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CAPÍTULO 4 – QUÍMICA MINERAL

5.3 Elementos menores e traço

A análise detalhada dos resultados obtidos permite evidenciar concentrações em Tl sistematicamente abaixo do limite de detecção (0.1) e, concentrações em Ag, Bi, Be, Cd, Hg, Se e Sn próximas ou abaixo do limite de detecção (0.1, 0.1, 1, 0.1, 0.01, 0.5 e 1, respectivamente). Note-se que as concentrações em Ag e Bi se encontram próximas ou acima dos respetivos limites de detecção para o subconjunto de amostras FAM. Os conteúdos em Ag são significativamente maiores que o limite de detecção, situando-se no intervalo [0.3 - 4.3] ppm (V1-FAM) e [0.4 - 5.2] ppm (V2-FAM) e valores medianos de 0.6 para ambos os subconjuntos. O Bi apresenta conteúdos no intervalo [0.2 - 1.2] ppm (V1-FAM) e valores medianos de 0.3 ppm (Tabela 5.1). Estes conteúdos se afiguram consistentes com a deposição de partículas de electrum com conteúdos em Ag no intervalo [5.56 - 8.37] wt% e Bi no intervalo [0.36 - 0.74] wt% (Tabela 4.11, cap.4). Os restantes elementos menores apresentam concentrações consideravelmente acima do limite de detecção, destacando-se o Au para além do As, Co, Cu, Ni, Sb, Pb e Zn presentes nos sulfetos e sulfossais; apenas o Au apresenta um valor abaixo do limite de detecção. Elementos como Au, As, Co, Pb e Sb apresentam elevada amplitude de variação nos conjuntos com maior intensidade de mineralização (V1-FAM e V2-FAM) com valores medianos e intervalo de variação para o conjunto de amostras V1-FAM de 4.2 [0.5 – 11.2] ppm, 432.4 [49.1 – 4312.8] ppm, 53.6 [31.6 – 74.4] ppm, 52.4 [5.6 - 352] ppm e 127.7 [7.0 – 2000] ppm, respectivamente. Para o conjunto V2-FAM, os valores se cifram em 0.5 [0.1 – 3.4] ppm, 219.2 [79.3 – 395.4] ppm, 90.9 [60.1 – 109.1] ppm, 46.5 [3.3 – 73.5] ppm e 416.8 [18 – 2000] ppm, pela mesma ordem. De notar também os conteúdos variáveis em Sr distribuídos entre 140.8 ppm e 739.7 ppm e Rb cujas concentrações se posicionam entre 1.2 ppm e 91.8 ppm (Tabela 5.1).

A análise multi-elementar dos elementos menores e traço recorre da aplicação e interpretação de dois tipos de diagramas multi-elementares, diagramas que utilizam os elementos do grupo de terras raras (ETR) e os designados spider diagrams. Os ETR são os elementos traço menos solúveis, sendo por isso relativamente imóveis durante os processos de metamorfismo de baixo grau, meteorização e alteração hidrotermal (Rollinson, 1993). A pequena diferença de tamanho e comportamento é explorado por um número de processos petrológicos causando a fracionação dos ETR uns em relação aos outros. Esta característica é usada em geoquímica para interpretar processos petrogenéticos e/ou de alteração (Rollinson, 1993). Os spider diagrams podem ser entendidos como uma extensão aos diagramas de ETR, tendo como base a comparação de elementos incompatíveis. Estes elementos são subdivididos em dois subgrupos, atendendo ao potencial iônico, os large ion lithophile elements (LILE), potencialmente mobilizados na presença de uma fase líquida, e os high field strength elements (HFSE) cuja concentração é controlada pela mineralogia e natureza da fonte que originou os magmas e/ou que se encontra na base de transformações ocorridas em condições de relativa

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alta temperatura (Rollinson, 1993; Winter, 2001). Em ambos os diagramas, as concentrações são normalizadas a um padrão conhecido, tendo-se selecionado para os ETR a normalização relativamente ao condrito (CN) de Palme & Jones (2003) e, para os elementos incompatíveis, a normalização ao manto primitivo (MP) de Palme & O’Neill (2003). Para os exemplares de filito carbonoso foi selecionada a normalização à North American Shale Composite (NASC) de Gromet et al., 1984, para os ETR e, a normalização à NASC de Condie (1993) para os elementos incompatíveis. Os valores de normalização encontram-se na Tabela 8, Anexo A.II.

