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Em suas pesquisas sobre cidades médias, Sposito (2006) alerta para uma qualificação do tempo de deslocamento na formação de uma centralidade, em que os equipamentos de consumo e os loteamentos de alto padrão se localizam próximos uns aos outros. Em suas palavras:

Por isso, as novas centralidades, geradas nos espaços urbanos periféricos ou periurbanos com a implantação dos shopping centers, por exemplo, são tão valorizadas nas escolhas locacionais dos loteamentos fechados quanto a acessibilidade a vias de circulação mais rápida, algumas delas eixos rodoviários interurbanos. (SPOSITO, 2006, pp.186-187)

Para os professores Elias e Pequeno (2010), no caso de Mossoró, a nova centralidade urbana é o eixo de verticalização, com forte atuação do setor imobiliário com investimentos de empreendedores provenientes de Fortaleza (CE), Natal (RN) e João Pessoa (PB), promovendo um forte dinamismo no setor. Nesse debate, Beserra (2017) apresenta uma contribuição no entendimento da produção do ambiente construído da nova centralidade de Mossoró, especialmente sobre o atual momento de aquecimento do mercado imobiliário. Em seu levantamento ele apresenta a existência de 64 condomínios fechados verticais e horizontais, localizados em sua maioria no Bairro Nova Betânia e adjacências. Ademais, para Elias e Pequeno (2010):

Somados aos condomínios verticais e horizontais presentes no Bairro Nova Betânia, essas formas de parcelamento do solo se apresentam como grandes alvos de especulação imobiliária, induzindo implantação de infraestruturas urbanas, como as redes de água e esgotamento sanitário – e sistema viário nessas direções em detrimento de vasta periferia desprovida de boas condições de habitabilidade urbana. (ELIAS e PEQUENO, 2010, p.251).30

Nesse sentido, o acesso à infraestrutura urbana tende a privilegiar determinadas localizações produzindo uma valorização diferencial do uso do solo urbano, que, por sua vez, gera uma escassez desses serviços em relação às necessidades da população. No caso brasileiro, o crescimento expressivo das cidades na década de 1960 e 1970 levou a escassez a um nível crítico, e exacerbou a valorização de poucas áreas bem servidas. Refletindo sobre esse processo em Mossoró, Queiroz (2012, p. 117), argumenta:

30 Sobre a relação entre o papel do Estado na implantação de infraestruturas: “De todo modo, faz-se importante

atentar para as áreas atendidas pela infraestrutura de esgotamento e sua relação com a especulação imobiliária. Nessa linha de raciocínio, a atual prefeita de Mossoró, no dia 15 /2/ 2011, em seu pronunciamento na abertura dos trabalhos da Câmara afirmou que “o saneamento básico projetado em nosso governo lançou as bases do atual boom imobiliário.” (QUEIROZ, 2012, p. 112).

Assim, podemos observar algumas tramas da economia política como política econômica no âmbito da habitação, no sentido em que os projetos se entrelaçam, ou seja, as obras para a construção da rede geral de esgotamento se apressam em atender às demandas do mercado imobiliário. Para tal, mostram o exemplo do Bairro Nova Betânia durante os primeiros dez anos do século XXI, bem como os do Minha Casa Minha Vida.

Penetrando nessa discussão, Smith (1989) argumenta sobre a acumulação capitalista a partir da renda do solo na escala urbana, e alertando para o cuidado do entendimento da especificidade do processo na cidade, principalmente relacionado à renda diferencial do solo urbano. Em suas palavras:

A renda do solo de um certo espaço é determinada por um certo número de coisas, incluindo suas propriedades (tamanho, forma de superfície, utilização atual, etc) e sua relação com outros melhoramentos e lugares (centro da cidade, transporte, rede de esgoto, etc). O sistema de renda urbana nivela o espaço urbano à dimensão de valor de troca, mas o faz como um meio de então coordenar e integrar o uso dos espaços individuais dentro do espaço urbano como um todo. A igualização do espaço urbano na estrutura de renda do solo torna-se o meio para sua diferenciação. Os usos competitivos são geograficamente selecionados, em primeiro lugar através do sistema de renda do solo. [...] (SMITH, 1989, p.200).

