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O substrato patológico mais comum da ELTM é a EH, que se caracteriza histopatologicamente por perda neuronal característica, sobretudo nas sub-regiões CA1

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(corno de Ammon 1), CA3 e hilo, gliose e reorganização sináptica das células sobreviventes (8,9).

A epileptogênese da EH resulta da perda de neurônios específicos do hipocampo e da reorganização sináptica dos elementos celulares sobreviventes que levam à hipersincronização e hiperexcitabilidade (9). Os eventos que iniciam o processo da EH ainda não são bem elucidados. Desde os anos 50, relaciona-se a EH a patologia crônica associada a injúria cerebral precoce (10). Estudos demonstram associação da ELTM com EH a fatores de risco precoces (ou eventos precipitantes iniciais), como insultos cerebrais perinatais, traumas e infecções do sistema nervoso central, sobretudo em pacientes que evoluem com crises refratárias, destacando-se o antecedente convulsões febris (CF) prolongadas (11). Porém, essas associações são decorrentes apenas de dados retrospectivos e os mecanismos que levam à perda neuronal característica da EH nesses casos não são bem compreendidos (11). Da mesma forma, os mecanismos envolvidos no desenvolvimento do foco epileptogênico na ELTM associada à EH derivam em sua maioria de estudos experimentais e, entre algumas teorias, podem estar implicados neurotoxicidade pelo glutamato, disfunção mitocondrial, fatores imunes e predisposição genética (11). Possivelmente, mais de um fator deve estar envolvido na gênese da EH em cada indivíduo, como, por exemplo, um fator precipitante inicial associado a outro fator individual que pode aumentar a vulnerabilidade do hipocampo à perda neuronal característica (12).

Da mesma forma, a história natural da ELTM associada à EH não é completamente conhecida (13). De um modo geral, a gestação, parto e desenvolvimento dos indivíduos com ELTM são normais. As crises epilépticas, em geral, têm início no final da primeira década de vida, após um período latente, de duração variável, que se segue aos possíveis

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fatores precipitantes iniciais. As crises inicialmente respondem adequadamente à terapia com drogas antiepilépticas (DAEs) e podem entrar em remissão, mas geralmente retornam na adolescência ou idade adulta (6,7). No entanto, as crises epilépticas podem ter início mais precoce ou apenas na idade adulta. Da mesma forma, apesar da prevalência de pacientes com crises refratárias, um contínuo entre pacientes com crises facilmente controláveis com DAEs (14), pacientes com padrão de crises alternante entre períodos de remissão e de refratariedade (15) e aqueles com crises de difícil controle é observado.

O estudo de imagens de RM permite a detecção in vivo da EH (ELTM-EH). Na RM, a EH é caracterizada por redução do volume e perda da estrutura interna do hipocampo, melhor visualizadas nas imagens ponderadas T1, além de aumento de sinal nas imagens ponderadas T2 (16). Estima-se que cerca de 70% dos pacientes com ELTM apresentem EH (17). No entanto, a incidência exata de pacientes com EH é desconhecida, uma vez que a confirmação desta patologia só acontece nos casos de indivíduos com crises refratárias que são submetidos a resecção cirúrgica das estruturas temporais mesiais e sabe-se que a EH é também encontrada em indivíduos com controle adequado ou remissão de crises (18, 19). Outra dificuldade de se estimar a prevalência da EH é que o diagnóstico precoce, ainda na primeira década de vida, da ELTM-EH é dificultado devido à detecção pouco frequente de sinais desta patologia em imagens de RM de crianças, levando à hipótese de que a EH seja uma lesão que se desenvolve ao longo do tempo (13).

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1.4. ELTM e RM normal

A ELTM com RM normal (ELTM-NL) é um grupo de pacientes não tão minuciosamente estudados como a ELTM-EH. De acordo com a classificação vigente da ILAE (1), a ELTM-NL é considerada epilepsia criptogênica (ou de origem desconhecida, de acordo com a nova proposta de classificação das epilepsias (20)). O número exato de pacientes com ELTM-NL não é conhecido, mas estima-se que eles correspondam a cerca de 30% dos casos de ELTM sem lesões estruturais que não a EH (4).

Dados sobre a história natural da ELTM-NL são mais escassos na literatura. Na ELTM-NL, as crises epilépticas, em geral, têm início no final da segunda década de vida. Nestes indivíduos, antecedente de convulsão febril prolongada é pouco frequente (16, 21- 23).

Dentre os indivíduos com ELTM-NL, é possível que um grupo apresente EH sutil, sem redução de volume ou aumento de sinal T2 que possam ser detectados pelas técnicas atuais de neuroimagem. No entanto, de acordo com resultados recentes de estudos com protocolos adequados de RM de alto campo e anatomopatológicos de pós-operatórios de pacientes com ELTM-NL com crises refratárias às DAEs, o percentual de anormalidades histopatológicas compatíveis com EH nestes indivíduos é pequeno. Em uma série de pacientes ELTM-NL selecionados para a ressecção do lobo temporal com base em um protocolo RM 1,5Tesla (T), EH foi observada em 30% dos casos (24). Em estudo mais recente, com pacientes selecionados através de um protocolo "moderno" para avaliação pré- cirúrgica, incluindo RM de 3T, EH só foi identificada em 18% dos casos de ELTM-NL (25). Ainda, é possível que parte dos pacientes com ELTM-NL apresentem outros tipos de

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patologias sutis não detectadas nos exames de imagens, como DCF (4, 24, 25) ou ainda que representem um subtipo diferente de epilepsia focal sem alteração estrutural específica (4). Apesar dos avanços de neuroimagem, genética e patologia nas últimas décadas, cerca de um terço das epilepsias são classificadas como causa desconhecida (20). Dentro do grupo das epilepsias de causa desconhecida, a ELTM-NL apresenta a oportunidade única de comparação com a ELTM-EH, um grupo de pacientes com fenótipo semiológico e eletroencefalográfico semelhante, porém dano estrutural conhecido. Nesse sentido, o estudo da ELTM-NL é importante como uma comparação com ELTM-EH a fim de se compreender o papel da etiologia no prognóstico e evolução dessas epilepsias.

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