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Eficácia da Intervenção

No documento A Assistência no Processo Civil (páginas 68-72)

A atuação do assistente implica a extensão do caso julgado à parte substituída na ação em que intervém como substituto processual233.

Contudo, o assistente, contrariamente ao assistido, não é titular da relação material que figura como objeto da causa, o que significa que não será condenado ou absolvido no processo judicial234.

Ainda assim, a sentença proferida na causa, nos termos do disposto no artigo 332º do CPC, constituiu caso julgado em relação ao assistente, obrigando-o “a aceitar, em qualquer causa posterior, os factos e o direito que a decisão judicial tenha estabelecido” 235

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Neste sentido os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 05/05/2014 (Processo nº 3862/11), de 05/05/2014 (Processo nº 779/11) e de 12/05/2014 (Processo nº 3324/10), todos eles disponíveis (e consultados a 28 de Novembro de 2015) em www.dgsi.pt.

232 Cfr. GERALDES, António Santos Abrantes, “Recursos no novo Código de Processo Civil”,… cit., pp. 239 e 241.

233 Cfr. SOUSA, Miguel Teixeira de, “As Partes, o Objecto e a Prova na Acção Declarativa”,… cit., pp. 54-55.

234 Neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 11/02/2008, proc. nº 303/08-2, disponível (e consultado a 25 de Novembro de 2015) em <www.dgsi.pt>.

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Olhando para o que dispõe aquela norma legal, é entendimento do legislador a vinculação do assistente à sentença, impossibilitando-o de alegar factos contrários aos que ficaram consagrados, bem como pretender uma solução de direito diversa daquela que ficou estabelecida, tudo isto numa ação posterior.

E só assim não é se o assistente: “alegar e provar, na causa posterior, que o estado do processo no momento da sua intervenção ou a atitude da parte principal o impediram de fazer uso de alegações ou meios de prova que poderiam influir na decisão final; ou mostrar que desconhecia a existência de alegações ou meios de prova suscetíveis de influir na decisão final e que o assistido não se socorreu deles intencionalmente ou por negligência grave”236

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A apresentação da contestação por parte do assistente, nos ternos acima referidos, constitui para o assistente uma faculdade, nunca um ónus. Isto é importante, porque a não apresentação da contestação pelo assistente numa situação de revelia do réu assistido não pode ser utilizada como argumento para retirar ao assistente a possibilidade de, para afastar a vinculação ao caso julgado da decisão proferida na sequência da revelia do assistido, alegar e provar que a atitude de (não contestação) deste assistido o impediu de fazer uso de alegações ou de meios de prova. Esta ideia pode ser retirada da própria leitura do dispositivo legal acima transcrito.

Dito isto, poderá inferir-se que a questão de se saber se a decisão constitui caso julgado sobre o assistente se cinge a um problema de prova, na medida em que o terceiro deverá demonstrar que foi impossibilitado de se defender adequadamente no processo237.

Terá o legislador querido determinar que a sentença constitui caso julgado sobre o assistente, nos mesmos termos que constitui para as partes principais?

Parece-nos que não. Ora vejamos.

A vinculação do assistente à decisão não implica que a mesma lhe seja exequível, e a ideia não poderia ser outra uma vez que ele não é titular da relação material controvertida, contudo implicará que numa ação futura o mesmo seja obrigado a aceitar a

235 Trecho retirado do artigo 332º do CPC.

236 É o que dispõem as alíneas a) e b) artigo 332º do CPC.

237 GONZÁLEZ, Esther Pillado, “La intervención de terceros en los procesos civiles especiales”, Valencia, 2014, p. 91.

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decisão como prova plena dos factos que a mesma estabeleceu e como caso julgado relativamente ao direito que ela determinou238.

