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2.1 ESTRUTURAS DE SOLO REFORÇADO

2.1.1 ELEMENTOS DE REFORÇO E MATERIAIS DE ATERRO

Reforçar um solo consiste em posicionar inclusões em determinadas regiões do maciço, resultando em uma redistribuição mais favorável de tensões (Palmeira, 1987). As inclusões, além de contribuírem com aumento da resistência, também são responsáveis pela diminuição da compressibilidade do aterro. Os elementos incorporados ao solo podem ser, por exemplo, tiras metálicas, tiras poliméricas, geotêxteis, geogrelhas. Na prática, a escolha do elemento de reforço está relacionada ao método construtivo adotado. No caso de muros em solos mecanicamente estabilizados com paramentos externos pré-moldados de concreto, os elementos de reforço são conectados ao muro. Usualmente são empregadas tiras ou grelhas metálicas, havendo também a possibilidade de uso de tiras sintéticas e geogrelhas uniaxiais. As

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tiras metálicas podem ser lisas ou apresentar ressaltos ao longo do comprimento, com a finalidade de aumentar o entrosamento com o solo. Usualmente, as tiras metálicas com ressaltos apresentam seção transversal com largura igual a 50 mm e espessura igual a 4 mm, enquanto que as tiras metálicas sem ressaltos costumam apresentar largura entre 60 a 120 mm e espessura entre 3 ou 4 mm (Berg et al., 2009a). Por sua vez, as tiras sintéticas, também denominadas geotiras, são elementos de reforço lineares compostos por polímeros, podendo ser usadas em substituição às tiras sintéticas convencionais. Entre as possibilidades comerciais podem ser citadas as tiras sintéticas convencionais (GeoStrap®) e as tiras sintéticas de alta aderência (GeoStrap HA®), as quais apresentam ondulações laterais.

As geogrelhas, são elementos planares em formato de grelha que apresentam resistência a tração em uma direção (uniaxiais) ou em duas direções (biaxiais). Podem ser soldadas, extrudadas ou tecidas, apresentando aberturas grandes o suficiente para permitir o entrosamento com o solo, favorecendo os mecanismos de transferência de tensões (Das, 2011).

Outros métodos construtivos podem ser encontrados na literatura, como é o caso dos solos reforçados com geotêxteis, o sistema de reforço com arrames duplamente torcidos (Terramesh® System) com face em muro de gabião, entre outros (Elias et al., 2001). O acabamento externo, além da possibilidade de uso dos painéis pré-fabricados de concreto, pode ser feito por meio blocos modulares, gabião, face com geossintéticos expostos e outros métodos pós-construção.

A seleção do material de aterro deve levar em consideração as especificações de projeto, a performance esperada e os requisitos mínimos especificados pelas normas. Uma série de normas técnicas que classificam e especificam os materiais para aterro em solos reforçado podem ser encontradas na literatura, como é o caso da norma brasileira NBR 19286 (ABNT, 2016), normas britânicas BS EN 14475 (BSI, 2006) e BS 8006 (BSI, 2010), norma europeia EN 14475 (BSI, 2006) e também especificações de projeto americanas da AASHTO – American Association of State Highway and Transportation Officials (AASHTO, 1996; AASHTO, 2012) e FHWA – Federal Highway Administration (Elias et al., 2001; Berg et al., 2009a; Berg et al., 2009b), alemã (EBGEO, 2011) e britânica MCHW – Manual of Contract Documents for Highway Works (MCHW, 2016).

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Basicamente, as especificações em questão sugerem o uso de materiais de boa qualidade, que facilitem a drenagem do maciço, que apresentem adequada resistência interna e que apresentem boa interação com os elementos de reforço. Na sequência são descritas as particularidades expostas pelas especificações.

a) Normas brasileira NBR 19286 (ABNT, 2016):

A norma brasileira NBR 19286 (ABNT, 2016) apresenta especificações quanto ao projeto e execução de muros em solos mecanicamente estabilizados. São classificados os materiais conforme o tipo de reforço a ser empregado, a granulometria e parâmetros mecânicos. No Anexo A estão apresentadas as tabelas a serem consideradas para seleção de material de aterro, sendo a Tabela A.1 referente às armaduras metálicas lisas e a Tabela A.2 referente às armaduras metálicas com ressaltos.