5.3.1 Padrões de concentração em ETR

Os padrões de concentração em ETR encontram-se na Figura 5.2. Os elementos encontram-se ordenados da esquerda para a direita segundo o número atômico. O padrão de distribuição dos ETR para o protólito V1 (Figura 5.2A) caracteriza-se por forte fracionamento das 1ETRL relativamente às ETRP e decréscimos suaves entre ETRM e ETRP. O forte fracionamento das ETRL é materializado por declives negativos e elevados valores da razão (La/Lu)CN no intervalo [12.6 – 39.5]. Como seria de esperar, os valores da razão (La/Sm)CN no intervalo [3.7 – 4.9] são mais elevados que os valores da razão (Gd/Yb)CN no intervalo [1.7 - 4.2] e conteúdos medianos de 4.4 e 2.9, respectivamente (Tabela 5.2). O protólito V2, representado apenas por uma amostra (Figura 5.2A) apresenta razão (La/Lu)CN, (La/Sm)CN e (Gd/Yb)CN de 21.1, 5.2 e 2.4, respectivamente, dentro da mesma ordem de valores apresentada pelo protólito V1 (Tabela 5.2). Para ambos os protólitos a anomalia do Eu é fraca ou ausente com 2Eu/Eu* no intervalo [0.8 - 1.2], com exceção da amostra EA-21 com fraca anomalia negativa e a amostra EA-1 com fraca anomalia positiva (Figura 5.2A).

Os padrões apresentados pelos exemplares do subconjunto MA (Figura 5.2B) preservam parte dos perfis documentados pelos protólitos V1 e V2 (Figura 5.2A), sendo complementados por enriquecimentos em ETRP (≈15 a 6.5 x CN), no caso dos exemplares EA- 26 e EA-38 (pertencentes a V2-MA) e EA-45 e EA-44 (pertencentes a V1-MA) devido a intensa cloritização e lixiviação acentuada dos conteúdos em ETR (nos exemplares EA-45, EA-53 e EA-79) com presença de anomalia negativa em Eu e anomalias positivas em Gd e Yb associadas à neoformação de carbonatos (± clorita – Figura 5.2B).

Os padrões apresentados pelos exemplares do subconjunto FAM (Figura 5.2C) reforçam os comportamentos geoquímicos face aos protólitos assinalados pelo subconjunto MA (Figura 5.2B), revelando enriquecimentos generalizados em ETRP (≈ 11 a 2.5 x CN) nomeadamente para as amostras do subconjunto V1-FAM; pequenas anomalias positivas em

1 ETR Leves (ETRL): La, Ce, Pr, Nd, Sm; ETR Intermédias (ETRI): Eu, Gd, Tb, Dy); ETR Pesadas (ETRP): Ho, Er, Tm, Yb, Lu de

acordo com Bodinier & Goddard (2003).

2

Eu/Eu* = EuCN/(SmCN x GdCN) 0.5

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Gd e Yb e esboço de anomalia negativa em Eu (Figura 5.2C). Dois exemplares pertencentes a V2-FAM (EA-85 e EA-97) mostram notórios empobrecimentos em ETRL (com anomalia negativa em Nd) e perfil de ETRP distinto marcado por anomalias positivas em Gd e Yb (Figura 5.2C).

Os padrões apresentados pelos exemplares de filito carbonoso (Figura 5.2D) não apresentam fracionação, com razões (La/Sm)CN e (Gd/Yb)CN muito próximas em torno de 1.093 e 0.967, respectivamente.

Figura 5.2. Padrões de concentração em ETR normalizados ao condrito (CN) para os (A) protólitos V1 e V2, (B)

subconjunto MA, (C) subconjunto FAM e (D) filito carbonoso. A mancha azul de referência representa a envolvente dos padrões de concentração normalizada evidenciados pelos protólitos V1 e V2.

Min Max Med Min Max Med Min Max Med

(La/Sm)CN 3.7 4.9 4.4 5.2 3.0 6.3 4.2 3.2 6.4 4.6

(La/Lu)CN 12.6 39.5 24.4 21.1 6.3 26.6 17.8 7.5 55.3 27.0

(Gd/Yb)CN 1.7 4.2 2.9 2.4 1.1 3.8 2.6 1.7 3.9 2.6

Eu/Eu 0.8 1.2 1.0 0.9 0.6 1.2 0.9 0.7 1.2 0.9

Tabela 5.2. Amplitude de variação dos conteúdos e razões entre ETR para as vulcanoclásticas.

V1

V2 V1 e V2-MA V1 e V2-FAM

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100 1.E-02 1.E-01 1.E+00 1.E+01 1.E+02 1.E+03 1.E+04 1.E+05 1.E+06 Cs Rb Pb Th U Ba K Ta La Ag Ce Nb Sb As Sr Nd Hf Zr Sm Eu Tb Yb Y Ti Lu Co Ni A m o s tr a /MP A V1 V2 1.E-02 1.E-01 1.E+00 1.E+01 1.E+02 1.E+03 1.E+04 1.E+05 1.E+06 Cs Rb Pb Th U Ba K Ta La Ag Ce Nb Sb As Sr Nd Hf Zr Sm Eu Tb Yb Y Ti Lu Co Ni B 1.E-02 1.E-01 1.E+00 1.E+01 1.E+02 1.E+03 1.E+04 1.E+05 1.E+06 Cs Rb Pb Th U Ba K Ta La Ag Ce Nb Sb As Sr Nd Hf Zr Sm Eu Tb Yb Y Ti Lu Co Ni A m o s tr a /MP C