Nesse debate, Lefebvre (1999) destaca o papel do Estado na indução da valorização de determinadas áreas da cidade, denunciando a forma de uso do solo no âmbito da produção capitalista do espaço, qual seja, a da propriedade privada. Segundo o autor (1999, p. 138), “o sistema contratual (jurídico), que o Estado mantém e aperfeiçoa enquanto poder (político), repousa na propriedade privada, a da terra (propriedade imobiliária) e a do dinheiro (propriedade mobiliária)”. Neste ínterim, de acordo com Seabra (2000), o Estado, como agente produtor do espaço, cria as condições gerais de reprodução das empresas. Na argumentação da autora, a ação do Estado, no tocante à materialidade do espaço, tem na construção das infraestruturas um fazer e refazer sem fim, afinal: “Produzir materialmente a cidade foi e tem sido um grande negócio.” (Ibidem, p.74).

Na cidade de Mossoró, observamos um crescimento sem precedentes de seu equipamento urbano, que se faz com a abertura de novas vias, o equipamento urbano das novas centralidades com apoio do Estado, a construção de infraestruturas para a instalação de grandes (novas) empresas na cidade, a construção de um corredor cultural no centro da cidade com investimentos suntuosos ao passo que os moradores das periferias da cidade convivem em relações sociais desiguais no aspecto material e social.

De todo modo, no plano do vivido, as novas centralidades impõem conteúdos associados a sociedade da mercadoria. Fazendo uma leitura dos novos usos da rua nas cidades médias, Maia (2006) argumenta sobre o plano simbólico das relações de poder, em que os automóveis representam o poder dos seus proprietários. Em suas palavras: “Tal característica é reforçada no final do século XX com a ascensão da sociedade do espetáculo denominada por Debord” (MAIA, 2006, p.162).

Na esteira da proposta de Maia (2006) sobre o entendimento da sociedade do espetáculo, a contemplação se apresenta como uma característica da modernidade que se amplia em diversos aspectos na sociedade do espetáculo, na qual a racionalidade da separação se apresenta no predomínio do ver e do parecer, em detrimento do ser.31 Para Debord (1997, p. 19): “o espetáculo é o herdeiro de toda a fraqueza do projeto filosófico ocidental, que foi um modo de compreender a atividade dominada pelas categorias do ver”. No caso de Mossoró, Bezerra (2006) apresenta o processo de reestruturação do espaço da cidade que foi concebido como uma imagem cultural que não expressa as experiencias sociais vividas. A autora desmistifica o espetáculo do planejamento cultural do território que buscou reconstruir a história local para atender os interesses das elites, negando a memória dos sujeitos subalternos.

Ademais, o espetáculo, como uma nova etapa de aprofundamento da dominação capitalista, amplia a lógica do fetichismo da mercadoria através da realização, sem obstáculos, dos seus desígnios. De acordo com Debord (1997, p.18), a primeira fase de expansão da dominação econômica sobre a sociedade se caracterizou na passagem do ser para o ter, ao passo que “a fase atual, em que a vida social está totalmente tomada pelos resultados acumulados da economia, leva a um deslizamento generalizado do ter para o parecer”.

Essa nova fase de dominação do capitalismo espetacular com o predomínio do ver e do parecer, se caracteriza por uma economia-política que se materializou em imagens, pois “o espetáculo é o capital em tal grau de acumulação que se torna imagem” (Debord, 1997, p.25). Sobre esse processo, Maia (2001, p. 95) argumenta: “Ademais, neste mundo, onde cada vez mais imperam as imagens, é a cidade seu supremo espetáculo e onde se estimula, cada vez mais, o ver em detrimento do viver.” Nesse contexto, a proposta de Maia (2001) de estudo das tradições e dos costumes se faz de grande importância como um contraponto a perspectiva de invisibilização da cultura popular propiciada pelo tempo da mercadoria. Para Maia (2001), se faz de fundamental importância o estudo do espaço vivido na busca do entendimento dos

31“A alienação do espectador em favor do objeto contemplado( o que resulta de sua própria atividade

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