No caso das armaduras metálicas lisas (Tabela A.1), a seleção do material de aterro é feita conforme a granulometria e o ângulo de atrito interno do material (), sendo também considerado o ângulo de atrito solo-armadura (φ). Materiais com D15 ≥ 0,08 mm e D10 ≥ 0,015 mm são considerados adequados para uso neste tipo de estrutura. Caso D20 ≥ 0,015 mm > D10, deve ser verificado o ângulo de atrito solo-armadura (φ), sendo o material aceitável quando φ ≥ 22º.

Quando se considera o uso de tiras metálicas com ressaltos (Tabela A.2), os materiais são classificados em cinco grupos (A, B, C, D e E), conforme a granulometria e o ângulo de atrito interno (ϕ) do material. Os grupos A e B são os mais adequados para uso em terra armada. O grupo C e D correspondem a materiais que podem ser usados neste tipo de obra, porém os parâmetros de interação com o reforço são minorados. A utilização do grupo E, por usa vez, depende de estudos especiais.

Na Tabela A.2 também são especificados os ensaios de laboratório utilizados na definição dos ângulos de atrito interno dos solos (ϕ). Basicamente, os parâmetros em questão devem ser definidos por meio de ensaios de cisalhamento direto. Diferentes condições de ensaio são especificadas para classificação dos solos nos grupos. Entretanto, independentemente da classificação, são empregados ensaios de cisalhamento direto rápido e inundado sobre amostras moldadas na umidade ótima (wót) e compactadas até atingir 95% do peso específico aparente seco máximo (γd,máx) do ensaio de compactação com energia correspondente ao Proctor normal.

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Na norma em questão também estão especificados os métodos usados na estimativa das propriedades de interação solo-reforço.

b) Norma Europeia EN 14475 (EN – European Standards):

Nas normas europeias (e.g. BS EN 14475, conforme BSI, 2006; NF EN 14475, conforme Norme Française, 2007) estão especificados os critérios de projeto e de execução de aterros reforçados, estabelecendo-se requisitos mínimos para os materiais de aterro. Na Tabela 2.1 estão resumidos os fatores que a norma recomenda que sejam considerados na escolha de um material de aterro.

Tabela 2.1. Fatores a serem considerados na escolha de um material de aterro (BS EN 14475, conforme BSI, 2006; NF EN 14475, conforme Norme Française, 2007).

Fatores Descrição

Trabalhabilidade Trabalhabilidade adequada para transporte, deposição e compactação do material;

Comportamento a longo prazo

Alguns tipos de estruturas estão sujeitos a grandes deformações ao longo do tempo, como é o caso das estruturas de contenção de grande altura. Por esse motivo, deve-se selecionar material que proporcione baixa compressibilidade após a compactação;

Espessura das camadas e tamanho máximo das

partículas

O tamanho máximo das partículas deve resultar em superfície uniforme e estar adequado à espessura das camadas. Não se recomenda o uso de solos orgânicos, materiais solúveis e solos muito expansivos;

Capacidade de drenagem

As características do solo devem ser consideradas ao se projetar o sistema de drenagem e filtração, incluindo a escolha de geossintéticos adequados;

Agressividade do aterro

A agressividade eletroquímica, química e biológica dos materiais de aterro deve ser considerada para garantir que o mesmo não cause a degradação dos elementos de reforço;

Interação solo- reforço

Deve ser verificada por meio de ensaios de cisalhamento direto ou de arrancamento, verificando-se os parâmetros adotados em projeto; Atrito interno e

coesão

A avaliação do atrito interno e da coesão do aterro deve ser representativa das condições de trabalho em campo e satisfazer os parâmetros de projeto.