Acresce ainda o facto de se encontrarem consagradas exceções à constituição do caso julgado sobre o assistente, uma vez verificadas certas circunstâncias, as quais têm na sua génese o facto de o assistente ter de aceitar o processo no estado em que o encontrar, não poder apresentar uma atitude contraditória com a apresentada pelo assistido e porque o assistido apresentou uma atitude negligente239. O que reflete exatamente que a situação jurídico-processual do assistente é distinta da parte principal.

Mas a verdade é que a lei, no artigo 332º do CPC, fala em constituição do caso julgado sobre o assistente, caso a situação jurídica do assistido seja prejudicial da situação jurídica do assistente, o que serve de fundamento à intervenção deste, e este último tenha utilizado todos as alegações e meios de prova que pudessem influenciar a decisão final, ficando o assistente impedido de pôr em causa o que ficou decidido, quer através de uma ação autónoma, quer através do recurso de revisão.

É verdade que os princípios que estão subjacentes ao caso julgado, nomeadamente as exigências da boa administração da justiça, da funcionalidade dos tribunais e da salvaguarda da paz social e da segurança jurídica, justificam que a sentença seja marcada pela certeza, evitando-se decisões eventualmente contraditórias quanto a um mesmo facto. Contudo, não se pode deixar de ter em consideração o facto da atuação do assistente estar subordinada à atuação do assistido, impedindo-o de desenvolver uma atividade processual livre e autónoma. Além de que não se pode olvidar que ao atuar, o assistente não introduz uma nova pretensão na causa e que a sua relação jurídico-material não é submetida diretamente a juízo, como tal não será afetado diretamente pela sentença, mas sim indiretamente sofrendo os efeitos reflexos daquela.

Como tal, o entendimento a retirar desse dispositivo legal não pode ser aquele que se infere da sua leitura literal.

É importante referir que o facto de se admitir a intervenção do assistente, não significa que haja um alargamento dos efeitos do caso julgado ao terceiro, bem como não alterará a natureza jurídica desses efeitos. Assim, seguindo o entendimento de Montero

238 Cfr. CARDOSO, Eurico Lopes, “Manual dos incidentes da instância em processo civil”, …cit., p. 155.

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Aroca, não se pode transformar por força da intervenção do assistente um efeito reflexo, que lhe serve de fundamento, num efeito direto, como se tratasse do titular da relação material controvertida. O objetivo da intervenção é evitar um prejuízo, pode conseguir-se ou não240.

240 Cfr. AROCA, Juan Montero, “La intervención adhesiva simple, contribución al estúdio de la pluralidade de partes en el proceso civil…cit., pp. 250-251.

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III- Fragilidades do regime legalmente consagrado

O assistente, enquanto titular da qualidade de parte processual, ainda que seja a título acessório, terá ao seu dispor todos os poderes próprios dessa condição, e isto, se se quiser que o instituto da assistência tenha alguma utilidade241. E na exposição de uma situação de conflito, como é o caso do subarrendatário intervir no processo entre o senhorio e o arrendatário como assistente, está a prova da utilidade desta proposta de solução ao regime vigente.

Não se pode deixar de ter em consideração que mais das vezes, embora o inverso também possa acontecer, o assistente tem conhecimento de factos que o próprio assistido não tem, e que podem auxiliar este a obter uma decisão favorável. Pense-se, pegando no exemplo acima referido, que o senhorio invoca a falta de pagamento das rendas, poderá o assistente apresentar factos e provas que contradigam aquilo que o senhorio invoca. Assistido e assistente, apesar de não serem ambos titulares da relação material controvertida, ambos anseiam, à partida, pelo mesmo fim, que é uma decisão favorável à pretensão invocada pela parte principal assistida.

Ainda que a intervenção do assistente implique um aumento da complexidade da causa, uma vez que poderão surgir no processo novos factos e provas, isso também pode determinar a efetiva descoberta da verdade material, e a consequente justa resolução do litígio. Antes uma decisão justa numa ação complexa, do que uma solução injusta numa ação simples.

No documento A Assistência no Processo Civil (páginas 68-72)