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Problemática 02: criação e financiamento de conteúdo fotojornalístico

3. DESAFIOS E ALTERNATIVAS PARA O FINANCIAMENTO DA PRODUÇÃO

3.3 Emphas.is: novas fronteiras para o fotojornalismo?

Voltada para o financiamento de projetos no campo fotojornalístico, essa plataforma busca estabelecer uma íntima ligação entre audiência e produtores de conteúdo, tendo por base, assim como o site de micropagamentos Flattr, o sistema de financiamento público (Crowdfunding). O conceito pode ser definido a seguir: propostas de produção de conteúdo são disponibilizadas no site para o público, que pode investir naquela pela qual se mostrar interessado. A ideia aqui é buscar recursos para custear o processo, não simplesmente o produto final. Vale ressaltar: se o projeto não atingir a quantia mínima para realização, os investidores são imediatamente reembolsados.

Contudo, diferente de outras propostas, que não oferecem um retorno direto para o investimento do usuário (ou seja, o próprio produto finalizado), a plataforma Emphas.is disponibiliza para o usuário acesso exclusivo à imagens, vídeos, material de trabalho e outros benefícios. Ademais, conteúdo em tempo real e utilização das redes sociais para acompanhamento do processo de criação também se apresentam como serviços ofertados. Mas é importante ressaltar que a escolha pela disponibilização desse material fica a cargo do fotojornalista, não da plataforma Emphas.is. Lançado em 10 de março de 2011, a plataforma Emphas.is já apresenta resultados, no mínimo, impressionantes: com, aproximadamente, quatro meses de atividades, seis projetos já se encontram totalmente financiados. De acordo com o site, 813 usuários/financiadores doaram o equivalente a $75.414,00, o que representa, em termos estatísticos, uma quantia de $92,76 por financiador, ou ainda 12.569,00 dólares por projeto.

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Figura 23: Projetos financiados apresentados no site Emphas.is (Fonte: http://emphas.is/)

O leitor não quer mais receber essa informação formatada que é parte de um modelo de comunicação de mão única. A maioria dos leitores procura pela informação que lhe interesse; querem participar e trocar ideias sobre o conteúdo oferecido, e, mais do que tudo, confia em suas redes sociais para se manter informado. Cada vez mais, o leitor confia mais no relato pessoal do que na reportagem objetiva; quer recomendações de pessoas próximas, quer decidir em qual nível de profundidade vai se inserir em uma história, quer discuti-la e moldá-la. Com Emphas.is, nós tentamos levar em conta todas essas tendências e fazer o leitor/espectador um parceiro no processo de produção, mais do que um mero consumidor. (GARAPA, 2010)

De acordo com Kadir Van Lohuizen, fotojornalista desde 1988, com trabalhos realizados em Angola, Serra Leoa e Sudão (cobertura de conflitos), a proposta lançada pelo site Emphas.is representa uma oxigenação na própria atividade fotojornalística. Para ele, desvincular os eixos de produção e financiamento pode dar início a uma verdadeira revolução no que diz respeito a própria escolha dos leitores em relação a que tipo de conteúdo gostaria de ser apresentadas e mesmo a que histórias gostaria de ter acesso. Ainda de acordo com Kadir, a procura por novos formatos de produção e circulação de conteúdo nos leva a descobrir um novo modelo de receita

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que se interconectará ao desejo dos usuários que se mostrarem dispostos a financiar todo esse conteúdo.

Se você me perguntar o que está acontecendo na mídia hoje, não haveria sequer um resultado da crise financeira global. A crise tem apenas acelerado uma tendência existente. Jornais têm se tornado parte de um grande conglomerado da mídia que não se refere apenas a fazer lucro, mas maximizar o lucro, e tudo o que fica no meio da maximização é simplesmente jogado fora. 37 (EMPHAS.IS, 2011)

Após receber parecer positivo do conselho editorial do site Emphas.is a respeito de uma proposta de criação de conteúdo a ser financiado pelos usuários, o fotojornalista alcançou a cifra de $16.148,00, o que ultrapassa os 15.500,00 dólares necessários, de acordo com Kadir, para realização do ensaio. Intitulado Via PanAm, o projeto busca, por meio de registros audiovisuais (fotografia, vídeo e áudio), abordar questões que dizem respeito as raízes das migrações nas Américas. O fotojornalista percorrerá 15 países (de Porto Rico ao norte do Alasca), produzindo histórias sobre a população local e desenvolvendo material que será disponibilizado para os financiadores. Outra novidade é a produção de conteúdo exclusivo para o dispositivo em formato de tablet, o IPad.