Segundo este documento, a performance de uma estrutura de solo reforçado depende das características do solo e de como as mesmas são afetadas por fatores internos e externos. As características do solo que são consideradas pela norma em questão são a granulometria e o índice de plasticidade (IP), permitindo a classificação dos materiais de aterro em quatro classes

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(1, solos drenantes; 2, solos granulares; 3, solos intermediários; 4, solos finos), conforme requisitos apresentados na Tabela A.3 (Anexo A).

Basicamente, à classe 1 (solos drenantes) correspondem os materiais com melhores propriedades geotécnicas (porcentagem em peso com D < 80 µm inferior a 5%), sendo D o diâmetro das partículas. Na classe 2 (solos granulares) estão contidos solos com porcentagem em peso com D < 80 µm inferior a 12% ou com porcentagem em peso com D < 80 µm entre 12% a 35% e porcentagem em peso com D < 20 µm inferior a 10%. Na classe 3 estão contidos solos com índice de plasticidade (IP) inferior a 25%, desde que a porcentagem em peso com D < 80 µm esteja entre 12% a 35% e a porcentagem em peso com D < 20 µm seja inferior a 25%, ou então desde que a porcentagem em peso com D < 80 µm seja superior a 35% e a porcentagem em peso com D < 20 µm seja inferior a 40%. Na classe 4 estão contidos os solos mais finos que não atendem às demais classificações, cuja aplicação usualmente não é recomendada. Na mesma tabela também estão relacionadas as aplicações usuais de cada um dos solos, os tipos de reforços indicados e os sistemas de paramento externo normalmente empregados.

c) Norma britânica BS 8006 (BSI, 2010):

Na norma britânica BS 8006 (BSI, 2010) apresenta recomendações de projeto e construção de aterros e solos reforçados. De acordo com essa norma, as características do solo a serem consideradas são aquelas que afetam as cargas impostas aos reforços e aquelas que afetam a durabilidade dos materiais constituintes dos mesmos. Esta norma britânica trata de uma série de aspectos relacionados à solos reforçados, enquanto a norma europeia EN 14475 (BS EN 14475; BSI, 2006) trata especificamente de aspectos construtivos destes tipos de obra.

As cargas que são transferidas para os elementos de reforço dependem basicamente dos parâmetros de resistência do solo. A norma evidencia que, no caso de solos que incorporam camadas de reforços, a resistência a ser considerada em projeto depende basicamente do atrito interno do solo. Uma vez que as deformações que ocorrem neste tipo de material são pequenas, a resistência interna do solo pode ser representada por ϕp, ou seja, o ângulo de atrito de pico do solo.

A norma destaca ainda que alguns tipos de estruturas estão condicionados a maiores deslocamentos, como é o caso de aterros sujeitos a recalques diferenciais. Nestas situações, o

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parâmetro de projeto costuma ser o ∅̅𝑐𝑣, ou seja, o ângulo de atrito a volume constante para solos granulares.

d) American Association of State Highway and Transportation Officials – AASHTO, especificações de projeto:

O documento AASHTO LRFD Bridge – Design Specifications (AASHTO, 2012) apresenta uma compilação de normas a respeito do projeto e construção de pontes e outras estruturas. Entre os temas tratados estão o projeto e dimensionamento de estruturas de contenção. Esta referência orienta que os solos adotados como aterro permitam a drenagem do maciço e não sejam expansivos.

e) Federal Highway Administration – FHWA, especificações de projeto:

Documentos publicados pela Federal Highway Administration, pertencente ao U.S. Department of Transportation, trazem informações relativas ao projeto e construção de muros em solos mecanicamente estabilizados. Este é o caso dos documentos FHWA-NHI-00-043 (Elias et al., 2001), FHWA-NHI-10-024 (Berg et al., 2009a) e FHWA-NHI-10-025 (Berg et al., 2009b).

