ridades essenciais na energia livre e, portanto, são muito (exponencialmente) fracas. Por este motivo, não há, até o presente momento, nenhuma vericação experimental de tal fenômeno.

3.1.2.3 Transições de fase quânticas

Gostaríamos agora de investigar quais são os efeitos deste mesmo tipo de desordem em sistemas quânticos. Tran- sições de fase quânticas são aquelas que ocorrem a T = 0, quando o estado fundamental do sistema muda como função de um parâmetro externo, como campo magnético ou pressão [8, 95].

CAPÍTULO 3. FASE DE GRIFFITHS ELETRÔNICA DA TRANSIÇÃO DE MOTT EM D = 2

Figura 3.2: Esboço de um magneto clássico diluído. A região sombreada é livre de impurezas e funciona como um pedaço do bulk do sistema limpo.

transverso em uma rede hipercúbica d−dimensional com N = Ld sítios. Seu Hamiltoniano é dado por

H = −X hi,ji JijSˆizSˆ z j − X i hxiix, (3.8) e é constituído por dois termos que não comutam. O primeiro é dado pela interação de troca entre as componentes zdos operadores de spin−1

2 Sˆilocalizados em sítios vizinhos. O segundo termo descreve a interação da componente

xdos spins com um campo magnético na direção transversa (direção x).

Discutiremos brevemente o caso limpo, Jij = J > 0 e hxi = hx. Na ausência do campo transverso (hx= 0),

o termo de troca faz com que todos os spins apontem em uma mesma direção, dando origem a um estado fundamental ferromagnético. Ao ligarmos o campo, induzimos os spins a tunelarem entre os estados |↑i e |↓i  ˆSx= ˆS++ ˆS

/2, diminuindo assim a magnetização na direção z. Há um campo crítico hx

c,0 acima do qual

este tunelamento destrói o estado ferromagnético e o sistema torna-se paramagnético. 3.1.2.4 Singularidades de Griths no caso quântico

Investigaremos agora os efeitos de regiões raras no modelo de Ising em um campo transverso, Eq. (3.8). Por simplicidade, consideraremos desordem apenas no termo de troca Jij e assumiremos um campo transverso uniforme

hx. Tomaremos uma distribuição binária P (J) = (1 − p) δ (J − J

0) + pδ (J − rJ0), onde 0 < r < 1, de modo que

Jij > 0, excluindo assim a possibilidade de acoplamentos antiferromagnéticos. Com a introdução de acoplamen-

tos aleatórios, favorecemos a fase paramagnética, de modo que precisamos de um campo transverso menor para destruirmos a fase ferromagnética hx

c < hxc,0.

Estamos interessados na região de Griths dentro da fase desordenada onde hx

c < hx< hxc,0. A probabilidade

de encontrarmos uma região de comprimento linear LR na qual todos os Jij ' J0 (região de acoplamento fortes) é

exponencialmente pequena no volume desta região e na probabilidade p. Para vericarmos isso, calculamos o termo dominante na probabilidade de acharmos tal região em um volume VR∼ LdR

P (LR) ∼ (1 − p) Ld

R exp −˜pLd

R , (3.9)

onde ˜p = −ln [1 − p].

Esta região ordenada ferromagneticamente dentro da fase desordenada possui um momento magnético total que é proporcional a Ld

R. Tal momento magnético total pode tunelar entre os dois estados que possuem sentidos inversos

de magnetização, sendo que a taxa de tunelamento é dada por ∆ ∼ exp −aLd

R , (3.10)

onde a é uma constante relacionada ao mecanismo microscópico de tunelamento. Esta taxa de tunelamento dá a diferença de energia entre o estado fundamental e o primeiro estado excitado desta região ferromagnética, sendo que os outros estados excitados possuem uma energia muito maior que a desses dois e podem ser ignorados.

CAPÍTULO 3. FASE DE GRIFFITHS ELETRÔNICA DA TRANSIÇÃO DE MOTT EM D = 2 Uma vez que a distribuição P Ld

R

é conhecida, Eq. 3.9, e sabemos como a escala de energia ∆ depende de Ld R,

Eq. 3.10, podemos encontrar a distribuição da diferença de energias ˜P (∆). Para isso, basta realizarmos a seguinte troca de variáveis ˜ P (∆) = P LdR(∆) dLdR(∆) d∆ ∼ ∆α−1, (3.11) onde α = ˜p/a.

Uma distribuição do tipo lei de potência para a escala de energia do problema é uma das principais características de uma fase de Griths, e ocorre porque a probabilidade exponencialmente pequena de encontrarmos uma região rara é compensada pela dependência também exponencial do gap de energia no volume da região rara. Ressaltamos aqui uma diferença com relação ao caso clássico. No modelo de Ising clássico, a dependência do gap no volume não é dado por uma exponencial, mas sim por uma lei de potência, o que gera uma distribuição de energia para a região rara exponencialmente pequena.

Dada a distribuição das escalas de energia, podemos calcular as propriedades termodinâmicas do sistema. Para calcularmos a susceptibilidade magnética do sistema a uma temperatura T , assumiremos que todas as regiões com ∆ > T (alto tunelamento) estão congeladas no estado fundamental não magnético. Todas as outras regiões raras são basicamente independentes e dão uma contribuição do tipo lei de Curie para a susceptibilidade. O número de spins livres a um temperatura T é dado por

n (T ) = ˆ T

0

˜

P (∆) d∆ ∼ Tα. (3.12)

Com o número de spins livres, podemos calcular χ como χ ∼ n (T )

T ∼ T

α−1. (3.13)

Para calcularmos o calor especíco, precisamos calcular a energia interna do sistema U = ˆ T 0 ∆ ˜P (∆) d∆ ∼ Tα+1, (3.14) e assim C T = 1 T ∂U ∂T ∼ T α−1. (3.15)

Vemos pelas Eqs. (3.13) e (3.15) que, quando o expoente α é menor do que 1, temos contribuições singulares para a susceptibilidade e para o calor especíco. Embora o expoente α seja não universal, este tipo de comportamento para as quantidades termodinâmicas é compartilhado por todas as fases de Griths.

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