5.3.2 Padrões de concentração multi-elementar – Spider Diagrams

A distribuição de concentração dos elementos traço litófilos encontra-se na Figura 5.3, seguindo uma ordem crescente de incompatibilidade da direita para a esquerda. Os padrões de concentração para a maioria dos elementos são apiciformes, contrastando com os padrões mais suaves registados para os elementos menos incompatíveis (Sr, Nd, Hf, Zr, Sm, Eu, Tb, Yb, Y, Ti, Lu, Co e Ni). As amostras do subconjunto MA revelam perfis equivalentes aos que representam os protólitos V1 e V2, embora registem maiores enriquecimentos em Pb (≈ 400 a 150 x MP) e As (≈ 7000 a 1900 x MP) por parte das amostras EA-45 (V1-MA) e EA-38 (V2-MA – Figura 5.3B). De notar, o comportamento diferenciado da amostra EA-53 (V1-MA) que evidencia empobrecimento relativo em quase todos os elementos e acentuado decréscimo em LILE como o Rb, K e Ba e HFSE como o Nd e Ti (Figura 5.3B). Este comportamento deverá documentar um domínio rochoso que terá sido sujeito a intensa lixiviação no decurso dos sucessivos ciclos de atividade hidrotermal, complementada por considerável deposição de sílica. As amostras do subconjunto FAM revelam notórios enriquecimentos em Pb (≈ 2000 a 100 x MP), Ag (≈ 2000 a 90 x MP), Sb e As (≈ 200000 a 100000 x MP) e empobrecimentos relativos em K, Nd e Lu (Figura 5.3C). Estas características geoquímicas traduzem os efeitos dos processos mineralizantes marcados por forte silicificação e precipitação de sulfetos, para além de franca lixiviação de vários elementos nomeadamente elementos alcalinos e ETR.

Os padrões de concentração multi-elementar para o filito carbonoso (Figura 5.3D) revelam notórios enriquecimentos em As (≈ 50 a 10 x NASC), Sb (≈ 50 x NASC) e Rb (≈ 200 x NASC).

Figura 5.3. Padrões de concentração multi-elementar normalizados ao manto primitivo (MP) para o (A) protólito V1 e

V2, (B) subconjunto MA, (C) subconjunto FAM e (D) filito carbonoso. A mancha azul de referência representa a envolvente dos padrões normalizados evidenciados pelos protólitos V1 e V2.

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A concentração relativa dos elementos que constituem as fases minerais que caracterizam as associações de sulfetos, sulfossais e ligas metálicas reflete mais uma vez os efeitos do carácter polifásico e heterogêneo dos processos de alteração/mineralização responsáveis pelas transformações V1 ⇒ V1-MA ⇒ V1-FAM e V2 ⇒ V2-MA ⇒ V2-FAM. A Figura 5.4A mostra o enriquecimento em Au e Ag que covaria positivamente com os conteúdos em As e Sb, separando de forma muito clara as amostras do subconjunto FAM que se associam aos processos de alteração/mineralização desenvolvidos durante o ciclo evolutivo principal e tardio, das amostras dos restantes subconjuntos que apenas evidenciam os feitos da alteração/mineralização (seguida de recristalização metamórfica) associada ao ciclo evolutivo precoce. Este enriquecimento é acompanhado por perda substancial de elementos LILE (como o Rb, Sr e Ba), reforçando o que anteriormente foi observado com base na interpretação dos padrões multi-elementares e de ETR (Figura 5.4C).

Figura 5.4. Diagramas de correlação (A) (Au + Ag) vs (Au + Sb), (B) (Au + Ag) vs (Sr + Rb + Ba) e (C) (Au + Ag + Sb

+ As) vs (Co + Zn + Pb + Cu) para os protólitos V1 e V2 e para os subconjuntos MA e FAM.

As amostras do subconjunto MA, desviantes do trend principal de alteração/mineralização correlacionável com a mineralização aurífera, apresentam conteúdos semelhantes ou mais elevados aos apresentados pelos protólitos V1 e V2 (Figura 5.4A, B e C).

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Os conteúdos em metais preciosos não se correlacionam linearmente com os conteúdos em metais base presentes em quantidades menores ou traço (como é o caso do Cu, Pb, Zn e Co). As abundâncias de metais base mantêm-se com o aumento dos metais preciosos, o que se afigura consistente com a presença de sulfetos, portadores desses metais base, nos estágios de alteração/mineralização precoces (Po 0, Py 0, Pn 0, Td 0 e Ccp 0), assim como com a introdução tardia de ouro no sistema (ciclo evolutivo tardio) sem assinalável deposição de sulfetos que não a pirita (Figura 5.4B).