Muros em solos mecanicamente estabilizados requerem materiais de aterro de alta qualidade, boa drenagem, facilidade construtiva e boa interação com os elementos de reforço, em geral constituindo-se materiais granulares e bem graduados (Elias et al., 2001; Berg et al., 2009a). Usualmente a estabilidade deste tipo de estrutura está condicionada à interação entre o solo e o reforço, justificando a necessidade de solos com elevado atrito interno, inviabilizando o uso de solos com elevado teor de argila.

Berg et al. (2009a) relacionam as propriedades geotécnicas desejáveis para materiais granulares de aterro a serem usados na zona de solo reforçado, conforme a Tabela 2.2. O material em questão deve ser bem graduado, de acordo com a Classificação Unificada dos Solos (SUCS). Segundo esta fonte, solos de alta não uniformidade (Cu > 20 e curva granulométrica côncava), assim como solos com lacunas na curva granulométrica, tendem a sofrer lixiviação e piping.

Berg et al. (2009b) recomendam que o material usado como aterro em solos reforçados seja livre de xisto, matéria orgânica, mica, gesso, esmectita, montmorilonita e outros solos de baixa durabilidade. No mesmo documento recomenda-se que não sejam usados determinados

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resíduos da construção civil, como é o caso de concreto asfáltico triturado e cascalho de concreto.

Tabela 2.2. Propriedades geotécnicas desejáveis dos materiais granulares de aterro (Berg et al., 2009a), ensaios conforme o documento AASHTO (2008).

Propriedade geotécnica

Método de

ensaio sugerido Especificação

Granulometria AASHTO T-27

* Porcentagem com D < 102 mm: 100%; * Porcentagem com D < 0,425 mm: 0 a 60%; * Porcentagem com D < 0,075 mm: 0 a 15%; Índice de plasticidade AASHTO 7-90 * IP ≤ 6;

Estabilidade dos grãos AASHTO T-104 * Materiais não devem conter xisto ou outras partículas de baixa durabilidade.

O material de aterro da estrutura de solo reforçado deve exibir um ângulo de atrito interno efetivo igual ou superior a 34º, conforme Berg et al. (2009b). Os mesmos autores orientam que a determinação do parâmetro em questão seja feita por meio de ensaios de cisalhamento direto, seguindo-se as recomendações da norma T-267 (AASHTO, 2008).

O teor de umidade do material de aterro, anteriormente ao lançamento e durante a compactação, deve estar uniformemente homogeneizado por toda a massa de solo. Berg et al. (2009b) sugerem que o solo seja lançado em campo com teor de umidade 3% inferior ou igual ao teor de umidade ótimo (Δwmáx = w-wót = -3%).

f) Manual of Contract Documents for Highway Works – MCHW, Series 600 – Earthworks, especificações de projeto:

O documento em questão (MCHW, 2016) trata de especificações para projeto de rodovias, sendo apresentadas informações referentes às obras de terra. Neste documento estão indicadas as propriedades geotécnicas desejáveis para materiais de aterro, assim como as propriedades indesejáveis.

De forma geral, os materiais de aterro para obras de terra são classificados conforme o uso que a que estarão submetidos (aterros granulares, aterros coesivos, material da camada superior, entre outros), apresentando-se limites de aceitação. No caso de solos granulares para uso em obras de terra, são adequados os materiais bem graduados (classe 1A), os materiais de granulação uniforme (classe 1B), materiais de granulação grosseira (classe 1C).

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Os materiais que não devem ser usados em obras de terra são classificados em classes (U1A, U1B e U2). Os solos que fazem parte da classe U1A correspondem a turfas, solos de pântanos, argila que possua limite de liquidez (wL) superior a 90% e índice de plasticidade (IP) superior a 65%, entre outros. Os solos das classes U1B e U2, por sua vez, correspondem a materiais contaminados e perigosos. Os materiais em questão, com exceção da classe U2, podem ser manipulados por meio de processos mecânicos e químicos para se adequarem aos requisitos estabelecidos pelo documento, podendo então ser usados como material de aterro.

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