Figura 24: Tela inicial do projeto Via Panam (Fonte: http://emphas.is/)

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37 Tradução livre para: “If you ask me, what is happening in the media today is not even a result of the global financial crisis. The crisis has only accelerated an existing trend. Newspapers have become part of huge media conglomerates that are no longer about making a profit but about maximizing profit, and everything that stands in the

EA! !

Para Michael Kamber, fotógrafo do Jornal norte americano New York Times com trabalhos no Iraque, Afeganistão, Sudão, dentre outros países, a plataforma Emphas.is também representa novos horizontes para a atividade fotojornalística. Entusiasmado com as novas abordagens referentes ao financiamento da produção das imagens para imprensa, Kamber se mostra entusiasmado com as oportunidades. Para o fotojornalista, entre as características mais importantes da plataforma está a possibilidade de alcançar pessoas que realmente se interessam por causas que, muitas vezes, não conseguiam espaço na cobertura da mídia tradicional. Como exemplo dessa perspectiva, ele cita uma jovem fotógrafa do Iêmen, Amira Al Sharif, que desejava documentar a situação das mulheres na América. No início, Kamber confessa que se mostrou cético em relação à tentativa de arrecadação de fundos pela web. Contudo, mostrou-se bastante impressionado com os resultados: os cinco mil dólares dos quais precisava Amira foram arrecadados em menos de uma semana.

O mercado do fotojornalismo encolhe e não há como escapar. Esse é o futuro. Não será o futuro: é agora. Este é o caminho em que um monte de fotojornalistas estão indo para financiar seus projetos e ter seu trabalho exposto

para o público.

Há um lugar para a grande mídia. Sim há. Mas há um monte de fotojornalistas profissionais realmente bons lá fora, que não poderão mais obter as atribuições das revistas. Eles vão ter que ir diretamente ao povo para financiar esses projetos e para obter a espaço para falar sobre o que está acontecendo no mundo. 38 (EMPHAS.IS, 2011)

Essa aproximação com a audiência atrelada à realização de projetos os quais busquem ampliar ainda mais a relação do fotojornalista com os sujeitos também é destaque no projeto (já financiado) do fotojornalista belga Tomas van Houtryve. Buscando dar continuidade a pesquisa sobre o comunismo no século XXI, a proposta disponibilizada no site Emphas.is oferece ao financiador uma gama de opções de retorno sobre o investimento (de acordo com o valor pago), a saber: acesso ao ensaio fotográfico, acesso ao making off do material, um livro editado juntamente com os financiadores, ou mesmo uma palestra sobre a realização do trabalho.

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38 Tradução livre para: “As the market shrinks for photojournalism, I think there is no other way. It is the future. It is not even the future: it is now. This is the way a lot of photojournalists are going to fund their projects and get their

work out to the public.

“There is a place for the mainstream media. There is. But there are a lot of really good professional photojournalists out there that can no longer get the assignments from the magazines. They’re going to have to go directly to the people to fund these projects and to get the word out about what’s happening in the world”.

@B! !

Contudo, antes mesmo de lançar seu projeto no site de financiamento, o fotojornalista buscou estabelecer na rede mundial de computadores um público o qual apresentasse afinidade por seu trabalho. Para tal, ele recorreu às redes sociais, sites de notícias com participação de internautas, como também a (ainda em experimentação) microplataforma de financiamento, Flattr. Resultado: somente no Digg39, Tomas obteve mais de 1 milhão de “cliques” em 04 dias, o que transformou seu conteúdo em um dos mais acessados.

Um financiador significa muito mais para mim do que apenas um leitor em uma revista porque eles têm uma estaca na estória; a maioria dos leitores são igualmente distraídos pelos anúncios próximos às estórias. Isso aumenta um pouco a pressão também, mas não mais do que ter um editor que dá seu dinheiro para acompanhar a estória. Em ambos os casos, quando alguém investe em uma estória, você irá sentir um senso de comprometimento e irá querer fazer isso da maneira certa. 40 (HOUTRYVE, 2011)

Figura 25: Tela inicial do projeto proposto pelo fotojornalista Tomas van Houtryve (fonte: http://emphas.is/)

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39 Site que recebe e publica notícias (em audio, video e texto) enviada por usuários, permitindo que os mesmos analisem e parametrem o conteúdo.

40 Tradução livre para: “A backer means so much more to me than just a reader in a magazine because they have a stake in the story; most readers are equally distracted by the ads next to the story. That increases the pressure a little bit, too, but not more than having an editor who gave you money to accomplish a story. In either case, when someone invests in a story, you’re going to feel a sense of commitment and want to get it right”. !

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